TRÊS

1200 Words
PAOLLA Durante os anos em que estive casada com Hugo, aprendi muitas coisas, uma delas era fingir. Eu era uma boa mentirosa desde criança, mas depois que me tornei sua esposa, havia ultrapassado níveis estrondosos. Era incrível que, todos achassem que eu era feliz com aquele homem. Durante anos, eu ouvia as pessoas falarem sobre o quanto invejam nosso casamento, mas, uma garota, perdida e ingênua, notou que era tudo mentira. - Brigou com seu marido? - ela perguntou relutante. Parei alguns instantes antes de responde-la, pouco tempo antes estávamos escolhendo seu vestido de casamento, não seria justo jogar toda aquela merda em cima dela, não é? A relação de Cassandra e Vicenzo não era como a nossa e, por Deus, nunca seria. - Casais brigam, é normal. - disse cautelosa. - Não chegamos nem a ser um casal. - suspirei me dando por vencida. - Algumas mulheres tem a sorte de se casarem com um homem bom, mas outras são condenadas ao inferno em vida, e eu sou uma dessas, estou pagando por crimes que eu nem mesmo cometi. - acabei jogando as palavras em cima dela, mas me arrependi sentindo seu olhar de pena em mim. Mas era mentira. Estava pagando por crimes que eu cometi. Pecados que eram meus. Eu tinha que aguentar calada e sobreviver. - Sinto muito. - tocou meu ombro com carinho- Se precisar conversar, ou desabafar eu estou aqui. - Não quero te assustar, Cassy - eu ri tentando não parecer tão amarga quando estava me sentindo - Só estou um pouco farta, mas não me deixariam vir sozinha, então apenas finja que não sabe de nada e me deixe sofrer por alguns minutos em silêncio, tudo bem? E lá estávamos nós, sentadas na areia observando o mar. Cassy topou sair e ficar em silêncio ao meu lado enquanto eu chorava e colocava para fora tudo que estava guardado no meu peito. Era a primeira vez que eu chorava na frente de alguém. - Não tem como se divorciar? - ela perguntou. É, parecia que ela não tinha aceitado apenas a ideia de me ouvir chorar olhando para o mar. - Posso falar com Vincenzo, se eu pedir com jeitinho, ele te ajuda. Acabei rindo. Cassandra ainda não fazia ideia de como as coisas realmente funcionavam na máfia. Nada era simples. - Um casamento na máfia só acaba quando um dos dois morre. - Não seria melhor morrer do que viver assim? - sua voz saiu baixa. Ela não sabia nada sobre minha história com Hugo, mas se soubesse, não mudaria de idéia. Cassandra parecia ter notado o quanto meu casamento era r**m pra mim, o quanto Hugo é r**m pra mim sem eu precisar falar isso com todas as palavras. - Você é a pessoa mais forte que eu conheço, eu não sei se seria capaz de aguentar um casamento sem amor. - Hugo é tudo que eu tenho - ergui neu olhar para as ondas calmas. Eu amava o mar, amava observa-lo, de ouvi-lo, mesmo que me lembrasse dos olhos azuis escurecidos de Hugo. - E mesmo eu tendo o recusado quando mais nova, quando meu pai morreu, ele não me deixou desamparada. Se não fosse por ele, não sei, minha vida seria pior. - Isso não justifica nada, Paolla, mas, quem sou eu pra julgar - ela riu triste - Pense pelo lado bom, pelo menos você não está grávida. Senti um gosto amargo e fechei os olhos com força. - Talvez se eu estivesse tudo seria menos r**m - dei de ombros. - Mas não seria justo forçar uma criança a viver essa vida. Cassy assentiu calada, ela me entende, ou pelo menos finge que sim, já que no fundo, nem eu me entendo. - Você aceitou se casar com ele de primeira? Você gostava dele? - Não sei o que passou pela minha cabeça, só sentia que não podia recusa-lo mais uma vez. - respondi e mesmo que Cassy não soubesse do que eu estava falando, não insistiu. Ficamos em silêncio alguns instantes. - Vamos. - me levantei da areia batendo em minha saia, tentando me livrar da sujeira - Vou te deixar em casa, ou seu futuro marido vai ter um pequeno ataque quando souber que eu roubei você enquanto ele estava fora. Cassandra revirou os olhos e eu ri. Ela ainda não tinha se acostumado com a possessividade disfarçada de cuidado do marido e não escondia o quanto isso a chateava. Cassandra era mais jovem que eu, estava com dezenove anos, e era obviamente muito inocente, mas, conversar com ela alegrava meus dias. Embora no começo eu tenha ido vê-la apenas para contrariar a ordem de Hugo sobre eu ficar longe dela, nossos encontros deixavam minha vida menos amarga, eram o ponto alto do meu dia. Era divertido estar com ela, acompanhar as mudanças da gravidez, conversar sobre o quartinho dos bebês... Era incrível e me tirava da bolha escura onde eu vivia. Katherine Benevintti foi o mais perto que eu tive uma amiga durante toda a minha vida e ela era uma cobra peçonhenta pronta para dar o bote, então, agora tinha Cassandra, que era definitivamente a pessoa mais normal e doce que eu havia conhecido em toda a minha vida. E talvez isso tenha feito Vincenzo se apaixonar perdidamente por ela, como aparentava. - Não quer ficar para o jantar? - ela perguntou quando parei o carro em frente a mansão Caccini, o lugar onde eu havia estado tantas vezes que conhecia tão bem quanto minha casa. - Estou cansada - menti. Eu não estava bem e ver dois casais melosos durante todo o jantar ia me deixar com má digestão. Além de Cassy e Vincenzo, haviam Ângelo e Virgínia. Sinceramente, eu não sabia qual deles eram mais apaixonados. Quando mais nova, eu sonhava por um casamento harmonioso como o dos pais de Vincenzo, eles eram o maior exemplo pra mim, um dos poucos casais que deram certo na máfia, eram invejados não só por mim, mas por muitas pessoas carentes como eu. - Se cuide - ela disse me olhando preocupada. - Você também - lhe mandei um beijo e ela saiu do carro, me permitindo fazer a curva para sair da propriedade, me preparando mentalmente para voltar para casa, enquanto torcia para que Hugo, não estivesse voltado ainda. Ele geralmente passa semanas e as vezes até meses longe de casa, não sei onde ou com quem, não me interessa, mas, todas as vezes que volto para a Mansão Espósito, meu corpo treme com a ideia dele estar de volta. Entreguei a chave para um dos seguranças para que ele guardasse meu carro e entrei em casa, mas fui barrada por uma das empregadas da casa antes que pudesse subir as escadas. - Boa noite, senhora. - Boa noite, Clara. - Senhor Hugo avisou que esta em uma viagem de negócios a Roma e não tem previsão para voltar. Tentei não abrir um sorriso instantâneo. Era uma viagem a mando da máfia, tinha ido com Vincenzo provavelmente, ou seja, algo sério tinha acontecido e enquanto ele não voltasse, eu era uma mulher livre e feliz. - Certo. Leve meu jantar para meu quarto.
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