A gente não gosta de pensar na morte. Nos escondemos desse fato imutável, dessa bandida que pode nos pegar a qualquer momento. Fugimos tanto do assunto que a simples visão de um caixão assombra até os menos impressionados de nós. E foi exatamente o que aconteceu numa esquina da Avenida Júlia Kubitscheck: uma linda, reluzente e gigantesca vitrine funerária expondo nossa mortalidade em plena luz do dia. E, diga-se de passagem, com um belo jogo de luzes durante a noite. Até pedra jogaram.
E aí que o dono decidiu colocar uma película para afastar dos nossos olhos o óbvio: vamos todos morrer. Ou melhor, censurar essa obscenidade que é fazer dinheiro com essa s*******m que é morrer. Agora, quando se passa pela esquina, só se vê o pé do paletó de madeira.
Estive passando por lá outra noite com meu irmão e a funerária estava recebendo clientes. Ele questionou quem compra caixão à uma da manhã. Como se a morte respeitasse nossas agendas, planners e compromissos sociais. Ela trabalha é com horários malucos, a s****a prefere chegar de surpresa. Onde já se viu questionar a hora de comprar caixão?
Comprar caixão naquela funerária pomposa é como um passeio no shopping e todas as vitrines expõem a vulnerabilidade humana. Sim, eu estou escrevendo esta crônica para reclamar de morrer. E também para caçoar dessa gente caiçara, provinciana e supersticiosa que tem medo de um pedaço de madeira bem-disposto atrás de um vidro.
Já volto, o telefone está tocando.