Sonhando
(Lucas)
Suspiro.
Estou mais uma vez num sonho.
Toda noite a mesma coisa.
Estou em pé, embaixo de uma árvore. Aurora está no balanço que tem pendurado num dos galhos da árvore.
Ela cortou o cabelo, está bem nos ombros, mas continua linda. Não consigo não acha-la linda.
— Cortou o cabelo... — Falo chegando mais perto, por trás.
Ela para de se balançar e se vira na minha direção.
Seu olhar apaixonado não me surpreende, mas amo ver todas as vezes.
— Foi uma pergunta ou afirmação? — Pergunta.
Ela está um pouco receosa, mas tenta deixar o clima menos tenso. Eu estou tenso. Não tenho boas notícias sobre ela, nem para ela.
Me aproximo e fico parado na sua frente, de braços cruzados, e sério.
— Você voltou com o b****a do Arthur? — Mudo de assunto e nem a respondo.
Ela me encara, talvez esteja pensando no que dizer, qual a melhor desculpa para isso.
Mas eu sei a verdade, Luna me ligou pelo Skype para contar que viu a mensagem da Aurora para o Arthur. Luna e Arthur estão ficando há uma semana, o que é um pouco estranho.
Mas não ligo.
Me importo só com a Aurora. E estou morrendo de ciúmes, mesmo que ela não seja nada minha. É mais forte que eu, maior que o sentimento e vontade de acabar com esses sonhos malditos.
— Não que seja da sua conta, mas não. E por que acha isso? Quer dizer, de onde você tirou essa ideia ridícula?
Que desculpa esfarrapada!
— Não interessa. — Me viro e vou caminhando pelo campo aberto.
Demora dois segundos, mas ela acaba me seguindo. Está tensa e confusa, posso sentir. Se continuar desse jeito vamos acordar no meio da madrugada.
— Você ficou muito bonita com esse novo corte. — Comento, quando me alcança e anda ao meu lado.
Ela me encara por um momento, mas quando vou encara-la de volta, ela desvia o olhar.
— Obrigada. Mas não é mudando de assunto que vai me fazer esquecer a pergunta ridícula que fez.
Rio, com escárnio. Quero muito acreditar nela, mas está difícil.
— Me falaram que você estava dando em cima do b****a.
— Quem disse?
— Não importa.
— Importa sim!
— Pra você ir lá, tirar satisfação?
— É! Credo, ficam falando mentiras sobre mim, e o pior, falam pra você!
— O quê que tem, me falarem sobre você?
— Não tem porquê! Não somos nada, nem temos nada!
Meu coração dá um salto. Infelizmente ela tem razão.
— Isso quer dizer que, o que temos não é nada? — Agora quero saber o que ela pensa.
— Aqui é tipo... Como se estivéssemos em um outro planeta e só existisse nós dois. Mas aí chega no mundo real, quando acordamos, é como se a gente não se gostasse mais ou nem fôssemos conhecidos. Isso que quero dizer, Lucas. Não tem porquê alguém ir te contar alguma coisa sobre mim, muito menos mentira.
— Então, por que você estava conversando com ele?
— Ele que estava me enchendo o saco, pra sair com ele. — Bufa, super nervosa. — Eu tentei cortar, disse um monte de coisas, mas ele não parava.
— Bloqueasse.
— Não é assim tão fácil, Lucas. Arthur, mesmo sendo quem é, é superimportante para mim.
— Você ainda nutre algum sentimento por ele. — Concluo.
Ela está nervosa, tentando se explicar, e eu estou morrendo de ciúmes, tentando entender.
— Caramba, Lucas. Não! — Grita e para de andar. — Cansei. Sério, você está insuportável hoje. Que nem aquela sua ex i****a.
— Pelo menos ela não mente para mim... — Falo comigo mesmo, pensando em como Luna ficou preocupada, achando que eu estava sendo traído.
— Como assim...? Vocês ainda se falam?! — Respiro fundo. Acertou, Aura... — Você está aí, falando de mim, mas conversa com sua ex, não é? E ainda acredita nas idiotices dela! Você é um hipócrita!
O quê?! É super diferente! Eu não gosto da Luna, e ela não é nem um pouco importante pra mim.
Paro de andar e me viro na direção da Aurora.
— Não é bem assim, Aura... — Tento me explicar.
— Tanto faz! Não quero mais ouvir.
Ela dá meia volta e eu a sigo.
Droga, Aurora, me ouça pelo menos uma vez!
Tenho coisas à falar, mas ela não deixa, já que acordamos graças às suas infelizes tentativas.
Vou ter que partir para o plano B.
***
(Aurora)
Minha mãe teve um treco logo pela manhã, assim que viu meu cabelo (ou a falta dele).
— Você só pode estar louca! — Ela diz, andando pela cozinha super nervosa. — Meninas da sua idade tem que ter cabelo comprido! Como é que arranja homem assim? Homem gosta de cabelo grande, b***a grande e peito grande. E não barriga grande e cabelo pequeno!
Arregalo os olhos, chocada, mas não surpresa. Minha mãe já falou várias besteiras, mas parece que a cada dia me incomodo cada vez mais. O pior é que não posso falar demais, afinal, ela é minha mãe, mesmo tendo esse pensamento retrógrado.
Ela para de mexer na cozinha e sobe para o segundo andar, talvez esteja indo para seu quarto. Aproveito que ela saiu e solto o grande ar que eu estava segurando. Às vezes acho que sou gorda de tanto engolir o que quero falar.
— Eu disse, que ela iria surtar. — Elizabeth comenta.
— Mas está maravilhoso, Eliza! Não tem porquê isso tudo!
— Eu sei. Assim como sei que, o que ela disse, foi uma grande besteira. E você está maravilhosa, Aura! — Minha irmã sorri, o que faz meu coração se esquentar de tanta felicidade e afeto por essa garota.
— Obrigada, Eliza — Me levanto e vou até à poltrona que ela está e a abraço.
Ela retribui o abraço, mas logo me solta.
— Aura, tenho que sair agora.
— Vai aonde? — Volto para meu lugar, no sofá rosa.
— Vou fazer um trabalho com a Abby. — a olho desconfiada — É sério.
Reviro os olhos e dou de ombros — Azar o seu, hoje é sábado e mamãe está em casa.
— Ela vai comigo. — Agora ela quem revira os olhos. — Vai ficar lá com o tio Gab.
Rio do jeito que a Eliza chama o namorado da mamãe. Ela começou com isso no Natal, quando ele lhe deu um cartão presente da Google, de duzentos reais. Ele me deu o mesmo tanto, só que da sss, mas nem por isso eu comecei a chama-lo de tio Gab.
Parece mais Gabriela que Gabriel, e eu acho isso meio estranho. Mas nada contra.
— E eu vou ficar aqui sozinha? — Faço bico, querendo começar a dramatizar.
— Vai sair, Aura! Desde quando você não sai com seus amigos?
— Meu único amigo era meu namorado. E eu terminei com ele.
— Você não fez nenhuma amizade na faculdade?
— Ah... Tem um garoto que se aproximou de mim, para um trabalho que estamos fazendo.
— Então! Chama ele para tomar um sorvete, sei lá. Talvez até rola um clima e... Quem sabe!?
— Ele é gay. — Digo com uma cara de "nem a p*u rola um clima".
— Ah! Então vocês podem virar amigos, o que acha?
— Pode ser uma boa. — Suspiro, pensando nos prós e contras. — Mas vou mandar a mensagem morrendo de vergonha.
Pego o meu celular, que estava jogado no sofá, e mando uma mensagem para o Miguel.
Eu: Ei, Miguel, tudo bem?
Miguel: Estava! Já disse para me chamar de Migay!
Eu: Ah, é! Desculpa, já mudei, Migay!
Migay: Ótimo! Agora estou super bem! E você?
Eu: Então... É sobre isso mesmo que eu estou te mandando mensagem.
Migay: O que aconteceu?
Eu: Vou passar o dia sozinha. Não quer passar comigo? Se estiver ocupado, ou não quiser, eu vou super entender.
Migay: Imagina! Também estou sozinho. Meu boy viajou, e como você sabe, eu moro só com minha avó, e nos sábados ela vai na casa da prima dela.
Migay: Isso quer dizer que... Sim! Vamos logo, porquê já não aguento mais esse apê m*l assombrado.
Eu: Podemos nos encontrar no shopping, daqui uma hora?
Migay: Pode ser. A gente se vê!