Quando eu finalmente acordei após a minha formatura, deitada em minha cama, na casa de praia com Spencer ao meu lado, eu tive a sensação de que eu tinha a vida perfeita. Era como eu por tantas vezes havia fantasiado: fim do ensino médio, meu namorado, futuro promissor, minhas merecidas férias e nenhum arrependimento, suspirei profundamente antes de acordar Spencer:
- Bom dia – eu disse beijando o rosto dele diversas vezes.
- Bom dia – ele espreguiçou-se e sorriu – acho que eu não podia imaginar acordar de outro jeito – ele suspira – acho que é a melhor forma de ser acordado, eu estava morrendo de saudades de acordar do teu lado.
- Eu também estava – aninhei-me em seu peito perguntei – sabe que horas são?
- Sim – ele resmungou – hora de fingir que não sabemos a hora...
- Estou com fome – eu disse rindo.
- Isso é um problema – ele abraçou-me apertado – agora vai ficar presa aqui.
- Preciso comer alguma coisa – eu disse protestando – já sei – eu ri – vou morder você...
- Tudo bem – ele soltou-me na primeira mordidinha – você é muito malvada, sabia?
- Não me deixe com fome – estiquei-me para pegar meu celular – nossa – eu ri – são quatro da tarde.
- Acho que descansamos enfim – ele riu – mas eu devia estar correndo, preciso pegar um vôo às oito da noite.
- Eu tinha esquecido disso – eu respondo chorosa – vamos tomar um banho? Saímos para comer alguma coisa e deixo você no aeroporto... Pode ser?
- Claro – ele beijou-me – assim eu posso ficar com você todos os segundos possíveis.
Enquanto eu levantei e fui para o banho, Spencer recolheu seus pertences espalhados pelo meu quarto, organizou algumas roupas e arrumou a cama, ele sabia ser eficiente e aproveitar o tempo livre... Tomei um banho demorado e quando por fim saí, sentia-me renovada. Escolhi um vestido leve com estampa étnica, coturnos e um cinto largo, peguei uma jaqueta de couro, pois havia previsão de chuva para o fim do dia e poderia refrescar.
Spencer parecia bem, tranquilo e conformado com a própria partida:
- E quanto ao seu dia na praia? – ele pergunta.
- Vai ser legal – respondo – eu não sei como vou fazer ainda, mamãe queria ir para Boston no domingo.
- Não pode perder – ele apertou meus ombros – sua última reunião com seus colegas do ensino médio, ao menos última que todos participam.
- Eu sei – respondi num suspiro – acredito que vamos conseguir deixar qualquer coisa que tenha que ser resolvida para terça ou quarta – eu o encarei – parece que ela quer se ver livre de mim as vezes.
- Acho que ela está ansiosa – ele riu – e a ideia de voltar a ficar mais tempo com o Brandon – ele sorriu – eles eram ótimos juntos.
- Verdade – eu respondo – vou sentir falta dessa casa.
- Também vou – ele abraçou-me beijando minha testa – com certeza eu vou, mas vamos criar novas memórias em novos lugares, certo?
- Certo – eu respondo, e dentro de mim, sabia que ele tinha razão: novas memórias em novos lugares e novas memórias com novas pessoas em antigos lugares, como a estação de Northstar, aquilo me fez paralisar alguns segundos.
- O que foi? – ele perguntou já pegando a mochila.
- Nada – respondo – acho que precisamos de uma foto – eu disse – possivelmente essa é a última vez que você e eu estaremos aqui.
- Verdade – ele soltou a mochila e pegou o celular, para tirarmos não uma, mas uma dúzia de fotos.
Dirigi até o Santa Bárbara, além da nostalgia que eu já sentia naquele lugar que eu realmente adorava, a comida era ótima e a atendente jamais julgaria meu pedido de hambúrguer duplo com fritas grandes naquela hora, ela sabia bem que eu deveria ter amanhecido no Baile. Notoriamente, não éramos os únicos, a lanchonete estava cheia e haviam vários conhecidos por lá.
Passeamos pelo píer depois de comermos e conversamos bastante, além é claro, de aproveitar a incrível vista e o pôr do sol que eu mais amava no mundo. No fim das contas, acho que eu estava acostumando-me de verdade com as nossas despedidas, elas pareciam cada vez mais frequentes e as ausências pareciam cada vez mais breves, aquilo fez com que eu sentisse uma pontadinha de alegria: em duas semanas estaríamos juntos até o fim das férias.
- Vou sentir muito a sua falta - Spencer abraçou-me apertado perto do portão de embarque - logo, logo eu vou estar de volta e vamos aproveitar as nossas férias juntos, cada minutinho que pudermos, certo?
- Certo - beijei-o intensamente - eu vou morrer de saudades - já tinha os olhos marejados apesar de estar me esforçando para conter o choro - vamos ficar bem, certo? Eu amo muito você.
- E eu amo você mais do que tudo - ele beijou minha testa - falta bem pouquinho...
E assim nos despedimos: Spencer deu-me as costas e eu corri para o carro o mais rápido que eu pude, porque eu precisava chorar um pouco. Mamãe estava em Washington com Brandon, haviam embarcado durante a manhã e eu sabia, então, eu provavelmente estaria sozinha, sentindo-me triste e chorando compulsivamente enrolada no sofá da sala.
Perto das dez horas a chuva começou: lenta, pesada e fria. O ar automaticamente tornou-se fresco e eu precisei fechar as janelas e pegar um cobertor. Tentava assistir um filme de comédia, alguma coisa sem gatilhos para fazer-me chorar novamente por horas, e então, a campainha tocou. Levantei-me assustada, enrolada em meu cobertor e espiei: Noah Abramsen estava parado à minha porta, na chuva, abri subitamente:
- Noah - eu disse saindo do caminho para que ele entrasse - o que aconteceu?
- Ah - ele me encarou um pouco confuso - eu precisava te ver.
- Certo - eu sorri e fechei a porta atrás dele - acho que tira essa camisa, vou pegar uma toalha para você - eu disse antes de sair apressada em direção ao banheiro - o que deu na sua cabeça? Porque não ligou?
- Pensei que se eu ligasse, você não atenderia - ele disse muito sério.
- Certo - entreguei a toalha à ele que já estava sem camisa: o corpo magro e muito definido de Noah era algo incrivelmente sexy, a pele clara, com poucos pelos estava fria e arrepiada, o cós da calça deslocado deixava aparecer a cueca preta e eu estava um pouco perdida com tudo aquilo - pode me explicar o que está acontecendo?
- Ah sim - ele terminava de se secar e me encarava sorrindo aquele sorriso sexy e auto explicativo dele - eu precisava conversar com você.
- Sobre o que? - tentei fingir que não sabia.
- Certo - ele largou a toalha sobre o aparador - onde está seu namorado?
- Em um avião, voltando para New York, no momento.
- Perfeito - ele aproximou-se de mim e abraçou-me, dei um pulo para trás devido ao choque da pele fria dele contra meu corpo quente - eu preciso resolver algumas coisas antes de encerrarmos este ciclo.
Sem tempo nem espaço para nada, Noah apenas beijou-me intensamente, de forma selvagem como da primeira vez, no acampamento. As mãos firme dele percorriam meu corpo fazendo minha pele arrepiar, eu estava extasiada e ao mesmo tempo confusa e excitada, ele parou de repente:
- Mariah Martinez, você estava simplesmente enlouquecedora no seu vestido de formatura - ele disse segurando meu rosto e olhando dentro dos meus olhos com seus olhos azuis profundos - eu simplesmente não conseguia pensar em outra coisa que não fosse arrancar aquele vestido do teu corpo.
- Noah - eu afastei-me um pouco - isso não está certo - eu disse.
- É claro que não está - ele gritou - pelo amor de Deus, Mariah, minha namorada atravessou o atlântico para ficar comigo, e eu não consigo parar de pensar em você... - ele esfregou o rosto com as mãos - eu quero você, eu preciso de você.
- Noah, isso não...
- Eu sei - ele aproximou-se novamente e beijou-me - eu sei que você também sente - ele soltou-me - e sei que vai sentir-se culpada demais - ele afasta-se um pouco mais - sinto muito, Mariah, mas vou precisar confessar que eu vim até aqui na chuva, como um maluco, porque se eu não beijasse a tua boca, eu possivelmente não conseguiria dormir.
- Vai embora, Noah - eu disse encarando-o muito séria.
- Está brigando comigo? - ele pergunta incrédulo.
- Não - eu me aproximo dele e beijo delicadamente seus lábios - eu estou pedido para que você me ajude a não cometer mais um erro.
- Você tem certeza disso? - ele segura meu rosto com as mãos, tem o nariz colado ao meu.
- Eu tenho - e digo isso com meus olhos marejados e o meu coração partido, eu não queria dizer não para Noah, provavelmente, eu o queria na minha cama tanto quanto ele desejava arrancar o meu vestido vermelho - somos amigos, Noah, ficaremos bem.
- Eu espero que sim - ele segura meu pescoço e beija minha testa por alguns segundos - você é uma garota incrível, Martinez, sinto muito por isso.
- Não sinta - eu respondo.
Noah apenas se afasta, pega a camisa e sai pela porta. Eu fico parada no hall de entrada segurando a toalha que ele havia usado por alguns minutos, totalmente confusa e muito tentada a pegar o carro e sair atrás dele na noite. Meu telefone tocando foi o que conteve o meu impulso, era Lindsey:
- Oi amiga - ela disse com a voz arrastada - tudo bem ai?
- Tudo - respondo num suspiro - e por ai?
- Tudo bem, eu acho - ela respondeu - só acho que eu estou me sentindo sozinha.
- Somos duas - eu ri - quer vir ficar comigo? Eu busco você...
- Eu quero, amiga - ela responde.
- Certo - eu digo - se arruma, estou ai em uns dez minutos.
Sem pensar muito enfiei a jaqueta e os corturnos e sai, com a toalha na mão. Parei há uns três quarteirões, Noah estava andando na chuva que agora era mais fina:
- Abramsen - gritei - sobe ai, eu levo você.
Ele não disse nada, apenas caminhou sorrindo até o Impala:
- Sem ressentimentos - eu disse e entreguei a toalha - Lindsey ligou e vou buscar ela para que ela fique comigo essa noite.
- Emergência emocional? - ele perguntou rindo.
- Não - eu respondo rindo alto - acho que eu preciso de alguém por perto para evitar fazer algo de que eu poderia me arrepender.
- Nossa - ele mordeu os lábios e sorriu - tenho muita vontade de você Mariah - ele desliza os dedos pelas minhas pernas - mas você tem razão, tem toda a razão, precisamos controlar isso.
- Com certeza - eu respondo.
O restante do percurso foi silencioso. Deixei Noah no edifício onde ele morava e segui para a casa de Lindsey, que já me esperava na varanda, com uma mochila à tiracolo:
- Ai amiga - ela disse - acho que eu fiz besteira.
- Que besteira? - pergunto intrigada.
- Eu e Justin - ela diz - acabamos discutindo, eu não sei se eu estou preparada para simplesmente deixa-lo ir.
- Como assim? - pergunto.
- Acho que eu percebi que eu gosto dele - ela sorriu sem jeito - tipo, do jeito que eu nunca imaginei gostar, e agora a possibilidade de deixar ele ir embora, de não ter mais ele por perto, está me incomodando demais, e ontem á noite, foi tudo tão perfeito no Baile e depois, mas quando amanheceu, eu só conseguia pensar que não queria perder ele.
- Ai amiga - eu e a abracei como pude, ainda dentro do carro parado em frente à casa dela - essas coisas são difíceis, e parece que nunca ficarão fáceis.
Liguei o carro e dirigi lentamente para casa; paramos no caminho, compramos cervejas e porcarias para comer e passamos a madrugada toda entre risadas histéricas e lágrimas pesadas, ponderando sobre nossas vidas e tudo o que ainda tínhamos para viver, tudo o que tínhamos para aproveitar... Precisei contar para ela sobre a visita de Noah, e ela, apesar de surpresa com a atitude, disse ter percebido que ele não tirara os olhos de mim durante a noite da formatura e aquilo, mesmo errado, fazia meu coração disparar: era a sensação maravilhosa de ser desejada por alguém.
Quando Lindsey por fim dormiu, eu ainda encarei as paredes pensando naquilo: Noah era a representação dos desejos mais íntimos das garotas, ele era sexy, tinha aquela pegada selvagem, era intenso em todos os sentidos. Spencer não era assim, ele era bom, era ótimo, mas era o namorado tradicional, tinha a paixão e o desejo, mas tinha amor e cuidado e brigas, muitas brigas... Michael, tinha sido só o amor, delicado, cuidadoso, não que ele não demonstrasse desejo, mas era muito mais contido, aquilo me fez perceber que com Noah, pela primeira vez, eu me sentia mulher de verdade - tão madura a ponto de conseguir resistir afim de evitar arrependimentos ainda maiores.
A sexta feira amanheceu ensolarada e morna e eu aproveitei para passear no shopping com Lindsey: queria aproveitar intensamente os meus últimos momentos com minha melhor amiga do ensino médio. Durante a tarde, visitamos Mia e Peter, que estavam contentes contando sobre a viagem que fariam para Lake Tahoe depois do aniversário de Amélie, e eu contei à Spencer sobre isso quando nos falamos à noite e contei o quanto eu estava feliz pela Mia e pelo Peter.