Capítulo 3
Tamara narrando
Depois daquele dia, eu e o Tubarão nos vimos algumas vezes, mas nada além de beijos. Fiquei de boa, esperando ele aparecer de novo, mas nada dele. Eu ligava e nada. Então, fui até o morro dele e fiquei sabendo que ele estava preso.
Não dormi quase nada naquela noite, pensando no Tubarão. Nem o nome dele eu sei. Acordei bem cedo, levantei, tomei banho e vesti um pijama mesmo. Meus pais saíram para uma conferência da igreja em Goiânia e vão ficar alguns dias por lá. Fiz um Nescau com leite e comi uma bolacha salgada. Meu celular começou a tocar e vi que era um número estranho. Já atendi na hora, muito ansiosa.
— Alô? — eu digo, torcendo para que seja ele.
— Princesa, sou eu — ele diz, e eu reconheço a voz.
— Você está bem? — pergunto, preocupada.
— Estou sim, só hoje consegui um celular. Fiquei sabendo que você foi ontem no meu morro atrás de mim. Aconteceu alguma coisa?
— Não, eu só estava preocupada com você. Já faz uma semana que a gente não se fala. Você sumiu e não me deu notícias — digo, triste.
— Mas você tá ligada que eu tô na jaula, né? Não sei quando vou sair daqui, Tamara — ele diz, e sinto a tristeza na voz dele.
— Eu posso ir te ver? — pergunto, e ele fica alguns minutos em silêncio.
— Melhor não, Tamara. Aqui não é lugar pra uma pessoa como você. Não sei quanto tempo vou ficar aqui, é melhor você não me esperar — ele diz, e eu sinto uma vontade de chorar.
— Então o que a gente passou nesses dias não significou nada pra você? — pergunto, com medo da resposta dele.
— Claro que significou, e você sabe disso. Eu gosto pra c*****o de você, gosto de um jeito diferente, tá ligado? Você fode com o meu juízo, morena, e eu dava tudo pra estar aí contigo. Mas você merece coisa melhor. Eu não sou o cara certo pra você — ele diz, com a voz triste.
— Aceita a chamada de vídeo, por favor — eu digo, coloco na chamada de vídeo e ele atende. — Quem sabe o que é certo pra mim sou eu. Eu gosto de você e quero ficar com você. Não me importo de ir te ver — digo, encarando ele, e ele n**a com a cabeça.
— Teus pais nunca vão aceitar isso, Tamara. E eu também não acho certo. Você é nova, linda, e tem um futuro pela frente. O que eu posso te oferecer? Eu sou só um fudido com o nome todo sujo — ele diz, e eu n**o.
— Para de falar assim — eu digo, e ele continua me olhando.
— Eu acho melhor você seguir a sua vida. Se eu sair logo daqui, a gente se vê aí fora, mas se eu não sair, você vai viver e ser feliz, Tamara. Eu gosto demais de você pra te prender a mim — ele diz, triste, e eu n**o com a cabeça.
— Por que você está fazendo isso com a gente? Eu tenho que decidir o que eu quero pra minha vida ou você está fazendo isso porque já tem outra pessoa? — pergunto, já chorando.
— Tamara, olha pra mim — ele diz, e eu olho pra ele. — Eu não tenho ninguém e já te passei a visão. Eu só não quero que você se sujeite a isso. Você merece coisa melhor. Não quero que você brigue com a sua família por minha causa, não quero que você estrague a sua vida vivendo em porta de cadeia. Vai ser melhor assim — ele diz, e eu continuo chorando. Olho em seus olhos, e ele estava com os olhos marejados. — Eu nunca vou me esquecer de você. Você vai ficar pra sempre na minha mente e no meu coração, mas é isso aí. Fica bem, e eu te desejo tudo de bom — ele diz, e eu só concordo com ele, ficando alguns minutos nos olhando. Ele chorou também, desligou a ligação, e eu desabei em choro.
Eu nunca senti tanta dor no peito igual naquele dia. Comecei a passar m*l; minha respiração parecia que não saía, e meu peito apertava e doía. Mandei uma mensagem pra Manu, que, em minutos, estava ali comigo. Acabei apagando, e quando acordei, estava no postinho. A Manu e a tia Débora estavam ali, olhando pra mim.
— O que aconteceu? — pergunto, e a tia Débora se aproxima de mim, segurando minha mão.
— Você teve uma crise de ansiedade, Tamara. Aconteceu alguma coisa com você? Você ficou nervosa ou passou algum susto? — ela pergunta, e eu n**o com a cabeça. Não ia contar a ela.
— Por favor, tia, não fale nada para os meus pais — eu digo, e ela me encara.
— Eu não vou falar, mas você vai me contar direitinho o que aconteceu. Vou te levar lá pra casa e você vai ficar lá até seus pais voltarem — ela diz, e eu concordo.
— Tudo bem — eu digo, e ela passa a mão no meu rosto.
— Não importa o que aconteceu, vai ficar tudo bem — ela diz, e eu concordo. — Estou aqui com você. Vamos orar, e vai dar tudo certo.
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No outro dia o doutor me deu alta, mas me indicou uma psicóloga e a minha tia prometeu que vai me levar a uma. Ele também me receitou um remédio antidepressivo, dizendo que eu preciso seguir corretamente o tratamento. Fomos direto para a casa dela, e a Rebeca não estava em casa quando chegamos.
— Tia, a Rebeca foi aonde? — perguntei olhando para ela.
— Ela tinha alguma coisa para resolver fora do morro e me avisou que vai ficar o dia todo fora hoje — ela disse, e eu concordei. Me sentei no sofá da sala e ela veio me trazendo um copo de suco.
— Tome o seu remédio, minha linda. Vai ter que tomar certinho — ela disse, e eu concordei. Peguei o remédio e tomei junto com o suco.
— Você está com fome? Quer comer alguma coisa? — ela perguntou, e eu neguei com a cabeça.
— Não, tia, eu não estou com fome — disse, e ela concordou. Sentou ao meu lado e ficou me olhando.
— A gente precisa conversar, Tamara. Está acontecendo alguma coisa e você precisa me contar para eu poder te ajudar — ela disse, e eu concordei. — Então pode começar a me falar e fique tranquila que o que você me contar vai ficar aqui mesmo — ela disse, segurando minha mão e me passando muita segurança.
— Ai, tia, acho que é muita pressão. Minha mãe quer me obrigar a ir à igreja, mas eu não ando me sentindo bem lá. Eu não gosto de participar das coisas e ela quer me obrigar — eu disse, e ela negou com a cabeça.
— Eu vou conversar com a sua mãe, minha linda. As coisas de Deus não são assim. Você tem que ir porque gosta, e não por obrigação. A gente tem que fazer a obra de Deus por amor e não por pressão nenhuma. Deus nem recebe as coisas desse jeito — ela disse, e eu concordei. — Mas tem mais alguma coisa, Tamara. Pode me dizer o que é, confia em mim — ela disse, olhando em meus olhos.
— Eu me apaixonei por uma pessoa, um cara que não é da igreja — eu disse, e ela concordou me olhando. — Ficamos juntos, mas não passamos de beijos — eu disse, olhando para ela com vergonha.
— Que bom que não passou disso. Mas e aí, ainda está com ele? — ela perguntou, e eu neguei, segurando o choro.
— Fazia alguns dias que eu não conseguia contato com ele, então fui atrás e descobri que ele está preso — eu disse, e ela arregalou os olhos. — Hoje de manhã ele me ligou — eu disse e comecei a chorar.
— Foi antes de você passar m*l? — ela perguntou, e eu concordei.
— Ele falou que não queria mais me ver, que lá não era lugar para mim e essas coisas. Ele desistiu da gente, o que me fez ver que só eu gostava dele, tia — eu disse chorando, e ela me abraçou, passando a mão nas minhas costas.
— Não fique pensando essas coisas. Pode ser que ele não queira que você vá visitá-lo, pensando em você, meu amor. É muita humilhação entrar em um presídio. Eu já fui fazer missão e orar pelas presas, e você nem imagina a humilhação que é — ela disse, e eu continuei chorando. — Pode ser que ele esteja só te protegendo, mas ore. Vamos orar e pedir para que Deus entre com providência. Se for pra vocês ficarem juntos, Deus vai abrir caminhos, e vocês vão ficar juntos. Eu e o seu tio tivemos tantos impedimentos também, e mesmo assim nosso amor venceu todas as barreiras porque tínhamos um relacionamento estruturado em Deus. Isso que você tem que fazer. Se não quer ir à igreja, não vá, mas ore em casa, leia a palavra e não se afaste do Espírito Santo, ainda mais nesse momento que você precisa tanto dele — ela disse, e eu concordei. Do nada, ela começou a cantar um louvor e continuou abraçada a mim.
Acalma o meu coração, acalma o meu coração
O vento está soprando
Mas é Te adorando que venço o mar da aflição
Acalma o meu coração, acalma o meu coração
Só venço esse mundo se for em Tua presença
Acalma o meu coração
Enquanto ela foi louvando aquele cântico, a minha dor pareceu ir passando. Eu chorei tanto que parecia ter lavado a minha alma. Senti um alívio tão grande e uma paz.
— Está se sentindo melhor? — ela perguntou, e eu concordei. — Então eu vou fazer o almoço. Fique tranquila que vai dar tudo certo — ela disse, olhando para mim. Ela deu um beijo em minha testa e se levantou, indo para a cozinha. Eu deitei no sofá e fiquei pensando em tudo o que ela me falou. Meu celular começou a tocar, e eu vi que era a minha mãe. Coloquei no silencioso e não atendi. Não estava com cabeça para falar com ela.
— É sua mãe? — minha tia perguntou, e eu concordei. — Me dá o celular, eu vou falar com ela — ela disse, e eu neguei.
— Acho melhor não, tia. Ela nunca me entende — eu disse, triste.
— Mas agora ela vai entender. Se não, você vem morar comigo. Pode deixar que eu vou falar com ela, e você fique tranquila — ela disse. Meu celular começou a tocar novamente, e eu passei para ela. Ela pegou o celular e atendeu a ligação, saindo da sala.
Continua ...