Capítulo 10

1687 Words
1 MÊS DEPOIS... Tudo aconteceu tão rápido depois daquele dia. Eu, simplesmente, não suportava ficar muito tempo na presença de Hades e, quando ele não me obrigava a me sentar ao seu lado durante o jantar, eu me trancava no meu quarto para não ter que interagir com ele. O problema, no entanto, era que agora eu tinha que conviver com a porcaria da família de Hades, como se não fossem pessoas horríveis como ele — e pelo que me lembro da mãe de Hades, todo mundo parece me odiar. No dia do meu casamento, eu não tive tanto contato com todas aquelas pessoas, mas agora eu teria. Não esperava que minha família me cumprimentasse ou me chamasse para me juntar a eles. Não me ligaram desde que cheguei aqui. Pareciam querer me apagar completamente da história deles. Estou me olhando no espelho. O vestido vermelho e longo faz com que eu me sinta ainda mais bonita. Cada curva do meu corpo é valorizada pelo tecido, como se eu fosse realmente deslumbrante. Queria que meu marido pensasse o mesmo, penso. Afinal, mesmo que a minha cabeça esteja trabalhando para mantê-lo afastado, não posso negar que eu adoraria receber seu amor, sua atenção, o mínimo de carinho. Ainda que eu seja uma mulher forte e acostumada com isso, no fundo, eu só queria ser acolhida. É tão difícil ter que lidar com esses sentimentos. Hades entra no quarto, ajustando o relógio no pulso. Ele está impecável em seu terno preto, como sempre, mas a expressão dura e os olhos frios são como uma navalha contra minha pele. — Está pronta? — Sua voz sai curta, direta. Faço que sim com a cabeça. Ele me olha rapidamente, os olhos passando pelo vestido, mas não diz uma palavra. Nenhum elogio, nenhuma crítica. Apenas o silêncio. Isso me atinge mais do que qualquer insulto que ele poderia ter lançado. Quando chegamos à mansão da família Di Tempesta, as luzes externas brilham como se fossem estrelas. Um contraste c***l com o ambiente que sei que me espera lá dentro. Assim que entramos, todos os olhares se voltam para mim. Alguns de curiosidade, outros carregados de desprezo. — Ah, a recém-chegada! — Uma mulher elegante, com cabelos castanho-claros presos em um coque impecável, comenta com um sorriso que não chega aos olhos. — Tate, não é? A esposa de Hades. — Sim — respondo, tentando manter a postura. — Que coragem sua, vir aqui hoje. — O tom dela é neutro, mas sinto a provocação nas entrelinhas. — Por que eu não viria? — rebato, tentando não demonstrar o desconforto. Ela ri, mas não responde. Em vez disso, lança um olhar para outra mulher, que sussurra algo e ri baixinho. — Parem de ser linguarudas. — Um homem diz. Ele é o mais velho, parece ter na casa do setenta anos. — Veja quem chegou. — Vovô. — Hades diz. — Tate, minha mais nova neta. — O mais velho diz, enquanto vem até mim para me abraçar. — Está deslumbrante. Meu neto teve mesmo bom gosto na hora de escolher uma esposa. Minhas bochechas coram e eu me encolho um pouco. — Obrigada por me receber. — Eu digo, por fim. — Não, não. É sempre bem-vinda nessa casa. Quando meu neto for o crápula que sei que ele será, pode vir passar o dia comigo. Podemos tomar chá e jogar xadrez. — Ele faz uma pequena pausa, segurando a minha mãe. — Giulia disse que você gosta de fotografia, tenho que te mostrar algumas mais tarde. — O senhor fotografa? — Era meu sonho antes de ter que comandar homens e matar pessoas, querida. — Ele dá uma risada. Eu o acompanho. — Vamos, vamos. Hades, não a sufoque muito hoje. Vou conferir o jantar. E ele se vira, carregando sua bengala e indo para a cozinha, em deixando sozinha na sala, no meio de um monte de pessoas que não parecem gostar nenhum pouco da minha presença. Outros se aproximam e todos parecem ser só educados. Sem comentários ácidos ou olhos mortais, apenas indiferentes — como se não se importassem. E isso ainda é melhor que ser subjugada, amaldiçoada e culpada por uma coisa que não tive controle quando aconteceu e que eu sequer sei o que é. — Hades, meu primeiro querido. — Um rapaz diz, dando um sorriso de canto para Hades. Seus olhos brilham em divertimento e meu marido bufa, olhando-o de cima abaixo. — Giovanni. — Sua voz é cheia de desgosto, como se odiasse estar ali, na presença dele. Eu observo a dinâmica dos dois em silêncio. — Então, você é a famosa Tate — ele diz, inclinando-se para beijar minha mão. — É um prazer finalmente conhecê-la. — O prazer é meu — respondo, desconfortável com a proximidade. — Não sabia que Hades era tão sortudo. — Ele sorri de um jeito que me faz sentir observada demais. Antes que eu pudesse responder, Hades se aproxima, colocando-se entre mim e Giovanni. — Giovanni, vá incomodar outra pessoa. Não a minha esposa. O primo ri, levantando as mãos em rendição. — Calma, primo. Só estou sendo gentil. Hades não responde. Apenas me pega pelo braço e me conduz até a sala de jantar. Ele não olha para mim, mas o aperto de sua mão é firme, possessivo. — Hades, está me machucando. — Sussurro, para que apenas ele possa ouvir. Ele não responde, mas o toque dos seus dedos suaviza. Ele puxa uma cadeira para eu me sentar e se senta ao seu lado. Logo a minha frente, no lado oposto ao da mesa, Giovanni. Eu posso sentir os olhos daquelas mulheres em mim, como se eu fosse um ponto sujo ali. Como se eu não devesse estar sentada a mesa como eles. Como se eu fosse nojenta e insignificante. Elas me olham como Hades me olha. Elas me olham com o mesmo desdém que ele e isso faz com que eu queira me levantar e andar pelas ruas sozinhas, torcendo para que a minha sorte mude. — É uma pena, sabe? — uma delas diz, olhando diretamente para mim. — Algumas pessoas não entendem que certos acontecimentos podem arruinar uma família inteira. — Isso mesmo. — Outra concorda. — É difícil conviver com o peso das ações de outros. Não entendia exatamente o que elas queriam dizer, mas as palavras parecem mirar em mim como flechas. Hades permanece calado durante toda a refeição, interagindo apenas quando absolutamente necessário. Ele me ignora completamente, como se eu fosse invisível. E, no entanto, há momentos em que sinto seu olhar em mim, pesado, como se estivesse me avaliando. Giulia está sentada ao lado de Hades, em silêncio, comendo devagar. Ela evita me olhar, mas percebo a tensão em seus ombros, como se quisesse desaparecer. Não conseguimos conversar ainda, mas quero perguntar a ela como está, se a sua mãe fez alguma coisa. Está usando roupas mais largas e mais feias do que tinha usado na minha casa — ao menos, durante toda a semana que se passou, ela parecia mais feliz e mais solta. Eu estava começando a suspeitar do que tinha acontecido, mas preferia que ela me contasse. Que dissesse na minha cara o que eu tinha feito — ou, no mínimo, do que eu era culpada para pagar. Quando o jantar termina, desconfortável, Hades sai com os homens e outros para o escritório. Eu me encolho no momento em que Giulia é puxada com toda brusquidão pela mãe e pelas tias para o Jardim. Eu estou sozinha na sala, sentada no sofá, deixando minha mente vagar por todos os acontecimentos da noite. Quero ir embora. Quero me enfiar no meu quarto e não sair mais. Não mereço viver uma vida assim. Uma presença ao meu lado me faz pular. Não esperava que alguém se sentase ao meu lado. Não esperava que alguém quisesse falar comigo. — Não posso deixar você aqui sozinha — ele diz, puxando uma cadeira para se sentar ao meu lado. — Está gostando da noite? — Está tudo bem, obrigada. — Você merece mais do que apenas "tudo bem". — O sorriso dele é descarado, e eu fico ainda mais desconfortável. — Não merece o que estão fazendo com você. — Ele suspira. — Veja bem, querida, é uma mulher bonita e observadoram, percebe que todas aquelas mulheres querem te afetar. Saiba que é porque são mais feias do que você e tem... Antes que ele pudesse continuar, Hades aparece novamente, sua expressão endurecida. — Acho que está na hora de irmos embora. Não há espaço para discussão. Ele me puxa pelo braço, e, desta vez, sua mão não solta até que estejamos de volta ao carro. No caminho de volta, ele fica em silêncio, mas seus dedos estão apertando o volante com força. É como se alguém o tivesse incomodado. Falta pouco para a meia noite e já viemos embora — não vou reclamar, tudo lá parecia muito desconfortável — mas, esse vai ser um natal triste, tenho que assumir. Vou ficar sozinha em meu quarto. Eu e minha própria insignificância. Quando finalmente chegamos à mansão, ele para no meio do corredor, se virando para mim. — Giovanni é perigoso — ele diz, sem emoção. — Mantenha distância. — Como se você se importasse. Ele me encara, seus olhos escuros fixos nos meus. — Não teste minha paciência, Tate. E, com isso, ele desaparece no corredor, me deixando sozinha novamente. Como sempre. Chego ao meu quarto e sinto as lágrimas querendo deixar meus olhos. Uma dor se alastra no meu peito enquanto me livro do vestido, da maquiagem, do penteado. As palavras de Giovanni me perfuram como uma faca. Todos nessa família me odeiam? Me visto com o meu pijama e estou pronta para me deitar quando duas batidas na porta me preenchem. Segura de que é alguém confiável, eu abro-a. Um sorriso se espalha pelo meu rosto no exato momento em que vejo quem é. — Eu não podia te deixar sozinha. — Giulia diz, segurando uma espécie de cesta. — Eu peguei doces e seu presente. Feliz natal!
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