Meraki a rainha de um planeta possivelmente é a idealização de uma leitora com problemas psicológicos. Estou convencida disso, o fato dela ser casada com um homem que sem dúvida é o mais lindo e arrogante que já vi na vida se torna a prova mais real disso, pensei enquanto estava deitada naquela cama gigante e macia.
—Ele deve me odiar! —Falei colocando as mãos no rosto, mesmo sabendo que não era real. —Certo, isso não importa! Feche os olhos e concentre-se em voltar para casa!
Tentei aquietar meus pensamentos com algumas das táticas que eu mesma utilizo com as crianças. Quando finalmente cai no sono mais profundo que poderia ser, começo a escutar o som de um violino tocando uma música alegre e dançante aos poucos outros sons começam a se unir formando uma melodia que fazia com que me sentisse em casa. Embora nunca tenha escutado tal canção. Em minha pele sinto a sensação quente daquelas mãos tocando sutilmente a minha e o frescor de sua voz em meu ouvido.
—Esposa, me dá a honra dessa dança?
As vozes e cenários ganham forma, o belíssimo salão de baile com criaturas fantasiosas espalhadas, elas riam, dançavam, serviam, estavam em centenas. Então percebi a doce pronúncia do homem que não parecia nada com o arrogante que conheci mais cedo.
— O que você disse?
—Dança comigo?— Os olhos azuis que agora transmitem a mais profunda calma e o sorriso deslumbrante com uma pitada de encrenca. — Esposa.
Tenho certeza que em meu rosto se abriu o maior dos sorrisos, ele pega minha mão me levando escada abaixo, todos abriam espaço para nós levando em consideração quem éramos. Consigo me ver no espelho por um breve segundo a coroa de prata e o vestido azul, os enormes cabelos pretos ondulados que iam até a cintura. Quando chegamos no meio de todas aquelas pessoas, Ananke me puxa para o mais perto dele e sussurra em meu ouvido:
—Achei que em nosso casamento havia alcançado o apogeu da beleza, mas a cada dia tu mesma o eleva.
— Sabes que já tens meu coração!
—É uma dádiva poder compartilhar contigo uma vida.
O coração de Meraki disparava, eu podia senti-lo queimar, eles eram completamente apaixonados, um desses amores épicos que poucas pessoas no mundo tem a chance de desfrutar. Comecei a sentir o cheiro r**m, eu poderia dizer que era o cheiro da morte transpondo o momento mágico que eu evidenciava. Seguido do gosto quase metálico, minhas vistas embaçam e não sinto mais o calor das mãos de Ananke.
—O que está acontecendo?— Perguntei em um vazio que tornava a pergunta um eco sem fim.
Com o frio tomando conta de mim, sinto o vestido mais pesado e começa a ficar difícil de respirar, eu estava me afogando, sem conseguir ver em que ou como sair dali, tento com todas as forças nadar para a superfície, mas parecia em vão. Até que mãos me puxam para cima.
—Majestade, está tudo bem? — Pergunta uma mulher muito parecida com Maha.
—O que?
Eu estava em campo de batalha próximo a um rio, o tempo começa a mostrar que uma chuva estava se aproximando. Percebo não usar mais vestidos e sim uma das armaduras que estavam no quarto da Meraki, era pesada e se dividia em metal e couro em outras partes.
—Temos que ir para a nave! — Gritou Ananke. —Meraki, leve as crianças antes que a chuva desça.
O som de espadas, arco e flecha e armas de fogo me deixaram desnorteada, eu nunca estive em uma guerra, acredito que só vi alguém armado três vezes, todos eram namorados da minha mãe. Era assustador, mas eu não comandava os impulsos daquele corpo. Os olhos de Meraki instintivamente correram, para as cinco crianças e três mulheres que estavam agachadas, eles não conseguiam sair daquela posição, se não seriam mortos.
Ela pega a arma que estava em seu pé e começa a correr e a atirar em todos os alvos, ela era veloz e atirava muito bem, quando chega próximo às crianças, ela os vê chorando abraçados nas mulheres.
—Nós vamos sair daqui! Preciso que confiem em mim, vocês conseguem? Preciso que os mais corajosos segurem isso bem firme, ok? —Ela os entrega um tipo de caneta, uma para cada criança — Quando eu disser vocês vão apertar o botão de cima e correr o mais rápido possível com suas mães, tudo bem?
Eles concordam com a cabeça, ela sorri e começa tirar as partes de metal da armadura e rasga as mangas, todos inclusive eu começo a pensar que foi nesse momento que Meraki morreu. Ela se levanta e diz: —Agora!
As canetas viram escudos e as crianças e mães começaram a correr em direção a nave, mas antes que algo os atingisse, as tatuagens no corpo de Meraki começam a brilhar em um tom de azul celeste, que parece contaminar os seus olhos, era absurdamente lindo de ver, mas de sentir foi se tornando angustiante, usar aquele poder era doloroso como se o corpo inteiro dela queimasse em uma chama intensa.
Ela começa a resmungar palavras baixinho que eu não entendi, o fogo começou a transcender a pele e ela começou a levitar, eu queria sair daquele pesadelo, mas estava presa no corpo dela sentindo aquela enorme dor.
—Eu amo quando ela faz isso. —Disse o homem que era da mesma espécie que Maha.
Ela abre os olhos e começa a jogar bolas de fogo naqueles que tentavam impedir que as crianças chegassem na nave, então ela abre um portal na frente das pessoas que tentava salvar e as coloca dentro da nave. Mas, a cada portal que abria para salvar seus amigos, a dor se multiplicava, o seu coração estava quase parando e a chuva anunciada no céu estava prestes a rolar, Ananke parava as balas com a lâmina de sua espada enquanto corria para a nave. A primeira gota de chuva caiu bem em cima da lâmina afiada deixando a mancha da corrosão, ainda havia aliados espalhados pelo que se tornou um campo de batalha.
A dor daquelas gotas queimando sua pele, era quase imperceptível para ela, mas para seus amigos causava contorções.
Ela mantinha 5 portais abertos enquanto seus aliados se arrastava para dentro, seu corpo estava quase se esgotando, quando finalmente todos entraram, assim que os portais se fecharam Meraki caiu quase desfalecida, Ananke a pega no colo e a leva para dentro, as gotas da chuva ácida não tinham efeito sobre aquele homem, ou era o que ele queria que ela pensasse. A nave que causaria inveja em Han solo, porém eu não conseguia ver direito, estava deitada no colo de Ananke, minha cabeça em seus ombros, enquanto os aliados recebiam cuidados, eu me sentia confortável e sem dor apenas, anestesiada talvez aquele homem tivesse algum feitiço calmante, admito que ele seria um travesseiro perfeito, pararia todos os meus infinitos pesadelos, senti minhas pálpebras pesarem até se fecharem completamente.
Meus olhos lentamente se abrem, estava enrolada em lençóis de seda , tão confortáveis e cheirosos como pensei ser, então me dei conta que ainda estava em um planeta em outra galáxia. Em minha mente eu xinguei de um jeito que apenas brasileiros sabem xingar cada palavra bem pronunciada, mas ainda estática naquela cama deliciosa.
A senhora quer tomar café da manhã?
A mesma voz que me sussurrou sobre a porta, saltei da cama e percebi Hanná, me observando, esperando que ela tivesse escutado os xingamentos, mesmo que não fossem direcionados a ela, era a o seu planeta.
— Você que está falando na minha mente?
Ela confirma com a cabeça, eu a encaro por alguns segundos desconfiada.
Eu escutei a senhora mandando todo se …
—Ei! Bom, mas não foi por m*l, eu só não acredito que vocês existem e não são um surto da minha mente maluca — Falei colocando as mão na cintura —Vamos tomar café então?
A mesa já estava posta, as porcelanas caras que só se colocam na mesa quando vem visita, me sentei na cadeira muito delicadamente com medo de quebrar qualquer coisa, porque teria que vender todos os meus órgãos para pagar uma xícara dessas.