IV

2310 Words
Naquela mesma noite, Paulo chegou em sua casa ignorando tudo e todos seguindo diretamente para o quarto onde se trancou lá. ─ Droga! Eu não consigo tirar esses pensamentos da cabeça... como eu queria poder matar aquele desgraçado! ─ Murmurava a medida em que se andava de um lado para o outro em seu quarto, mas no momento seguinte parando rente a parede e encostando a testa contra ela, se viu fechando os olhos e arquejando enquanto seu corpo esquentava ao se lembrar de Mikael. ─ Se bem que só de pensar no Mika de toalha eu... eu me perco... e acabo... argh! ─ Exclamou socando a parede enquanto mordia o lábio inferior. ─ Mas que merda eu estou falando?! ─ Abriu os olhos se afastando da parede enquanto passava a destra sobre os fios de cabelo. ─ Mikael e eu somos amigos desde pequenos. Eu não deveria sentir isso por ele... Apenas amigos. Paulo já tenso, levou ambas as mãos até o bolso de sua calça, nada. Depois as bateu sobre a camisa e um breve frio percorreu pela espinha. ─ Ah! merda! esqueci minha blusa na casa dele. E pelo horário ele já deve estar dormindo. ─ respirou fundo umedecendo os lábios, não tinha como aliviar sua frustração com os cigarros então logo foi para a cama se deitando de forma em que seu antebraço destro repousasse sobre a face enquanto o canhoto permanecia sobre o tronco. ─ De qualquer modo, amanhã eu pego, mas tenho que evitar de ir na casa dele um pouco, pelo menos até isso passar. ─ Pensou por fim fechando os olhos tentando se concentrar no sono. [•••] No dia seguinte, eu havia me atrasado bem mais do que o normal para chegar na escola. Com muito custo teria convencido o porteiro do colégio pra que me deixasse entrar, somente teria conseguido esse feito pois o porteiro me conhecia e nunca tinha notado uma falta minha, também sendo aquela a primeira vez que me via tão atrasado. Chegando na sala, ofegante com o peito subindo e descendo a procura de fôlego, pedi licença para o professor presente e então segui para minha carteira. No caminho até ela estranhei o fato da carteira de Paulo estar vazia. Anna por sua vez parecia bem animada em me ver, e tratou logo de ir discretamente sentar-se atrás de mim cochichando: ─ Bom dia flor do dia! Paulo ainda não chegou, até pensei que estavam vindo juntos. ─ Neguei enquanto retirava da mochila o caderno e o estojo de lápis os deixando sobre a mesa. ─ Eu sai atrasado hoje, não teria como ver ele no meio do caminho. Pensei que ele já estivesse aqui. ─ Pensei que ele tivesse dormido na sua casa, pelo horário que ele mandou mensagem dizendo já estar indo te ver. ─ Soltou as palavras o elo ar enquanto fingia estar escrevendo algo no caderno, enquanto isso o professor procurava a frente de onde vinham os cochichos. ─ Sabe que não me sinto bem quando dorme mais gente lá em casa. De qualquer modo, só jogamos um pouco e ele foi embora logo depois. Anna imediatamente soltou a caneta, por mais que Mikael não pudesse ver sua feição, ela estava claramente indignada com o que Mika teria soltado. Não era como se estivessem falando do seu pai ali, e Paulo certamente jamais faria algo com ele que não fosse da sua vontade. Mas logo ela murchou. Nunca teria passado por algo assim e dava graças por isso, então não saberia como seu amigo realmente se sentia. E o trauma poderia ser maior do que ela imaginava. Lançou aqueles pensamentos fora e voltou a realidade. ─ Bom, só estranhei. Ele nunca atrasa. ─ Completou, depois disso ficando quieta na dela prestando atenção na aula que se seguia. Anna tinha razão, Paulo nunca foi o tipo de aluno que faltava atoa, e aquilo já era um motivo de preocupação. [•••] Três dias de ausência seguidos, e nenhuma visualização nas mensagens que enviavam para Paulo, nem nenhuma ligação atendida. A esse ponto, Eu e nem Anna conseguíamos mais nos concentrar nas aulas com tamanha preocupação, pensando somente no pior. ─ OI! ─ ressoou a doce voz de Anna, essa que sempre me recebia com abraços calorosos e um imenso sorriso, mas que hoje não se tinha aquela mesma empolgação embora ela tivesse se esforçado pra isso. ─ Notícias dele? ─ Ainda não. ─ Respondi tão cabisbaixo quanto ela, segurando as alças da mochila. ─ Será que aconteceu algo grave com ele? nunca foi de faltar ainda mais sem nos avisar. Ele nem visualiza as mensagens. ─ As minhas também não. Bom... ─ Antes mesmo que pudesse terminar de responde-la o professor Allex, que também passava pelo corredor nos cumprimenta, logo dizendo que precisava falar comigo depois, eu apenas respondi com um simples acenano de cabeça em confirmação. [•••] Depois daquilo não mais tocamos no assunto e seguimos tentando se doar ao máximo nas aulas. Na hora do recreio fui até a sala do professor Allex e sem querer o vi trocando de roupa, não pensei que alguém ali pudesse se trocar com a porta aberta. Instantaneamente senti as bochechas queimarem em vergonha, se já não bastasse a cena, Allex havia o notado ali e reparei em seus lábios um pequeno sorriso ladino se formar. Eu não pensei duas vezes antes de sair da frente da porta esperando ele se vestir; assim que feito ele me chamou, mas estava tão tímido que m*l pude me mover, então o mais velho veio até a porta e me puxou para dentro pedindo para que me sentasse e assim o fiz enquanto ouvi a porta sendo fechada e alguns passos se aproximando. Algo estava completamente errado naquela situação toda. Tudo bem que o mais velho quisesse conversar sobre algo com um aluno, mas qual seria a necessidade de fechar a porta para isso? Um nervosismo agora começava a tomar conta do meu corpo. ─ Você é sempre tímido assim Mikael? ─ Ele questionou em tom baixo seguindo até ao lado da mesa, apoiando o quadril na borda ao que cruzava os braços enquanto olhava em minha direção. ─ A-as vezes... ─ Respondi quase que num sussurro virando o rosto para o lado encarando o chão, ainda sentia as bochechas em chamas enquanto mantinha as minhas mãos sobre os joelhos que não paravam de tremer. Era uma sensação estranha quando estava ao seu lado ou tão próximo. Talvez fossem só coisas da minha cabeça ou nervosismo de estarem a sós naquela sala, sozinhos. ─ Acho isso tão fofo em você. ─ C-como? Desculpe senhor, eu... uh! eu não entendi. Você precisava falar comigo, certo? ― Assim que me pronunciei um tanto confuso, Allex descruzou os braços e deu um passo segurando os "braços" da cadeira onde eu estava sentado, não consegui conter um suspiro de espanto, e logo o vi se curvando levemente na minha direção. Merda, aquilo não era nada bom. Não tinha boas lembranças com coisas como aquelas e o medo somente aumentava. Tão logo o mais velho levou uma das mãos até meu rosto, segurando-me pelo queixo ao que aproximava e me roubava um selar de lábios demorado. No mesmo instante, meus olhos se arregalaram em espanto com aquela atitude inesperada da parte do professor. Minha única atitude foi de levar ambas as mãos até seu peitoral o empurrando para que se afastasse de mim. Sentia em meu peito o coração acelerar em nervosismo e desconforto com aquela situação, era praticamente a mesma sensação que sentia quando meu pai me forçava a algo. E logo comecei a ter uma espécie de crise de pânico, onde já era difícil respirar e o que mais desejava naquele momento era somente sair dali o mais rápido possível. ─ Eu preciso ir, Anna deve estar me esperando no refeitório. Eu... ─ meu nervosismo teria sido tanto que ao me levantar, teria acabado por me desequilibrar caindo ao chão. Allex por sua vez, queria rir da situação achando graça em como eu reagia aquele tipo de coisa, sem nem ao menos ter noção alguma do que se passava comigo. Mas logo se deu conta de que aquilo poderia ter sido um erro e tanto. Tentou reverter a situação se aproximando e oferecendo ajuda. ─ Vamos, deixe-me te ajudar. ─ Ainda com certo choque, instintivamente me arrastei para trás, não queria ser tocado. ─ Não me toque! ─ Gritei com o peito arquejante e os olhos lacrimejados. Como se já não bastasse a insegurança dentro de casa, agora a escola também se tornaria um pesadelo? Aquilo não podia estar realmente acontecendo, poderia? Porquê eu, porquê somente eu?! Minha cabeça começava a se perder em um turbilhão de pensamentos que me sufocavam como nunca. Com um pesar no peito, Allex notou a extrema merda que havia feito, talvez se repreendendo mentalmente por aquilo. Se aproximou me puxando para um abraço apertado tentando me acalmar de alguma forma. "Me perdoe" dizia incessantemente ao que eu mesmo relutava em ser envolto pelo mais velho. ─ Sério, me perdoe Mikael. Eu jamais faria com você algo que não quisesse. ─ O olhei incrédulo ao que escutava da boca do homem. Como não faria?, por acaso eu entrei na sala pedindo pra ser beijado?. Obviamente que não. E já não sabia mais se deveria ou não confiar nele. ─ Olha, eu gosto de você, está bem? Não como aluno e professor. Já a algum tempo. E isso foi uma péssima forma de demonstrar isso. Por favor, me perdoe. Sei que errei, não vou fazer de novo. Jamais. ─ Insistia em afirmar, contudo, não estava propício a ouvir no momento. ─ Eu quero sair daqui. Por favor. ─ Pedi já deixando algumas lágrimas rolarem pelo rosto. Não tendo muita escolha e sendo erro somente de sua parte, Allex cedeu passagem para que o me levantasse e saísse da sala. Enquanto isso, o mais velho ficou ali se lamentando pela merda que havia feito. [•••] Seguindo corredor a fora, não contive o choro e me vi obrigado a ir em direção ao banheiro masculino, me trancando em uma das cabines para melhor me acalmar. Fiquei o intervalo inteiro trancafiado ali, ignorando o fluxo de alunos que entravam e saíam. Alguns até tentavam utilizar a cabine onde eu estava, mas visto que a mesma estava trancada e sem resposta alguma da minha parte, eles desistiam. Levei um tempo até que as lágrimas parassem, e quando finalmente pararam, sai da cabine e segui até a pia onde lavei o rosto e molhei a mão levando até a nuca soltando um suspiro. E pensar que teria um horário com ele naquele dia, céus, que inferno. [•••] No caminho de volta para a sala, me deparei com Anna que pulou em minhas costas animadamente ao ver o retorno de seu amigo, que teria "sumido" de sua vista no intervalo. Mas "murchou" assim que notou algo de errado comigo. — Ei, o que houve? ─ Me segurou pelos ombros, fazendo-me olhar em seus olhos. ─ Estava... chorando, Mika? ─ Não foi nada de mais. Não se preocupe. ─ Assegurei para a mesma, que claramente não aceitava aquele tipo de resposta. Logo pensando no pior. ─ Não me diga que o loirinho te respondeu?! Mano! Ele tá vivo? Fraturou alguma coisa pelo corpo? Aí meu Deus! ─ Por um momento, um sorriso surgiu nos meus lábios ao ver Anna daquela forma. Sempre tão... ela mesma. ─ Não, Anna. Respira, vai. ─ E no mesmo instante meu semblante voltou a ficar sério ao ver Allex adentrar na sala. Anna ficou de lado observando pra onde eu olhava e levou seus mirantes esverdeados na mesma direção que a minha. Não foi preciso somar um mais um pra ter uma noção óbvia. Com aquilo teria se lembrado de que mais cedo o professor disse precisar falar comigo. E então associou com aquilo. ─ Está com notas baixas em educação física? ─ Questionou inocentemente. Mas, voltando os mirantes na direção de Anna, me recusei em responder aquilo. Somente sugeri que entrássemos logo pois as aulas iriam começar. [•••] Passei aquele horário inteiro nervoso, era estranho o fato de somente eu estar incomodado naquela sala, enquanto que o mais velho parecia agir normalmente como se nada tivesse acontecido. E enquanto ele estava ali dentro, evitei a todo custo manter contato visual, sempre voltando os mirantes para uma direção contrária, ou simplesmente focando a atenção no caderno cujas folhas permaneciam em branco, sem nenhuma anotação daquele dia. Allex por sua vez, não conseguia deixar de pensar no garoto. E constantemente se via olhando em direção a carteira dele, preocupado em como ele poderia estar se sentindo naquele momento. Céus, como ele daria de tudo pra ter se segurado mais e agido de forma diferente. Agora teria de lidar com o garoto lhe evitando. [•••] Depois de longos e tortuosos cinquenta minutos, finalmente aquele maldito horário tinha acabado. E agora eu podia respirar em paz, embora ainda me sentisse desconfortável. Nos dois últimos horários, minha atenção teria voltado para as matérias com mais facilidade, já que não tinha a presença do professor Allex ali. Então foram bem mais rápidos e "fáceis de se engolir". Com o sinal indicando o término das aulas naquele dia não me dispus em demorar a juntar todos os materiais o mais rápido que conseguia, para finalmente sair daquele lugar. Não queria arriscar ser encontrado e parado pelo professor pelos corredores a fora depois do que havia ocorrido. Somente me lembrei de despedir rapidamente de Anna, inventando qualquer tarefa inadiável para estar tão apressado, jurando que mandaria mensagem assim que chegasse em casa. E então corri. [•••]
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD