Capítulo 4

1351 Words
Chego à fábrica e já percebo um olhar de pena ao meu redor. A notícia da gravidez da Nicole fez com que eu me tornasse ainda mais vítima de toda a situação. No início, ser vítima me fez vender mais, agora só está despertando uma comoção de pena, algo que eu detesto. Finjo não perceber o clima das pessoas e reajo com animação. Faço elogios, brinco, dou sugestões e tento amenizar o clima pesado que está no ar. Quando chego à minha sala, fecho a porta e encosto-me à mesma, já exausta do teatro que está só começando. Não consigo me concentrar no trabalho, continuo buscando as fotos. Preciso dela para fazer com que o Samuel assine o contrato de nossas empresas independentemente de nossa relação pessoal. Ele jamais arriscaria ver essa foto nos jornais, acabaria com sua imagem pessoal e prejudicaria seu relacionamento. Jamais a usaria, mas ele não precisaria saber, iria chantageá-lo, conseguir o que queria e pronto. Todos nós sairíamos ganhando. Eu peço uma relação dos fotógrafos do evento, e como foi praticamente todo mundo que participou do meu evento, consigo com facilidade o contato com eles. Peço para ligarem um por um atrás da foto e inclusive que seja ofertado o valor que fosse necessário. Mas nada de conseguir, o dia foi todo perdido, uma busca por algo que parece ter evaporado. Fim do expediente. Alice entra no meu escritório com a cabeça baixa já demonstrando que não tinha tido sucesso em sua pesquisa. Ela se senta na cadeira a minha frente e antes de falar o que eu já sei, suspira. — Ou ele sumiu com a foto, ou quem tirou não é um profissional, por isso não encontramos pessoa responsável. Infelizmente, não iremos conseguir essas fotos com facilidade, Lorena! O que estava ao nosso alcance, fizemos. Agora é esperar se quem tirou, não vendeu para o Samuel e chegue até a gente por livre e espontânea vontade. Bato a caneta levemente na minha mesa e solto o ar com força. — Ok, vamos voltar ao nosso foco. Conseguiu o planejamento de vendas? Também quero saber como está o andamento de nossas licenças para importação. Ela força um sorriso e começa a me mostrar os relatórios que está preparando. Finjo não ser atingida por um soco quando entendi que preciso desistir da foto. Finjo não ligar para o caminho que o Samuel me levaria, seria muito mais rápido e fácil do que exportar sozinha, sem a Ristretto ao meu lado. Conseguir o que desejo levará tempo, sabedoria e muita dor de cabeça com o Samuel lutando contra mim. A reunião demora e percebo que temos inúmeras pendências a serem solucionadas, dou um prazo de 30 dias para que possamos ter boa parte das pendências finalizadas ou, ao menos, em andamento. Quero ainda esse ano ter meus produtos nas prateleiras dos gringos e agora, para isso acontecer, o trabalho será redobrado. — Agora que já acabamos nossa reunião... — Ela faz aspas com as mãos. — Que tal sair para tomar um vinhozinho? Um happy hour seria uma boa opção para você dar uma desopilada. — Estou tão cansada, Alice, o que preciso mesmo é terminar de ler os relatórios que o pessoal do laboratório mandou e ir dormir. Ela balança os ombros. — Você vai para casa e vai ficar pensando sozinha na p***a da barriga daquela Nicole. Vamos comigo, a gente nunca mais conversou. Você emendou uma viagem na outra depois do que aconteceu com o Samuel. Tenho certeza que será bom para a gente. Suspiro. — Falei com a Verônica e ela também topou — ela insiste, levantando as sobrancelhas de forma frenética. — A Verônica aceita tudo, isso não é nenhum motivo extraordinário para eu mudar de opinião. — Ok, vou ser mais apelativa. Ela me disse que reservou nossa mesa naquele restaurante de vinhos que você ama e que dessa vez não vai beber Aperol. Ela vai entrar na divisão da garrafa de vinho da gente. Eu gargalho. A Verônica não toma vinho, depois de uma ressaca que vomitou inúmeras vezes e precisou ir para a emergência, ela jurou de pé junto que nunca mais iria beber vinho. — Ela até disse que não liga se precisar ir para a emergência de novo por ter tomado vinho excessivo conosco — ela continua insistindo. — Tá de brincadeira! — falo me divertindo. — Eu tenho umas contas para acertar com ela. Ela me arranjou um paquera péssimo e eu só vim saber depois que já tinha acontecido tudo. Estou pensando em me vingar hoje, enchendo ela de vinho, talvez umas cinco garrafas só para ela já de um bom resultado. — Ela sorriu com divertimento. — Você não tem nada para acertar as contas, não? Eu gargalho e fecho os olhos, pensativa. — Ela me deixou com a Zumi e a Clara, sozinha há uns 15 dias, enquanto passeava com a Frida no shopping. A Zumi fez um cocô que melou as costas todinhas, e a Clara teve um ataque de choro porque queria comer 4 barras de chocolate de uma só vez. Então eu realmente tenho motivos para querer me vingar. — Ela não deixou nenhuma babá com você? — Ela deu folga e só me avisou no dia. — E sua mãe? — Mamãe e papai estavam viajando no Caribe. — Seus motivos para uma vingança são muito maiores e melhores que os meus. Ela estica as mãos e fazemos um hi five. — Quanto tempo mais você precisa para a gente sair? Preciso avisar a Verônica que nossa vingança tem hora marcada hoje. Sorrimos juntas. — Mais uns 30 minutos e eu acho que consigo terminar. — Beleza, vou organizar minhas coisas e te espero lá no estacionamento. Assim que ela sai da minha sala, abro os relatórios que precisava ler, mas sou interrompida por uma mensagem no meu celular. “Princesa, pedi para o jurídico entrar em contato com você para a gente por um fim de uma vez em algumas pendências.” O Samuel era mesmo um babaca. Reviro os olhos várias vezes. “Querido, quais pendências você se refere?” Ele responde logo em seguida: “Princesa, quero o colar de volta. Pertence a minha família há anos.” Eu gargalho enquanto releio a mensagem. Ele só pode estar de brincadeira. “Deveria saber que presentes não podem ser simplesmente devolvidos.” Ele responde: “Em nenhum momento eu pedi para você devolver. Princesa, estou disposto a pagar o dinheiro que você quiser.” Meus olhos se enchem de lágrimas. “Assine os documentos de nosso trabalho em conjunto. Leve minha marca para o exterior junto com a sua, e o colar será seu.” Ele demora um pouco para responder. “Princesa, o desejo de ter o colar em minhas mãos de novo é só para atender ao pedido de uma recém-mãe. É um pedido pessoal e não profissional. Você sabe bem que não misturo as duas coisas. Somos concorrentes e do que depender de mim, você jamais vai estar nas mesmas prateleiras que eu novamente.” Respondo com as lágrimas escorrendo por meu rosto: “Querido, vá se f***r você, sua empresa e sua querida esposa!” Desligo o celular e desabo na mesa, chorando de raiva, de nojo, de tristeza. Eu preciso encontrar uma forma de vencer. Ele, com certeza, dificultará minha exportação. Sei que ele consegue por meios errados barrar inúmeros alvarás que preciso. Sei que irá burlar o que for necessário para me manter longe de meu sonho. Eu sei muito bem que ele irá usar a minha gana de vencer para me ter em suas mãos e ser seu brinquedo de diversão quando sua família não for mais atrativa. Ele quer que eu seja o que um dia a Nicole e tantas outras mulheres foram para ele, quando ele esteve comigo. E não, eu nunca tive que abrir as pernas para conseguir algo e não será dessa vez que farei isso. Eu não me tornarei a segunda opção oculta do Samuel, mesmo que isso signifique ter que desistir de um sonho.
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