O dia amanheceu azul claro, sem nem mesmo uma nuvem no céu: aquele era o céu que Sophie sempre havia imaginado que veria no dia de seu casamento. Lóren estava sendo incrível, andando de um lado para o outro para conferir se tudo – absolutamente tudo – estava na mais perfeita conformidade: aquela era a irmã mais nova, sempre disposta a tudo para ver Sophie feliz e realizada.
O vestido escolhido por Sophie era simples e delicado: rendas nobres, sem brilhos e sem bordados, decote canoa, mangas longas estilo flare, saia ajustada nos quadris longa, com uma cauda curta. Casou-se calçando botinas, o que rendeu boas risadas e a certeza de que ela ainda estava no comando das coisas.
Vicente ficou longe: não conseguia ver ela de perto, linda daquele jeito... Os cabelos longos e acobreados estavam trançados, pequenas flores do campo pontuavam aquela trança, e ele bem lembrava-se quando era ele quem lhe enfeitava a trança com pequenas flores que colhia pelo caminho entre a parada do ônibus e a casa, quando ela era ainda uma garotinha.
Ela parecia tão segura de si e decidida, ao lado daquele b***a mole que era o noivo, que Vicente nem mesmo sabia como agir. Queria correr até o altar improvisado, pega-la pela cintura, e beija-la como sempre havia sonhado e depois, ignorando aquele bando de gente b****a que ele bem sabia que ela detestava, em sua grande maioria, carrega-la na garupa de sua moto e sumir no mundo.
Pouco importava se o filho que ela carregava era de outro: ele faria qualquer coisa para ter ela ao seu lado, e enquanto a cerimônia acontecia, ele fantasiou ao menos dez formas de tirar ela dali: mas não conseguiu. Pois quando ele finalmente tomou coragem para fazer alguma coisa, ela virou-se para o marido, e o encarou de longe, e ele conhecia aquele olhar, o olhar de quem implora para quele não faça nada: ele o vira tantas vezes, quando ela tentava esconder as travessuras do pai ou da mãe, que ele reconheceria aquele olhar à léguas de distância. Ele simplesmente deu às costas e foi sentar-se em um canto, não precisava continuar se torturando com aquilo.
- Linda festa – Inácio Ottero aproximou-se para cumprimentá-la assim que foi possível – e você – ele sorri sem jeito – você sempre foi linda, mas acredito que hoje a palavra certa seja deslumbrante.
- Obrigada, Inácio – ela responde num sorriso.
- Eu sempre soube que se casaria aqui – ele enfia as mãos nos bolsos – só pensei que o noivo seria outro.
- Inácio, eu... – ela diz sem jeito.
- Não – ele ri – eu nunca tive essa pretensão toda – ele ri.
- E com quem pensou que eu fosse me casar, Inácio? – ela pergunta rindo, mas sabia da resposta.
- Com o Vicente – ele ri – eu sempre achei que ele voltaria, e que você confessaria o seu amor, como naqueles seus livros bobos, e ele confessaria que a amou em segredo por anos e no fim, você dois acabariam se casando aqui.
- Você é um romântico incorrigível – ela disse rindo alto.
- Vocês dois chegaram a conversar? – ele pergunta.
- Sim, conversamos um pouco... – ela responde.
- E ele não confessou seus sentimentos mais profundos? – o amigo brinca, mesmo depois do fim do relacionamento, os dois mantiveram-se amigos.
- Não – ela suspira – você sabe que não, nunca foi recíproco.
- Mas ainda sente algo por ele? – ele questiona, mesmo depois de todos esses anos, uma parte de Inácio não aceita o interesse de Sophie pelo peão.
- Acho que eu nunca deixarei de sentir, se quer saber – ela suspira – eu acho que isso é uma coisa que eu vou levar comigo, para todo o sempre, entende?
- Sim – o outro sorri – eu entendo – mas o olhar de Inácio está longe, longe demais de Sophie, está na mesa onde está o seu pai com alguns outros convidados – eu só não entendo porque está se casando.
- Porque eu estou esperando um filho do Gonzalo – ela diz sem rodeios – e eu quero que esse bebê cresça com o seu pai, sua mãe... Você sabe.
- Sim – Gonzalo responde – eu sei sim, acho que está fazendo o que é certo.
- Eu espero que eu realmente esteja – ela diz, e logo afasta-se de Inácio.
Sophie retorna para perto do noivo que, apesar de ter se mostrado resistente no início, quanto à ideia de casar-se na Fazenda, parecia tão feliz quanto ela:
- Está feliz, minha querida? – ele pergunta.
- Sim – ela responde suspirando – eu estou muito feliz, meu querido esposo... – ela enfatiza a palavra esposo fazendo-o sorri - E você?
- Eu estou feliz, porque eu estou com você – ele a beija – porque eu casei com a mulher da minha vida e porque ela está carregando o melhor presente que eu poderia ter recebido na minha vida toda. Eu amo você.
- Eu também amo você – ela responde, e sim, ela o amava, de uma forma diferente, mas o amava.
O jantar foi servido e todos os convidados pareciam satisfeitos e felizes: a família da mãe que havia vindo de longe, a parabenizava constantemente e as primas – com quem ela pouco convivera – estavam felizes em vê-la casando-se, pois era uma das mais velhas, o que significava que em breve, poderiam casar-se também: algumas regras ainda eram mantidas no interior.
Passavam das onze da noite, os casais começavam a ensaiar uma dança pela pista improvisada no galpão quando Vicente percebeu que não tinha mias nada para fazer ali e decide ir embora, tão logo consiga parabenizar a noiva. O que por fim consegue fazer, e por sorte ela está sozinha.
- Está linda – ele diz aproximando-se dela sorrindo – você está linda, essa festa está linda...
- Obrigada – ela sorri e o abraça – obrigada por ter aparecido, por ter ficado, foi importante para mim.
- Eu sei que foi – ele suspira lembrando-se do olhar dela enquanto estava no altar – eu só não sei se esse era o desfecho que eu havia imaginado para a sua vida – ele riu – enfim, que seja muito, muito feliz no seu casamento, na sua vida toda...
- Obrigada – ela agradece emocionada, no fundo, ela sabe que aquilo é uma dolorosa despedida, algo que ela havia evitado da última vez que partira.
- Eu preciso ir – ele diz sem jeito – deixa meus parabéns para a Lô, a festa está linda demais.
- Tão cedo? – ela questiona.
- Sim – ele responde – tenho uns negócios para resolver, enfim, foi maravilhoso te ver, conhecer o cara de sorte e tudo mais.
E assim ele despede-se dela, finalizando seu discurso com o dolorido “se cuida” que se diz, quando tudo o que queremos é cuidar, nós mesmos, do outro. Sophie fica imóvel na ponta da pista de dança, observando ao longe o homem da sua vida indo embora. E ela sabia que provavelmente, nunca mais o veria.