O Dia do Casamento
Larah estava desesperada. Não conseguia entender como tudo havia mudado tão rapidamente. Apenas alguns dias atrás, ela estava no convento, preparando-se para fazer os votos que a tornariam freira. O convento era seu refúgio, seu lar, desde os 12 anos. Seu pai havia decidido mandá-la para lá depois que uma bomba foi encontrada no carro que a levava para a escola, oito anos antes.
Ela não sabia ao certo, mas todos diziam que quem colocou a bomba havia sido Washington Salermo. Diziam também que foi por causa disso que seu pai matou o líder da família Salermo e sua esposa. Dias depois, com medo de represálias, seu pai a levou para um convento em uma ilha distante, onde ficou até três dias atrás.
No convento, Larah tinha certeza de que aquela era a vida que queria. Mas tudo desmoronou quando seu pai apareceu de repente, dizendo que Robert Murray exigira sua presença na festa de aniversário de 70 anos.
— É apenas um evento — dissera Antony Hoffa, tentando acalmá-la. — Você estará de volta ao convento antes de perceber.
No entanto, ao chegar à festa, tudo mudou num piscar de olhos. Sem entender como, foi arrancada dos braços do pai, que gritava, parecendo tão surpreso quanto ela. Era evidente que a cerimônia também era uma surpresa para ele. Mas nada adiantava gritar. Em poucos minutos, vestiram-na com um vestido de noiva. Tudo parecia um borrão; ela m*l conseguia raciocinar quando foi levada para a igreja e colocada diante do padre e de um homem que nunca havia visto antes.
Agora, ali de pé, com o véu cobrindo seu rosto, Larah só conseguia chorar. As lágrimas escorriam silenciosas enquanto ela olhava ao redor, buscando desesperadamente uma saída, uma explicação. Sua vida havia mudado completamente nos últimos dois dias, e agora ela estava ali, na igreja, amedrontada com seu destino e com aquele homem que parecia carregar apenas ódio no coração.
Rômulo, seu noivo forçado, mantinha um olhar frio e c***l. Ele a observava por detrás do véu com desprezo, como se ela fosse responsável por todas as tragédias que haviam ocorrido em sua vida. Larah tremia. Estava perdida, confusa e obrigada a fazer algo que nunca quis.
O padre prosseguia com a cerimônia, mas Larah m*l conseguia ouvir suas palavras. Seu coração batia tão rápido que ela sentia que poderia desmaiar a qualquer momento. Quando finalmente o padre anunciou que eles eram marido e mulher, tudo parecia um pesadelo do qual ela não conseguia despertar.
Na saída da igreja, seu pai a abraçou com força, um gesto que não lhe trouxe conforto, mas sim mais medo.
— Nunca abaixe a cabeça para um Salermo, Larah. Nunca! — sussurrou ele em seu ouvido, suas palavras carregadas de rancor e determinação.
Antes que Larah pudesse responder, Antony virou-se para Rômulo, seu olhar duro como pedra.
— Se minha filha sofrer um arranhão, Rômulo, eu mato você. — Sua voz era grave, uma ameaça clara.
Rômulo o encarou com frieza, os olhos faiscando de raiva contida.
— Prática de bater e matar mulheres é coisa dos Hoffa, sogro, não dos Salermo. — Suas palavras cortantes deixaram o ar ainda mais tenso.
A festa de casamento ocorreu na casa de Robert Murray, mas Rômulo não olhou para Larah nem por um momento. Ela se sentia completamente isolada, perdida em um mundo onde nada fazia sentido. Os convidados murmuravam entre si, sussurrando sobre o absurdo daquela união. Larah permaneceu quieta, olhando ao redor com os olhos marejados, sentindo-se mais sozinha do que nunca.
Mais tarde, foi levada para um quarto grande e opulento, onde se esperava que consumassem o casamento. O quarto estava decorado com flores e velas, mas para Larah era apenas uma prisão. Ela esperou, tremendo de medo, enquanto os minutos se arrastavam lentamente. O silêncio era opressor, e cada som a fazia sobressaltar.
Porém, Rômulo não apareceu. Ela passou a noite sozinha, sentada na beira da cama, abraçando as próprias pernas, sem conseguir parar de chorar. Cada lágrima que caía era um grito silencioso de desespero e impotência.
Ela entrou em seu próprio mundinho e relembrou seu último dia no convento.
Lembranças de Larah
Larah estava agachada ao lado de Bessie, uma égua de olhos grandes e expressivos, que ofegava pesadamente, suas narinas dilatando a cada tentativa de empurrar o potro para fora. A pequena estrebaria do convento estava silenciosa, exceto pelos gemidos de Bessie e as palavras de encorajamento sussurradas por Larah. Ela acariciava a barriga suada da égua, tentando, em vão, aliviar seu sofrimento.
— Vamos, Bessie, você consegue, garota. Só mais um pouquinho — murmurava, quase como uma prece. O suor escorria pela testa de Larah, misturando-se às lágrimas silenciosas de frustração.
Depois de horas de agonia, sem progresso aparente, o veterinário foi chamado. Ele observou a situação com olhar clínico e meneou a cabeça com seriedade.
— Teremos que forçar o parto. A égua está exausta e o potro pode estar preso.
Larah sentiu o coração apertar. Não queria que Bessie sofresse mais, mas a ideia de uma intervenção brusca a apavorava. Ela se aproximou da cabeça da égua, encostando sua testa na dela, buscando uma conexão silenciosa.
— Bessie, você precisa ajudar a gente. Vamos, querida, força — sussurrou, como se pudesse transmitir sua própria energia para a égua.
Como se entendesse cada palavra, Bessie começou a empurrar com uma nova determinação. O esforço foi doloroso e Larah, desesperada, colocou as mãos na lateral do ventre da égua, incentivando-a. Então, um grunhido gutural escapou do animal e o potro finalmente começou a sair. Larah viu a cabeça do potrinho emergir e, em seguida, todo o corpinho molhado deslizar para o chão de palha. Lágrimas de alívio e felicidade explodiram nos olhos de Larah.
O potro, ainda trêmulo e coberto com a membrana amniótica, fez um esforço para ficar de pé, tropeçando nas próprias patas desajeitadas. Larah riu, o som ecoando pelo celeiro, enquanto limpava o pequeno com as mãos, sem se importar com a gosma que se espalhava por seus braços e roupas.
— Você conseguiu, garota. Você conseguiu! — exclamou, abraçando o pescoço de Bessie, que relinchou baixinho, exausta, mas satisfeita.
Nesse momento, a porta da estrebaria se abriu e uma das freiras, Irmã Bernadette, entrou apressada. Seus olhos se arregalaram ao ver Larah coberta de líquido amniótico, os cabelos grudados na testa.
— Larah, você tem visitas urgentes. Eles estão esperando na sala de visitas. Não temos tempo para você se limpar.
Larah piscou, confusa, o coração ainda acelerado pela emoção do parto. Mas as palavras da irmã eram claras. Ela lançou um último olhar ao potro, que agora estava firmemente de pé ao lado da mãe, antes de sair apressada.
Caminhou pelo convento, ainda envolta no cheiro da estrebaria e coberta com restos de placenta e palha. Entrou na sala de visitas e parou abruptamente ao ver seu pai, Antony Hoffa, sentado na poltrona de couro, com um semblante severo. Ele ergueu uma sobrancelha ao vê-la naquele estado.
— Larah, por que diabos você tem pedaços de placenta nos sapatos? — perguntou, a voz grave com um toque de incredulidade. Antes que ela pudesse responder, a madre superiora entrou na sala, sua expressão neutra, mas firme.
— Senhor Hoffa, peço desculpas por sua filha. Larah, vá arrumar suas coisas. Você está voltando para casa.
Larah piscou, surpresa e alarmada.
— Mas, madre, e meus animais? — perguntou, sentindo o pânico se instalar. A madre superiora não respondeu, apenas virou-se para sair da sala, deixando claro que a discussão estava encerrada.
— Eu preciso arrumar alguém que cuide deles. São pequenos, vão morrer sem meus cuidados.
Antony, sabendo da paixão da filha por criaturas, disse sério:
— Voltaremos em poucos dias, e, se demorarmos mais, eu mando buscar.
— Todos eles ? - Larah perguntou
— Todos eles! — garantiu o pai
Com o coração pesado por deixar seus bichinhos, Larah subiu para sua cela. Lá, encontrou seus companheiros de quatro patas — um bezerro frágil, dois passarinhos de penas opacas, um porco de orelhas caídas e um lobo de olhar astuto. Ela acariciou cada um deles, sussurrando palavras de conforto e prometendo que não os abandonaria.
Uma hora Larah sorriu sapeca ao ver o pai olhar para ela , boquiaberto ao ver a filha ela com uma pequena procissão de animais. A menina era uma espécie de São Francisco.
— Isso... isso tudo.... eles todos são seus? — perguntou, olhando para o bezerro sendo conduzido com uma corda improvisada, os pássaros empoleirados em sua bolsa e a porquinha em seus braços.
— Sim, esses são Rômulo o bezerro, Ana e Ema os passarinhos e a porquinha e Fifi em homenagem a minha avó Josefina que era redonda e rosada. - Larah riu da considencia seu bezerro e seu marido tinham o mesmo nome.
— Você colocou o nome da minha mãe em uma porca?
— É uma homenagem pai. - Larah disse seria — E ela realmente parece com a vovó.
— Larah se comporte — A madre disse — Pare com essa mania de colocar nomes de pessoas nos bichos, já magoou muitas pessoas.
— Como eu ia saber que a irmã Clara iria chorar porque coloquei o nome dela numa cobra? Foi a senhora que disse que a irmã Clara tinha língua de serpente.
— Larah!
— Desculpa madre. — Antes da madre responder Larah puxou o pai — Vamos, tenho que levar todos para o celeiro e ensinar a irmã Creusa como cuidar deles, porém eu não posso deixar Fifi para trás — disse Larah com uma determinação — Ela não fica bem sem mim.
Larah foi para os estábulos depois para o celeiro e se despediu de cada amigo.
Com o coração doendo foi com seu pai.
* * *
A porta se abriu quando as primeiras horas da manhã se anunciaram interrompendo as lembranças de Larah, era Rômulo...
Continua....