O feriado de ação de graças estava se tornando, ano após ano para mim, uma verdadeira desgraça. Eu precisava me dividir entre minha mãe, meu pai e Spencer e bem, todos pareciam extremamente chateados quando eu não conseguia corresponder as expectativas ou me encaixar nos planos que eles haviam feito sem me comunicar, e meu peito apertava com esse pensamento, afinal, eu amava todos eles, e até mesmo o Sr. Ivanov havia me convidado para o jantar...
Mamãe havia realmente facilitado todo o processo: comunicou logo cedo na segunda-feira, que estaria na Georgia para o feriado, então, eliminei uma refeição em família, mesmo sabendo que ela voltaria uma pilha de nervos, o que não podia ser bom, e na tarde de terça-feira, papai ligou-me desolado, pois Sanchez havia insistido que fossem para a casa da família dela em Albuquerque, então eu pude apenas suspirar – um pouco aliviada – e dizer “sem problemas, papai, sabe que eu vou ficar bem” e contava que sim, afinal, eu ficaria com Spencer.
Quando contei a novidade para ele ao telefone, ele me pareceu bem feliz, afinal, ele precisava ver a mãe dele e a avó, Brandon estaria em Washington, e como nem mesmo Mia iria ficar com ele no feriado, Spencer pensou que não fazia muito sentido ir... Não conversamos nenhum detalhe, ele apenas me disse que chegaria já na noite de quinta-feira.
Meu coração disparava, minha mãe embarcou logo depois do meio dia, então depois das minhas aulas e principalmente, depois de organizar toda a papelada para as Universidades juntamente com o Diretor Sanderson, Lindsey, Noah, Justin e os outros três que enviariam candidaturas antecipadas, eu voltei para casa e limpei a casa toda e comecei a arrumar tudo, então Spencer enviou uma mensagem de texto dizendo que a mãe o buscaria no aeroporto, e que me veria na manhã seguinte, frustrando meus planos de ver ele ainda naquele dia. Apesar de não muito satisfeita, tive que compreender que mães sentem saudades de seus filhos, mas confesso que eu fui dormir um pouco frustrada.
- Bom dia flor do dia – acordei-me com Spencer sentado ao meu lado na cama.
- Ai meu Deus – saltei e abracei ele com lágrimas nos olhos – eu estava com tanta saudade – beijei seu rosto tantas vezes quanto pude – como foi que você entrou aqui? Ah, meu Deus, não importa, estou tão feliz...
- Ainda tenho a chave – ele sorriu – quis fazer uma surpresa, e você estava tão linda dormindo que eu podia passar o dia todo olhando pra você, mas aí eu me lembrei que tinha outros planos...
Não fui na aula aquele dia – e nem senti culpa, quase ninguém ia – e eu tinha um pouco de crédito, era uma das promessas do ano, então me dei ao luxo de passar o meu dia inteiro em casa, de pijamas e com Spencer. A chuva fina deixava o horizonte esbranquiçado e frio, e Spencer não parecia ter outro plano que não fosse comer, namorar e dormir, e para mim, aquilo tudo estava ótimo, exatamente daquele jeito e naquela ordem. No começo da noite fomos visitar Mia, Peter e Amélie e nos divertimos bastante por lá. Daniel também apareceu com a namorada, e a simples ideia de todos nós reunidos em volta de uma mesa foi nostálgica e mágica, colocamos todos os assuntos em dia, jogamos cartas e rimos até a barriga doer, Spencer e eu voltamos para casa e retornamos ao ciclo anterior: comer, namorar e dormir, e eu com certeza estava vivendo o fim de semana perfeito, pelo menos até a tarde de sábado quando Spencer disse que iria em um encontro dos ex-colegas:
- Eu apenas acho que esqueci de te contar – Spencer disse pela terceira vez – vamos lá – ele me abraçou apertado - não é como se o mundo estivesse acabando, é coisa de uma hora ou duas – ele acariciou meu rosto.
- Tudo bem – grunhi – duas horas no máximo, ok? Eu odeio ficar sozinha...
- Combinado – ele beijou minha testa, pegou as chaves e saiu.
Não era realmente o fim do mundo, mas para mim, era como se fosse. Ele não tinha me contado nada sobre nenhuma reunião da turma do colegial naquele feriado de ação de graças, na verdade, normalmente isso acontecia nas férias de verão, enfim, conformei-me com a espera e um filme de romance clichê. Quase três horas se passaram até Spencer voltar.
- E aí – ele sorriu – desculpa pelo atraso – beijou-me de leve nos lábios – vou compensar, eu prometo, só vou tomar um banho – ele já caminhava em direção as escadas – que tal pedirmos pizzas?
- Ah, tudo bem – não tive muito tempo para pensar porque ele logo gritava do chuveiro os sabores que queria, e que deveríamos buscar, que o Thed’s estaria lotado.
O fim da noite de sábado foi totalmente conforme o esperado, e eu estava feliz de verdade pro não ter que fazer nenhuma correria alucinante no domingo afim de tentar estar em todos os lugares e com todos os meus parentes. Almoçaríamos com Sarah, a mãe de Spencer e Mia, ou melhor, de Spencer, ela ignorava Mia desde a notícia da gravidez, e ela aproveitava para ficar com a família do Peter que era mais normal, eu encararia a cobra sozinha.
Escolhi um vestido discreto azul marinho, meias calças escuras e sapatos de salto. Completei meu look com um casaco bonito de lã batida, escovei meu cabelo, fiz uma maquiagem leve e gostei da minha imagem ao espelho, estava me sentindo bonita e confiante. Spencer repetiu várias vezes que eu estava linda, e até chegarmos na casa da mãe dele, estava tudo bem:
- Querido – ela sorriu ao abrir a porta – ah, você não me disse que traria convidados... – ele olhou-me de cima abaixo com o mesmo desdém de sempre.
- Mãe – ele disse entre os dentes – eu disse que a Mariah viria sim.
- Sem problemas – ela virou-se de costas sem me cumprimentar – colocamos mais um prato – e pegou Spencer pela mão arrastando-o para a sala de estar onde diversas pessoas desconexas e estranhas estavam – Pam, querida, o que acha de ajudar Spencer com isso?
- Claro – a garota sorriu e meu sangue ferveu: Pamella Stone estava na casa da mãe de Spencer para o feriado de ação de graças – oi Mariah.
Não respondi. Apenas sorri e deixei-me afundar em uma poltrona no canto da sala, onde, se fosse possível, ninguém me veria. E aparentemente, ninguém viu. Spencer parecia estranhamente à vontade com aquelas pessoas, o que fez meu peito apertar novamente, parecia que eu não sabia nada sobre ele, como quando havíamos nos conhecido enquanto corríamos no East Garden, anos atrás. Após o almoço, ainda precisei passar pela sessão de tortura de fotos do colegial, onde muitas vezes, Pam aparecia pendurada como um carrapato em Spencer.
Não consigo dizer exatamente por quanto tempo que aquele show de horrores durou, eu apenas esperei pacientemente até a hora que Spencer se cansasse e resolvesse fugir, bem, aquilo acabou demorando mais do que eu estava preparada para aguentar, com toda a certeza.
- Não acredito que isso está acontecendo – disse surtando assim que entrei no carro tirando meus sapatos de salto e me encolhendo em meu casaco.
- Ah, não entendi – ele me encarou confuso.
- O que é que ela estava fazendo lá, Spencer? Porque a sua mãe a convidou... – então fiz uma pausa – é o tipo de coisa que você gosta.
- Olha – ele me encarou – fiquei tão surpreso quanto você ficou quando cheguei na quinta – ele me encarou – é provisório, ela veio fazer uns testes e os pais mudaram-se para Washington faz uns quatro meses...
- ... ela está morando com a sua mãe? – gritei – Eu não acredito! Como foi que você não pensou em me dizer nada?
- Achei que reagiria assim, e não queria estragar... – ele encarou o vazio fora do carro.
- Estragou, claro que estragou, pelo amor de Deus – gritei – eu odeio a sua mãe, odeio de verdade, porque eu odeio o fato que ela me ignora e me trata m*l o tempo todo, e eu fui até lá por você, Spencer, você tinha obrigação de me dizer uma coisa dessas, já que nem mesmo me defende da grosseria da sua mãe... – quando percebi, havia dito até o que não devia dizer.
- Eu sinto muito, Mariah – ele disse me olhando nos olhos – fui meio i****a, bem i****a – ele sorriu envergonhado – mas não queria perder tempo brigando, olha aí, gente tem tão pouco tempo...
- Me leva para casa – disse com lágrimas nos olhos, furiosa.
- Mariah, mas minha avó... – ele me encarou sem entender.
- Você me leva e visita a sua avó – respondi seca.
- Mas não vai dar tempo de...
- Tudo bem – eu menti – já faz tempo que não temos tempo.
- Quer terminar comigo? – ele pareceu confuso e um pouco indignado.
- Não – disse com tristeza – eu só quero que não minta mais para mim e... Quero ficar sozinha.
- Melhor darmos um tempo – ele disse antes de ligar o carro – acho que você está em duvida sobre o que quer, está em dúvidas sobre o que sente e por isso que está se deixando abalar com esse tipo de coisa pequena.
Não respondi nada, apenas chorei durante todo o percurso e corri para dentro de casa o mais rápido que eu pude, não deixando que ele dissesse mais nada, e passei o final da tarde e toda a noite de ação de graças encarando garrafas de vinho pela metade e um fogo tímido crepitando na lareira.
A semana foi, sem sombra de dúvidas, a pior da minha vida. Quando minha mãe voltou, sem ter a menor ideia do que estava acontecendo, foi difícil, porque eu não queria falar sobre aquilo, e de alguma forma, ela precisava saber, então eu apenas disse que estava com problemas com Spencer e ela foi bastante compreensiva e disse que caso eu precisasse, poderia contar com ela.
Conforme a semana passava eu ignorava diversas ligações de Spencer, tantas quantas ele podia fazer, porque não queria conversar sobre aquilo, pois falar sobre aquilo, poderia tornar tudo real e eu não queria que aquilo fosse real. Fiz o mesmo com todas as mensagens e e-mails, simplesmente eu não li, e na escola, Lindsey me ajudou a segurar a barra, e por duas vezes, pelo menos, inventou uma desculpa esfarrapada para meus atrasos nas aulas enquanto eu apenas sentava e chorava escondida no banheiro da escola como uma garotinha boba e assustada.
Não estudei com os meus amigos e sim sozinha dentro do meu quarto, durante a semana inteira, porque pensar na ideia de alguém me olhando com aquele olhar de pena por mais algum tempo, partia mais ainda o meu coração. E com toda a confusão, acontecendo, eu quase havia me esquecido do próximo evento oficial da agenda escolar daquele ano, o evento pelo qual todos estavam realmente esperando e que muito certamente Noah não me deixaria esquecer: o acampamento, que aconteceria dentro de duas semanas, logo depois dos exames e antes das provas do bimestre.
- Precisamos confirmar com o ônibus – ele disse com uma folha nas mãos, andando atrás de mim pelos corredores – e os formulários, tem alunos que ainda não trouxeram... E tem as listas...
- Certo – parei e encarei Noah muito séria – estou tendo uma semana difícil e hoje ainda é quinta-feira, então, facilita a minha vida, Noah, pelo amor de Deus, me diz o que você precisa que eu faça, exatamente? – eu já estava praticamente chorando e gritando ao mesmo tempo, devia ser assustador.
- Ei – ele aproximou-se e me abraçou – está tudo bem – soltou-me e sacudiu as folhas – eu cuido disso, certo?
- Não – eu tive um momento de sanidade.
- Sim – ele me encarou com aqueles dois olhos azuis enormes – eu cuido de tudo.
- Não, Noah – falei baixo, me dei conta que eu precisava ajuda-lo – eu só... Me desculpa – suspirei e peguei as folhas da mão dele – de verdade, sinto muito.
- Eu resolvo – ele me abraçou novamente pegando as folhas e logo me soltou – eu sei que as coisas estão difíceis pra você, mas vai dar certo, okay?
- Okay – respondi imitando o estranho jeito dele dizer okay.
- Pelo menos eu faço você rir – ele disse sorrindo, e reparei ele que tinha um sorriso lindo, daqueles que fazem os olhos quase se fecharem, como Michael...
- Obrigada por isso – não por me fazer rir, pensei, mas por me lembrar do sorriso de Michael Murray, e logo me senti confusa e ri para tentar disfarçar – vem comigo, esquisito, vamos chamar o pessoal pelo sistema de som para lembrar à todos de trazerem esses formulários – peguei ele pelo braço e sai andando pelo corredor.
Me envolvi um pouco mais no projeto de acampamento do Noah, não sei se porque me senti culpada por gritar com ele ou apenas porque precisava de uma distração real para fugir do meu ciclo de auto piedade ou ainda, porque de repente ele me lembrou uma parte muito importante da minha vida. Nós encontramo-nos no almoço para terminarmos de redigir a lista de itens essenciais e desejáveis e também a lista de suprimentos. O diretor Sanderson parecia realmente feliz com a ideia de uma atividade que fosse ao ar livre e sem álcool – bem, pelo menos ele não precisava saber dos contrabandos de bebidas que estávamos planejando, mas, de acordo com Justin, éramos os alunos promissores e amados, e pelo menos até chegarem os nossos resultados, éramos os donos da verdade e poderíamos fazer um pouco de coisas normais de adolescentes.
Quando meu coração parecia que não iria mais aguentar de saudades, eu atendi uma ligação de Spencer, e isso foi apenas na noite de sexta-feira, e definitivamente, aquela foi uma das conversas mais difíceis que eu tive com alguém durante toda a minha vida, apesar da sua curta duração. Assim que eu atendi, antes mesmo que eu dissesse qualquer coisa, ele começou a falar:
- Eu senti muito a sua falta essa semana – a voz dele estava estranha e aquilo realmente parecia ser sincero.
- Eu também –suspirei respondendo - também senti muito a sua falta.
- Então porque é tão orgulhosa, Mariah, porque não atendeu...?– ele tinha uma voz chorosa e arrastada – Pelo amor de Deus, eu quase tive um ataque aqui, meu amor.
- Eu não sabia se queria falar sobre aquilo, Spencer, foi bem difícil – era verdade – e eu estava ocupada – ou eu procurei o que fazer para me manter ocupada para não pensar sobre aquilo - são tantas coisas que acho que acabei me perdendo um pouco... Não queria pensar sobre o que aconteceu.
- Eu entendo – ele disse ouvi a voz dele embargar um pouco – eu... eu acho que foi uma ideia realmente i****a - ele disse.
- Não – suspirei já chorando – não, talvez é o certo, a gente não consegue...
- Ei, a gente consegue sim – ele disse – você sabe que sim, nós não podemos ficar longe agora.
- A gente tá longe agora – eu gritei – e sabe, quando a gente estava perto, você estava longe também, longe demais – chorava alto, não me importava muito que minha mãe escutasse o meu drama.
- Não fala assim, Mariah – ele chorava também – eu errei, certo? Errei f**o, mas tem como consertar, você sabe...
- Olha, Spencer, vamos deixar assim, a gente da um tempo, e quando você vier para cá, a gente vê o que vai fazer, a gente conversa, não dá para ter essa conversa por telefone, eu não consigo ter essa conversa por telefone... – eu estava num choro desesperado, tudo o que eu queria, de verdade, era encerrar aquela ligação de uma vez por todas.
- Tudo bem – ele suspirou engolindo o próprio choro – eu entendo você, você não está errada, tem toda a razão – ele parecia desesperado – eu só sinto muito, de verdade, por ter mentido e por ter dito aquilo, acho que foi a coisa mais i****a que eu já fiz – ele suspirou novamente – mas foca nos estudos, certo? A Columbia é nossa no ano que vem, sabe que estou te esperando, sempre.
- Eu sei – e aquilo aqueceu meu coração por um minuto: a faculdade e não precisar se preocupar com a distância eram quase uma utopia naquele momento difícil.
Nos despedimos e eu chorei por horas a fio, pensei em conversar com meus amigos, mas estava tarde e eu desisti, e finalmente fui dormir. Tive uma coletânea curiosa de pesadelos horríveis, e me senti a pior pessoa do mundo quando acordei. Contei para mamãe que eu e Spencer havíamos rompido e ela foi muito compreensiva, quer dizer, nenhuma mãe gosta de ver a filha sofrendo, e a distância é complicada, e disso todos nós sabíamos.
Eu tinha tido a ideia b***a de desmarcar minha sessão com o Mark, bem naquela semana, porque queria estudar para os exames, então, ignorando totalmente a minha necessidade de sentar e conversar, acabei por reunir todos os meus amigos no sábado em minha casa, desde cedo da manhã, e estudamos o dia todo. No domingo, foi a vez de encarar os livros na casa de Lindsey, o dia todo novamente. Nós faríamos exames todas as manhãs e estudaríamos durante todas as tardes, assim, estaríamos sempre afiados para a próxima matéria.
Quando aquela semana infernal de exames passou, estávamos tão cansados e estressados que m*l falávamos, agíamos como zumbis, caminhávamos em silêncio em direção à comida e ao descanso. Na tarde de sexta-feira, quando saímos da última prova, Lindsey e Justin seguiram para a casa dela, alguma coisa sobre prometer levar o irmãozinho dela no parque, um compromisso levado a sério por Justin. Eu apenas disse tchau a eles e sentei-me nos degraus das escadarias do colégio e chorei... Chorei porque eu tinha perdido Spencer, porque estava exausta, porque queria um colo. Admirava como Mia estava encarando toda aquela pressão, ela tinha motivos para surtar e saiu plena da prova, antes que eu terminasse um terço dela... Não sei por quanto tempo fiquei ali, apenas voltei à realidade quando Noah sentou ao meu lado em silêncio e me abraçou por longos minutos dizendo baixinho que tudo ficaria bem.
Ele me levou para casa, literalmente, dirigiu o Impala até a minha casa, preparou um café maravilhoso e ficou comigo por horas, até a minha mãe chegar. Ela estranhou a presença dele, mas ele apenas falou algumas coisas para ela em voz baixa na cozinha enquanto ela mesma tomava um café e depois abaixou-se no sofá onde eu estava, beijou minha testa e foi embora, dizendo que me ligaria mais tarde. Minha mãe o acompanhou até a porta, e assim que ele saiu, sentou ao meu lado e me abraçou, me fazendo chorar novamente.
Acho que eu só consegui falar alguma coisa coerente, depois de umas três horas e quatro xícaras de café, levantei do sofá e encarei minha mãe que estava na cozinha:
- Acho que eu perdi o controle da minha vida – eu disse.
- Não – minha mãe voltou a me abraçar – apenas está num momento difícil, minha filha – ela beijou meu rosto, liguei para o Mark, ele acha que pode ser estresse pós traumático, toda essa pressão das provas e o Spencer... – ela segurou meu rosto com as mãos – vai ficar tudo bem, certo?
- Certo – suspirei.
- Seu amigo foi ótimo – ela disse – evite ficar sozinha, certo?
- Tudo bem – respondi.
Mamãe preparou o jantar, eu comi pouco, conforme ela, quase nada, mas mães são assim, então ela não estaria satisfeita nunca. Assim que voltei para meu quarto, peguei o celular e enviei uma mensagem para Noah:
- Ei, esquisito, obrigada por cuidar de mim hoje, e sinto muito por isso...
- Não se desculpe por isso, é o mínimo que eu posso fazer, certo? – ele respondeu no mesmo minuto.
- Certo, mas obrigada mesmo assim – enviei com uma carinha feliz.
- Como está se sentindo? – ele perguntou.
- Um pouco melhor, amanhã tenho terapia...
- Vai se sentir melhor quando conversar sobre isso, tenho certeza. Se precisar de qualquer coisa, pode me chamar, a qualquer hora, sabe estou aqui para você.
- Obrigada, Noah, boa noite.
- Boa noite – ele respondeu.
Spencer tinha mandado várias mensagens perguntando sobre os meus exames, no fim das contas, eu acabei respondendo apenas “acho que fui bem, mas estou exausta, amanhã conversamos, um beijo” e enviei sem pensar muito, afinal, havíamos rompido, de repente o beijo não seria uma boa ideia. Dormi com isso na cabeça.
Acordei cedo na manhã seguinte e meu eu interior me disse para sair para correr, então eu o fiz, e devo dizer que me senti melhor depois disso. Tomei meu café da manhã, um banho quente e fui para a minha sessão de terapia, que teria duas horas dessa vez, porque Mark achou que tínhamos muito o que conversar, contei sobre minha crise de choro e ele perguntou:
- Do que se lembra antes de sentar e chorar?
- Nada muito concreto, pensei nos meus amigos, no meu namorado... Ex namorado, eu estava exausta, os exames acabaram comigo.
- Compreendo – ele disse – e acho que, como disse ao telefone ontem para sua mãe, é um episódio de estresse pós traumático, você teve uma semana bem difícil, Mariah, e sabe disso. Acho que precisa de um descanso, precisa realmente desligar.
- Sim – suspirei – tenho um acampamento na semana que vem.
- Parece uma ótima opção – ele sorriu – sem celulares, sem livros... Apenas contato com a natureza e conversas amenas, certo?
- Tudo bem – suspirei.
Durante a tarde, visitei minha avó. Não visitei meu pai, apenas minha avó, pelo menos poderia sentar e chorar mais um pouco, caso fosse necessário, e ela, como sempre compreensiva, sabia que eu não estava bem assim que me enxergou passando pela porta:
- O que houve, minha querida? – ela perguntou-me com doçura.
- Spencer e eu... – eu chorei – estamos dando um tempo, acho que não tem mais conserto.
- Ah, eu sinto muito – ela beijou meu rosto – sinto tanto, de coração minha pequena, tão jovem para sofrer desamores...
Ela consolou-me por um tempo, por muito tempo, na verdade, saí da Prince’s House já era noite, e quando cheguei em casa, mamãe havia preparado uma deliciosa lasanha para o jantar, escolhemos comédias para assistir e comemos doces – ela tinha passado na confeitaria de uma amiga dela durante a tarde para buscar os meus preferidos – e tivemos uma noite realmente boa.
Na manhã de domingo, fui acordada por uma ligação de Lindsey, que parecia que teria um ataque de nervos, ou de alegria, eu acho que não conseguia saber, contando-me sobre os últimos passeios com Justin e que quase haviam se beijado, mas que o grande momento havia sido interrompido pelo irmão mais novo dela e um mega tombo do skate de Justin, bem, o pirralho havia quebrado o braço, Justin sentia-se culpado, mesmo depois de ter levado o garoto para o hospital e comprado sorvete. Ela parecia empolgada demais, e eu sabia o que ela estava sentindo, e ficava infinitamente feliz por ela.
O meu domingo foi estranho... Revirei os materiais de estudo de Michael mais uma vez, apenas porque sim, depois, encarei meus diários velhos, até minha mãe me arrastar para fora do quarto dizendo que aquilo era praticamente uma sessão de tortura e que eu devia tacar fogo em tudo aquilo, pelo menos ela me fez rir.
Na segunda feira eu me sentia um pouco melhor, apesar do ambiente escolar me causar uma pressão terrível, eu sabia que não havia mais muitas coisas para fazer, minha sorte estava lançada na semana anterior, e nos envelopes lacrados enviados antes disso.
Mia estava afastada da escola naquela semana, depois da pressão dos exames, ela pediu atividades online por uns dias, ela não iria acampar com a turma, e eu compreendi que talvez ela quisesse se afastar um pouco, mas telefonei para ela, para me certificar de que tudo estava bem e combinei de ir ver ela durante a tarde.
- Falei com o meu irmão - ela disse séria e decepcionada - não quero que se sinta m*l por isso Mariah - ela me abraçou assim que eu entrei pela porta - eu realmente sinto muito, ele é um i****a.
- A culpa não foi bem dele... - tentei melhorar a situação.
- Você tem mania de diminuir as coisas que ele faz - ela disse irritada - não precisa defendê-lo.
- Eu acho que eu já estava irritada, com a coisa toda do encontro da turma... - eu disse.
- Que encontro da turma? - ela perguntou curiosa.
- No sábado - eu respondi - antes do feriado.
- Peter não falou de nenhum encontro - ela disse séria - lamento, mas não sei de nada.
Aquilo foi um golpe: eu não fazia a menor ideia de onde Spencer havia se metido por três horas na véspera do feriado que ele deveria passar comigo, respirei fundo e tentei contornar mais uma vez a situação.
- Não importa - eu disse - nós estamos... Separados agora, um tempo, sei lá.
- Tudo bem - Mia sorriu gentilmente - você é legal demais, eu já te disse isso...
Mudamos de assunto assim que ela disse isso. Eu não queria ficar falando de Spencer ou do nosso tempo, ou de todas as coisas que me incomodavam, era para isso que eu pagava sessões de terapia, queria conversar amenidades, falar de planos, e Mia parecia bem empolgada com um programa universitário para o qual Peter estava inscrito, e havia um grande volume de aulas online, assim ele não ficaria fora por mais tempo, e aparentemente, ele tinha cumprido os requisitos. Estava feliz por eles.
Na tarde de terça-feira, eu sai com Lindsey para comprar alguns itens da minha lista de equipamentos de acampamento – e isso era engraçado, porque não sabíamos por onde começar, e de toda forma, meus pagamentos reduzidos ainda foram suficientes para prover os itens necessários e alguns contrabandos alcóolicos e doces para o grande evento: três noites acampados na Reserva, isso seria muito selvagem, e frio. Adquiri uma barraca pequena, colchão inflável, lanternas, botinas, uma jaqueta corta vento, um bom canivete e uma faca. Alguns itens para pesca, Lindsey encarou pilhas para câmeras, mas acabamos dividindo o custo de um bunker de energia com placa solar e entrada para os carregadores de telefone e de baterias de câmeras, lanternas e caixinhas de som.
Sabíamos que a Reserva tinha banheiros com chuveiros quentes e tomadas, mas a liberdade de ficar no acampamento para carregar os aparelhos era um plus. Arrumei minha mochila assim que cheguei em casa, sairíamos para a Reserva na quinta feira pela manhã e bem, estávamos tão empolgados que era difícil acreditar que íamos para o meio do mato. Na noite de quarta-feira, eu e mamãe conversamos bastante, ela me disse que tinha conversado novamente com Brandon e que bem, ele tinha dito que sentia falta dela, ela parecia ter gostado de ler isso, mas me dizia não saber como lidar com as escolhas que fazia. Fiquei triste por ela pensando nisso, quer dizer, já era h******l quando éramos jovens, imagine quando mais velhos, arrependermo-nos de coisas que deixamos de fazer, simplesmente por ter medo de encarar o novo, aquilo soava estranho quando se tratava da minha mãe - eu acho que eu nunca me acostumaria com a ideia de ver ela em duvida ou sentindo culpa.
E então, na manhã seguinte, depois de revisar meu equipamento e os meus suprimentos por dez vezes para ter certeza de que não havia esquecido de nada e carregar todas as cobertas extras que eu consegui enfiar dentro da minha cota de malas e bagagens, mamãe me levou para a escola para pegar o ônibus para a reserva e disse estar muito feliz de me ver fazendo coisas diferentes, apesar de ter certeza de que eu não acharia tão empolgante assim quando começasse a passar frio.