Capítulo 06

1744 Words
O PRIMEIRO DIA na faculdade acaba de se tornar o pior. Ter Marjorie como universitária na mesma faculdade, tudo bem, mas ter em convívio os mesmos amigos é demais. Não por não termos uma relação amigável, e sim por ela me odiar mesmo.    Isso só pode ser um sinal.    Eu não consigo silabar palavras para me dirigir à minha irmã que me encara com um olhar cheio de raiva. Então após alguns segundos em silêncio, Marcos ao meu lado quebra-o:    — Como assim vocês se conhecem? — Ele encara nós duas e eu respiro fundo.       — Ah, então ela não contou para vocês? Que pena, Maitê. Perdeu a chance de se fazer de vítima — ela diz irônica, estalando a língua em seguida.    Céus, tem que ser tão difícil assim?    — Eu não sei porque você é assim comigo, Marjorie. Eu nunca te fiz nada — Minha voz soa levemente falha, mas me recomponho logo em seguida.    — Você ter nascido já é um bom motivo para eu te odiar.    Marjorie encara os amigos e se despede, sussurrando algo que eu não consigo ouvir para eles. Talvez tenha pedido para terem cuidado comigo ou algo bem parecido; falar bem de mim é que ela não iria. Ela se retira e meu olhar acompanha cada movimento seu. Sinto vontade de visitar Pilar novamente, porém o receio de ser expulsa sempre me atinge quando penso em ir. Engulo em seco e me volto para os dois que me encaram com um ponto de interrogação visível nas faces.    — Não diga que ela é uma ex sua revoltada? — Isabel é a primeira a se pronunciar.    — Sem chances de explicar isso agora para vocês, mas não, ela não é minha ex.    — Quero detalhes mais tarde — Marcos é quem diz e eu apenas concordo, repassando em minha mente tudo que acabou de acontecer.    Já pode mandar um terremoto, destino, nada mais me abala.    Deixo de pensar nisso quando me lembro do convite feito mais cedo, então me despeço de ambos e saio após Isabel dizer que me buscará às 14:00 juntamente com Marcos.    Sigo para casa a pé. Quero mentalizar tudo que aconteceu hoje, inclusive meu reencontro com Marjorie. Eu realmente quero ter uma boa relação com ela, mas fica impossível quando ela tem tanto ódio de mim. Aposto que em outra vida ela me odiou tanto que trouxe esse sentimento para essa.    Ao chegar no apartamento, coloco as minhas coisas sobre o sofá e me jogo nele, fecho meus olhos por alguns instantes antes de subir para tomar banho. Preciso almoçar antes de sair, mas pelo horário, não dará tempo. E em pensar sobre almoço, lembro-me de que não fui ao mercado desde que cheguei, sorte a minha ter mercado aqui perto.    Crio coragem após alguns segundos e me levanto do sofá.    Subo para o quarto e deixo minha bolsa sobre a cadeira do criado-mudo. Tiro meu celular e meus fones de dentro, colocando sobre a cama para que eu me lembre de ligar para Mia. Saudades da minha pestinha de estimação.    Retiro minha roupa e respiro fundo adentrando o chuveiro, sinto a água cair sobre meu corpo e me permito descansar durante aquele momento.    [...]    Me despeço de Mia após alguns longos minutos de seu discurso dizendo o quão Marjorie é desnecessária e que ela será uma pedra no meu sapato, após eu relatar tudo o que aconteceu com detalhes desde a minha visita à Pilar até hoje.    Antes de eu devolver meu celular para o carregador, ele toca e encaro a tela brilhar com o nome "Isabel". Droga, com a ligação de Mia eu esqueci completamente de almoçar e que eu irei sair. Olho a hora e constato ser 13:50. Atendo a videochamada com uma sobrancelha erguida e do outro lado da tela, observo Isabel e Marcos, que aparece segundos depois.     — Você não esqueceu da nossa saída, esqueceu? — ela pergunta após ver o meu estado pela chamada.    — Hum, bem, não, jamais, eu nun... ok, eu esqueci, mas estou quase pronta, só preciso... — Remexo os lábios e observo meu visual. — Me vestir.    Abro um sorriso amarelo e coloco o celular encostado na prateleira de livros, enquanto vou procurar algo para vestir. Eu ainda não tive tempo de comprar nada, então tudo que tenho em minhas malas são roupas do estilo de Costa Rica. Nada que chegue aos pés dos looks brasileiros. Procuro por uma roupa mais casual e menos chamativa, e visto. Faço um coque em meus cabelos que eu agradeci por não ter os lavado, seria complicado ter que deixá-los enrolados como estão após molha-los.    — Maitê, não esquece do biquíni — meu amigo diz e isso faz com que eu pare no meio do quarto e com as mãos na cintura me volto a eles.    — Oh, céus. Eu não tenho biquíni!    — Hellooo, você veio para o Brasil e não trouxe biquíni? Amiga, você vai ser expulsa pelos brasileiros e não vai demorar — Isa diz em tom de brincadeira.    — Não, eu tenho, Mia falou para trazer, mas eu acabei esquecendo. Enfim, foi até melhor assim, meus biquínis não são os melhores. — Faço uma careta. — Estou descendo, beijos.    Pego o celular e encerro a chamada após estar pronta e saio do quarto levando a carteira em uma pequena bolsa.    Minha roupa é composta por um vestido longo florido que há uma f***a ao lado das pernas, ele é apertado no b***o e modela meu corpo. Nos pés calço uma sandália com detalhes floridos e não uso maquiagem, tampouco acessórios. Acho que a pressa não deixou eu me arrumar.    Fecho a porta e desço no elevador, não demorando para encontrar os dois que estão em um carro cinza. Não reconheço a marca, sou péssima em detalhes assim.    — Você precisa renovar seu guarda-roupa, gatinha. — Marcos desce do carro para abrir a porta e eu poder entrar.    Ele usa uma regata preta sem mangas, deixando sua pele visivelmente a mostra, um short moletom e um sapatênis.    — Concordo com ele, mas você está linda, Maitê — Isa, com seus cabelos soltos caindo por seus ombros e costas, diz. Ela veste um macacão de short cinza, um cropped colorido e um all star nos pés.    A cultura brasileira é realmente muito diferente da que estou acostumada.     — Obrigada, você está um arraso também, Bel — devolvo o elogio, adentrando o banco de trás do carro.    — Adorei o apelido. — Pisca ligando o carro e dando partida.    Não sei para onde estamos indo, mas de uma coisa eu tenho certeza, irei me divertir tanto ao ponto de esquecer meu problema brasileiro com o nome Marjorie.    [...]    O dia passou tão rápido que sequer percebi. Andamos bastante e conheci diversos lugares, constatei então que se eu tivesse feito sozinha um tour, iria com certeza me perder. Fomos também no shopping da cidade e Isabel gentilmente me obrigou a comprar calças jeans, pois em suas palavras as minhas calças folgadas faziam-me parecer uma velha. Estamos agora no parque Ibirapuera, sentados na grama observando o pôr do sol, que minha nossa, é muito lindo.    — Hora de você falar, gracinha. — Marcos me cutuca e eu me assusto com o que ele diz e encaro-o sem entender.    — Sobre?    — Sua história com a Mar — a morena conclui.    Silabo um "ah" sem som e me ajeito sobre a grama, puxando meu vestido e arrumando ele.    — Bem, eu vou resumir bem resumidamente, porque não gosto muito de falar sobre. — Respiro fundo.     Jogo minhas mãos para trás para apoiar meu corpo e encaro os dois ao meu lado.    — Meus pais fizeram fertilização in vitro, e a mãe da Marjorie foi a barriga solidária. Só que meu pai acabou traindo minha mãe e isso ocasionou em uma superfetação. Marjorie é minha meia-irmã gêmea, dividimos a mesma barriga, mas não somos filhas da mesma mãe, e sim do mesmo pai. — Encaro o sol que está sumindo dentre as montanhas, e isso vai escurecendo o dia, dando a noite sua vez de brilhar. — Então, eu vim para o Brasil assim que descobri para tentar me aproximar e ter uma boa relação com ela, mas como vocês já notaram, ela me odeia.    Digo rindo sem humor.    — Sua vida é uma verdadeira novela.    Marcos diz me empurrando pelo ombro e no mesmo momento, meu estômago faz barulho. Esqueci completamente que eu não havia almoçado.    — Que trovão foi esse? — Isa provoca e eu balanço a cabeça, me levantando.     — Preciso comer, onde tem um lugar em que eu possar comprar algo?    — Tem um quiosque de cachorro-quente perfeito aqui, você irá amar.    Me puxa pelo braço e eu não consigo nem dizer que eu nunca havia comido cachorro-quente, me deixo apenas ser levada pela morena.    Isabel pede três cachorros-quentes com purê de batata e me pergunto que mistura estranha é essa, mas não reclamo quando ela entrega o meu. Voltamos para onde Marcos está e ela entrega o seu. Observo o cachorro-quente em minhas mãos e me atrevo a morder o primeiro pedaço. Sinto o gosto do purê juntamente com o molho e me derreto pela junção incrível.    — Céus, isso é incrível. — Solto um gemido de aprovação e passeio minha língua sobre meus lábios para limpar o que havia sujado.      — Não geme assim que eu gamo — brinca Marcos enquanto come o seu cachorro-quente. — Se você ficou assim com um mero hot-dog, imagine quando experimentar a famosa feijoada.    Pisca, voltando a atenção para seu lanche. Me sento ao lado de Isabel e continuo a comer em silêncio, apenas aproveitando o sabor do lanche. Não sei se é minha fome ou se realmente isso é um pedaço de pecado.    Termino de comer já me sentindo satisfeita. Levanto para jogar os papéis do guardanapo no lixo e encaro os dois que ainda comem.    — Então, encerra por aqui nosso "pequeno" tour? — Levanto minhas mãos para meus cabelos para ajeitar os fios que haviam se emaranhado. Já havia escurecido, então não tinha noção do que poderíamos fazer nesse horário.    — Não, senhora, sabe aquele biquíni que eu pedi para você comprar? — Respondo que sim e logo os dois se levantam. — Vamos te apresentar a praia brasileira.    Isabel me puxa com tamanha euforia e Marcos nos acompanha.    Como os alguns brasileiros dizem: “onde é que eu fui amarrar meu bode?”.
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