BLAKE
Caminho apressadamente pelo o corredor do hospital, especialmente hoje, está uma loucura. Acabo de chegar de férias e vim direto para o Vanetti.
Houve um acidente de ônibus e as vítimas com ferimentos gravíssimos foram transferidas para cá. Entre uma cirurgia e outra, informar parentes das vítimas sobre seu óbito é a parte mais dolorosa da nossa profissão.
Suspiro passando as mãos sobre minha face cansada. O corpo começando a apresentar indícios de exaustão.
Encontro Will no corredor com uma expressão cansada, nada boa e já sei o que vem a seguir.
Informar um óbito a alguém, principalmente para ele que perdeu sua irmã em um acidente de carro recentemente, não é fácil.
Paro na recepção observando ele consolar uma garota loira de cabelos longos que desabava em lágrimas. Escutar seu choro copioso me doeu o coração.
Ela se senta e abaixa a cabeça negando veemente.
Seus ombros se sacodem conforme seu choro aumenta.
Logo uma garota de cabelos negros chega e a envolve em um abraço reconfortante. Fico tocado com a cena, embora eu presencie isso frequentemente no hospital.
— Ela acabou de perder a mãe— Will murmura com um suspiro.
Entrega alguns papéis na recepção e se vira para mim com um sorriso triste.
— Cara, é uma merda ter que dar esse tipo de notícia. Tem horas que penso em desistir dessa profissão. — Assinto entendendo o que ele está sentindo. Hoje mesmo, informei três mortes e o cenário de desespero e dor das pessoas é algo difícil de assistir.
— Então, daí, eu me lembro que não sei fazer outra coisa.
Ele bate em meu ombro com uma última olhada na garota.
— Ela é linda. É até um sacrilégio vê-la sofrendo desse jeito.
Sigo o seu olhar observando a garota sendo consolada.
Um instinto protetor me invade e quando percebo estou caminhando em sua direção.
— É minha culpa Ema, não devia ter deixado ela sozinha — Sua voz saiu sussurrada em meio ao seu choro.
— Ei, não diga isso amiga. Você não tem culpa de nada. Está me ouvindo? — A morena pega em seu rosto com uma mão de cada lado olhando em seus olhos.
— Foi uma fatalidade.
Algo estranho acontece. Sinto vontade de confortá-la, embalá-la em meus braços, mas não é certo. Então, pego um lenço no bolso do meu jaleco e estendo em sua direção.
— Ela tem razão. Tem algumas coisas que fogem do nosso controle. Se acontecem, é por alguma razão. Por mais que seja triste, faz parte da vida— Murmuro e recebo um rápido olhar dela.
Seus olhos castanhos claros estão vermelhos por conta do choro, mas a algo neles que me atrai. Me sinto estranho diante do seu olhar. Parecem ver através de mim. Enquanto demonstram dor, transborda ternura, doçura. Sinto uma sensação estranha… familiar. Ela recolhe o lenço da minha mão rapidamente como se saísse de um transe e agradece.
Sua amiga me olha por uns segundos e cochicha algo em seu ouvido.
A loira assente e coloca seus longos fios para o lado onde noto uma pequena pinta em seu pescoço que me chama bastante atenção. Tenho a sensação de já tê-la visto antes. Seu formato em um suposto coração não me é estranho.
Quando resolvo sanar a minha curiosidade e questioná-la, um enfermeiro interrompe.
— Dr. Ambrósio, estão lhe chamando na emergência.
Agradeço e me levanto correndo as mãos pelo meu cabelo lançando um último olhar para a loira.
— Eu sinto muito! — Sussurro com pesar. Ela balança a cabeça e se apoia no ombro da amiga.
Caminho rumo a emergência sem olhar para trás, apesar de sentir um aperto no peito e uma insana vontade de voltar lá e abraçá-la calorosamente, sussurrar em seu ouvido palavras doces, apesar de a vida nem sempre ser. Afirmar que ela ficará bem, e que o onde quer que sua mãe esteja, está orgulhosa da filha que têm. Entretanto, não o faço. Sigo pelo corredor frio e nada auspicioso torcendo para reencontrá-la em outras circunstâncias, uma de boa sorte, onde eu possa ser contemplado pelo seu belo sorriso que certamente ela tem.