CAPÍTULO I
Cada vez que o sol raiava, o medo consumia Ella mais e mais. O dia que mais temia desde os 15 anos estava próximo: o dia em que se casaria com a fera. Xavier, conhecido por não ter clemência com ninguém, tinha olhos de aço. A impressão que ela teve na primeira vez que o viu era que aqueles olhos, negros como a noite, eram capazes de cortar e levar qualquer um à mais completa escuridão.
Desde então, Ella acordava no meio da noite sobressaltada, e algumas vezes seus gritos, depois de um terrível pesadelo, acordavam as colegas de quarto. Nina, a única amiga que havia encontrado, aprendera a sair de sua cama para dormir com Ella nessas horas de pânico. Mas Ella sabia que, em breve, ninguém poderia protegê-la, pois o pesadelo se tornaria real, e ao lado dela na cama dormiria o homem que se tornaria seu marido.
Nina percebeu o choro silencioso de Ella e a abraçou mais apertado, enquanto a raiva a consumia. Como era possível que alguém obrigasse aquela criatura doce, que nem ao menos havia beijado um rapaz, a se casar com um homem nove anos mais velho e a quem todos temiam?
— Não chore, talvez algo aconteça e você não se case com ele. Ainda resta esperança.
— Você sabe que ninguém vai me salvar. Meu pai espera ansioso por esse casamento, e meu irmão, como ele mesmo disse, só sente não ter podido me levar para a cama antes do meu futuro marido.
Nina sentiu calafrios ao pensar na família de Ella, com quem convivia desde os 11 anos. Assim que Ella começou a entrar na puberdade, o pai percebeu o interesse doentio do irmão pela filha, e a única maneira que encontrou de proteger Ella e preservá-la para um casamento honrado foi mandá-la ao convento.
Aquela era a última noite de Ella ali. Pela manhã, a garota voltaria para casa e começaria os preparativos para o casamento. O noivo, que fazia mais de três anos que não via, exigira que um de seus soldados de confiança passasse a vigiar a noiva e a casa até o dia em que Ella se mudasse definitivamente para a residência que iriam compartilhar após os votos matrimoniais. Ah! Se ele soubesse que o maior perigo estava dentro de casa e possuía o mesmo sangue que ela.