PRÓLOGO
— Por quanto tempo temos que usar isso? - o garoto de cabelos escuros e olhar azul intenso questionou impaciente para o amigo apenas dois anos mais velho, Vin, que não parecia se importar em usar smoking e gravata borboleta.
— Fale baixo, filho. - a mãe dele brigou em seu ouvido. — Estamos na casa do senhor, Hugo.
— O que viemos fazer aqui, mamãe? É tão chato. - continuou reclamando e a mãe riu. — Vin, vamos brincar lá fora, o que acha?
— Depois do batizado de Paolla, vocês podem ir. - Virgínia interviu ao lado do filho. Ela compreendia o pequeno Hugo, também achava aqueles eventos um saco. Preferia estar em qualquer outro lugar, mas era o batizado da filha de um dos sócios, não seria apropriado fugir com as crianças para o jardim atrás da capela.
— Não precisamos levar, Katherine, não é? - Vincenzo olhou para a mãe e ela riu, não lhe dando uma resposta.
O menino sorriu aliviado e Hugo voltou os olhos para a cerimônia que acontecia logo a frente. Uma menininha vestindo branco estava sendo banhada pelo padre, logo em seguida, um choro ecoou pela capela e ela foi acalenta da pelos pais, que sorriam orgulhosos.
— Estão torturando ela, mãe? - perguntou e Virgínia tentou não rir alto. Hugo era uma peça. — Coitadinha.
— Não amor, o que combinamos sobre você não falar sobre isso? Tortura não é assunto de crianças. - a mãe dele brigou.
O cerimônia foi encerrada alguns minutos depois, Hugo e Vincenzo já estavam planejando a primeira brincadeira do dia, mas foram separados novamente pelos pais. As famílias iriam para uma pequena recepção na casa da família que batizou a filha.
— Esse lugar é enorme, Vincenzo, não se meta em confusão - Virgínia alertou quando o filho avisou que ia brincar com o amigo. — E isso vale pra você também, Hugo. Estou de olho em vocês.
— Não vamos fazer nada de errado, tia Vir. - Hugo disse sorrindo meigo. Ele encantava as pessoas facilmente, até mesmo Virgínia caia em suas palavras doces.
Vincenzo e Hugo sorriram quando ela assentiu e os dois puderam começar seu jogo: esconde-esconde. Vincenzo iria contar e era a vez de Hugo se esconder, ele correu para dentro da casa, que sua mãe deixou claro que ele não poderia ir, e subiu as escadas mesmo que fosse levar um sermão depois, o importante era ganhar a brincadeira, se Vincenzo não o encontrasse em quinze minutos, ele seria o vencedor.
No segundo andar, após escolher uma das portas, abriu e viu que estava ocupado. Droga.
— Posso me esconder aqui, tia? - perguntou da forma mais fofa possível olhando para a mulher sentada em uma poltrona, ela estava com a bebê no colo, parecia ninar a menina.
— Claro, Hugo. Entre. - ela sorriu amigável e ele entrou no quarto de paredes rosas e móveis brancos. — Escondendo-se de Vincenzo?
— Sim - ele riu de ladinho. — Como a tia sabe meu nome?
— Eu e sua mãe somos amigas - ela explicou rindo da curiosidade do pequeno - Venha, aproxime-se, venha conhecer Paolla.
— Ela é bem pequena, não é tia? - Hugo comentou se aproximando. — Oi, Paolla. Eu sou Hugo. - Hugo encarou os olhos azuis vividos da garotinha, que estavam focado neles, por alguns instantes Paolla sorriu fazendo a mãe rir junto.
— Ela gostou de você. - a mãe dela disse, mas Hugo ficou em silêncio. — Quer pegar ela no colo? - ele assentiu a mulher, Yeter, entregou a filha nos braços do garotinho, o ajudando a segura-la. - Hugo, você é bom em guardar segredos?
— Sim, tia. Nunca conto nenhum dos segredos que Vincenzo me conta, mesmo que minha mãe briga comigo. - sua afirmação a fez rir.
— A tia pode te contar um segredo, então? Mas só se me prometer que não vai contar pra ninguém... - ela olhou nos olhos de Hugo que assentiu confiante.
— Prometo, tia.
— Eu estou morrendo - Yeter disse suavemente, mas Hugo já sabia que era morte. Ele arregalou os olhos e a mulher continuou. — Eu estou morrendo e estou com muito medo, querido - sua voz saiu fraca agora, lágrimas tomaram conta dos seus olhos. — Estou com medo da minha bebê ficar sozinha. - Hugo não sabia o que dizer. Era apenas uma criança de três anos. Embora fosse inteligente para a idade, ele continuava tendo três anos. — Pode cuidar dela pra mim quando eu não estiver aqui, Hugo? Por favor, cuide dela.
— Não se preocupe, tia. Eu vou cuidar dela. Eu prometo. Eu vou crescer e me tornar forte, para cuidar dela.
— Obrigada, querido. Muito obrigada.
— Hugo? - a voz da mãe do garoto o fez pular assustado e Paolla começou a chorar em seus braços. Yeter a pegou de volta antes que Ofélia entrasse no quarto. — Filho? O que esta fazendo aqui?
— Hugo estava conhecendo Paolla. - a outra respondeu calmamente.
— Como tem estado, Yeter? - Eugênia perguntou ao pegar o filho no colo.— Faz alguns meses que não nos vemos, não parece bem.
— O médico só me deu alguns meses - a mulher disse indo colocar a filha no berço. — É um milagre eu ter sobrevivido ao parto.
— Sinto muito.
Yeter riu simplória.
— Era de se esperar.
— Outra hora venho para conversarmos, Raúl está nos esperando.
— Claro. Venha. - ela parecia feliz com a possibilidade de uma visita — E Hugo, não esqueça do que conversamos.
— Não se preocupe, tia.
Eugênia lançou um olhar desconfiado para a outra mulher e saiu do quarto, quando estava longe o suficiente, perguntou ao filho:
— Sobre o que conversaram filho?
— Nada, mamãe.
— Não minta pra mim, Hugo.
— Nada, mamãe - repetiu lembrando-se das palavras de Yeter. Ele era uma pessoa de confiança, não ia contar seu segredo e iria cumprir o que ela pediu. — Pode me trazer para brincar com Paolla depois? - perguntou ignorando as suspeitas da mãe. — Ela é um bebê fofo.
— Vamos pedir ao seu pai. - Eugênia respondeu.
X
— Pai? - Hugo chamou o homem que terminava de vestir o terno preto de três peças. Hugo também estava com roupas escuras, assim como a mãe que havia o arrumado minutos antes. — Quem morreu?
— Lembra-se de Paolla? - Hugo engoliu seco antes de assentir. — Lembra-se que ela e a família foram para o exterior buscando cura para a doença da mãe?
— Lembro, pai. O que aconteceu com Paolla?
— A mãe dela acabou de falecer. - o homem respondeu não parecendo se abalar com a notícia, mesmo que tenha sido a esposa de um grande amigo que havia morrido. — Vamos prestar nossas condolências a família Santoro.
Hugo se manteve em silêncio. Faziam anos que não ouvia falar sobre Paolla e sua mãe doente, mas elas nunca a foram apagadas de sua memória. Ele se lembrava exatamente do dia em que as conheceu, também a última vez em que as viu. Mesmo que cinco anos tivessem se passado, Hugo não se esqueceu daquele dia, e de nenhuma palavra que Yeter disse a ele.
— Vamos, Hugo - o pai chamou.
— Vincenzo também vai?
— Claro. Ele é o futuro consigliere, tem que estar em todos esses eventos, e você, como meu herdeiro, tem que estar junto com ele.
Hugo tinha entendido muito cedo que ele e Vincenzo, ficaram juntos pelo resto da vida, por sorte, eram bons amigos. Ele estava satisfeito com a ideia de servir ao amigo, sua lealdade era imensa, mesmo que fossem jovens demais para esses assuntos.
— Não gosto de velórios... - Eugênia comentou quando desceram do carro. Hugo lembrava-se da fachada da casa, em sua memória não parecia fazer tanto tempo que esteve ali. — Vamos ficar só um pouco, tudo bem? Não estou me sentindo muito bem, Raúl.
— Ficarei até o fim. - Hugo disse e a mãe olhou confusa para o pai. Raúl deu de ombros, ele ficaria se o filho quisesse.
Os três entraram na casa e foram recebidos por alguns familiares da falecida, mas Hugo não viu quem realmente queria. Paolla. Ele não fazia ideia de como ela era, era um bebê de colo quando a viu, mas sentia que acabaria sabendo quem era ela assim que a visse.
— Hugo?! - a voz de Katherine invadiu seus ouvidos. Assim como os outros, ela usava preto e seus cabelos castanhos estavam preso em uma trança elaborada. — Vincenzo está com você? Não o encontro em lugar nenhum.
— Acabei de chegar, Kathe. - ele respondeu olhando ao redor. Vincenzo, Kathe e Hugo, praticamente passavam todo o tempo juntos quando não estavam na escola, já que tinham idades parecidas e os pais eram amigos. — Viu Paolla?
— A filha da falecida? Porque está procurando ela? Ela é só uma menininha. Não vai saber brincar com a gente.
— Você tem nove anos, Kathe, não é tão mais velha que ela.
— Que seja - ela revirou os olhos — Vou procurar Vincenzo, se o ver, avise que eu estou esperando por ele. - e saiu.
Hugo caminhou até a sala principal, onde o caixão de madeira escura estava posicionado no centro do cômodo. Ao lado dele, estava uma garotinha, ela usava um vestido branco cheio de flores azuis e os cabelos dourados, tão claros e ondulados, estavam soltos, com apenas um laço também branco de lado.
Era ela. Só podia ser ela.
Hugo se aproximou e pode ver mais de perto o quanto ela chorava. Seu pequeno rosto estava vermelho e molhado.
— Não se preocupe, Paolla - ele disse segurando sua mão, tornando-se o foco da garotinha. — Eu vou cuidar de você.
Ela não entendeu porque ele estava dizendo aquilo, mas ficou feliz, era a primeira pessoa que vinha até ela. Paolla apenas se jogou em seus braços o abraçando com força, e ele a confortou.
— Ela não vai voltar? - sua voz saiu baixa e triste. — Eu coloquei o vestido favorito dela, ela amava esse vestido, mas ela continua dormindo, e não importa o quanto eu chame, ela nem olha pra mim! Ela não vai voltar?
— Não. Ela não vai. Ela morreu. - Hugo tentou não ser tão realista, infelizmente não teve tanto sucesso. — Mas eu vou cuidar de você, agora. Confie em mim.
Novamente, Paolla não entendeu as palavras de Hugo, nem mesmo sabia seu nome, mas seu coração cheio de dor e tristeza, sentiu alívio ao ouvir tais palavras.
Enquanto a mãe do garoto assistia a cena triste ao lado da amiga. Virgínia decidiu fazer das palavras do pequeno e inocente Hugo as suas; cuidaria de Paolla.
— Mamãe, peça que Katherine pare de me perseguir - a voz de Vincenzo fez um sorriso nascer no rosto da mulher e ela se abaixou limpando as lágrimas para ter mais uma conversa com o filho sobre noivado. — Eu não quero me casar com ela. Ela é chata.
— Vincenzo, esse não é lugar para conversarmos sobre isso - ela tocou o rosto do menino. — Agora, faça como Hugo e seja bom com as garotas. Seja um cavalheiro, assim como seu amigo.
Ela indicou com a cabeça para Hugo que abraçava a menina de cinco anos.
— Ele gosta da Paolla - Vincenzo deu de ombros — Mas eu detesto a Kathe, e, não vou, me casar com ela.
— Como você sabe que aquela é Paolla? - Virgínia questionou, ignorando a outra fala do menino de dez anos.
— Hugo fala há anos sobre ela, eles vão se casar um dia, segundo ele. - Vincenzo sussurrou no ouvido da mãe e em seguida lançou um olhar a Eugênia, como se indicasse que, era um segredo. — Mas isso é um segredo, mãe.
— Oh, certo. Um segredo.