Salvador
Custei a por, Célia Maria Cândido Andrade, a dormir novamente. Mas graças a minha desenvoltura como pai amoroso, consegui driblar a ferinha.
Celinha não podia ser despertada fora do seu habitual horário noturno, caso ao contrário ficava com pavor. Seu modo de despertar foi acostumado a abrir lentamente as persianas do seu imenso quarto infantil. A primeira coisa que vê ao abrir os olhos é a foto de sua mãe na cabeceira a sua direita, com mais duas empregadas para ajudá-la a se banhar, secar, vestir e arrumar os lindos cabelos encaracolados, meio aloirados. Semelhante a Deise. Celinha se parecia cada dia mais com sua mãe.
Deise faleceu com as complicações do parto, e a minha filha sabia desse ocorrido. Não tinha como esconder, claro, que falei de uma maneira suave como foi a sua morte. E hoje em dia fala tranquilamente sobre o ocorrido, assustando muita gente adulta por passar uma imagem fria e morbida diante da morte.
Tratada por uma doce psicóloga, que parecia aguentar a menina quando chegava os momentos de depressão infantil, pois a minha filha chegou a cogitar que eu me casasse de novo. Isso foi a um ano atrás, e pôs na cabeça que ela escolheria a mulher certa, porque seu grande objetivo era ter um irmão de uma mulher saudável para por no mundo uma criança e não ser preciso ir embora por causa disso.
Me sentia culpado por ter falado toda a verdade, embora a doutora orientar-me que essa foi a melhor solução. Celinha fazia muitas perguntas sobre a época que estava na barriga de sua mãe, e só tínhamos aquela foto, de aspecto mais saudável. Escondi as demais fotografias para não assustar a pobre criança.
Dos seis meses em diante, Deise lutou pela filha. Se deteriorando devagar, ficando desgastante para minha esposa.
Sai do quarto deixando uma luminária ainda acessa.
No corredor aproveitei para ligar para a minha advogada.
— Alô... que bom que me ligou Salvador. Pensou na minha proposta?
Sua voz saiu vitoriosa.
Quanta petulância de sua parte!
— Pensei sim, e já resolvi o problema.
— Hum... quer vim comemorar no meu apartamento? Estou usando uma camisola super sexy.
— De jeito nenhum Joice, apenas prepare a papelada do contrato de casamento. Vou te passar o fax com as instruções. E por favor, faça sem me questionar!
— Pelo jeito não sou eu a felizarda, ok. Contanto que você me dê uma nova oportunidade de te mostrar que posso ser muito mais útil do que você pensa.
— Sei o quer, e não estou com cabeça para pensar em sex.o. Vidas depende desse empréstimo, da sociedade juntando as empresas; alimentícia e ferroviária. Nada a ver, mas não me interessa se combina ou não, só almejo sair da lama. Portanto, acelere a papelada, amanhã venha no jantar aqui em casa, vou te apresentar a moça contratada.
Fui pro meu aposento, desejando tomar um longo banho relaxante.
— Interessante... Por acaso passou a madrugada toda perambulando pelas ruas cariocas, pegando a primeira p**a que se encaixasse no perfil? Não creio que tenha se rebaixado a ralé. Não levei a sério o que me disse mais cedo.
— Não importa, como minha advogada, sendo muito bem paga para executar os meus comandos, limite-se a fazer como lhe foi instruído!
Desliguei o aparelho, e o joguei na cama. Puto, por querer bancar a espertalhona comigo.
Arranquei os sapatos, bufando e reclamando sozinho. Após remover as roupas partir para um ducha.
***
Deitei na cama de roupão, igual o que a Adriana usava. O modelo é exclusivo, carrega o brasão da minha família.
Durante os meus pensamentos de organização para os próximos passos, a imagem da ex-prostituta ganhou destaque em minha mente. Queria apagar ela vindo toda feliz, cantando uma música animada de funk, rebolando ao som desse linguajar indecente.
Não conhecia esse tipo de melodia, mas já ouvi por alto uma das empregadas da imensa propriedade deixar o som tocando em dia de faxina geral. "Deixa baixo... deixa baixo"
Aquela cabeleira, ainda úmida, pingando, soltos, descendo em cascatas. Adriana tem cabelo castanho, lisos. Os fios chegam um pouco abaixo dos ombros. Os olhos de uma gata siamesa, embora não ter a cor azul. Cílios alongados, sobrancelha feita naturalmente. Na pinça. Sabia perfeitamente a maneira feminina de ser cuidar, apreciava cautelosamente seus esforços para se manterem mais belas. Claro, sem muito exagero. Por isso estranhei aquela peruca ruiva da cabeça dela, sabia que não era natural, não combinava com ela.
Amava apreciar minha Deise, uma pena temos descoberto seu problema de coração durante a gestação, e não antes de tentarmos ter filhos. Teria evitado uma gravidez, o foco principal seria cuidar da sua saúde. Mas o destino não quis assim.
Tenho sorte de ter Celinha, embora através dela tenha perdido o meu grande amor.
Segundo o obstetra ela teve um colapso, o organismo inteiro não acompanhou o indivíduo estranho em seu corpo tão debilitado. Ou seja, tarde demais para possíveis tratamentos, e a bendita cura. Se tivesse uma, com a medicina avançada. Poderíamos ter tido esperança.
Contudo, depois do sexto mês, a cada mês que se passava era mortificante pra ela. Passamos mais no hospital do que nossa casa.
Virei para o lado, me sentindo esquisito por dentro por ter uma nova mulher dentro do mesmo lar onde iriamos construir uma família. Me casar de novo era como trair sua memória, todavia, não podia ser injusto, egoístas, com as demais pessoas que dependiam da empresa para dar de comer as suas famílias. Sou responsável por eles, por muitas vidas, aprendi a ser como o meu avô. Já o meu pai, só me ensinou o que nunca iria querer ser quando crescesse.
Sinto, que Adriana não vai me dar problemas, paguei uma boa grana para tirar ela daquela vida miserável, porém dar liberdade para a moça sair quando lhe der vontade, não estava nos meus planos. Minha confiança tinha um certo limite.
Pesquisei sua ficha inteira enquanto estava lá tomando seu banho, aproveitando a mordomia. Não sou nenhum o****o.
Adriana é solteira, sua mãe é doente dos pulmões, possivelmente esteja com câncer, mas não aceita, ou não tem dinheiro pra se cuidar em casa. Caso de internação. O padrasto cadeirante, que só sabe beber e gastar o dinheiro da companheira em mais bebidas.
A moça era a única provedora, usando seu corpo desde que entrou na maior idade. Tem vinte e cinco anos, e com toda certeza era mais rodada do que eu. Não a julgo, apenas fiquei pensativo. Pensando na quantidade de homens que teve que servir para por o pão na mesa. Nostalgicamente olhei a foto da minha amada, no dia do nosso casamento. O seu sorriso era contagiante.
Aos poucos fui deixando me levar pelo cansaço desse dia, achar uma esposa de fachada era mais complicado do que encontrar uma de verdade.
Adormeci sonhando com a minha Deise.