CAPÍTULO III

870 Words
Já havia se passado um ano desde a última vez que Ella tinha visto as ruas fora do convento. Era bom respirar um ar diferente e ver a cidade, mas voltar para casa a assustava. Tudo a assustava: o casamento que se aproximava, a noite de núpcias e, principalmente, seu irmão. Ella tinha um medo terrível de Xavier, mas de Otávio, além do medo, havia o nojo. Ela tremia ao pensar nas palavras ditas por ele em sua última visita; seu desejo ainda estava lá. Saiu de seus pensamentos com a voz de Xavier: — Chegamos. Ella desejava sair correndo do carro, fugir até se afastar de tudo e de todos, mas não podia. Xavier percebeu seu medo: — Ella, está com medo de entrar em casa. E quero saber por quê. Mas ela não podia contar. Como poderia explicar o medo que sentia de Otávio? — Estou esperando uma resposta. — Não estou com medo. Só estava pensando que me resta pouco tempo para ficar em casa. Ele a encarou de forma dura: — Essa não é sua casa; é a do seu pai. A sua você terá quando se casar comigo. E eu vejo o medo em você. Por isso, a partir de hoje, terá um soldado meu para protegê-la. E vigiá-la também, é claro. — Tenho o Ricardo. Ele sempre cuidou de mim quando eu estava em casa. Confio nele. Xavier a olhou de forma enigmática. — Mas eu não confio. Antes, você era uma menina, tímida e tranquila. Agora é uma mulher bela e desejável. Estéfano, meu soldado, cuidará de você, assim evitaremos problemas ou, melhor, mortes desnecessárias, porque, se alguém tocar em você, morre, Ella, independente de quem seja. Lembre-se disso agora e quando estiver casada comigo. Eu não compartilho. Você é minha. Era um aviso. Ella sabia. Parecia ser apenas um objeto aos olhos dele. Esperava, pelo menos, que Xavier não danificasse o que acreditava ser sua posse, porque, na verdade, ela não era propriedade dele nem de ninguém. Ela abriu a porta do carro, mas ele segurou sua mão. Ella olhou ao redor e percebeu que os outros carros que estavam com ele já não os seguiam. — Quero um beijo de despedida, Ella. Ela sentiu um choque percorrer seu corpo e puxou a mão. Xavier tentou segurá-la, mas a surpresa com a fuga dela deu-lhe uma vantagem. Ella correu, e no portão encontrou Ricardo, jogando-se em seus braços. Ele a amparou. Ouviu passos e o som de uma arma sendo engatilhada. Ella se virou e encontrou os olhos de Xavier, escuros como a noite, e a arma apontada para o antigo soldado que sempre a protegeu. Ela se colocou entre Xavier e Ricardo. — O que está fazendo? — perguntou. — Eu avisei que, se alguém a tocasse, morreria. Não estava brincando. Ricardo se posicionou à frente de Ella, o medo a consumindo. Mas a voz forte e dura de Ricardo, que sempre lhe inspirava segurança, soou com firmeza: — O senhor fala como se existisse, nesse abraço, algo mais que carinho fraterno. Não há. Sempre gostei da menina como se fosse minha irmã mais nova, uma menina. — Mas ela não é mais uma menina. É uma mulher, e você sabe disso. — Para mim, ela sempre será uma menina. Ella não conseguiu segurar o choro e se colocou à frente mais uma vez, implorando. Finalmente, Xavier abaixou a arma e olhou para Ricardo. — Ella tem medo de alguma coisa nesta casa. Não disse o que é. Se está com ela todo esse tempo... você sabe. Meu soldado Estéfano chega depois do almoço. Poupo sua vida, e você o ajuda a protegê-la. Ella achou que Ricardo simplesmente concordaria com um aceno, mas ele encarou Xavier com firmeza: — A protejo porque sempre foi o que fiz, e vou continuar fazendo. Não pelo medo da sua ameaça. Sei usar uma arma e uma faca tão bem quanto você. Incrivelmente, Xavier pareceu satisfeito com a resposta. Deu um breve "ok" e foi embora. Ella mais uma vez se jogou nos braços de Ricardo. Havia sido um longo tempo sem vê-lo, e ele a abraçou e beijou seus cabelos, onde estavam fora do alcance das câmeras. — Menina! Precisa parar com o costume de se jogar em mim. Infelizmente, vai se casar, e não vai pegar bem se nos virem abraçados. Vão imaginar coisas, como seu noivo imaginou, e ele não é alguém que quero como inimigo. Ella pediu desculpas e se afastou. Ele secou suas lágrimas e sorriu. — No entanto, pode fazer isso quando estivermos sozinhos, Ella. Quando pequena, ele nunca conseguia negar nada do que ela pedia. Primo de terceiro grau de sua mãe, Ricardo a amou e a mimou no lugar dela. Os brinquedos, doces preferidos e filmes prediletos eram todos presentes dele. Seu pai não era r**m, mas, depois da morte da mãe de Ella, quando ela tinha cinco anos, a família deixou de ser importante para ele. A única preocupação era com a segurança, já que ele tinha inimigos. O amor, porém, ficou por conta de Ricardo. Por isso, o segredo que ele lhe contou quando ela tinha apenas 12 anos ficaria guardado para sempre com ela.
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