—Nossa, lindo... meio potente, né? — Tobi tossiu e olhou para Clariss. — Será que você poderia vir aqui medir minha pressão arterial?
Clariss se apressou em ir até Tobi.
—Pai, a Tara avisou para você sair de perto. — Abby falou entre risos.
Will estava quase rolando no chão de tanto rir.
—O senhor quer que eu busque água? — Adam perguntou também rindo.
Eu estava me segurando, mas depois do que Adam falou não consegui, e Mike, ao meu lado, apenas com um sorriso divertido.
Acontece que fomos mostrar para Tobi nossa combinação, e aprimoramos bastante em uma semana o nosso furacão. Tobi ficou perto demais e o furacão de chamas surgiu, ele tomou um baita susto e caiu no chão bem perto do furacão, que queimou um pouco suas roupas.
—Não, Adam. Tudo certo, Clariss? — Tobi perguntou e Clariss assentiu. Ele se levantou ainda meio tonto e se virou para o outro g***o. — E o que vocês têm?
—Temos uma coisa ótima! — Abby diz animada e se vira para mim. — Quer ser nossa cobaia, Tara?
—É seguro? — Perguntei.
—Sim — Abby disse animada.
—
—Não! — Will falou quase ao mesmo tempo que ela.
Estávamos trabalhando bem nessa coisa de se deixar levar pela ligação e até estávamos nos dando bem uns com os outros, mas às vezes foge do controle.
—Me usem. — Tobi falou.
—Tem certeza, pai? — Abby perguntou, mas não precisou de resposta. Tobi se posicionou na frente dos três e abriu os braços como se dissesse “vão em frente.” — Ta bom então.
Will começou fazendo uma espécie de muro de uns 3 centímetros ao redor de Tobi. Foi rápido, o muro simplesmente brotou da terra no comando de Will. Então Abby cuspiu água dentro do muro encarando os sapatos de Tobi, e quase que ao mesmo tempo, Adam fez uma bola de eletricidade com as mãos e jogou na água.
O que aconteceu em seguida foi uma correria. Tobi começou a ser eletrocutado e não conseguia sair de dentro do muro, então Will jogou seu martelo nele, fazendo Tobi cair no chão, fora do muro, e desmaiar. Ele acordou minutos depois falando que estávamos de parabéns e mandando ficarmos bem longe dele. Principalmente Will.
Tiramos o resto do dia para descansar e comer comida de verdade. Quando estávamos todos juntos numa sala, era possível sentir uma melhora e até... alegria.
Eu entendo. Eu larguei minha família para estar ali, mas eles? Essa era a nova família deles. Adam estava certo naquele dia no carro. Eu era a única que tinha alguém lá fora. Automaticamente lembrei de Adam falando sobre a luta dele com Mike, de como ele viu dor nos olhos dele, e quando aconteceu aquela coisa estranha e eu consegui sentir tudo que ele sentia. Veio tanta dor, tanto rancor...
Mike é o mais fechado de todos. Eu sei que a mãe de Abby morreu, que Will foi rejeitado por ser quem é, que o pai de Adam odeia ninjas e ele teve que fugir..., mas Mike?
Ele foi o primeiro que chegou ali. Depois de Abby, é claro, mas acredito que ela não saiba de onde vem essa dor. Mas Tobi deve saber. Penso em perguntar para Tobi sobre Mike, mas eu sei que não vou obter respostas. Tobi é extremamente fiel a cada um de nós.
De noite, nos reunimos na fogueira. Tobi só havia saído do quarto para receber uma carta que chegou amarrada nos pés de um falcão. Era claramente um falcão ninja, daqueles que ninjas invocam. Eu só tinha visto os corvos de invocação do meu pai, nunca havia visto uma águia e espero aprender aquilo um dia. Todos sabem que apenas os ninjas mais poderosos conseguem essa habilidade. Ele foi bem misterioso sobre o que tinha na carta, apenas leu e voltou pro quarto.
E agora, horas depois, assando marshmallows no fogo que eu mesma fiz, estávamos nós conversando sobre coisas bobas. Era evidente que o clima havia melhorado bastante. Não estávamos mais tão sobrecarregados.
Adam estava no meu lado. Ele havia voltado a ser o velho Adam. Abby sentava no mesmo banco que Will. Os dois estavam rindo tanto que queimaram seus marshmallows. E Mike na minha frente, com a cabeça meio que torta olhando para mim.
Ele estava fazendo isso desde nossa luta. Algo me diz que ele está tão curioso para saber de onde vem minha dor, quanto eu estou da dele. Eu não sei o que ele sentiu exatamente, mas certamente estava errado. Eu não tinha dor. Eu fui abandonada num orfanato e tal, mas eu não sou infeliz por isso. Minha família é ótima. Até no orfanato eu era feliz. Eu tinha uma melhor amiga, a Asuna. Éramos tão parecidas. Tínhamos a mesma idade, éramos crianças, a amizade foi imediata. Meus pais me levavam para visitar ela depois de me adotarem, mas a responsabilidade com os ninjas era maior, então paramos de fazer isso.
Eu não tive mais notícias da Asuna, ela não era uma ninja como eu.
—
—Ahhn... crianças? — Tobi aparece de repente. Não gostávamos quando ele nos chamava de crianças, mas é apenas seu instinto paternal. — Eu vou ter que resolver algumas coisas na cidade, recebi uma carta do meu contato de confiança e ele... precisa de mim.
—O senhor vai nos deixar sozinhos? — Abby perguntou.
—Mike está no comando. Treinem e não façam besteiras. — Ele disse ajeitando a mochila nas costas.
—O senhor volta quando? — Abby questionou novamente.
—Logo. — Ele foi direto. — Clariss, vai me dar uma carona.
Abby correu para dar um abraço no seu pai que retribuiu abraçando-a e lhe dando um beijo na cabeça cheio de amor. Clariss apareceu com as chaves do carro de Abby, que recuperamos dias depois de termos fugido, e os dois partiram.
Abby veio se sentar conosco, meio pensativa.
—Você sabe quem é esse contato do seu pai? — Perguntei a ela.
—
Abby deu de ombros.
—Tudo que eu sei é que ele é novo. Meu pai me falou que conheceu ele há pouco tempo. Mas ele estava investigando uma coisa pro meu pai. — Ela respondeu mexendo na fogueira com uma vara longa que achou no chão.
—Podíamos dar uma volta de furgão enquanto eles estão fora. — Adam sugeriu rindo.
Abby olhou f**o para ele.
—Quer ver sua namoradinha? — Ela perguntou com deboche na voz.
A expressão de Adam mudou. Ele olhava pra Abby como se pudesse atravessá-la por ter mencionado aquilo.
—Eu terminei com ela — Ele respondeu e baixou a cabeça.
Abby levantou a sobrancelha surpresa.
—Você terminou com ela? Por que? — Ela perguntou.
Adam parecia incomodado com as perguntas e bravo, mas não com Abby, bravo por ter que lembrar do que fez.
—Olha a vida que levamos! Na verdade, eu nem se quer terminei com ela, não tive nem a chance! Corremos para cá e perdemos o contato. Ela deve ter tirado suas conclusões. — Ele disse irritado e triste.
Ao meu lado, Will prestava atenção nas expressões dos dois. E Mike fingia que não estava prestando atenção, mas estava tão interessado quanto nós.
—E você deixou isso acontecer? — Abby perguntou levemente irritada. Dava para perceber que ela estava incomodada com alguma coisa.
—O que queria que eu fizesse? Mandasse uma carta por um pássaro? — Adam levantou abruptamente e gritou com Abby.
Abby levantou também ainda segurando o graveto. Os dois se encaravam com raiva, e não tinha nada a ver com a ligação.
—Sim! Você tem que lutar pela garota! Do que adianta ser um excelente ninja, se deixa a garota que ama escapar? — Ela gritou de volta.
Adam respirou pesadamente. Era quase possível ver faíscas saindo de seus olhos, e talvez com Adam isso até seja possível.
—Qual o seu problema comigo? Ficou toda bravinha quando comecei a namorar a Rachel porque você gosta de mim e agora tá aí surtando! — Ele gritou tão alto, mas imagino que não se ouviu falar. Will tocou em mim. E eu pude sentir o quão m*l estava se sentindo Abby. Raiva e tristeza passeavam nela e sabíamos que Adam, estava sentindo também. — Eu...
Adam começou a falar, mas Abby golpeou ele na costela com o graveto quente tão forte que Adam se contorceu e gritou.
Corri para levantar sua blusa e ver o estrago quando ele alcançou o chão. Somos ninjas, um simples graveto é uma a**a na nossa mão. O corte era profundo e ele estava sangrando bastante.
—m***a, Abby! — Ele esbravejou.
—
Mike apareceu atrás de mim e eu só percebi sua proximidade quando seu cabelo tocou meu ombro e minha pele arrepiou com o toque repentino.
—AI MEU DEUS. Tá sangrando muito! Tipo, parece que abriu o mar vermelho natural na sua costela, cara! Sério, não fecha os olhos, não morre! — Will falou escandalosamente deixando Adam ainda mais nervoso.
Mike se levantou e olhou para Abby.
—Cure-o. — Ele ordenou.
Abby, que estava complemente fora de si, voltou à tona e balançou a cabeça para Mike. Ela se abaixou perto do corte de Adam e examinou.
—Eu preciso de linha de costura e uma agulha. Não sou profissional como Clariss. — Ela falou e se virou para mim. Pude ver lágrimas silenciosas nas suas bochechas rosadas, mas fingi que não vi. Abby não precisava dessa atenção agora. — Tara, meu pai tem na gaveta com a fechadura. Arromba ela, não sei, apenas pegue!
Corri sem olhar para trás rumo ao quarto de Tobi. Quando entrei, sai procurando uma gaveta com fechadura, até achar no criado mudo de Tobi. Como imaginava, estava trancada. Precisei me transformar, mas derreti a fechadura e abri a gaveta. Tateei tentando encontrar a linha de costura e a agulha entre vários papéis e parei quando reconheci algo.
Era a marca de cera que meu pai colocava nas cartas que ele enviava. Um corvo, seu animal de invocação. Reconheci o formato do papel que estava a marca. Era pequeno e retangular, enrolado e amarrado com uma fitinha para os pássaros poderem transportar.
Peguei a carta e a abri.
Diana sequestrou Sara. Preciso de ajuda, não conte para Tara.
Maxwell Baker
Pisquei e reli a carta mil vezes. Minha mãe havia sido sequestrada pela Diana.
—
—Que demora é essa? Por que está aí parada? O Adam está sangrando. — Mike apareceu de repente me dando um susto e me fazendo derrubar a carta. Nos olhamos por alguns segundos até nós dois avançarmos até a carta, mas antes que eu pegasse, Mike convocou ventos para levá-la até ele. Observei Mike ler a carta devagar e depois me olhar. — É sua mãe?
Assenti.
Eu ainda não sabia o que sentir, eu queria poder fazer alguma coisa.
—Meu pai enviou essa carta. — Falei.
—O que você vai fazer? — Mike perguntou. Ele me olhava com preocupação, mas também com algo diferente. Ele parecia realmente querer saber minha resposta.
—Nada. — Menti. — Tobi já foi até lá ajudar.
Peguei a linha e a agulha de costura e saí do quarto, mas antes de desaparecer da vista de Mike, me virei para ele.
—Você não vem? — Perguntei. Mike assentiu, guardou a carta no bolso e me seguiu.
—
Eram 2:38 da madrugada. Levantei devagar, calcei minhas botas e coloquei minha mochila nas costas em silêncio. Antes de Abby aparecer, arrumei uma mochila com coisas que eu precisaria, algumas pílulas de comida e garrafas d’água. Peguei minha Yari fechada, e sai do quarto devagar. Alcancei as chaves do furgão em cima da estante e sai da casa devagar.
Não fiz um barulho se quer.
Sai andando pelo mato com um único pensamento de resgatar minha mãe. Se preciso, darei minha vida. O furgão estava estacionado perto do portão. A noite está clara, é possível ouvir corujas e grilos. O furgão está na minha frente. Olho para trás desejando que essa não fosse a última vez que eu iria ver meus amigos.
Abri a porta do furgão e joguei minha mochila antes de entrar.
—Aí. — Ouvi uma voz dizer e rapidamente me transformei e abri minha Yari. Quando percebi, estava com a ponta da lâmina no pescoço de Mike.
—O que está fazendo aqui? — Perguntei baixando a lâmina.
— O que VOCÊ tá fazendo aqui? — Ele corrigiu. — Pensou mesmo que iria sair assim? Sem mais nem menos? — Ele falou bravo saindo do furgão.
Ficamos frente a frente e eu estava um pouco envergonhada por ter mentido pra ele, mas nada me faria voltar atrás. Eu iria salvar minha mãe.
—Saia da minha frente. Você não vai me impedir. — Falei pronta para uma boa luta.
—
—Impedir? Quem falou em impedir? Eu vou com você. — Mike falou indo até uma moita e tirando sua mochila dali.
Eu devia ter pensado nisso.
—Por que quer ir comigo? — Perguntei.
Mike trocou o peso de uma perna pra outra. Ele me olhava profundamente e desviou o olhar l******o os lábios antes de me responder.
—Se você morrer, acabou a profecia e todo esse treinamento foi por nada. — Ele respondeu e claramente havia uma mentira ali. Exatamente quando eu menti para ele mais cedo.
—É só por isso que não posso morrer? — Perguntei.
Mike abriu um pequeno sorriso.
—E também, com quem mais eu iria implicar? — Ele perguntou me fazendo rir.
Mas aquilo não era uma brincadeira. Eu iria invadir o covil de Diana e arriscar minha vida para salvar minha mãe. Mike não tinha nada a ver com isso. Essa era uma coisa que eu precisava fazer e eu não me perdoaria se perdesse alguém no caminho.
—Desculpe, mas essa é uma coisa que eu vou fazer sozinha. Se quiser lutar comigo, vamos em frente, mas eu vou dar minha vida se for preciso. — Falei seriamente segurando firme minha Yari e sentindo ela esquentar na minha mão.
Mike chegou mais perto.
Não tinha mais humor no seu olhar. Ele tinha o mesmo olhar de quando soubemos da profecia. Um olhar sério, de que daria a vida dele para proteger os seus.
—Nós todos somos parte de uma profecia da morte. E nenhum de nós vai morrer antes disso. Principalmente você. — Ele falou e tocou meu braço meio hesitante, até que eu senti sua confiança aumentando e Mike segurou meus braços forte e me olhou tão intensamente que a Yari caiu das minhas mãos, e mesmo escuro, eu me perdi nos seus olhos enormes me olhando como se tivesse me fazendo um pedido. — Eu não posso perder você.
Fiquei alguns segundos olhando para ele.
—Nem nós. — Ouvi a voz de Abby atrás da gente.
Mike me soltou abruptamente, e nos viramos para ver Abby, Adam e Will com uma mochila nas costas cada e suas armas nas mãos.
—Eu... contou para eles? — Perguntei para Mike.
—Não. — Ele respondeu.
—Senti seu incômodo e te vi saindo. Avisei aos outros e encontramos vocês aqui. Seja lá pra onde forem e o que forem fazer, não vão sem nós. — Abby falou me olhando nos olhos intensamente.
Eu não entendo. Por que eles se importam tanto?
—Eu não posso deixar. — Falei.
—Se fosse eu, você faria o mesmo. — Will falou.
Ele tinha razão. Mas ainda assim era perigoso. Olhei para cada um deles. Estavam tão determinados a me ajudar e nem sabiam o porquê.
—Eu vou invadir o covil de Diana e resgatar minha mãe. — Falei.
Os três pareceram assustados. Eu estava basicamente acelerando a profecia. Acelerando a morte de um de nós ou de todos nós. E fazendo exatamente o que Diana queria, pois ela não sequestrou minha mãe apenas por diversão. Ela descobriu que um de nós tinha uma família e quis nos atrair até ela.
E pela cara deles, eles não iriam se arriscar assim. E eu não os culpo.
Me virei para Mike. Mais alto que eu, eu tinha que levantar a cabeça para olhar nos seus olhos com toda aquela proximidade.
—Desculpe. — Falei e empurrei ele para entrar no banco do motorista do furgão.
Fechei a porta e liguei o carro. Então a porta do meu lado se abriu e Mike entrou. Ele jogou sua mochila atrás ao mesmo tempo que as portas de trás se abriram e mochilas começaram a voar batendo nos bancos e os outros três entrarem.
—Então, temos um plano? — Adam perguntou com a mão na costela enquanto fechava as portas.