— Sinto muito pela minha mãe. — Ela murmura, baixinho. — Ela é um pouco intensa quando o assunto é ser contrariada.
— Minha bochecha percebeu isso.
— Meu irmão parece gostar de você. — Ela diz, do nada. Seus olhos me analisando, esperando qualquer reação de mim.
Queria dizer que sim, que somos imensamente apaixonados e que ele daria o mundo por mim, mas sei que é mentira. Ele não daria. Meu marido, por algum motivo que não sei — e que, pelo que me lembro, envolve o que aconteceu com Giulia, me faz pagar pelos erros de outras pessoas de maneira c***l.
Ele quer ser meu algoz e eu apenas aceitei meu destino. Estou pronta para receber o que vier, torcendo para que eu sobreviva e não parta em um milhão de pedaços. Torcendo para ter uma vida boa, minimamente descente e não me tornar uma casca oca e sem sentimentos.
— Ele não gosta. — Digo, por fim.
— Como tem tanto certeza? — Pergunta, curiosa. Parece que ela começa a se soltar e mesmo que esse sentimento me incomode um pouco, ainda é um passo largo demais para voltar atrás.
Giulia seria a primeira pessoa dessa família que me daria uma a******a — mesmo que pareça que ela mesma não se dá bem com seus familiares.
— Não se engane, Hades está me defendendo pois ser agredida por qualquer pessoa pode estremecer sua autoridade. — Eu paro de fazer meu sanduíche, olhando-a por um segundo. — Na verdade, acredito que ele tenha um pouco de nojo de mim.
— Mas você é tão bonita. — Ela exclama.
— Mas ainda tenho o DNA do meu pai e Hades o odeia, odeia toda a minha linhagem e prometeu que eu pagaria por algo que fizeram com a sua família. — Eu dou de ombros. — Eu sou apenas uma peça no jogo sádico de todo mundo.
Ela me analisa por um segundo, parecendo me analisar.
— Afinal, todas nós somos. — Ela diz, depois de um minuto de silêncio.
— Não. Nem todas. — Eu sorrio para ela, mesmo que dizer isso doa em uma parte dentro de mim que ainda é sensível. — Hades te ama, faria qualquer coisa por você. Posso ver nos olhos dele. Você não está na mesma posição que a maioria de nós, tem sorte.
— E mesmo com tudo isso, ainda me machucaram. — Ela sussurra.
— O que aconteceu com você? Eu posso saber? — Eu pergunto, baixando a minha voz.
Um silêncio recai sobre nós. Não levanto meus olhos para ela; Não enquanto ela parece digerir a pergunta em seu cérebro, pensar se pode confiar em mim, se pode me contar sobre isso, ou ainda pior, se quer me contar sobre isso.
— Giulia, levante-se, nós vamos embora. — Sua mãe diz, da maneira mais arrogante que consegue, invadindo a cozinha com seus saltos barulhentos batendo sobre o piso de cerâmica.
Observo como a garota fica desconfortável. Como se retrai quando a sua mãe se aproxima. Olho para ela, para a mãe, para Hades com as bochechas vermelhas de raiva, a veia da sua testa pulsando, seus dedos fechados em punhos e por fim, recaem sobre o meu sanduíche.
— Na verdade, eu estava fazendo um sanduíche para Giulia. — Minto, colocando meu prato na frente dela. Ela me lança um olhar desesperado, grato.
— Giulia não precisa comer isso. Não dessa mulher. — Ela diz, sua voz saindo esganiçada. Está com raiva, quer me matar, quer estrangular a própria filha por aceitar algo de mim, posso sentir. — Você não tem comida em casa?
— Giulia pode comer aqui, não tem nenhum problema. — Eu digo, entre dentes. — Depois, se ela desejar, eu mesma garanto que ela chegue em casa em segurança, com um dos nossos motoristas.
— Eu não estou falan...
— Eu gostaria de ficar. — Minha cunhada disse, por fim. Sua voz saindo mais baixa e mais suave, como se estivesse morrendo de medo. — Eu quero ficar.
— Giulia, você não...
— Mamãe... — Sua voz sai como uma súplica. — Ela é boa. Não adianta me dizer coisas ruins quando ela tem me escutado mais do que qualquer pessoa da nossa família, e só estamos aqui na cozinha a dez minutos. — Ela me olha. — Eu quero ficar e quero conhecer a Tate.
— Não é uma opção.
— Ela já disse que quer ficar. — Hades intervém. Finalmente, um alívio me percorre. — E ela vai ficar o tempo que achar necessário. Ela é minha irmã e é bem vinda na minha casa.
Sua mãe parece odiar a idéia, seus olhos passam por mim e por ela.
— Você vai se arrepender disso e vai me ligar chorando, suplicando. — Ela diz, entredentes.
A mulher se vira bruscamente, saindo batendo no ombro de Ares com força. Ele a encara por cima do ombro, pronto para intervir, mas ela sai em silêncio.
Eu olho para Giulia, que agora está sorrindo para mim. Ela parece estar realmente grata.
— Nós podemos fazer chá gelado? — Ela pergunta.
— Quer usar roupas mais frescas? Eu posso te emprestar um vestido.
— Eu... não sei... — Ela se encolhe, olhando para os lados.
— Vou dispensar todos os homens trabalhando nessa casa. Eles ficarão do lado de fora. — Hades fala.
Vejo suas bochechas corando e ela acena com a cabeça para mim.
— Eu adoraria, Tate. Seria muito gentil.
— Então, vamos. — Eu digo, animada.
Seria a primeira vez que eu teria uma irmã. Seria a primeira vez que eu teria alguém para cuidar, alguém que gostasse de me ouvir. Eu estava em êxtase. Queria que Giulia gostasse de mim.
— Pode comer o sanduíche, Hades. É de peito de peru. — Eu digo quando passamos por ele.
Ah, eu estou tão animada para isso. Não consigo acreditar que isso está mesmo acontecendo.
Eu vou dar meu máximo para cuidar de Giulia e fazer ela se sentir em casa.