7- Ele me chamou de "cara"?

1757 Words
Fazia dois dias que Eduardo e Kauan não se viam. O editor trabalhava em casa em artigos para o jornal e para o seu blog, que há algum tempo não era alimentado. O estagiário não tinha notícias dele e não sabia se o seu suposto namorado ainda existia. Por isso trabalhava e estudava meio que suspenso no ar. Eduardo terminava um texto quando recebeu a tão esperada mensagem no celular. Seu coração disparou quando viu que era de um número desconhecido, naquele aplicativo que quase não usava.  Erica: Eduardo? Eduardo: Oi!! Tudo bem? Erica: Td. Vi que vc tem feito seu trabalho direitinho. Eduardo: Tenho tentado... Erica: Eu vi. Mas ele ainda não. Então, escuta, vou te passar o endereço e horário de um evento. Tenta ir e levar o namorado. Ele vai estar lá com o namorado dele. É um evento para advogados, alguma coisa assim, mas essas coisas sempre têm cobertura da imprensa. Tenta ir de algum jeito.  Eduardo: Vou tentar. Erica: Faça ele te ver, mas finja que não o viu, se der. E nunca diga que eu te falei. Invente uma desculpa plausível, caso ele fale com você e te pergunte. Vou te passar o endereço, dia e hora daqui a pouquinho. Estamos quase lá! Eduardo: Tá bom! Obrigado, Maria. Erica: Nada. E boa sorte. Acho que dessa vez vai! Kkk Erica enviou o endereço poucos minutos depois, mas Eduardo ainda estava com os batimentos acelerados só de ter a possibilidade de chegar perto dele de novo, de poder vê-lo. Era quarta-feira e o evento seria na quinta, num hotel famoso. Realmente se tratava de um evento para advogados. Eduardo não sabia, mas o sócio de Rodrigo seria um dos homenageados da noite, por isso ele iria com Andrei,  que, relutante, tentou escapar, mas não conseguiu. Rafael e Adriana já tinham sido contatados por Eduardo e se mobilizavam na tentativa de conseguir uma entrada de imprensa. Não conseguiriam para o dia seguinte, mas um conhecido de Aquiles arranjou a entrada de Kauan e Eduardo como convidados e o jornalista poderia entrar. Kauan já tinha sido comunicado àquela altura e usaria a mesma roupa que tinha comprado para a festa na qual ele beijou Eduardo pela primeira vez. Sentia um arrepio quando lembrava, e por isso estava animado. Não ficaria se soubesse os detalhes que ficou sabendo apenas no caminho para a festa. — Então ele vai estar lá? — Kauan quis ter certeza do que tinha ouvido. — Vai, cara, não é incrível? — ele falava animadíssimo, deixando o estagiário chateado não só pela animação, mas pela forma que se referiu a ele. "Cara? Ele me chamou de cara?!", Kauan pensava, revoltado. Ultrajado.  Eduardo m*l conseguia controlar a emoção. Via-se que ele estava ridiculamente ansioso, alegremente empolgado, de uma forma que Kauan ainda não conhecia. Irritado com aquela empolgação de seu editor, ele ficou em silêncio. E, calado, entrou em mais um evento de ricos, de mãos dadas com seu namoradinho jornalista.  A estrutura era parecida com a da festa anterior, mas ao contrário daquela, não havia um espaço vago no centro do salão. Todo o local estava preenchido por mesas chiques e bem decoradas, pois se tratava apenas de uma premiação, mas teria um coquetel no final. Ninguém dançaria ou se entreteria ali dentro. Era um evento profissional e os dois intrusos foram acomodados em uma das últimas mesas, pois nem advogados eram. Estavam sozinhos dessa vez, o que deixou Kauan um pouco mais à vontade, a despeito da raiva que sentia. O jornalista queria ver Andrei, mas queria também ver seu namorado. Era uma curiosidade meio masoquista, mas ele queria olhá-lo, saber como ele era. Eles não estavam em nenhuma das mesas próximas, que foram checada pelos olhos atentos de Eduardo uma a uma. Kauan pouco poderia fazer para ajudar, uma vez que nem conhecia o hacker. E se conhecesse não moveria um dedo para ajudar a encontrá-lo. Ele sabia que não deveria sentir aquelas coisas, ele sabia que o namoro era uma farsa, que Eduardo estava apaixonado por outro e que não ficaria com ele. Mesmo com os beijos quentes que trocaram, ele sabia que não devia nutrir qualquer tipo de esperança, mas ele nutria e sentia ódio de si mesmo por causa disso. Um homem falava no palco, algumas pessoas subiam, pegavam um troféu, agradeciam e sentavam. Era como a entrega do Oscar, só que ainda mais chata e sem tapete vermelho e gente famosa de verdade. Foram mais de duas horas de monotonia e enrolação e naquela noite, pela primeira vez, Kauan quis não estar com Eduardo. "Ele que visse esse cara sozinho", pensava, cheio de ciúmes. A entrega terminou e uma mesa elegante de vidro, enorme, tinha sido posta em um dos cantos afastados das mesas e lá havia comidas chiques que Kauan nunca tinha visto, por isso só comeu canapés que os garçons levavam às mesas. Eduardo quase não comeu nada, pois seu estômago revirado pela ansiedade, impedia. — Vamos comigo até perto da mesa? Preciso que ele veja a gente. — pediu Eduardo. — Tá. — concordou Kauan, tentando disfarçar o mau humor. Foram de mãos dadas até a mesa e Eduardo viu Andrei. Sua mão começou a suar, seu coração disparou e suas pernas tremeram. Ele não tinha mais controle do próprio corpo. — Ele está ali. — falou para o estagiário, que segurava sua mão e virou de costas para onde estavam Rodrigo e Andrei. — Perto daquela mulher de vermelho. — Eduardo disse, virando-se de frente para Kauan e o abraçando pela cintura.  O garoto olhou em seus olhos, depois envolveu seus braços em torno de Eduardo, para conseguir ver o rapaz misterioso. — Tô vendo. — falou no ouvido de Eduardo, sentindo também um frio na barriga. — Ele é bem bonito mesmo. — Kauan continuou, abraçado ao jornalista. — Mas o namorado dele é lindo! Meu Deus! — e ao dizer isso um sorriso quase maléfico surgiu em seus lábios e ele se sentiu ligeiramente vingado. Porque Rodrigo era realmente bonito.  — Não vi o namorado. — Eduardo resmungou. — Então vamos trocar de lugar pra você ver. Kauan fazia questão. Queria olhar no rosto de Eduardo quando ele visse aquele homem. Viu então seu rosto se fechar, ficando sombrio e silencioso, para o lento prazer do jovem que o assistia. — Ele é bonito mesmo.  — o jornalista concordou, com uma expressão indefinida. Depois olhou para Kauan. — Mas não é mais bonito que você. — disse, olhando para o garoto que gargalhou, deixando-o bravo. — Por que tá rindo? — inquiriu, sério. — Porque você é um mentiroso. — ele ainda ria. — Olha aquele homem, pelo amor de Deus! E eles parecem estar mesmo apaixonados. Você viu o jeito que se olham? — Kauan se vingava. O hacker era bonito, tinha que concordar, mas era evidente que eram um casal apaixonado e que Eduardo não teria a menor chance. — Vi. — falou Eduardo, soturno, olhando para Kauan, que também olhava para ele, ainda abraçado. Eduardo então beijou Kauan, beijou com força, com uma leve raiva. Dele, de Andrei, da beleza de Rodrigo. Mas a boca do garoto o acalmara e por poucos segundos ele esqueceu que estava encenando. Segurou o rosto de Kauan nas mãos, sorriu e o beijou novamente. Com delicadeza dessa vez, amolecendo o jovem ciumento em seus braços, transformando a raiva de ambos em alguma coisa que ainda não tinha nome, mas que surgia ali, naquele beijo. Levou-o mais para o canto e não o soltou. Continuou agarrado a ele, beijando com vontade. Kauan continuava de frente para o local onde os dois estavam, mas não olhava mais para eles. Eduardo tampouco se virou novamente. Ocupou-se de beijar seu namorado mais e mais vezes, como se quisesse competir com a paixão de Andrei e Rodrigo. Mas ninguém sabia se de fato era isso. Abraçou Kauan forte, apertado, sentindo seu corpo pequeno, quente e aconchegante. Estava fazendo o que tinha ido fazer. — Você pensa nele quando me beija? — perguntou no ouvido de Eduardo. — Claro que não. Não quero que pense isso... eu gosto mesmo de te beijar... — dizia, olhando para ele firme, tentando demonstrar confiança e credibilidade.  Kauan não acreditou, mas nada disse. Beijaram-se mais algumas vezes e Kauan, abraçado com o seu namorado de mentira, olhou para o lado e viu Andrei passar quase colado neles. O hacker olhou bem nos olhos de Kauan, que tentou fingir que não sabia de quem se tratava, mas estremeceu ao vê-lo tão de perto. Eduardo, abraçado ao estagiário, não os viu. Kauan também não disse nada a respeito, mas algo se metamorfoseou com aquele olhar e Kauan sentiu de perto que poderia ter se enganado. Que talvez Eduardo tivesse alguma chance com aquele rapaz, que tinha mesmo um estranho charme misterioso, pois ele havia o olhado com alguma espécie de raiva, talvez. Kauan não conseguia achar uma boa definição para aquele olhar. Mas sentiu que ele não gostou de ver Eduardo o abraçando. Sabia que aquela impressão poderia ser resultante do ciúmes que sentia, no entanto ele não conseguia evitar e sentia tão forte que achou, naquele segundo, que talvez Eduardo acabasse ficando mesmo com o rapaz. — Acho que já deu, né? — perguntou a Eduardo. — Acho que sim. Ele deve ter visto a gente. — Eduardo concordou. — Você quer vê-lo mais uma vez? — questionou Kauan, sabendo que aquela era uma batalha perdida. — Se quiser, ele acabou de entrar no banheiro. Sozinho. — avisou, com uma honestidade dolorida. — Eu não quero. — Eduardo falou com honestidade, provocando em Kauan um sorriso impossível de ser escondido. — Então vamos. Embora tenha ido mais feliz do que quando chegou, Kauan não quis beijar Eduardo mais aquela noite. Só queria ir para a sua casa e dormir, com a sensação de dever cumprido e de ser um completo i****a. Porque apesar de seus beijos dizerem o contrário, seu olhar, sua emoção ao ver aquele jovem evidenciavam que o coração de Eduardo já estava preenchido. E Kauan era só um "cara" qualquer.  Já Eduardo estava ainda sob efeito de emoções tão intensas quanto conflitantes. Ver Andrei era tudo o que ele queria, mas vê-lo com o namorado, aquele namorado especialmente, foi como cair da corda bamba na qual se equilibrava tão debilmente. Não era uma queda de grande altura, mas era uma queda.  E em vez de dor, ele sentia correr pelo corpo uma forte e estranha espécie de alívio.
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