Aspen parecia animado assim que atravessei a porta pesada de madeira que separava o corredor do salão principal. Ele estava na janela, admirando o amplo jardim e conversando com uma das criadas que esfregava uma das janelas ao seu lado.
- Aspen! - exclamei, tomando a sua atenção para mim.
- Alteza! - disse, fazendo uma reverência.
- Não é necessário referências, e me chame apenas de Alexandra ou Alê! - disse, abraçando-o. - recebeu meus presentes?
- Sim, muito obrigado! - agradeceu, com um sorriso de orelha a orelha. - minha mãe nunca esteve tão realizada.
- Bom, espero que tenha conseguido ajudar. - suspirei, enquanto encarava seus olhos castanhos.
- E muito. - deu de ombros. - sobrará mais dinheiro para comprarmos os remédios do meu pai.
- Era sobre isso que eu queria conversar com você. - disse, puxando seu braço para dentro do extenso corredor. - Eu queria conversar sobre os remédios do seu pai.
- Os remédios do meu pai? - disse, franzindo o cenho.
- Sim, venha comigo. - respondi, fazendo-o me seguir até a ala sul do amplo palácio.
- Você sabe o que ele tem? - perguntei, abrindo uma portinha simples de madeira.
- Sim. - suspirou. - é algum tipo de doença infecciosa, por isso, minha mãe toma o maior cuidado possível e nos proibiu de vermos o nosso pai por um tempo. Ela tem medo de contrair.
- E você sabe mais ou menos os sintomas? - Perguntei, enquanto subia a escada longa e apertada que dava ao topo da torre.
- Febre, cansaço e muitas dores na cabeça. - respondeu, vindo atrás de mim.
- Bom, estou te levando ao nosso curandeiro. - murmurei, batendo três vezes na porta do homem grisalho.
- Alexandra, querida. - o homem disse, vindo me abraçar.
- Oi, Senhor Nabuco. - cumprimentei, dando passagem para Aspen entrar. - esse é meu amigo, o Aspen. Viemos saber se o senhor tem algum tipo de cura para a doença do pai dele.
- Bom, eu tenho cura para quase tudo. - disse, animado. - O que seu pai tem?
- Achamos que é aquela doença infecciosa que ocorreu na Europa a algum tempo atrás. - Aspen disse, se sentando na mesa de madeira com um livro apoiado. - Ele tem dores de cabeça, febre e muito cansaço.
- Hum.. - o homem murmurou, pondo a mão no queixo e alisando o local. - Vamos procurar aqui. - disse, folheando o livro. - ele tem falta de ar, tosse e dores no peito?
- Sim. - respondeu, batendo os dedos na mesa e encostando a mão no rosto.
- Bom, eu tenho algo que poderá ajudar. - disse, indo atrás de alguns frascos com cores diferentes. - olhe, são remédios.. mande ele tomar duas vezes ao dia, um antes do almoço e a outra antes do jantar. dentro de uma ou duas semanas, ele estará bem.
- Obrigada, senhor Nabuco. - sorri, amigavelmente e depositei um beijo em seu rosto. - você é o melhor do mundo.
- logo, será meu neto em meu lugar. - ele disse, rindo um pouco. - estou ficando velho, minha querida.
- Seu neto será tão bom quanto o senhor, mas eu ficarei tão triste sem você. - disse, triste com o rumo da conversa.
- Bom, me diga, Aspen. - ele disse, sentando-se do lado oposto ao que Aspen se mantinha sentado. - como seu pai contraiu essa doença?
- Ele fez uma viagem pela Europa a alguns meses, e quando voltou, disse que um dia antes de vir, comeu um bezerro que os donos de uma casa tinham dado a ele e aos amigos.. - ele começou, dando de ombros. - sete dias depois, ele começou a dar os primeiros sintomas e só foi piorando.
- Os homens devem tomar mais cuidado com o que recebem, provavelmente, o animal estava infectado com algo.
- Também acho. - Aspen disse, suspirando fundo e encarou o frasco. - espero que isso funcione.
- Vai funcionar, meu filho. - ele disse, sorrindo.
- Vamos, Aspen? - disse, colocando uma pequena flor branca de volta a bancada. - Obrigada mais uma vez, senhor Nabuco.
- Vamos. - Aspen alisou uma das pernas e levantou, segurando com as duas mãos o vidro cheio.
***
- Você sabe qual é a cor preferida da sua mãe? - perguntou, sentada em um balanço no jardim. Aspen estava sentado no chão, embaixo da árvore encarando a fachada do lugar.
- Sei. - disse, desviando seu olhar para mim. - Rosa.
- eu prefiro azul. - murmurei, olhando o céu. - me lembra o céu e me faz pensar em como o mundo é infinito.
- Eu acho melhor eu ir. - Aspen disse, se levantando. - tenho de voltar para almoçar.
- Já vai? - disse, triste.
- Sim, princesa. - ele sorriu. - prometi que voltaria para tomar sopa com legumes hoje.
- Parece ótimo. - sorri, pulando do balanço.
- E é. - ele sorriu abertamente, com os olhos brilhando. - hoje minha mãe irá usar um pedaço da carne que você mandou para nós.
- Que bom que gostou, Aspen. - eu disse, segurando sua mão e alisando-a com a outra. - obrigada por ter vindo.
- Não poderia negar o seu pedido. - ele sorriu de lado. - obrigado, Alexandra. Você me ajudou muito.
- Sempre a disposição. - sorri. - Vamos, eu te levo até a carruagem.
- Eu posso ir andando... - ele disse, me seguindo.
- Não é incomodo algum, acredite.
- Não precisa mesmo.. - protestou.
- É perigoso. Eu insisto. - disse, apressando o passo.
Andei apressadamente até a entrada do palácio, com Aspen ao meu encalço. Pedi a uma das criadas que varria as folhas para que chamassem uma carruagem, que não tardou a chegar.
- Obrigada mais uma vez. - agradeci, antes que o homem entrasse ao meio de transporte.
- Obrigado você. - ele disse, dando um último sorriso e entrando na carruagem. A porta de fechou e ele pôs o rosto para fora da janela uma última vez. - Até mais.
- Até. - respondi acenando.
A carruagem começou a sumir pelos portões e os perdi de vista. Suspirei mais uma vez, e me sentei no segundo degrau da escada, com as mãos nas bochechas, assim como eu tinha feito a sete anos atrás, quando o meu pai saiu para viajar junto com o meu irmão, Alexandre, que nunca mais voltou para casa.
Alexandre tinha o nome do nosso pai, e era o herdeiro do trono. Ele tinha apenas quinze anos e estava animado com a viagem, iria conhecer a Inglaterra.
Implorei que ele ficasse, estava com uma sensação r**m. Mas, ele me disse que tudo ficaria bem e que logo estaria de volta para brincarmos.
Alexandre nunca voltou e seu corpo nunca foi encontrado ao mar, e de uma noite para um dia, eu me tornei herdeira direta ao trono. Jamais superei a perda do meu irmão, e até hoje, eu olhava para o quadro com a sua imagem no corredor principal.
A vontade de chorar tomou posse de mim, e eu subi o mais rápido possível para o terceiro andar. Um grande quadro da nossa família estava lá, Eu, Alexandre, meu pai e minha mãe. Ao lado, uma foto de Alexandre, embaixo, uma pequena placa dourada dizia "Alexandre II". Toquei o quadro sutilmente, enquanto imaginava Alê me deixando dormir em seu quarto nos dias de chuva.
Alexandre saberia o que fazer, ele me ajudaria. Estaríamos felizes agora, estaríamos juntos. Uma lágrima escorreu sobre o meu rosto, e em seguida, outras.
Dei dois passos para trás, ainda encarando o quadro a minha frente. Encostei na parede gelada, e me permiti escorrer para o chão e chorar. Tentei abafar meus soluços com as mãos e me permiti que as lembranças voltassem com toda força.
"- Alê, fica! - pedi, agarrando a barra da sua calça.
- Você sabe que eu não posso agora, minha pequena. - respondeu, abaixando-se a minha frente e ajeitando a tiara torta em meus cabelos.
- Prometa que voltará logo. - pedi, sentindo as lágrimas escorrendo pelo meu rosto.
- Prometo, e nós treinaremos sua leitura, tudo bem? - perguntou, sorrindo.
- Tudo bem. - disse, entre um solução. Ele secou minha lágrimas, me abraçou forte e me deu um beijo na testa. "
O vi partir naquela carruagem, e nunca mais tive o privilégio de ver Alexandre, de abraça-lo ou de ler algum livro infantil para ele, enquanto ele fazia anotações em seu caderno preto.
"- Alê, deixa eu ler outro livro. - disse manhosa, segurando o meu exemplar de "o patinho feio" entre os dedos.
- Não gosta desse? - perguntou, tirando os olhos das suas anotações.
- Não, é chato. - bufei, jogando o livro de lado e pulando para a sua cama.
- O que você quer ler? - perguntou.
- O seu diário. - disse travessa.
- Não mesmo. - ele disse rindo, e fechando o caderno. Ele colocou na gaveta e trancou a mesma. Logo, me empurrou na cama e me encheu de cosquinha.
- Eu te amo, Alexandre. - disse, enquanto o abraçava e beijava sua bochecha.
- Eu te amo mais, boneca. - ele sorriu."
- Alexandra. - meu pai disse, surpreso e se aproximou. - O que aconteceu?
- Estou com tanta saudades dele, papai. - disse, o abraçando e me permitindo chorar muito.
Senti meu corpo ficar mais leve e o andar do meu pai, enquanto mantinha meus rosto escondido em seu ombro.
Algum tempo depois, meu pai me depositou em minha cama e retirou a minha tiara.
- eu sinto tanta saudades dele, papai. - eu disse, sentindo a lágrima quente e solitária escorrer pelos meus olhos.
- Eu também, meu amor. - ele disse, com a voz embargada. - mas, ele está te olhando lá do céu, minha boneca.
Meu pai alisou meus cabelos por mais algum tempo, e eu acabei pegando no sono, cansada de tanto chorar.
Eu sinto tanta saudades dele....