Melancolia na despedida

1645 Words
            Ficaram abraçados mais alguns minutos, até Marianna perceber que não poderia mais procrastinar. Saltou da cama e foi para o banheiro, onde tomou uma ducha rápida e arrumou a maquiagem, pensou na roupa, e lembrou que havia subido com a bolsa, vestiu um roupão e foi buscar na sala, ela nem mesmo tinha reparado que aquele apartamento era tão grande e tão bem decorado. Tudo tinha um estilo rustico que lembrava muito de Lemos: couros e madeiras nobres, algumas plantas verdes e muitos livros. - Ai está você – ele sorriu por trás da bancada da cozinha americana – não tem muitas opções, então fiz torradas de queijo e café... - Eu vou me vestir... - Não – ele foi ao encontro dela – a gente toma café e depois você se veste, quero guardar esse momento, você, de roupão, o sol nascendo no fundo – ele riu e enfiou um morango na boca dela – você não faz ideia do quanto eu sonhei com esse momento e agora, ele ainda parece melhor do que a própria expectativa...             Ela não sabia o que dizer. Era notório que ele a desejava há tempos, mas ele nunca havia percebido o quanto ele poderia ser romântico e dedicado. Tomaram café da manhã sem muita conversa, Lemos sorria com os olhos, estava extasiado. Quando terminaram, Marianna vestiu um vestido leve de cashmere preto e meias calças, o sapato e o casaco da noite anterior, e não pode deixar de notar uma certa melancolia na despedida, ele pediu que ela telefonasse assim que estivesse disponível, e ela prometeu o fazer, mesmo sabendo que ele se apresentaria no CT às duas da tarde para um jogo no outro dia.             O caminho do prédio de Lemos até o centro, onde era o consultório de sua terapeuta foi tranquilo para um sábado e logo Marianna entrava na sala e afundava-se no sofá depois de dizer um apressado “bom dia”. - E então? – Lorena questionava – Como foi sua semana. - Ah, tudo bem – ela ironizou – eu chorei no ombro do meu estagiário, no ombro do meu sócio, apaguei de novo, chorei no ombro do meu ex amor da adolescência... Não, não chorei, só vomitei meus problemas conjugais em cima dele, e ai eu bebi muito, e transei com um menino... - Calma – Lorena suspirou – vamos por partes... Menino? - Sim, ele tem vinte e dois. - Não é um menino – Lorena respondeu na hora – essa diferença de idade está te incomodando? - Muito, são doze anos... - Não é nada... O Pedro e você tinham... - Era diferente. - Porque? – Lorena a encarou – Não se cobra tanto, Marianna. - Tudo bem – ela suspirou. - O que está te incomodando?             Logo Marianna despejou um lote de angustias e culpas, e o que era uma sessão de uma hora, virou uma hora e quarenta minutos. No final, ela sentia-se um pouco melhor. Eram quase onze horas. Entrou na Dodge e encarou a imagem no espelho retrovisor... Pegou o celular: chamadas perdidas de Henrique, Vicente... Ignorou todas a enviou uma mensagem para Lemos “estou liberada” foi tudo o que escreveu, quando pensar em girar a chave e dar partida, Lemos telefonava: - Oi – ela disse apressada, sem deixar de sorrir. - E aí, quais são os planos? – ele perguntou - Eu estava pensando em descer pra Fronteira logo depois da terapia... - Fica comigo até a hora de eu ir pro CT? – ele foi bem direto. - Não enjoou de mim ainda? – ela riu. - Não acredito que isso seja possível. - Preciso ir para casa – ela lembrou da zona de guerra que era o apartamento. - E isso é você me dispensando ou me chamando pra ir para lá com você? - Uhm... – ela suspirou – opção dois – ela merecia ser feliz. - Estou lá em dez minutos. - Até logo.             Deu partida e dirigiu apressada, chegou, tirou os sapatos e subiu correndo somente de meias as escadas. Dona Ruth do apartamento de baixo, sempre ranzinza e briguenta, sorriu ao ver Marianna subindo, fazendo-a sorrir de volta enquanto pensava “será que a velhinha só queria que eu fosse t*****r?”. Assim que entrou no apartamento começou a separar roupas sujas e colocar dentro da máquina, recolher lixos e jogar pelo duto no corredor e ainda, arrumar a cama rapidamente. O interfone tocou em seguida e ela abriu a porta já vestindo calças de pijama e uma blusa de cotton preta justa.             Novamente nenhuma palavra foi dita. Lemos se ateve a segura-la com firmeza pela cintura e beija-la com delicadeza e desejo. Logo estavam aninhados um ao outro no sofá da sala., não falaram muito, pediram um almoço e aproveitaram juntos o pouco tempo que tinham até a apresentação dele no CT. Marianna ponderou em silêncio, assim que ele saiu, se iria para a fronteira ou não, e acabou decidindo por encarar quatro horas e meia de viagem para tentar resolver tudo com o ex marido antes do retorno das crianças.             Chegou perto das oito horas da noite, sem reserva de hotel, sem querer ir para a casa que dividira com o ex e sem querer ir para a casa dos pais. Parou a Dodge em frente do chalé e respirou fundo: sabia que Pedro estava em casa, o carro estava na garagem. Tomo coragem e tocou a campainha. Logo a porta se abriu e o ex marido apareceu vestindo calças de pijama e sem camisa, apesar do frio.  - Porque não usou a chave? – ele perguntou intrigado. - Eu não moro mais aqui e não queria... - Ah, Marianna – ele disse assim que ela passou pelo vão da porta, tinha a intenção de abraça-la, mas ela foi mais rápida do que ele. - Eu vim buscar as minhas coisas – ela disse rapidamente. - Pode ficar aqui se quiser – ele disse sem esperanças – eu tinha compromisso... - Vai dormir fora? – ela questionou. - Sim – ele suspirou. - Tudo bem, eu vou embora antes das nove horas. - Não íamos almoçar juntos? – ele a encarou sério. - Não estou no clima, Pedro. - A gente vai ter que conviver, Marianna. - E eu sei disso – ela respondeu inquieta – pelas crianças, e bem, as crianças não estão. - Você venceu – ele aplaudiu – vai buscar as meninas no aeroporto? - Sim – ela suspirou – eu vou. Vamos passar a semana na capital e viemos no fim de semana novamente, para pegar as coisas delas. - Marianna, não precisa ser assim... – ele parecia suplicar. - Então, o que você sugere? - Tira essa ideia da cabeça, a gente sempre deu tão certo... - Pedro, você tá maluco? Como demos certo, com você me traindo... - Você me deixava sozinho, p***a! – ele gritou – A p***a da semana toda, Marianna, trabalhando... - Mentira – ela gritou – eu viajava a trabalho, sim, mas por dois ou três dias, eu sempre estive perto e nós dois concordamos com isso, Pedro. - Ah, como se eu tivesse tido alguma escolha... - Seu caso com a Amanda começou antes, bem antes, e você sabe. - Eu termino com ela, sabe que eu amo você... - E o seu filho? Você ignora ele também? – ela gritava furiosa já subindo as escadas – Deixa de ser frouxo, assume logo a merda toda que você fez, assume, simples – ela virou-se para ele – pega a p***a do telefone, liga para a sua mãe e conta que estamos nos separando e que você emprenhou uma v***a qualquer... - Marianna – ele agora parecia chocado. - Não, não fique surpreso... Pensou em esconder da vovó que ela ganharia mais um netinho? – Marianna se dava muito bem com a sogra – Inclusive, resolve essa merda agora, sua mãe me ligou a semana toda para saber o que estava havendo...             Ela simplesmente deu as costas ao ex marido e foi para a sua suíte onde ficou encarando as paredes por um tempo: como Pedro podia pensar que esse tipo de coisa se resolveria com o tempo... Em poucos minutos ele batia na porta do quarto, que estava aberta, com duas cervejas na mão. - Tudo bem – ele suspirou – eu sou um merda – esticou uma das garrafas abertas para ela – você tem razão, não tem como consertar a merda que eu fiz... – ele sentou-se ao lado dela – sinto muito. - Não – ela respondeu – você não sente – ela deu um gole em sua garrafa – mas f**a-se. Não tenho tempo para remoer as coisas, sejamos adultos. - Eu não insisto mais, prometo – ele a abraçou – não queria que as coisas terminassem assim... - Não piora as coisas – ela desvencilhou-se do abraço – o acordo do divórcio tá na mesa de jantar. - Certo – ele suspirou – não quero ler. - Adianto: eu fico com a cobertura que comprei e a Future, deixo a casa aqui, deixo o apartamento da Santana, deixo as terras, os carros, fico só com a Dodge... Somando, dá mais da metade, para você, mas você abre mão das cotas... - Tudo bem – ele suspirou. - Fácil assim? – ela o encarou. - Eu nem queria o apartamento, mas vou precisar usar para ver as meninas. - Vou deixar a mobília então. - Obrigada – ele sorriu – vou deixar você em paz.             Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, ele saiu pela porta e logo ela percebeu que ele estava saindo de casa. Encarou o vazio da suíte e Budweiser, o Golden Retriver que parecia confuso: - Seu grande bobalhão... – ela abraçou o cão – logo vai estar de casa nova também. 
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