Pai & Filho

4068 Words
Theodore não havia imaginado que entraria no mesmo carro que o seu pai depois da noite em que brigaram. Mas lá estava ele sentado no banco de trás da caminhoneta, indo para uma festa sertaneja fazer companhia à sua futura madrasta. A festa seria um churrasco de chão feito no terreno da cooperativa. Quando a caminhoneta estacionou e Theodore descera do carro, já ouvira as músicas sertanejas tocando no som de um carro com o porta malas aberto. O cheiro de cerveja lhe davam as boas vindas junto como cheiro da carne sendo assada mesclada aos feromônios misturados das classes. — Parece que o povo já está animado. — Ria Maggie ao descer do carro. — Já estão entortando o caneco — Sorria Bill sem desgrudar os olhos dos camaradas que riam e jogavam cartas. — E você pretende entrar na roda, não é? — Tentarei não passar do limite. Maggie sorria satisfeita. Bill logo fora na frente entrando na festa, sendo cumprimentado com grandes vivas e gritos dos peões e vaqueiros já alcoolizados. Deixados para trás, a noiva segurara o braço do ômega e o puxava para a festa. — Nós, pessoas civilizadas e comportadas consideradas caretas, ficaremos perto da comida. O que acha? — Comida é melhor que cerveja. — Isso mesmo. Só poderá dizer o contrário quando for de maior. As mesas foram organizadas longe da bagunça dos homens embriagados, mas próximo do buffet. Maggie escolhera uma mesa afastada, que Theodore agradecera mentalmente por estar vaga. A festa estava cheia e muitos convidados cumprimentavam Maggie com largos sorrisos. Ela havia dito que seu pai era conhecido, mas Theodore achava que sua futura madrasta também seria popular. Certamente ela não ficaria sozinha mesmo que suas amigas não tivessem vindo à festa. Maggie parecia com Gabriel, imaginava o loiro com um sorriso no rosto. Uma pessoa que se dava bem com qualquer um, como se o seu carisma fosse um imã natural. Alguém que brilha por conta própria e atrai as pessoas, fazendo-as se sentirem bem ao seu lado. E ainda assim, aquela jovem mulher escolhera convidar Theodore para ir na festa lhe fazer companhia. Se sentira comovido com sua atitude. — Espero que não se sinta mau em lugares cheios. Essas festas de cooperativa parecem ser sempre entupidas. — Já fui em algumas quando era pequeno, mas eu me preocupava mais em correr com a molecada. — Então é a primeira vez que vem desde criança? Theodore assentia com a cabeça, observando a festa em sua volta comparando com suas memórias infantis. Não chegavam a ser tão diferentes, mas era nítido a passagem do tempo. As músicas, a forma como as pessoas interagiam e se vestiam. A nostalgia tornava a abraçar o rapaz adolescente. — Maggie! Como você está, querida? Uma mulher de cabelos curtos e escuros sorria como uma boneca de porcelana. O que não era um elogio, já que Theodore tinha pavor daquelas bonecas antigas. Elas sempre tinham seus olhos esbugalhados que pareciam seguir onde quer que passasse, e o sorriso engessado parecia esconder malícia. — Olá Tânia. Parece que sempre nos esbarramos nessas festas. — Só assim pra te encontrar. — A mulher olhara de canto com seus olhos arregalados e apontava para o adolescente loiro. — Quem é? — Oh, é o meu enteado. Theodore. — Enteado? Quer dizer... Filho do Bill? — Claro ué. De quem mais seria? A mulher dera um sorriso nervoso encarando Theodore. O rapaz arqueara a sobrancelha, apenas acenando com a cabeça em um cumprimento. — Que rapaz bonito. Acho que só cheguei a conhecê-lo por fotos, e ainda de quando era criança... Theodore abrira um fino sorriso, sem ter muita vontade de interagir com a mulher. Porém seu sorriso logo se desfizera com o comentário suspirado da mulher. — Que desperdício. O rapaz engolira em seco piscando algumas vezes sem saber se teria escutado corretamente. Erguendo os ombros e o queixo, não se permitira demonstrar nenhum sinal de abalo. Para ninguém. Ao contrário de Maggie que ficara perplexa. — O que disse? — Bom, eu vou indo. Tenho que cumprimentar algumas amigas. Até mais tarde, viu? Rapidamente a mulher correra para outra mesa, onde descaradamente sussurrava alguma coisa para o grupo de mulheres. Theodore acompanhava a cena já imaginando que sua ida naquela festa fora um equívoco. — Não baixe a cabeça, Theodore. — Sussurrava Maggie acariciando as costas do futuro enteado em conforto. — Jamais baixe a cabeça. — Eu estou bem. Na escola é assim também. — Na escola? — Maggie virou a cabeça tão rápido que até o loiro ficara surpreso. Apoiando os braços na mesa, Theodore abrira um sorriso calmo para a noiva de seu pai. — Quer dizer que na escola também sabem que você... — Depois daquela noite em que briguei com meu pai, quando eu fui pra escola, o cara que eu gostava ficou preocupado comigo. Então ele me pediu pra ir na casa dele, porque queria cuidar das feridas. Acabamos sendo pegos pela família dele, e então... A escola acabou descobrindo. — Mas como a escola inteira poderia saber disso? Você não estava na casa do rapaz? — É por causa da família dele. — O que tem a família dele? — Conhece os Mckenzie? — Maggie concordara com a cabeça imediatamente, e Theodore alargara o sorriso dele — Era um dos possíveis herdeiros deles. Emudecida, Maggie permaneceu encarando Theodore por um bom tempo até que seus olhos castanhos piscassem sem parar. — Espere aí... Acho que tive um pane no sistema. Está falando sério? É por isso que os Mckenzie retiraram todo o patrocínio da cooperativa? Fora a vez de Theodore ficar surpreso, tendo a cor desaparecendo de seu rosto. — Como assim? Eles... Patrocinavam? — Eram um dos maiores investidores daqui. Fornecíamos alguns sacos da colheita para seus hotéis. E então repentinamente deixaram de investir. Quando perguntei pro seu pai o que poderia ter acontecido, ele nunca me deu detalhes. A cabeça de Theodore dera algumas voltas com aquelas informações. Nunca se importara com os trabalhos de seus pais, já que não era do seu interesse. Porém jamais imaginara que suas atitudes poderiam atrapalhá-los daquela forma. Não queria se culpar, já que não sabia daquilo na época. No entanto era difícil não sentir o nó se formar em sua garganta ao imaginar o quanto de problema que poderia ter resultado em seu pai. Olhando em sua volta, ainda sentia os olhares dos grupos de mulheres da mesa afastada sobre si. Theodore se questionou o quanto elas saberiam daquela história, e o quanto elas o condenariam. Inevitavelmente seus olhos recaíram para o grupo mais afastado, próximo às churrasqueiras, onde seu pai jogava baralho com outros homens. — Eu vou pegar alguma coisa pra comermos, tudo bem? Sem coragem para responder, limitou-se apenas a acenar com a cabeça. Aquela festa então tornou-se repentinamente sufocante. Theodore tinha a impressão de que olhares eram dirigidos sobre suas costas, como martelos que pregavam a culpa em sua consciência. Durante todo o um ano que ficara sem visitar o pai, havia dito a si mesmo que não errara em nenhum momento. Não havia errado em nascer um ômega. Não havia errado em gostar de outro garoto. Não havia errado em ser sincero consigo mesmo e ter se entregado de corpo e alma para outro garoto. Só que agora recriminava-se. Havia errado em não ter pensado que o sobrenome de Jake pudesse acarretar em problemas para as pessoas queridas para Theodore. Então, seria justificável a fúria que seu pai sentira naquela noite? Deveria Theodore pensar em pedir desculpas? Mesmo com Maggie sendo sua companhia no jantar, Theodore queria fugir por um instante. Aguentara até o último instante, comera alguma coisa junto com a moça e esboçara o sorriso mais amigável que poderia lhe dar. E no instante em que fora deixado sozinho pela moça quando ela avistara algum conhecido, Theodore aproveitara a oportunidade para deixar a sua mesa pela primeira vez naquela noite. Evitou a multidão para respirar ar puro se livrando dos cheiros misturados. No estacionamento, próximo da caminhonete de seu pai, se encostara na lataria com as mãos no bolso de seu jeans escuro permitindo se perder em pensamentos. Tão perdido estava, que mau notara a pessoa que acompanhava cada passo seu desde a sua chegada na festa. Beto já havia bebido algumas garrafas de cerveja e não escondera o sorriso quando avistara o garoto ômega chegar. Para a sua infelicidade, Maggie montara guarda em volta do rapaz quase que a noite inteira até que os dois se separaram dando a chance que Beto esperava. Imediatamente o peão abandonara sua roda de amigos seguindo para o estacionamento, onde na escuridão encontrara o adolescente loiro sozinho. Aproximando-se lentamente até ficar na frente do garoto, erguera os ombros sem conseguir diminuir a diferença de tamanho entre eles. Respirando fundo sentia um cheiro doce sutil ser emanado, delicioso e excitante. — O que tá fazendo aqui sozinho? Pode ser perigoso, sabia? Theodore respirara fundo, inclinando a cabeça levemente irritado por ter sido seguido. — Quero fizer sozinho. — Não diga isso. Estamos numa festança dessas, cheio de mulher boa... Ah, certo. Tinha me esquecido que você não curte essas coisas, não é? Theodore arqueara a sobrancelha se desencostando do carro. — O que quer comigo? Seja direto, não gosto de rodeios. — Não vou dar em cima de você, sou homem de força. Não uma gazela. Os dedos de Theodore se fechavam em punho no bolso de sua calça. Tivera de olhar para os lados tentando se acalmar, mesmo que a pessoa em sua frente insistisse em lhe provocar. Não estava se recriminando por dar problemas ao seu pai anteriormente? Theodore se esforçava para não cometer o mesmo erro novamente. Mas era impossível. — Se você não vai com a minha cara, então vaza. — Eu só estou me perguntando como que é ficar com outros homens. Será que você não poderia.. — Não, eu não poderia. Pode me deixar sozinho agora? Prestes a voltar para a sua mesa, Theodore dera com seu ombro no de Beto. Fora parado quando o peão segurou seu pulso impedindo sua saída. — Vamos lá! Se fizer o que te peço, eu posso te ajudar com o patrão. — Não preciso de ajuda com nada. — Eu consigo ajudar o patrão a ganhar o seu posto de volta na cooperativa. Sou bom em dar recompensas, mas preciso ganhar também. Theodore não tivera sucesso em puxar o pulso para se soltar. Fitando a figura de Beto percebia a malícia transparecer em seus olhos e sorriso medonho. — Fique longe de mim, eu não quero nada de você. — Mas eu quero. Beto puxara com força o pulso de Theodore o jogando contra a caminhoneta. Batendo as costas no trinco da porta, o rapaz loiro arfava tentando se recuperar da dor que sentia. No entanto, Beto não estava disposto a deixá-lo escapar tão facilmente, já que agarrara ambos seus pulsos com extrema força. Rebatendo tentando se soltar, o desespero crescia junto com o medo sendo exalado em seus feromônios. — Me solta! — Fica quietinho, assim acaba mais rápido! A voz do peão soara amedrontadora quando sussurrada, o bafo de cerveja contra o rosto do garoto loiro aumentava o pânico. Os lábios secos e ásperos de Beto tocaram os de Theodore com selvageria, arrancando um beijo forçado. Theodore recusava a abrir sua boca, e mesmo tendo seus lábios mordiscados pelo peão, não cedera. Irritado com a resistência do garoto, Beto mordera com mais força, sentindo o gosto de ferro passar por seus lábios. Mesmo com dor, Theodore não permitira que seus lábios fossem invadidos pelo peão. Afastando-se irritado, Beto segurava o queixo de Theodore tentando lhe forçar abrir a boca. — Vamos, pivete. Quero minha recompensa agora, hm? Theodore balançava a cabeça para os lados continuando a sua árdua batalha para se livrar dos toques do peão. Seus pulsos doíam quando apertados pela grande mão do rapaz, sua mandíbula também doía com o aperto de seus dedos. E por mais difícil que fosse, o ômega não cedia. Até que a paciência de Beto se esgotara e sua mão se fechara em punho para acertar um soco na mandíbula de Theodore. — Abra...a...sua...maldita...boca! A cada soco proferido em Theodore, o garoto sentia-se zonzo quase sem forças para se defender. Tudo o que conseguia fazer era manter a boca fechada e os braços esticados para aumentar a distância entre os corpos. Porém suas costas já doíam de tanto bater contra o trinco da caminhoneta, e os socos desceram para suas costelas e barriga. Para a sua sorte, Beto repentinamente soltara grotescamente de si e um par de braços confortáveis lhe abraçaram de maneira protetora. Abrindo os olhos, vira o perfil de Maggie olhando assustada para algum outro ponto enquanto apertava o futuro enteado em seus braços. Seguindo o seu olhar, Theodore se surpreendia com a figura animalesca que apontava a arma na cabeça do peão. O mesmo olhar que tinha quando brigaram em uma noite tempestuosa, como se fosse a própria encarnação da raiva. Bill encostava o cano da arma na cabeça de seu peão e acionava o gatilho. Sua presença ameaçadora típica de alfas mesclava bem com sua careta, amedrontando qualquer um. — P-Patrão, faz isso não... — Um. — Ele me seduziu com esse cheiro dele... — Dois. — Eu sei como trazer mais dinheiro pra cooperativa... — Três. — Patrão! Um tiro ecoara e o som da música parara de imediato. Os convidados da festa se aglomeravam na entrada do estacionamento com os olhos esbugalhados de curiosidade. O peão que havia fechado os olhos temendo o pior, abrira lentamente ao ver o cano da arma apontado para baixo, perto de seu pé onde fora dado o único tiro. Tremendo, erguera a cabeça para o alfa alto e bronzeado, que o fitava ameaçadoramente. Bill então jogara a chave do carro para a noiva, que assim destrancado abrira a porta traseira segurando firmemente o cotovelo de Theodore o jogando para dentro da caminhoneta. Maggie dera a volta para entrar no banco do motorista, não se demorando em ligar o motor. Abrindo a porta do passageiro, antes de entrar Bill dera uma última olhada para o peão que o encarava amedrontado. — Não adianta fugir, acertaremos as contas mais tarde. No instante em que a porta do carro fora batida, Maggie já batera em retirada da cooperativa. Deitado no banco de trás, Theodore cobria os olhos com o antebraço engolindo a angústia e a vontade de chorar. Não se permitiria mostrar-se vulnerável bem debaixo do nariz de seu pai. Não quando tinha medo do que poderia vir depois. O caminho fora silencioso e apressado, tendo Maggie liberado os próprios feromônios para acalmar os dois homens. Depois que a caminhoneta fora estacionada na garagem da casa amadeirada, Maggie apressou-se em sair do carro para ajudar o loiro a descer. — Consegue se mexer? Está machucado em algum outro lugar? — Eu consigo andar, obrigado. Theodore conseguira sair da caminhoneta com dificuldades, suas costas doíam assim como sua face. Ainda assim seguira para dentro da casa como se aguentasse a dor do mundo. Sem dizer uma única palavra para os adultos ele seguira até seu quarto. Ainda parados na porta assistindo o adolescente se trancar no quarto, o casal suspirava e fechava a porta. — Não imaginava que fosse acontecer isso, Bill. Eu sinto muito, eu só queria... — Não posso controlar a língua dos outros, quando nem consigo controlar a minha. Maggie olhara chorosa para o noivo, recebendo o seu abraço apertado e confortável. Queria chorar e pedir desculpas ao garoto Theodore também, já que fora ela quem o convidara para a festa com a intenção de passar mais tempo com ele. Tudo o que ansiava era conhecê-lo melhor. Mas os planos pareciam ter ido por água a baixo. Respirando fundo e enxugando as lágrimas, a moça dera um sorriso trêmulo para o noivo. — Deveria ir falar com ele. Desviando o olhar para o andar de cima, Bill fizera uma careta. — Sou a última pessoa que o garoto deseja ver agora. — Se não for agora, isso aumentará o problema. Ele vai voltar pra casa e a mãe dele irá pensar que foi você quem fez isso de novo ao menino. — É só contar o que aconteceu, não preciso ir até ele. — Bill, você passou um ano inteiro ouvindo as pessoas falarem coisas maldosas sobre o seu filho. Carregou a culpa por ter batido nele, e ainda viu que as pessoas podem ser piores do que imaginava. — Sei o que eu fiz, não precisa me lembrar. — Preciso te lembrar de que o garoto que está naquele quarto é o seu filho. — Maggie segurou o rosto do noivo, sem desviar os olhos dos dele. — Você não foi o único a ouvir esse tipo de coisas, ele também passou por isso. Meio reticente, Bill desviou os olhos por um momento e relaxara os ombros antes de tornar a sustentar o olhar da noiva. — O que ele comentou com você? — Parece que esse tipo de coisa acontece na escola também. Bill respirara fundo e olhara para cima como se pedisse ajuda de algum santo para lhe dar forças. — Ainda acho que é melhor você ir. Ele parece ter gostado de você. Sorrindo levemente, Maggie se afastou do noivo indo até a estante de madeira escura onde guardava uma pequena caixa de primeiros socorros. Voltando para perto do noivo, lhe estendera a caixinha junto com o seus olhos brilhantes. — Ele é seu único filho. Vá. Segurando a caixinha oferecida, Bill tornara a encarar as portas dos quartos superiores. Engolindo em seco ele respirou fundo e subira degrau por degrau indo até a segunda porta do corredor onde dera batidas leves antes de girar a maçaneta. Abrindo uma fresta da porta, espiara o suficiente para encontrar o filho sentado na beira da cama segurando pedaços de papel higiênico para limpar o sangue da boca. Theodore erguera a cabeça para ver quem entrava no quarto, se surpreendendo com a figura paterna segurando o kit velho. — Posso? Theodore assentira com a cabeça, baixando os olhos para o papel amassado em suas mãos. Bill fechara a porta e se sentara ao lado do filho deixando o kit sobre seu colo. Por um instante nenhum dos dois ousara dizer alguma coisa, mas o alfa respirara fundo pigarreando para quebrar o silêncio. — Como você está? O loiro mantinha a cabeça baixa e balançava a cabeça. — Vou sobreviver. — Certo. Theodore olhara de canto para o pai, percebendo a arma presa no cinto da calça. — Não sabia que andava armado. — Aprendi com o seu avô — Bill abrira a caixinha tentando se desfazer da sua vergonha — Na minha época se alguém ousasse invadir nossas casas a gente podia meter uma bala na cabeça. — E se tivesse mesmo acertado? Bill arrancara um pedaço de algodão e o molhara no soro fisiológico. — Seria preso, não estamos mais na minha época. O pai segurou o queixo do filho com uma delicadeza estranha. Seus dedos eram rígidos mesmo que tomasse todo o cuidado para não ferir ainda mais Theodore. Deslizando o algodão sobre os lábios do garoto, dava-se conta do quão ferido seu rosto estava. — Sua mãe vai me matar quando ver tua cara. — Eu explico pra ela o que aconteceu. — Deixa isso. Vou ligar mais tarde — Bill resmungava concentrado em sua pequena tarefa. — Tenho que assumir minhas presepadas. — Por quê? Bill encarara os olhos de Theodore, parecendo ver sua ex esposa jovem na sua frente. Ainda se assombrava com a semelhança que o garoto tinha com a mãe, o que era um tanto quanto invejável. Pegando outro pedaço de algodão e o molhando para continuar com a limpeza das feridas, Bill tornara a pigarrear antes de sussurrar. — Porque eu sou seu pai. — Foi o meu pai que fez algo parecido antes. Bill congelara a mão a deixando cair em seu colo. — Isso mesmo, fui eu quem lhe deu uma surra por descobrir que meu filho não era homem. — Eu sou um homem, apesar de ainda ser novo, mas sou homem. — As pérolas azuladas lacrimejavam quando as palavras saíam de seu peito para ganharem liberdade. — Ou vai me dizer que isso me torna menos homem? Que sou um pervertido que irá seduzir qualquer outro homem por puro prazer? Não acha que fui eu quem começou tudo isso? Que eu seduzi o seu peão pra fazer isso comigo, porque eu gosto? Bill engolira em seco em ver Theodore irritado. Certamente não por ter medo dele, mas por finalmente perceber que aquele já não era a criança que costumava correr entre a plantação e se divertir escalando árvores. O tempo fizera questão de lhe mostrar que algo mudou em sua vida, mas um pai nunca está preparado para aceitar que um filho crescera. Porque é solitário. — Eu sei que você não fez nada com Beto. Mas isso não significa que seja fácil aceitar que você seja desse jeito. — Que jeito? Diga! — Pedia Theodore cerrando os punhos sobre os joelhos. Da mesma maneira que evitara de abrir a boca para ser beijado, o loiro não permitira que as lágrimas caíssem em seu rosto. — Não é desse jeito. Eu sou seu filho, sou um homem ômega e sou gay. Respirando fundo, Bill deixou sua mão sobre o punho fechado de Theodore. — Tem razão. Você é meu filho, já que está sendo teimoso feito uma mula igual ao seu velho pai. Acha mesmo que naquela noite eu não tenha me arrependido? Que pai iria preferir esbofetear o próprio filho sem sentir remorso? Theodore engolira suas lagrimas e desviara o olhar para o chão, sem coragem alguma de sustentar os olhos melancólicos de Bill. — Escute Theodore, não vou te dizer que o que fiz foi certo. Só Deus sabe o quanto me arrependi de ter chegado aquele nível. Só que também não me peça pra aceitar tudo tão depressa, porque eu não consigo te acompanhar mais. Eu preciso de um tempo pra me acostumar. — Eu só peço o mínimo de respeito. Se preferir que eu nunca mais venha aqui, tudo bem. É melhor do que receber uma surra toda vez em que pisar nessas terras. Bill então pegara uma pomada do kit de socorros e abrira a mesma pegando uma pequena quantidade em seu indicador. Novamente segurou o queixo do seu filho o fazendo lhe olhar, e então espalhava a pomada branca sobre os hematomas. — Não quero que fique longe, Theodore. Ver você crescendo longe de mim já é castigo suficiente pra esse velho homem. Mas não chega a doer mais do que a dor que senti nessa noite. Encolhendo os ombros com a ardência que sentia nas feridas, Theodore comprimia os lábios tentando não fazer careta. Não quando percebia que seu pai estava sendo sincero pela primeira vez desde que brigaram. Era uma rara oportunidade que não poderia perder. — Que dor? — Ousara questionar. — De vê-lo sendo machucado por outra pessoa. — Afastando a mão do rosto do filho, Bill baixava a cabeça enquanto arrumava o kit em seu colo — Maggie me contou que a escola tem sido difícil pra você. Prendendo a respiração pelo assunto sendo trazido à tona, Theodore balançava a cabeça engolindo em seco. — As pessoas apenas me evitam, nada demais. — Vou saber mais quando conversar com sua mãe. De qualquer forma, apenas quero pedir seu perdão pelo que fiz. Encarando o seu pai com surpresa, Theodore sentia os olhos queimarem mais uma vez naquela conversa. Bill o olhava com serenidade e paciência, mesmo que sua presença continuassem intimidadora. Nada que não esperasse de seu pai, que sempre parecera um homem grande e forte. Era a primeira vez que ele pedia desculpas por alguma coisa. Umedecendo os lábios, Theodore concordara com a cabeça várias vezes antes de baixar a cabeça escondendo as lágrimas que escorriam de seus olhos. Bill suspirou e abraçara a cabeça do loiro, o fazendo encostar em seu peitoral. Observando da pequena fresta que abrira, Maggie olhava para o teto contendo a emoção. Infelizmente não poderia enxugar as próprias lágrimas, já que segurava uma bandeja de leite quente e biscoitos de chocolate.
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