Capítulo 29

2899 Words
Leonardo narrando Clara estava grávida de dois bebês e tinha chegado o dia que ela teria de dar à luz a eles. Eu estava muito feliz porque teria dois lobinhos. Neste dia, eu não pude ficar com ela no hospital. Tive que trabalhar o dia todo, mas acompanhava pelo celular tudo que estava acontecendo através dos amigos que acompanhavam ela. Quando meu expediente acabou, me dirijo ao hospital feliz da vida e quando entro na sala onde Clara estava, vejo que ela estava amamentando duas crianças. Eu me dirijo feliz para perto dela e ela parecia meio preocupada com um dos nossos filhos. Um era um lobinho parecido comigo, o outro era um tanto estranho, tinha várias pintas espalhadas pelo corpo. Nós olhamos meio que espantados, mas estava tudo bem. A gente não queria reconhecer que ele era diferente. Aí uma médica disse que queria falar em particular comigo. Eu resolvo acompanhar ela até a sala ao lado e ela me dá a triste notícia que um dos meus filhos nasceu prematuro e que ele não viveria muito. No momento, senti como se o chão estivesse desmoronando aos meus pés. Eu segurei as lágrimas e voltei para onde minha esposa estava, ela estava muito feliz e perguntou se havia acontecido algo. Eu disse que estava tudo bem. Eu dormi com ela, naquela noite, na maternidade. No dia seguinte, ela recebeu alta e voltamos para casa. Os dias foram passando e ela comentou desde o início que um de nossos filhos era meio estranho. Nós colocamos o nome dele de Matheus e o outro de Barone, os dois foram registrados como sendo lobos, por mais que tivesse evidências de que um dos nossos filhos era um tanto estranho. A gente gostava mais do lobinho que se parecia conosco, ele sempre pareceu mais frágil em comparação com o irmão dele, mais independente. Eu torcia para que o Barone fosse um alfa, mas o Matheus que era. Fiquei muito decepcionado quando minha família o rejeitou, chegaram a dizer que o Matheus não era o meu filho e que eu teria sido traído. A nossa vida virou um inferno. Eu não conseguia aceitar aquele garoto como meu filho, mas também não conseguia abandoná-lo. Nós fizemos outra tentativa para ver se teríamos outro filho, esperava que fosse lobo porque meus pais e os pais dela o eram, mas não deu certo. O Barone morreu e ela se foi. Ela descobriu alguns segredos e eu fiquei com o Matheus. Nunca senti por ele o que os pais sentem por seus filhos, mas nunca, jamais, deixei que faltasse algo para ele. Matheus ficava cada vez mais parecido com uma hiena, mas não aceitava isso. Para mim, ele era um lobo e ponto final. Desconfio que os rumores a respeito de meu pai são verdadeiros e eu tinha um medo por causa da família de Clara, mas ela nunca me disse nada até que eu descobrisse com meus próprios olhos. O Matheus foi crescendo e eu queria colocar ele no mundo dos lobos, mas ele sofria rejeição por eles todas as vezes. Uma vez, fui buscar ele na escola e ele estava sentado sozinho, de cabeça baixa, enquanto os outros alunos brincavam. Ele chegava chorando em casa porque não era aceito e que os garotos da escola xingavam ele. Minha mãe também infernizou minha vida, ela me culpava por não saber escolher ninguém. Ela dizia que eu deveria escolher uma loba, não uma gata filha de uma loba com um lobo estranho. Ela não gostava do meu filho, mas de alguma forma o Matheus sempre pareceu ser forte, se ele fosse um lobo iria longe. Eu não queria que Matheus fizesse amizade com hienas, até porque somos inimigos históricos e poderiam virar ele contra mim. Uma vez, fiquei preocupado porque ele beijou uma garota que era hiena e meu irmão, o Theo, havia visto e me contou tudo. Todos ficamos decepcionados com ele, Matheus ficou de castigo e os dois não se viram mais. Agora, depois de tudo que fiz por ele, ele me desafia, não me respeita, não fala com minha família e nos ignora. Tenho saudades de antigamente, ele parece não ter mais jeito. Depois de tantas tentativas, encontrei outra pessoa, que é uma loba parecida comigo. Graças a deus, tivemos um filho e ele é parecido comigo, mas é meio bobinho e não parece ser muito esperto. Comparado ao Matheus na mesma idade, parece ser dependente e chora o tempo todo. Tomara que ele fique mais parecido com o Matheus ou comigo, não com a Juliana. Matheus narrando Continuo procurando fotos da família de meu pai e mãe em busca de hienas. Meu pai esconde alguns álbuns a sete chaves, mas ele está muito doente agora, não acho que vai melhorar tão cedo. Eu resolvo desobedecer ele e, por curiosidade, pego seu molho de chaves. Me dirijo a um dos quartos e abro um antigo guarda roupa, onde ele havia escondido os álbuns, em busca de mais fotos. Enquanto procurava pelos álbuns, eu encontro o que parece ser um diário, eu o abro e começo a ler na mesma hora que o Barone aparece e pergunta o que estou fazendo. Eu digo — Nada, tô só arrumando. Barone me diz: — O papai disse pra você não mexer neste guarda roupa, vou falar para ele. — Barone, não! — digo eu — Te compro pirulito, se não disser nada. — e faço “Shh” com a boca. Eu escuto o que parece ser meu pai andando na casa e coloco o diário na camisa. Fecho o guarda roupa e saio do quarto junto com o Barone, o fechando. Eu coloco o diário dentro da minha bolsa, enquanto meu pai aparece no quarto e pergunta o que estamos fazendo. Barone diz — Nós estamos brincando. Meu pai estava fraco, ele me olha enviesado e volta para o quarto. Eu dou uma balinha para o Barone e digo pra ele ir brincar, mas ele não vai, ele volta e fica querendo brincar comigo, morder meu rosto e me empurrar. Eu já estava perdendo a paciência, eu pego ele pelo braço, o levo para o quarto do meu pai e deixo os dois lá. O Barone começa a chorar e a apontar para mim e dizer que não quero brincar com ele. — Brinca com o Leonardo — eu digo a ele — Ele que é seu pai, não eu — digo isso saindo do quarto e Barone aparece abraçando minhas pernas. Eu estava de saco cheio, eu desgrudo ele de minhas pernas e me fecho no quarto, enquanto ele ficava chorando. Eram quatro da tarde e estava meio frio, esquecendo completamente do diário, me deito na cama e durmo. Eu acordei às cinco e já era noite. Eu desço para jantar, o jantar já estava sendo servido e meu pai estava na mesa. Ignorando a presença deles, eu pego o prato, coloco a minha comida e volto para meu quarto. Eu ficava escutando o que eles falavam lá embaixo, Barone perguntou a meu pai se eu era irmão dele, ele ficava falando: — Responde aí papai, por favor. Eu coloquei os fones de ouvido, eu preferia não escutar aquilo e continuei comendo. Era galinha cozida com arroz e estava uma delícia. — Juliana pode não prestar, mas a comida dela presta — pensei sorrindo. Eu termino de comer, desço com o prato sujo e o lavo, depois enxugo e o coloco no armário. Todos estavam na sala, eu passo e subo para o quarto, enquanto Barone me olhava com uma carinha triste e Juliana com indiferença. Pude notar que meu pai parecia meio triste. Eu vou até o banheiro, escovo meus dentes e noto que minha aparência tem mudado muito há um tempo, parece que tô mais parecido com meu pai agora. Eu escovava os dentes enquanto pensava em Lucas, não conseguindo tirar ele da minha cabeça. Eu termino de escovar e volto para meu quarto, coloco os fones de ouvido e me vem à cabeça várias lembranças dos momentos que ficamos juntos, do dia em que eu e ele uivamos para a lua como dois lobos. Nossa, aquilo quase me fazia chorar. Eu sei que as coisas são difíceis para as hienas, mas aquelas lembranças eram reconfortantes. Eu continuo pensando naquilo até cair no sono. Sonho Eu estava no banheiro da escola, na frente de um espelho, e minha aparência ficava mudando de lobo pra hiena. Estranho aquilo, ficava toda hora mudando. Aí escuto um grito que parece ser do Lucas, vindo de outro lugar, pedindo ajuda. Antes de sair do banheiro, olho o espelho e vejo a imagem de um lobo. — Lucas, onde você está? — pergunto. Ele estava pedindo socorro, eu corro até uma sala e lá está ele. Estava saindo sangue da boca dele e ele dizia: — Me ajuda, por favor, eu tô morrendo. Eu tento correr na direção dele, mas não consigo sair do lugar, ele vai ficando cada vez mais longe e tudo vai ficando lento. E o sonho termina comigo acordando no meio da noite e com o coração a mil. Eu respiro, ofegante, por alguns minutos e depois tentava dormir de novo e não conseguia. Olho as horas no celular e são nove horas. Eu tomei uma decisão impensável, pego meu lençol e travesseiro e me dirijo até o quarto do meu pai. Ele preferia dormir sozinho às vezes, mesmo tendo um quarto com uma cama de casal para ele e Juliana. Ele estava lá, deitado no escuro, com Barone mordendo as orelhas dele e ele tentava dormir. Sem dizer nada, eu me deito perto do meu pai e ele e Barone ficam me olhando sem reação. Me acomodo e começo a dormir, com Barone vindo para o meu lado e tentando morder minhas orelhas. Eu até digo: — Não enche, guri — empurro ele, ele se aconchega no meio de nós dois e dorme. Leonardo narrando Matheus se deitou na minha cama, eu não esperava por isso, resolvi deixar e não disse nada. Se Barone podia, ele quis vir, mas ele já está passando dos limites, tenho que dar uma lição nele pra ele se colocar no seu lugar. Matheus narrando No dia seguinte Era um dia chuvoso, estava fazendo muito frio e chovendo muito. Eu acordo e vejo meu pai deitado com o Barone, eu me levanto e faço o café da manhã. Nem tomo banho, só escovo os dentes e me dirijo para a escola. Pego um guarda chuva e caminho até a parada, de longe vejo Ryan voltando para a casa também sob um guarda chuva e levando uma sacola de pães, ele estava com uma raposa. Nunca mais tive nenhum sinal de Lucas e o porquê dele ter sumido. Não demora muito e José aparece na parada me cumprimentando: — Oi, Matheus. Eu dei um “Oi” de volta e estávamos só nós dois na parada, não tinha ninguém. Eu reparei que José ficava me olhando, eu perguntei o que era e ele disse que eu estava diferente. José parece sempre minha sombra e das outras hienas, parece que não tem vida própria e uma mãe que sempre é muito submissa. A quantidade de vezes que aquela mulher foi corna é de se surpreender. José, parece que gosta de ficar no meio de cachorro, hiena e lobo, nunca com os gatos. Ele já namorou várias cachorras e nenhuma gata. Não demora muito e o ônibus chega, nós fechamos nosso guarda chuva e entramos. Eu me sentei no meio do ônibus, não havia muitas pessoas e uma cachorra acenou lá atrás para José. Ele se sentou perto delas e eu preferi ficar sozinho. Quando chegamos à escola, eu fui direto para o meu canto. Ninguém tinha coragem de ficar perto de mim, a não ser o José e as hienas. A primeira aula foi de língua portuguesa, eu não estava entendendo nada de próclise, ênclise e mesóclise, muito menos de período composto por coordenação e subordinação. Como estava chovendo muito, eu acabei dormindo na aula, e quando acordei a professora estava passando uns exercícios de fixação. Eu não entendia nada e José ajudou eu e Paulo, Luís não tinha ido. Enquanto fazia meus exercícios, umas garotas me olhavam de longe e ficavam rindo e cochichando. José se empolgou logo e ficou olhando para elas, até mesmo Paulo olhou, mas elas viravam a cara quando olhavam para eles. Eu não sabia o que fazer, José cochichou no meu ouvido e disse: — Aproveita, cara, olha pra elas. Eu escutava coisas como: “Ele mudou, tá bonito agora”, “Os olhos verdes dele, gosto de homens sérios” e “Muito gostoso” deu um embaraço em mim. Elas olhavam para José e diziam: “Esse gato magricela aí, comigo nunca”. Eu escutei um cochicho: — Acho que ele é gay, não olha pra gente. Matheus ficou sem jeito e deu umas olhadas desinteressadas para elas que até os seus amigos perceberam. O dia todo a mesma coisa, ele estava desinteressado em tudo. No final da aula, ele estava voltando para casa, disse para os amigos que ia caminhando e queria voltar sozinho. Enquanto ele caminhava, seus pensamentos pulavam do pai do irmão e da mãe para Lucas. Ele andava meio distraído enquanto subia a ladeira próxima a escola. Ele caminhava pela sombra das árvores e enquanto caminhava passou perto de um bosque. Dentro deste bosque havia um morrinho pequeno e dava para ver a cidade toda, ele ficou observando o morrinho enquanto se lembrava da noite em que ele e Lucas uivaram juntos para a lua. Ele continuou andando até chegar em casa, o pai tinha piorado. Como de costume, Matheus joga a bolsa no sofá, vai para o banheiro tomar banho e depois comer. Subiu as escadas e se deitou na cama, mas antes disso deu uma leve olhada para o quarto do seu pai. Leonardo estava dormindo enquanto Barone brincava no chão, Matheus se deita na cama para tirar um cochilo e Barone aparece querendo brincar. Barone mordia suas orelhas e seu rosto, Matheus estava impaciente com ele e dizia: — Cai fora, guri — Matheus o pega, o coloca fora do quarto e o tranca, dizendo: — Moleque chato. Enquanto Barone chorava, Matheus só ouviu Juliana levando Barone para tomar banho. Matheus conseguiu dormir e acordou de bom humor. Eram 3 horas da tarde e estava na hora da merenda. Juliana pediu que Matheus fosse comprar algo para eles lancharem, ela pediu por favor, pois Matheus não obedecia às suas ordens e para o espanto dela, ele foi de bom grado. Matheus comprou uns salgados e dois pedaços de bolo com cobertura de chocolate e cereja. A merenda foi dividida e eles foram para o sofá assistir algo. Matheus, querendo se divertir, coloca "Annabelle" e Barone começa a chorar. Matheus ria e Leonardo lá de cima grita o nome de Matheus, ele muda e coloca “Escola pra cachorro”. Enquanto eles assistiam o desenho, Barone devorava o pedacinho de bolo e Matheus achou aquilo engraçado, ver o lobinho com o focinho sujo de cobertura e lambendo os beiços. Barone devorou tudo com uma enorme velocidade e Matheus só beliscou sua fatia de bolo. Barone queria mais, mas não tinha mais. Aí ele olhou para o que estava no pratinho do Matheus querendo mais, Barone queria mais um pedacinho, mas Matheus não queria dividir. Barone começa a chorar e Juliana desce pra ver o que estava acontecendo. Ela se senta no sofá e pega o lobinho nos braços, o consolando e ele aponta o dedo para Matheus dizendo: — Ele não quer dividir comigo. Matheus separa o bolo em dois pedaços, pega um com a pata e meio emburrado, dá um pedacinho para o seu irmão. Barone o devora quase que imediatamente e ainda pede mais. — Não tem mais — diz Matheus — Acabou. Barone começa a chorar de novo e Matheus pega o restante e dá tudo para ele enquanto pensava — Que guri chato. Juliana sobe as escadas de novo para ficar perto de Leonardo, enquanto pede que Matheus fique de olho em Barone. O guri não parava quieto, ficava mordendo a orelha e o rosto do irmão, mas Matheus não estava mais irritado, ele estava começando a gostar do irmão e entrou na brincadeira também. Leonardo só gritava pedindo silêncio. — Pai chato — sussurrava Matheus no ouvido de Barone e ele ria. Matheus teve uma ideia e ficou sorrindo. Nesta hora, ele sobe as escadas e dá uma olhada no quarto de Leonardo. Juliana não estava lá, ela estava no quarto dela dormindo e Leonardo dormia e roncava como uma pedra. Matheus desce as escadas, voltando para a sala, tinha uns bombons nos seus bolsos. Ele cochicha no ouvido de Barone: — Papai chato tá dormindo. Vai lá, fica debaixo da cama, puxa a cauda dele e se esconde — diz sorrindo. Os dois sobem as escadas e Matheus cochicha — Fica debaixo da cama. Barone vai até lá e se esconde. A cauda de Leonardo estava quase batendo no chão e Barone ficava puxando de leve, e escutava um pequeno rosnado. Mesmo dormindo, os instintos de Leonardo estavam em ação e Matheus ria abafadamente, Barone também. A cauda balançava e toda vez Barone pegava ela de novo.
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