9- O fardo de Aquiles

3681 Words
Eduardo marcou de se encontrar com Aquiles, pois precisava mostrar para ele e para os outros o que tinha conseguido. Queria sugestões de jornalistas de outras empresas para trabalhar em parceria com eles na divulgação do material que tinha em mãos, mas Aquiles teve um contratempo. No auge dos seus trinta e sete anos, morando sozinho há tempos, escrevendo para alguns jornais do país e encabeçando o projeto audacioso que era o Brazilian Watch, ele tinha pouco tempo para si, o que achava até bom, porque depois de ter terminado um relacionamento de quase oito anos há quase três ele não queria mais problemas, não queria tempo livre para estar sozinho, mas o problema bateu à sua porta. Estava ele se preparando para ir ao trabalho quando o porteiro interfonou. — Boa tarde, seu Aquiles, tem um rapaz chamado Danilo aqui perguntando do senhor.  — Não conheço nenhum Danilo, João. — falou com pressa. — Ele disse que sua mãe é madrinha dele... que ele é filho da Regina... — o porteiro insistiu, com pena do garoto com aquela mochila enorme. — Ah, c****e! Fala pra ele subir.l! Obrigado, João. — disse, irritado. Abriu a porta quando a campainha tocou e deu de cara com um garoto bonito, de pele morena bronzeada, sorridente e com uma mochila grande nas costas. — Entra. — ele falou, saindo da frente da porta. — Obrigado. — o jovem agradeceu, deixando a mochila num canto, no chão.  — Então, Danilo... — Eu vim aqui porque fui na casa da sua mãe e ela não estava... e como ela tinha dito à minha mãe que eu podia passar uns dias na casa dela caso passasse na faculdade, eu vim... e como sua mãe não estava, um vizinho me deu seu endereço. — Deve ter sido o Jorge. — Acho que sim. — Minha mãe não mora mais na cidade... — falou Aquiles, olhando para ele. — Espera um pouco que eu vou ligar pra ela e já volto. - disse, indo para o seu quarto.  — Pode sentar... — Aquiles falou de longe, com sua voz grave. Assim que entrou no quarto, Aquiles ligou para sua mãe, ainda meio aturdido. — Oi, mãe.  — Oi, filho. Tudo bem? Aconteceu alguma coisa? — Aconteceu. Tem um garoto na minha casa. Filho da Regina. Ele veio de mala pronta pra morar com você, porque você disse que ele poderia, caso viesse fazer faculdade! — Meu Deus do céu, Aquiles! Pois é! Menino!! Eu nem lembrava que tinha falado isso! Faz tempo! E agora? — E agora eu que te pergunto, né, mãe? O que eu faço com ele? — Aquiles, você não pode pôr ele na rua! — Eu não coloquei. Mas ele não vai ficar aqui, mãe. Nem pense nisso! — Não dá pra ele ficar lá em casa, Aquiles! Tá tudo vazio. E Eles não têm condições de pagar um...  — Mãe... Ele não vai ficar aqui. — Filho, escuta... A Regina é minha amiga de infância, minha comadre. Ele é meu afilhado. Sou uma péssima madrinha. Nunca nem vou visitar o menino... — Ele é quase um homem já, mãe. Agora é tarde pra reparar isso. — Me deixa falar, Aquiles... Eu prometi pra ela que ajudaria.  — Mas você não tá aqui. Explica pra ela. Tenho certeza que ela...  — Vou tentar ligar pra ela e já falo com você.  — Espera. Mãe... Merda! Ela desligou, deixando o filho ainda mais irritado. Depois de alguns minutos de uma angustiante expectativa, Fátima voltou a ligar. — Oi, filho, sou eu. — Eu sei, mãe. E aí? — Então. Falei com a Regina. E será que ele não pode ficar aí pelo menos um semestre?  — p***a, mãe! Eu disse que não... por que tá fazendo isso comigo? - Aquiles! Ela não tem condições de pagar um lugar pro menino ficar. Foi um sacrifício ele entrar numa faculdade pública. O pai dele abandonou os dois quando ele era criança. Ela criou ele sozinha. Será que você pode deixar de ser egoísta? — Mas, mãe... Aquiles deu uma respirada profunda. Uma das poucas pessoas que o amoleciam era a mãe. — Eu posso deixar ele ficar lá em casa, mas está quase sem móveis e ele vai ficar quase sem ter o que comer. Você vai deixar uma pessoa nessa condição, Aquiles? Você tem coragem? — Eu posso ajudar com dinheiro. Levo umas coisas pra ele... Sei lá.  — Ela só me pediu seis meses. Ele arruma um emprego e se vira depois. — Posso ajudar com dinheiro? — repetiu a oferta. Aquiles não queria ter sua privacidade invadida, sua liberdade cerceada, ou viver com alguém por perto depois de tantos anos vivendo sozinho. Aquilo soava terrível para ele. — Ajuda como você quiser, Aquiles. Se é assim que você pode ajudar, enfia o menino naquela casa vazia e deixa ele lá sozinho, então. — dizendo isso, alto, Fátima encerrou a ligação, deixando mais uma vez seu filho falando sozinho. — c*****o!  O berro ecoou forte, sendo possível ouvir de onde Danilo estava. Ouvi-lo fez com que o garoto se encolhesse e corasse levemente. Ele sabia que o grito de raiva era por sua causa. Lamentava internamente incomodar, envergonhou-se até. Mas naquele momento não tinha outra alternativa senão ficar ali, engolir sua humilhação e fazer a matrícula no dia seguinte. Danilo tinha estudado a vida toda em escola pública. Fez cursinho popular e conseguiu com muita dificuldade entrar em uma faculdade pública. A vaga, porém, era na capital. Ele morava com a mãe em uma cidadezinha litorânea, e como não tinham recursos suficientes para pagar moradia fora da cidade, sua mãe precisou aceitar a ajuda oferecida outrora pela comadre, sua amiga de infância. Simples e desajeitada como era, Regina não se atentou aos detalhes, colocando o filho naquela situação embaraçosa na qual se encontrava. Não ligou para a amiga para confirmar se ela estaria em casa. Simplesmente entregou o endereço que tinha ao filho e mandou que fosse procurar a madrinha. E ele foi.  Ao contrário das pessoas que vivem em cidade grande, para quem mora no interior ou em cidades pequenas, no geral, a palavra empenhada não fazia curvas. Era uma certeza. E a mãe de Danilo não teve dúvidas. A mãe de Aquiles era mais velha que a amiga. Casou-se jovem e teve filho muito cedo, apenas um. Foi morar na capital, deixando a casa dos pais na pequena cidade praiana, a qual visitava de vez em quando. Sempre amou a amiga, para a qual deu o primeiro filho para batizar. Mas depois da morte da mãe, Fátima deixou de visitar a cidade, que não era das queridinhas dos turistas, e seus contatos ficaram escassos. Regina teve filho bem mais tarde, o que fazia com que a diferença de idade entre eles fosse grande. Teve apenas um também, Danilo, que criou com dificuldade, já que o pai da criança a abandonou, fazendo com que ela tivesse que criar, educar e sustentar o garoto sozinha. Como fazem tantas outras mulheres. Mas em cidade pequena tudo é mais difícil. Tanto pela escassez de emprego quanto pelo falatório dos vizinhos que, mesmo nos tempos atuais, ainda julgam mães-solo. A forma encontrada por ela para o sustento do lar foi trabalhar numa imobiliária da região e acumular empregos em época de temporada, trabalhando também, durante as noites em um quiosque perto do mar. O resultado disso era um cansaço permanente e uma aparência envelhecida que faria com quem olhasse para ela e a amiga, caso postas lado a lado, a achasse a mais velha. Mesmo com a jornada extenuante de trabalho, o salário era apertado. Danilo, depois dos 16 anos, passou a trabalhar em quiosques de praia em época de temporada também, a fim de colaborar com orçamento doméstico e poder comprar alguma coisa para si. Pois ainda que fosse um garoto de gostos simples, não se importava com artigos de grife, nem tentava ostentar um padrão de vida que não era o dele, ele queria vestir coisas bonitas, como todo adolescente. Mas era apenas nos períodos de temporada que se arrumava emprego naquela cidade. Eram sempre temporários. No resto do ano, era raro quem conseguia manter um emprego fixo. Por isso, Danilo estudava. Regina o incentivava. Ele sabia que precisava sair de lá. E como todo adolescente pobre, ele queria dar uma vida melhor para a mãe. O caminho escolhido por ele, ensinado e incentivado pela mãe, era o estudo. Depois de findado o Ensino Médio, Danilo não conseguiu entrar direto na faculdade, porém não deixou de tentar. Apenas dois anos depois foi que o sonho se concretizou mediante trabalho árduo e ajuda de cotas para estudantes de escola pública. Por mais que se esforcem, é difícil para alunos pobres competirem com quem tem acesso a tudo. As condições são desiguais. Mas ele iria para uma faculdade pública, enfim. Na capital. Mãe e filho estavam felizes, pois tinham a certeza de que a madrinha, aquela ideia distante, ajudaria. Era uma promessa, afinal. E Regina estava tranquila. Aquiles, por outro lado, morava sozinho em um amplo apartamento de três dormitórios, num condomínio de torre única, com apenas dois apartamentos por andar. Aos trinta e sete era um jornalista bem sucedido e engajado, mas fechado, sisudo e grande. Seu pai já tinha se aposentado e resolvido ir morar num lugar mais tranquilo, não muito longe, mas afastado do grande centro urbano, num lugar serrano. Sua mãe não trabalhava. Pretendiam vender a casa da cidade, mas ainda não a tinham esvaziado por completo. Muitos poderiam achar que ele tinha tudo para ser mimado, mas ele não era. Apesar da boa condição financeira de seus pais, sua mãe sempre fora uma mulher firme e de caráter. Teve uma infância humilde da qual nunca se esqueceu. Cresceu em cidade pequena e ensinou valores e honestidade ao filho, mas não um conservadorismo t**o e burro, do qual sempre foi contra. Devido à  boa condição financeira do marido, não precisou trabalhar e pôde se dedicar à educação do filho. Conforme ele foi crescendo, ela se engajou em trabalhos voluntários diversos. Não apenas como doadora, mas dispensava parte de seu tempo ajudando animais e pessoas. Fátima se casou com um homem bom e a homossexualidade do filho nunca foi um problema para eles. Aquiles era um rapaz de sorte perto de outros jovens gays. Sempre estudou em escolas pequenas e particulares. Sofreu pouco bullying, pois sempre foi muito alto e seu aspecto rústico sempre assustou os colegas de escola, evitando que ele passasse por muitos dos problemas tão comuns para os gays adolescentes.  Ele foi aprender sobre preconceito quando adulto. E aprendeu muito sobre o preconceito velado, pois sua condição socioeconômica privilegiada, sua cor e seu tamanho o pouparam de muita coisa, mas não o pouparam de tudo. O ódio internalizado, aquela raiva aprendida, passada de um para o outro culturalmente sem que se perceba ainda estava ali, à espreita, ele via, todos os dias da sua vida adulta, como a homofobia está entranhada no tecido social, ainda que ele próprio tivesse a sorte de ter sido poupado de crises existenciais, de surras e de ter de se trancar à chave num armário, ele via que essa, infelizmente, não era a realidade da maioria. E por isso seu trabalho na Brazilian Watch era tão importante. E por não ter tido que lidar com grandes problemas na adolescência, o término de sua relação foi algo difícil para ele, até então um monogâmico convicto, que adorava a vida a dois e que nunca havia nem sequer olhado para outro homem nos oito anos em que ficou com Marcelo  o rompimento foi tão duro para Aquiles, que ele passou a evitar a todo custo as elações exclusivas, tendo, desde então, apenas encontros casuais. E fazia questão de deixar sempre claro suas intenções, pois não queria magoar ninguém como foi magoado. Também não falava sobre isso no trabalho, pois prezava a privacidade acima de tudo. Até Danilo chegar e ele se ver obrigado virar sua vida do avesso. Teve de levá-lo junto consigo à redação da BW aquele dia, às pressas. Completamente irritado por ver que teria sua rotina modificada e sua privacidade invadida, já que teria que morar seis meses com aquele moleque, ele tentava manter a calma, porque, afinal, não adiantava ser engajado apenas da boca pra fora. Era verdade que Aquiles era uma rocha, quase impenetrável, mas seus pensamentos eram líquidos e escorriam, caso alguém quisesse mesmo ver. Eles tinham vida. E estavam vivos, em movimento. Voltou para a sala onde encontrou o garoto sentado. Respirou fundou e começou a assinar o documento de perda da sua privacidade. — Minha mãe disse que você pode ficar na casa dela. Mas a casa está praticamente vazia. Nem sei se tem cama. Posso te ajudar com algumas coisas. Se você preferir ficar lá. — disse, iniciando a explicação. — Conversei com a minha mãe, que conversou com a sua. E... se você preferir, pode ficar um semestre na minha casa. Um semestre. Até se ajeitar. — sua voz tinha ficado mais séria. — O que prefere? — Prefiro ficar na sua casa. Se você não se importar. — respondeu sem jeito, olhando pra para frente, ora para baixo e mordendo o interior da boca. Aquiles respirou fundo. Certamente não era a resposta que ele preferia ouvir.  — Tudo bem. Mas vou avisando, eu sou gay, você vai ver homens na minha casa. Não vou mudar minha vida por sua causa. Se tem algum problema com relação a isso, sugiro que fique em outro lugar. — Tudo bem. Não tenho problema, não. — disse Danilo, aliviado, apesar da rudeza. — Ninguém vai mexer com você, não se preocupe. Antes que você pense alguma bobagem. — Eu não pensei nada. Eu... também sou gay. — falou, desajeitado. — Hum. Menos m*l. — Mas eu tenho namorado. Então, não se preocupe. — disse, caso ele achasse aquilo um problema. — Hum... Tá bom. Mas nada de namorados aqui. — avisou quase rude. — Tudo bem. Obrigado por me deixar ficar. — ele sentia que um peso grande tinha descido de seus ombros. — Agora eu preciso ir para o trabalho. Vamos comigo. Te explico no caminho as coisas da casa. — Tá bom. — Deixa essa mochila aí. — falou Aquiles. E eles foram à sede da BW, onde o editor chefe se encontraria com Eduardo. Eu não vou ser babá. Esse moleque que não me encha o saco. Hoje à noite já vou deixar bem claro que não quero ninguém me atormentando. Minha mãe é f**a! Agora tem um pirralho pra morar comigo. p**a que pariu. Não dá pra acreditar. Mas eu ia fazer o quê? Deixar o menino sozinho naquela casa vazia? Sem ter o que comer? Merda, viu?! Que merda! Chegando no trabalho, ele apresentou Danilo para quem estava lá, deu uma mesa vazia para ele sentar e pediu para que Kauan pegasse algo para ele comer e desse água, coisas do tipo. Kauan fez o que foi pedido e descobriu que Danilo tinha 22 anos, um a menos que ele e tinha ido cursar Biologia numa Universidade pública, a mesma que a dele. Ficaram conversando, deram-se bem e Kauan se ofereceu para levar Danilo para fazer a matrícula fora de hora, pois ele passou na última chamada da faculdade. Antes que Eduardo chegasse, Aquiles, que não era de expor a vida pessoal, reclamava para Rafael, enquanto Kauan recepcionava gentilmente o convidado. A primeira pessoa que viu Eduardo chegar foi Kauan e já sentiu o coração disparar de raiva. Todos que estavam presentes se reuniram e Eduardo expôs a situação. Leu os e-mails e os passou de mão em mão. Disse que estava disposto a compartilhar o que recebesse com todos da redação que quisessem escrever sobre assunto, mas que precisaria publicar algo inédito no jornal que trabalhava e queria ele mesmo escrever algo com o Kauan, que tinha se sacrificado para que ele não perdesse a fonte. Seria a primeira matéria publicada de Kauan e por mais raiva que estivesse de Eduardo, ele sabia que não deveria perder a oportunidade. Eduardo também reforçou a ideia de trabalhar em parceria com mais um veículo de mídia, mais um jornalista, e os colegas ficaram de pensar em nomes.  Naquele momento, o que tinha ficado decidido era que primeiro Eduardo escreveria um artigo para o jornal mencionando apenas a parte da encomenda da morte da personagem gay. Depois, Rafael e Adriana escreveriam juntos sobre a personagem feminista para o BW e por fim Kauan e Eduardo escreveriam sobre a reforma tributária, o tema mais complexo. Aquiles não quis escrever sobre coisa alguma, tinha problema demais e já estava satisfeito que o vazamento da informação sairia no BW. Os outros presentes concordaram em se revezar conforme as informações fossem chegando. Assim, parte do trabalho estava resolvida e Eduardo precisava começar o artigo o mais depressa que conseguisse. Quando todos foram embora, Aquiles se viu novamente sozinho com o seu problema. Foi então com Danilo para a casa. No caminho, reforçou algumas coordenadas já dadas. — Você tem quantos anos? — 22.  — Ótimo. Não é menor de idade. Menos m*l. Porque eu não quero bancar o pai de ninguém. — falava nitidamente m*l-humorado, enquanto dirigia. — Então vai ser assim, você pode ficar no quarto que vou te mostrar assim que chegar em casa, que é o mais distante do meu. Como eu disse, eu sou gay, não namoro, então de vez em quando levo caras em casa. Não falo sobre minha vida pessoal no trabalho e espero que você faça o mesmo, caso eu precise te levar lá de novo. Não por eu ser gay, mas porque odeio gente se metendo na minha vida. Houve uma pausa antes de Aquiles continuar reiterando o que já havia dito. — Tudo bem. Então, você vai ver homens. Não faz sentido eu pagar motel se eu moro sozinho. Isso não vai mudar. Eu m*l conheço você, então eu não quero que você traga ninguém pra minha casa, sendo seu namorado ou não. Isso pouco me importa. Se quiser t*****r, transe em qualquer outro lugar, menos aqui. Não use drogas na minha casa e não chegue bêbado fazendo escândalo, porque eu vou ficar puto. — Tá bom. — continuou ouvindo atentamente. Reparou que Aquiles tinha as sobrancelhas grossas  e mordia quase imperceptivelmente o interior da boca enquanto falava, mas isso não lhe conferia um ar de insegurança, mas de leve ansiedade, como se quisesse encerrar logo a conversa. Ele tinha um ar despojado, embora fosse o Editor-chefe daquele jornal. Aquiles costumava usar barba e tinha os cabelos compridos. Barbeava-se quando tinha algum evento que não podia deixar mesmo de ir, pois no geral evitava todos. Gostava mesmo de ficar em casa.   Não era afeito a aparições públicas e seu trabalho era totalmente focado no jornalismo escrito, o qual dominava. Não era um homem de uma beleza comum. Muita gente nem o achava bonito. Mas ele chama a atenção, não só pelo tamanho, mas uma espécie de charme rústico. Diferentemente de Eduardo, que tinha uma beleza mais convencional, com seus cabelos escuros e arrumadinhos, tinha a falava mais suave, olhar mais profundo, Aquiles era mais duro. Extremamente educado, mas firme demais. Assustava alguns. Sua assertividade incomodava outros. Se ele fosse heterossexual talvez tivesse dificuldade com as mulheres, devido ao pragmatismo adotado recentemente, depois do término com Marcelo. Mas homens muitas vezes estão acostumados às relações mais práticas e objetivas e Aquiles não tinha dificuldade para encontrar quem levar para a cama. Ainda mais quando encontrava quem fetichizava seu tamanho. Ele pouco se importava. Já que não estava à procurava de nada que ultrapassasse uma noite de sexo. Kauan o achava até bonito, como ele mesmo dizia, mas tinha um certo medo dele. Não medo propriamente dito, mas se sentia intimidado, como quase todo mundo. Eduardo, que nunca se sentiu atraído por homens como Aquiles, não se sentia do mesmo modo, ainda que ele fosse muito mais alto, muito sério e muito fechado. Eduardo conseguia até mesmo arrancar algumas risadas do Editor-chefe, ainda que não fosse uma pessoa muito engraçada. Ninguém entendia aquilo. Mas eles se entendiam. Talvez porque Aquiles visse em Eduardo a total falta de interesse e curiosidade sobre sua vida e aquilo o tranquilizava. Ele sentia que em momento algum viria uma pergunta inesperada, ou alguma intromissão. Era uma relação sem demandas, que deixava Aquiles totalmente despreocupado. A verdade é que a única pessoa que despertava a curiosidade de Eduardo era aquele jovem, lindo e enigmático, hacker. — Você pode fazer o que quiser dentro do seu quarto desde que não use drogas e não leve ninguém. E pode comer o que quiser que tiver na casa. A hora que quiser. Isso não é um problema e não quero se acanhe com relação a isso. Só não quero problemas. Senão terá que ir embora. Tem banheiro no meu quarto, então você usa o outro banheiro. Tem uma mulher que limpa a casa dia sim, dia não. Vou fazer uma cópia das chaves pra você.  O que mais? Acho que é isso. — Aquiles continuava dando diretrizes, já no apartamento. — Tudo bem. Obrigado por me deixar ficar. Vou fazer o possível pra você nem perceber que estou aqui. Prometo. — Danilo dizia calmamente, olhando para ele. Sabia que seu anfitrião não o queria ali. Mas ele não tinha escolha. Precisava mesmo ficar. — Ótimo. Acho que é isso, então. Se precisar de alguma coisa, ou alguma coisa não estiver funcionando me avisa. — Tá... Muito obrigado. — disse mais uma vez, acanhado. No dia seguinte, Aquiles providenciou a cópia das chaves e uma TV para o quarto de Danilo, assim ele teria que sair ainda menos de lá. Mas mesmo isso não o acalmou. Ainda achava um incômodo ter que dividir seu apartamento com outra pessoa. Levou-o com ele à sede da BW e dispensou Kauan para ir com ele fazer a matrícula na faculdade. Deixando Aquiles um tempo livre de seu novo fardo.
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