Olivia Fernandes
— Planeja se esconder aqui por todo o período? — A voz de Lucas parecia distante, mesmo estando ao meu lado. Eu ainda estava perdida nos meus pensamentos, tentando processar tudo.
Por um instante, senti-me aliviada por não precisar me envergonhar perto dele. Com Lucas, eu podia respirar, sem o medo de ser julgada. Ele era meu porto seguro, mas não para todos os meus segredos.
Cheguei para o lado no banco do parque, abrindo espaço, e Lucas se acomodou ao meu lado. Ficamos em silêncio, o peso desse silêncio se acumulando entre nós, até que ele decidiu quebrá-lo.
— Vamos descobrir quem fez isso, Liv — disse ele, sua voz acolhedora atingindo algo dentro de mim. Por um segundo, quis desabar. O peso que eu carregava já me sufocava como há anos não acontecia, a última vez que me senti assim foi em casa, com a minha família.
— Não precisa se envolver nisso, Lucas — respondi, segurando o choro que parecia rasgar minha garganta. Passei a mão pelos cabelos, colocando-os atrás da orelha, enquanto observava as crianças brincando à minha frente, o céu azul e bonito daquele dia de primavera. — Temos que continuar com nossas vidas. A faculdade não vai esperar eu me recuperar de mais um trauma.
Ele apenas assentiu, já conhecendo o quanto eu era dura comigo mesma.
— Então está pronta para voltar? — Ele se levantou, estendendo a mão para mim. — Temos prova depois do fim de semana, e não quero que as coisas piorem ainda mais.
Soltei uma risada sem graça, lembrando que tinha esquecido de algo tão importante.
— Vamos voltar — disse, segurando sua mão enquanto nos dirigíamos de volta ao campus.
Eu sempre pensava demais. Sobre tudo e qualquer coisa que me perturbava. Isso me impedia de focar no presente, mas, ao mesmo tempo, essa intensidade de pensamento me dava uma vantagem em resolver certos problemas. E o vazamento das minhas fotos não seria diferente.
Eu era uma anônima na faculdade. Poucos me conheciam, e a maioria deles eram amigos de Lucas. Eu podia me distanciar de tudo isso. Já tinha passado por algo semelhante. Não exatamente assim, porque agora eu tinha vaidade. Mas já fui alvo de piadas, cochichos e olhares maldosos durante grande parte da minha vida.
Isso seria só mais uma fase r**m, e eu decidi que não deixaria esse assunto consumir minha mente. Ao menos nisso eu me sentia segura, o oposto do que sentia em relação a Lucas.
E Dante.
“Não me procure, não podemos continuar com isso.” Foi a mensagem curta e evasiva que enviei para ele.
Segurei o celular com tanta força que meus dedos suavam. Caminhando de volta para o campus ao lado do meu melhor amigo, me perguntava quanto tempo conseguiria guardar esse segredo dele. Mas o que me surpreendeu foi a ausência de qualquer resposta de Dante. Nenhum protesto, nenhuma pergunta. Nada.
Ele parecia ter aceitado minha decisão, e, de algum modo, isso me incomodava. Era como uma etiqueta m*l cortada numa roupa, me fazendo me revirar, procurando o porquê daquilo me irritar tanto. Um homem respeitar minha decisão deveria ser o mínimo. Mas eu queria mais? O desejo por ele ainda estava ali, pulsante.
Eu não confiava mais nas minhas próprias decisões. Estava corrompida, e tudo isso por causa dele.
[...]
Quando chegamos ao dormitório, Natália estava dormindo, provavelmente consequência de mais uma das noites de farra que ela nem se lembraria no dia seguinte.
Lucas se acomodou na minha cama de solteiro enquanto eu buscava alguns livros para irmos até o apartamento dele estudar, como fazíamos desde que nos conhecemos. A praticidade de ser perto do campus facilitava tudo.
Ele preferia morar sozinho, em vez de dividir um quarto coletivo. Mais privacidade.
— Será que ela está viva? — perguntou, apontando para Natália, que estava jogada na cama. Ele se levantou e pegou um espelho pequeno para verificar se ela ainda respirava.
— Não seja i****a, Lucas — tentei segurar o riso, mas falhei no instante em que Natália quase acordou e ele deu um pulo, assustado.
— Vai acordá-la! — Ele correu em minha direção, tentando me fazer parar de rir. — Pelo amor de Deus, acho que ela me daria um soco e me apagaria, aí eu que ia ficar no lugar dela.
Ele se aproximou, tentando me fazer parar, usando o dedo para cutucar minhas costelas. Eu m*l conseguia me mexer, com ele tão próximo de mim. E então, de repente, ele parou. O sorriso largo que exibia se desfez aos poucos, como se ele também tivesse percebido que aquilo era diferente para nós dois.
Meu coração começou a acelerar, frustrando-me ao perceber que nem mesmo o que aconteceu na noite passada havia sido suficiente para apagar o que eu sentia por Lucas. Era como se, agora, eu estivesse dividida entre dois homens, e essa sensação não era nada agradável.
— Vai querer ficar aqui com ela ou o quê? — brinquei, sussurrando e apontando para Natália, que já começava a roncar.
Tentei disfarçar aquele peso incômodo que se instalou entre nós.
Saímos de bicicleta, como fazíamos habitualmente, até o prédio onde Lucas morava. Ele chamava seu apartamento de “mini”, mas, para mim, era mais do que suficiente.
— Já conseguiu uma cama que passa pela porta? — zombei, genuinamente curiosa.
— Consegui. Agora preciso de uma quando a Luara vier. — Ele respondeu, como se fosse a coisa mais natural do mundo, até perceber que nunca havia mencionado isso para mim. — Sobre isso… vou te explicar melhor durante o jantar.
— Jantar? — perguntei, confusa, enquanto subíamos as escadas intermináveis até o quinto andar. O prédio era tão velho que nem elevador tinha. Nunca entendi por que ele decidiu morar ali, considerando que tinha dinheiro o suficiente para viver em um lugar melhor.
— Sim, jantar — disse ele, ofegante, parando na frente da porta do apartamento. — Mademoiselle — brincou, esticando o braço para que eu passasse.
Soltei uma risada exagerada, como sempre fazia com as piadas bobas de Lucas. Mas, no momento em que dei o primeiro passo dentro do apartamento, me deparei com uma figura que não imaginava encontrar tão cedo.
E, quando nossos olhares se cruzaram, todo o ar pareceu sumir, assim como da primeira vez que o vi.