No dia seguinte, com o problema resolvido, Rodrigo foi à casa de seus pais para conversar com seu irmão, embora nunca fizesse isso.
— Posso entrar? — perguntou a Bruno, depois de bater na porta.
— Claro! Nossa... entra aí. — Bruno respondeu, surpreso com a visita inesperada.
— Vim te agradecer pessoalmente. O cara foi lá ontem e resolveu o problema em minutos. Se não fosse você, valeu mesmo, brother. — abraçou o irmão meio sem jeito.
— Que isso, Rô. — ele falou. — O Zilinski é bom, né? É um dos melhores... não te falei, porque se ele não fosse você ficaria frustrado. Mas todo mundo dizia que ele era um gênio na faculdade. Faz tempo que não vejo ele. — continuou, depois do abraço.
— Vocês eram da mesma sala?
— Não. Ele entrou depois. Deve ser uns dois anos mais novo que eu. Ele entrou bem cedo na faculdade... É mais novo que a Erica até... — Bruno dizia, sentado na cadeira da escrivaninha do quarto, virado para Rodrigo que, sentado na cama, o ouvia atentamente.
— Nossa... ele é novinho mesmo, então! — exclamou, impressionado.
— Ele é.
— E você? Como tá o trabalho? Tá gostando? — perguntou Rodrigo.
— Tô... tá bem legal. Sem muita emoção.
— Você sabe que se quiser pode trabalhar lá na empresa, né? — o advogado lembrou ao irmão.
— Sei... valeu, cara... Mas prefiro ir mais pra minha área mesmo.
— Ofereci emprego pro seu amigo. — Rodrigo entrava aos poucos no assunto que queria.
— Pro Andrei?? — Bruno gargalhou. — Ele não vai aceitar!
— Por quê? — Rodrigo franziu a testa.
— Duvido que aceite. Ele pode ganhar muito mais dinheiro de muitas outras formas que você nem tem ideia.
— Eu tenho, sim. — ele afirmou, um louco ofendido. Por que, afinal, todo mundo achava que ele era um i****a?
— Tá. — Bruno duvidou, com uma leve ironia. E Rodrigo ficou lá, sendo motivo de piada de seu irmão mais novo.
Na mesma semana dois moleques resolveram fazê-lo de bobo. Mas ele decidiu que não reclamaria, já que seu problema havia sido resolvido.
— Vou embora daqui, pra você parar de rir da minha cara. — falou em tom de brincadeira.
Rodrigo e Bruno cresceram em lares privilegiados. Estudaram em boas escolas particulares. Moraram em boas residências, puderam viajar para fora do país ainda na adolescência. Embora não fossem milionários, sempre tiveram uma vida tranquila. Foi fácil para ambos ingressarem em universidades públicas.
Com Andrei e Erica foi diferente. Não eram irmãos. Conheceram-se na faculdade. Ao contrário dos irmãos Moretti, sempre estudaram em escolas públicas e tinham em comum o gosto pelas disciplinas de exatas. Logo fizeram amizade, apesar da personalidade e temperamento diferentes, e montaram um grupo de ativismo hacker antifascista que cresceu mais do imaginavam. Não em número de integrantes, mas em operações. Ao todo eram dez pessoas, que se encontravam pessoalmente pouquíssimas vezes. Eram 4 mulheres e 6 homens. Eles gostariam que fosse o contrário, mas foi o que conseguiram.
E foi Bruno quem fez essas histórias se cruzarem. Bruno estudou Tecnologia da Informação na mesma faculdade que Andrei e Erica. Ele nunca fez parte do grupo deles, mas era considerado um cara legal. Embora de realidades diferentes, nunca foi visto como um playboy. Bruno era simples. Se tivessem estudado com Rodrigo teriam, possivelmente, outra impressão. Mas ele tinha feito Direito, e era bem mais velho. Neste ponto da história, Erica e Bruno têm 25 anos, Andrei 23 e Rodrigo 37. É fácil ser sócio de uma empresa quando se tem um incentivo inicial vindo dos pais. Ou melhor, da mãe. O pai, no caso, já era falecido.
De qualquer forma, Rodrigo precisava trabalhar para manter o padrão de vida. Não queria morar com a mãe para sempre. Já não morava fazia tempo. Se não fosse sócio de Antônio trabalharia como advogado de qualquer outra forma, contratado em alguma empresa, provavelmente. Ele gostava de trabalhar. Apesar de privilegiado, não era um cara encostado. Era um homem bonito, tinha uma certa vaidade, e por trabalhar de terno ficava ainda mais elegante. Tinha uma beleza normal de gente com dinheiro. Bruno era mais bonito. Rodrigo era charmoso. Tinha aquele charme misterioso clichê. Não era um homem arrogante como poderiam pensar. Parecia frio e distante para muitos. Era sério, às vezes sombrio. Mas não era rude com as pessoas. Tratava todos com educação. Era incisivo quando advogava, dono de uma firmeza quase libidinosa quando num tribunal.
Dois dias depois da visita de Andrei, reinava o que se podia chamar de paz no escritório. A rotina corria normalmente quando Rodrigo recebeu uma ligação no celular, de um número privado.
— Alô.
— Se eu aceitar o emprego posso trabalhar de camiseta? Ou tenho que me vestir como você? — dizia a voz do outro lado. Uma voz calma e segura.
— Quem é? — Rodrigo estranhou.
— Já esqueceu que me ofereceu emprego, senhor Moretti? — Andrei dizia com leveza.
— Como tem meu número pessoal se eu não te dei?
— Não preciso que me dê. — disse com um sorriso tímido. — Mas não se preocupe que foi só isso que procurei sobre você.
— Então? — objetivo, Andrei queria uma resposta.
— Sim. Você pode trabalhar de camiseta. — falou Rodrigo, sorrindo. — Mais alguma exigência? — ironizou, sem tirar o sorriso dos lábios.
— Sim.
— É sério?! — indagou, espantado com a audácia do garoto.
— Não é exigência. Só uma pergunta... se eu aceitar, posso trabalhar com fones de ouvido?
— Sim. Sem problemas.
— De calça jeans? Por que advogados usam ternos e tal...
— Com a roupa que quiser. — Rodrigo tinha o sorriso tatuado no rosto.
— Ah. E posso trabalhar com aquelas três pessoas?
— Sim. Pode até ser chefe deles...
— Não!! Não quero ser chefe de ninguém! — disse, extremamente enfático.
— Tudo bem. — Rodrigo se assustou. — Não vai ser chefe.
— Então eu aceito. Quando eu começo?
— Pode ser amanhã? — o advogado estava incrédulo por ter conseguido contratar alguém tão bom, a despeito do deboche de seu irmão.
— Pode, sim. Que horas?
— Entramos às oito horas.
— Posso entrar às nove?
— Claro. — disse Rodrigo, rindo. Afinal, o tal geniozinho tinha aceitado o emprego e aquilo ainda soava como um troféu.