Transei com o Ricardo mais duas vezes. Ele me levou para o sofá e ficamos ali até nossos corpos não aguentarem mais. Acabei pegando no sono e quando acordei o dia já havia nascido. E eu estava sozinha. Levantei e levei um tempo para processar a noite anterior. Eu bebi muito vinho, definitivamente. Fui até o portão e ele estava trancado. Ricardo tinha passado a chave e jogado na garagem. Respirei aliviada com o cuidado dele. Subi para o meu quarto preguiçosamente e observei a janela dele, as cortinas estavam fechadas. Ele deveria estar dormindo. Tomei um banho rápido e deitei novamente na cama. Eu me sentia exausta. O meu corpo estava esgotado depois da quantidade de orgasmos que aquele homem me fez sentir. Ri sozinha da minha própria loucura. Eu havia deixado um homem completamente desconhecido, que poderia muito bem ter mentido sobre quem era, entrar na minha casa e me comer loucamente. Eu deveria ter dito não. Que tipo de pessoa faz isso? A atração que eu senti por ele não era uma atração normal. Ele tinha uma energia sexu4l selvagem e isso me fazia parar de pensar. E sentir o corpo dele no meu, as sensações que ele me proporcionou me levando ao topo do prazer repetidas vezes fez meu âmago pulsar com a lembrança. A noite tinha sido completamente maluca, só que era hora de reagir!
Depois de me trocar com roupas leves, voltei a trabalhar. Eu tinha um novo cliente. Um Coronel aposentado do exército que queria se candidatar a vereador. O problema era que enquanto coronel ativo ele havia cometido várias barbaridades e isso veio à tona nos últimos dias. O assistente dele me assegurou que era tudo mentira, mas com base no meu conhecimento, eu sabia que a chance de ser verdade era infinitamente maior.
Fiquei no telefone com o Everton, assistente do coronel, por quase uma hora antes de sentir fome. Eu tive a impressão que ele ficava inventando assunto para me manter na linha, mas ele me pagaria bem, e é o que importa. Se o coronel conseguisse aguentar até a eleição sem nenhum escândalo eles me pagariam uma pequena fortuna como recompensa, e para isso eu precisaria aceitar investidas como a do Everton, enquanto nos falávamos. Finalmente me livrei dele. Homens como aqueles me viam como um alvo, como alguém que você come e sai. Uma diversão de uma noite. Eu sentia nojo deles, eu nem conseguia me imaginar me relacionar de nenhuma forma com homens que matariam para conseguir o que quisessem. Terminei a minha salada de frutas ainda pensando como impor limites a ele quando meu celular tocou.
- Senhorita Cardoso? - Uma mulher muito educada me saudou.
- Sim.
- Falo em nome de Ricardo Campos. Ele pediu para lhe agradecer pela sua companhia na noite passada. - Senti o rubor me dominar. Ele mandou uma espécie de assistente me ligar para agradecer?
- Ahh, ok. - Consegui responder.
- E ressaltou que quer encontrá-la novamente, agora de forma formal. - Eu estava incrédula, ainda chocada com o agradecimento anterior.
- Seu nome? - Ela se identificou no começo, mas o nome me fugiu.
- Eva.
- Eva, agradeço o convite. Diga ao Ricardo que fico lisonjeada, mas terei que recusar.
- Eu nem expliquei do que se trata. - Ela não estava acostumada a ouvir não.
- E eu não quero saber do que se trata. Se ele não é capaz de falar comigo em pessoa, então não merece a minha atenção. Obrigada pela ligação Eva. Passe bem. - Desliguei.
Me senti m4l por Eva, ela provavelmente não sabia como reagir a minha recusa, mas ela sobreviveria. Mas aquele comportamento me lembrava muito os homens que eu trabalhava. Mandando alguém falar por si mesmo. Isso era horrível. Ele veio até a minha casa, fez loucuras comigo sem conseguirmos falar sobre nada de muito pessoal e no final ele fez a última coisa que deveria, me deixando enojada. Colocou outra pessoa para falar por ele. Esse era um comportamento covarde e sem escrúpulos.
Ele tinha o meu número, era meu vizinho e sabia como falar comigo. E agora, sóbria e lúcida eu via o quão problemático tinha sido a noite passada. Ele se sentiu atraído por mim sem nem saber quem eu era. E se eu fosse uma mulher casada? Lésbica? Ele fez questão de repetir várias vezes que queria comer quando nem sabia o meu nome. E em um rompante de insanidade eu fiz loucuras com ele, e isso não poderia acontecer de novo. Não iria acontecer de novo. Meu celular tocou de novo, agora era a Malu, minha melhor amiga.
- Oi amiga. - Atendi ela com preguiça. A Malu com certeza acharia que a minha aventura da noite passada era o tipo de coisa que deveria acontecer na minha vida parada e monótona.
- Você está vendo o noticiário?
- Não, estou trabalhando. - Era sábado, e eu sempre trabalhava aos sábados, de casa.
- Liga agora Cla, agora! - A voz dele era puro desespero. Alarmada corri até a TV e liguei no noticiário. Levei um segundo para entender o que estava acontecendo. A foto que pairava acima da frase: “Assassinado brutalmente” me fez perder o ar. Sentei no sofá quando senti as pernas falharem.
- Malu, como isso aconteceu? - Consegui falar com ela, ainda no telefone.
- Não explicou muito, só que ele foi encontrado em um lugar deserto, dentro do carro. Com as mãos cortadas e depois enforcado. Ninguém explicou o motivo. Nada foi roubado.
Minha cabeça girava e eu não conseguia fixar os pensamentos. Ele estava bem ontem, ele estava normal. Quando ele saiu daqui ele estava bem. A campainha tocou me tirando dos meus pensamentos.
- Malu, tem alguém aqui, já te ligo. - Desliguei e me encaminhei ao portão.
Dois homens bem vestidos me aguardavam, me encarando sérios.
- Clara Cardoso? - Assenti.
- Sou o detetive Rocha, e o meu colega é o detetive Fin. Gostaríamos de conversar com você sobre um incidente que houve ontem a noite. - O tom do detetive era estranho e eu estava surpresa pela abordagem séria dos dois. Me forcei a perguntar:
- Que incidente? - Surpreso com a minha pergunta, ele respirou fundo.
- Pode nos dizer onde estava ontem, entre 23:00 e hoje às 2:00 da manhã?
- Aqui em casa. O que é isso? Eu sou suspeita de alguma coisa? - Os detetives se olharam.
- Estamos investigando o assasinato de Gerson Rodrigues, seu ex-noivo.