O EXPRE55O 4BB4DON

2396 Words
Todos os seres humanos, desde que surgiram neste mundo, seja criados por Deus, ou evoluídos através da teoria de Darwin, possuem anseios e ideais a realizar. Alguns almejam tanto alcançar esses ideais, que quando não conseguem fazê-lo em vida, tentam realizá-los depois da morte. Em meados de 1942, um jovem policial chamado Saymon Strauss, recém fugido de uma prisão militar em Frankfurt, cuja pena fora insubordinação, por não ter assassinado um grupo de dezesseis meninas judias, após elas terem sido estupradas pelo alto escalão nazista, anda o mais depressa possível por uma estrada nos arredores de Mainz, seguindo em linha reta até a estação de trem mais próxima, a fim de pegar um trem rumo à liberdade fora da Alemanha. - Sei que vou conseguir chegar até a estação mais próxima, rumar até o porto mais perto do litoral, entrar em um barco rumo à América e conseguir minha liberdade definitiva do outro lado do mundo. Lá eu vou conseguir realizar o meu sonho de ser maquinista, me casarei com uma índia americana e passarei o resto de minha vida cruzando o país em minha máquina à vapor – pensava o jovem Saymon, em voz alta. O que ele não esperava é que em uma curva da estrada, um grupo de ladrões e salteadores espreitava todos os passantes, para furtar tudo o que pudessem. Eles estavam escondidos por trás das árvores e arbustos, espiando todos os passantes, analisando as presas mais fáceis de abordar, até que se admiraram com Saymon e suas vestes, que apontavam um certo prestígio social. - Olhem rapazes: esse parece que está cheio de dinheiro. - Vamos nos certificar agora mesmo! Eles então cobriram os rostos com lenços, sacaram suas baionetas e praticamente pularam em cima de Saymon. - Em guarda! - Pelo ninho da águia: salteadores! O que eles não contavam era que Saymon após a fuga da prisão militar em Frankfurt, conseguiu trocar uma cruz de ferro de segunda classe por uma baioneta K98 e uma Walther 38 e alguns marcos alemães em cédulas e moedas, tamanha a bravura a cruz que ele possuía representava. Só que ele não teve tempo de sacar a pistola e lutou com os salteadores apenas com a baioneta. Saymon lutou bravamente contra os salteadores, pois apesar de seu único crime ter sido o de insubordinação, ele era um exímio combatente na luta corpo a corpo, que estava fazendo os salteadores ficarem em desvantagem. E estava indo bem, até o momento em que ele se distraiu e levou uma estocada nas costas, caindo no meio da estrada, desacordado. Horas depois, Saymon acorda, tateia o próprio corpo, vê que não está ferido e procura por seu dinheiro. Os ladrões levaram tudo, ou melhor: pensaram que levaram tudo. Quando Saymon enfia a mão dentro da camisa, ele percebe que eles não tiveram tempo de revistá-lo e haviam sobrado trinta moedas dentro de uma pequena bolsa. - Ladrões idiotas, ha, ha, ha, ha! Levaram o dinheiro de meus bolsos, mas não revistaram o resto de minhas roupas. O que guardei neste saquinho dentro da minha blusa, eles nem tocaram! Agora vamos continuar a rumar até a cidade mais próxima. O que Saymon não havia percebido, é que a estrada havia ficado mais sombria. Mas sua vontade de fugir era tanta, que ele nem havia reparado nisso. Ele caminhou até o final do dia, quando já adentrava em uma pequena cidade desconhecida por ele, cujo nome ele não conseguia traduzir, mas pela placa escrita em alemão, logo na entrada, era chamada de Deskörperlos: uma cidade bem típica alemã, que parecia não ter sofrido, muito menos se abalado em nada, com a Segunda Guerra, pois apesar do ar sombrio, ela se mantinha com suas casas intactas, como se a guerra não tivesse passado por lá. Ele então ruma para a estação de trem mais próxima. Mas antes de chegar lá, ele entra na primeira taberna que encontra, para obter alguma informação sobre algum trem ou sobre alguém que pudesse ajudá-lo. A taberna se chama Sieben Häute e ficava perto da estação de trem, da cidade que mais parecia protegida a todo custo pelo III Reich. Pois nela não se ouvia os sons da guerra e as pessoas pareciam tranqüilas, longe de toda a loucura que a guerra causa. Saymon entra, senta-se numa mesa próxima do balcão, chama a copeira, que atendia pelo nome de Emma Oliver, ou simplesmente Emma O. e pede uma caneca de vinho. A atendente trás a caneca e o serve. Ele agradece e antes dela se retirar, Saymon pergunta: - Copeira, não sabe como posso arrumar uma passagem barata, para ir embora da Alemanha o mais rápido possível? A copeira se desculpou dizendo não saber de nada. Mas sempre aparecem ricos donos de fábricas por ali, atrás de trabalhadores. Saymon agradeceu e ficou lá na taberna, bebericando seu vinho, pensando em como iria sair dali, sem que a SS o encontrasse. Foi quando um homem que estava sentado em um canto escuro da taberna, aparentando ter uns sessenta e seis anos, mas com cabelos e bigodes pretos, dono de um olhar extremamente satânico, se aproximou de Saymon e sem perder a seriedade, puxou assunto com ele. - Desculpe-me jovem, mas ouvi sua conversa coma copeira e posso ajudá-lo. - Como assim, me ajudar? - Me chamo Lúcio Fernandes e sou um rico fabricante de armas. Estou indo para o novo mundo abrir uma fábrica de armamentos e estou recrutando pessoas que estejam dispostas a mudar de vida, começar do zero, entende? Sem nem pensar duas vezes, Saymon viu ali a grande chance da sua vida, abriu um sorriso no rosto e perguntou o que ele precisaria fazer para ingressar na fábrica do Sr. Fernandes. Ele, enfiando a mão em seu casaco, retirou um papel, uma pena e uma pequena adaga. - Assine esta carta de recomendação e leve-a no endereço abaixo: é a casa onde estou hospedado aqui na cidade. Entregue-a para meu criado e ele lhe dará uma autorização para viajar no meu trem. Agora vá o mais rápido possível, pois o trem parte amanhã de madrugada, às três da manhã em ponto. Saymon pegou o papel e a pena às pressas. Mas quando foi assinar, percebeu que a pena estava sem tinta. Afoito, ele perguntou onde iria encontrar tinta. Sua resposta veio através da atitude do Sr. Fernandes: com o punhal, ele perfurou o próprio dedo, molhou a pena e a entregou para que Saymon assinasse o papel. Após assinar, o jovem agradeceu ao Sr. Fernandes, depois saiu correndo de dentro da taberna e rumou para o endereço que estava mencionado logo abaixo. E como não conhecia nenhuma rua daquela cidade, saiu perguntando até chegar exatamente do outro lado da estação. Ao se deparar com a casa, uma sensação de repugnância tomou conta dele, pois a casa era de um terror sem explicação: paredes, janelas e portas escuras, nenhuma planta viva ao redor e com uma decoração ainda mais assustadora: na frente da casa, um gato preto, caolho e enforcado, decorava de maneira macabra, a estranha residência.  Na porta, uma aldrava em formato de corvo com as asas abertas e abaixo, entalhadas na madeira, a frase: ego autem pune. Como o latim para Saymon era algo de outro mundo, ele não se atentou, nem procurou saber o que significavam aquelas palavras. Assim que Saymon bateu na porta, um homem coxo, recurvado, com uma enorme corcunda extremamente saliente o atendeu. Ele se apresentou secamente e seriamente como Marduque, criado do senhor Lúcio Fernandes. Na hora, o jovem quase morre assustado com a feiúra e a frieza do homem. Mas como estava decidido a ir embora daquela guerra de uma vez por todas, enfiou a mão no casaco e tirou de dentro dele, a cara que assinou na taberna. Extremamente sério como uma estátua de sal, o criado de nome Marduque, pega o papel, confere a assinatura de Saymon e abre um sorriso de satisfação, como se tivesse ganho algo muito valioso. - Quer dizer que o jovem quer ser funcionário do senhor Fernandes na América? Espere um momento, por favor, que vou ali pegar sua autorização para embarcar no trem das onze, das onze não, digo... No trem das três da manhã! O criado entra, com sua perna coxa e sua corcunda, até uma sala, retornando poucos minutos depois, com outro papel, diferente do primeiro, nas mãos. - O senhor Fernandes mandou este envelope com sua passagem de trem. Pegue tudo o que você tiver de bagagem e vá para a estação. Lá você vai esperar o expresso ABBADON, que para no portão 616. Boa sorte no novo mundo! Saymon pega o envelope, agradece ao criado e fica zanzando pela cidade até a madrugada do dia seguinte, que era justamente uma sexta-feira 13. Lá chegando, a surpresa: a estação estava lotada. Pessoas de vários lugares se aglomeravam no portão 616, para pegarem o trem e irem embora. Talvez todos eles sejam refugiados ou foragidos como Saymon, mas não dava para perceber isso. Ele sabia apenas que muitos soldados estavam fugindo, pois dava para ver muita gente em trajes militares na estação. Quando o relógio da estação já apontava ser duas e meia da manhã, ele chegou: enorme, com muitos vagões de passageiros, forte, brilhante e imponente. Na sua lateral, o nome enorme escrito em letras garrafais já deixou todos da estação agitados: ABBADON. Era ele, o trem que o senhor Lúcio Fernandes havia falado. Assim que parou, as pessoas começavam a se acotovelar, com as cartas do Sr. Fernandes nas mãos, querendo entrar o mais rápido possível. Mas os bilheteiros e seguranças do trem, disseram que somente às três da manhã era que eles poderiam subir. De repente, uma agitação tomou conta de toda a estação, deixando os bilheteiros, seguranças e funcionários do trem bastante agitados. Era um comboio de mais de quatro caminhões que cercava toda a estação. De dentro dele desciam vários soldados que mais pareciam médicos, pois seus fardamentos militares eram todos brancos. Eles cercaram o trem e toda a estação, pois eram muitos. Do meio dos soldados, surgiu um coronel, que também estava vestido de branco, que trazia um documento nas mãos, alegando que o trem só partiria depois de ser feita uma triagem nas pessoas que estavam ali na estação, pois nem todo mundo iria embarcar. Os bilheteiros, os seguranças e até mesmo o próprio Lúcio Fernandes, que aparece após os comboios chegarem, leram o documento e praguejando contra aquele coronel, como se conhecessem os superiores dele. O Sr. Fernandes liberou então que fosse feita a triagem e assim que o coronel deu a ordem aos seus soldados, eles entraram por entre as pessoas e começaram a separar as pessoas que ali se encontravam. Primeiro gritaram o nome de uma menina chamada Jane. Ela estava com um grupo de pesquisadores que tentavam inutilmente escondê-la para que não pudesse ser vista. Depois uma família inteira fora separada de um homem chamado apenas de Defeo Jr. Os soldados disseram que somente ele poderia embarcar, sua família não. Outra menina que estava juntamente com uma senhora, seus filhos e muitas outras crianças, chamada Sylvia L. Um menino chamado Roland, que estava com um padre, cujos bilheteiros do trem o cumprimentavam como Padre Zuzu, também foi separado à força do mesmo, pois seu nome constava na lista. Uma menina chamada Annelise também fora separada de sua mãe, uma religiosa fanática que estava quase embarcando com ela no ABBADON, se os soldados de branco não tivessem aparecido. E por último, uma menina chamada Doris Bither, que estava sozinha no meio das pessoas, também fora separada dos demais. As demais pessoas foram liberadas para embarcar. Assim que as pessoas da lista foram colocadas em cima de um dos caminhões e levadas embora por aquele estranho exército, o apito do trem soou e a ordem que fora dada era para que as pessoas entrassem o mais rápido possível, pois o trem já iria sair. Saymon entregou a carta para o bilheteiro, que a conferiu e o liberou para subir e se acomodar. E quando ele entrou no vagão, outra surpresa: o ABBADON era um trem de luxo. Ele ficou encantado com o brilho dos detalhes e a maciez das poltronas. Quando todos estavam dentro do ônibus e devidamente acomodados, um homem barbudo, bem vestido e com ar de intelectual, entra no vagão e começa a dar algumas instruções para os que estavam sentados. - Olá a todos. Meu nome é Alexander Zazel. Sou eu quem vai ensinar vocês a lidarem com armamentos quando chegarem ao Novo Mundo. Vim em nome do senhor Lúcio Fernandes, que está no último vagão, dar-lhes as boas-vindas nesta que será a viagem que mudará para sempre, todas as suas escolhas. Espero que gostem do trajeto, pois estamos todos indo para o Inferno! Quando fora dado o apito anunciando que o trem já iria partir, uma terrificante cena começou a aparecer: o trem começou a ter uma aparência macabra e os bilheteiros e seguranças começaram a se transformar em demônios. As pessoas em pânico tentaram se levantar e fugir. Mas algemas invisíveis as prendiam nas poltronas, as impedindo de sair. Saymon tentou se levantar, mas então percebeu que estava preso. E pior do terror aconteceu minutos depois, quando de dentro das poltronas, estacas de ferro saíram e atravessaram os corpos de todos os passageiros do expresso ABBADON. Alguns no peito, pernas, braços; outros no pescoço, cabeça, olhos e bocas. Só quando Saymon fora atravessado pelas estacas de ferro, foi que ele compreendeu tudo: ele tinha morrido na estrada, alguns dias atrás, durante a luta que teve com os salteadores, vitimado pela estocada que recebera. E agora, sem poder sair dali, um destino obscuro, c***l e ao mesmo tempo ameaçador o esperava: as labaredas do inferno. O trem então sai dos trilhos e sobe no ar como se estivesse subindo numa montanha. Assim que chega o mais alto que pode, uma enorme cratera flamejante e com um forte odor de enxofre se abre no chão, e o comboio desce em um mergulho único, em linha reta e em queda livre. E enquanto mergulha nas chamas daquela enorme cratera, do lado de fora do último vagão, o senhor Lúcio Fernandes, está sorrindo a gargalhar de maneira insana e sádica. Sua gargalhada podia ser ouvida a quilômetros de distância, misturada aos horrores causados pela Segunda Guerra.
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