Capitulo 2

5000 Words
A Alice foi gerada em uma noite de amor que tive com o Ricardo. Ele era amigo de um antigo namorado da minha melhor amiga, Estela. Foi, em uma festa na casa dela, que eu o conheci. Ele era alto, loiro, forte e tinha os olhos verde-esmeralda. Ele era sedutor, sabia seduzir qualquer menina. Tinha um tom de voz que qualquer um reconheceria de longe. Depois que nos conhecemos, ele passou a me ligar todos os dias para me desejar boa noite, além de ir me ver sempre no final da aula. Antes do Sr. Colis me buscar na escola, ele já estava me esperando no outro portão, nos beijávamos, jurávamos amor eterno e eu corria ao encontro do Sr. Colis sem deixar nenhuma pista daquele amor escondido. Eu não poderia namorar até completar vinte anos, era proibido sob pena de perder privilégios e, principalmente, a confiança dos meus pais que me deixavam viver com liberdade na minha pequena cidade. Ele foi minha primeira paixão, chamava-me de morena. Cada vez que me chamava, eu me derretia. A voz dele era como um ímã para mim, ele encostava o nariz no meu pescoço e sussurrava o apelido que ele tinha inventado para mim. Ele tinha uma fixação pelos meus cabelos pretos longos, passava os dedos sem interrupção pelos fios lisos, percorrendo o meu corpo e, chegando à minha cintura, emitia um grunhido de satisfação. Passamos meses dessa forma até que, em uma noite, ele me ligou eufórico, parecia ter sede de mim e, com uma voz sedutora, falou: — Morena, vamos para a festa da Jasmim? Será às 20h. Posso te encontrar na casa da Estela e vamos juntos no meu carro. Você fala para seus pais que irá fazer um trabalho e precisará dormir na casa dela. Ele já tinha um plano, ele tinha inclusive mudado a voz para eu não resistir, ele sabia que eu iria aceitar, porque o plano era perfeito. Surpresa com aquele pedido, respondi: — Mas a Jasmim não é bem-quista aqui em casa, o papai não gosta dos pais dela, sem chances de ele deixar. Objetivo e decidido ele continuou: — Morena, ele não vai saber! Você pede para seu pai dar a ordem para seu empregado Colis deixar você na casa da Estela e eles não irão saber. Seus pais não estão viajando? Quem irá contar? — O Sr. Colis não e só meu empregado, Ricardo. Fico triste de ouvir você falar assim, e ele vai descobrir no outro dia, pois a cidade é pequena. — Você está certa, desculpe-me, não entendo muito essa relação com Sr. Colis, mas ele não vai saber, morena, a festa será na granja da Jasmim. Só estaremos nós na festa. A cidade não vai saber quem foi ou não. Por favor, morena, vamos ter mais do que alguns minutos. Preciso de você esta noite. Aquele pedido de saciedade já tinha invadido o meu corpo. Eu o desejava, eu o amava, eu o queria. — Tudo bem. Vou falar com o papai. E a Estela? — Deixa a Estela comigo, sei como convencê-la. O Ricardo desligou, e eu liguei imediatamente para o papai. Foi através de uma mensagem que o papai pediu para que o Sr. Colis me levasse à casa da Estela. O Sr. Colis ficou sem entender o motivo de eu ter pedido para meu pai falar com ele, afinal, eu sempre resolvi tudo diretamente com ele. No caminho da casa da Estela, o Sr. Colis me perguntou com uma voz triste de decepção: — Minha menina, você pode me ligar a qualquer hora e eu pego você após finalizar o trabalho. É melhor que você durma em casa, é mais confortável. Ele estava desconfiado, e eu não sabia mentir, mas eu precisava dar continuidade ao plano do Ricardo e, com a voz trêmula, respondi: — Mas vamos ficar a madrugada conversando coisas de menina, Sr. Colis. A mãe dela fez bolo para a gente, estamos empolgadas com essa noite diferente. Ele, com uma voz firme, olhou nos meus olhos e disse: — Estou vendo sua empolgação, até parece que vocês irão aprontar algo. Baixei minha cabeça para não ter que olhar nos olhos dele e arriscar o plano do Ricardo, e respondi: — A professora foi quem mandou fazer o trabalho, nós só estamos obedecendo. O Sr. Colis continuou questionando, esperando que eu finalmente falasse a verdade: — De quê? Engoli a seco a pergunta do Sr. Colis, eu havia esquecido esse detalhe importante, então, respondi com a primeira matéria que veio à mente, ainda com a cabeça baixa já abrindo a porta do carro: — Química. Saí do carro disparando para a casa da Estela. Eu sentia que o Sr. Colis me olhava, mas eu não podia mais voltar, o plano já estava em ação. A Estela me recebeu com um sorriso grande no rosto e foi logo me puxando para o seu quarto. Começamos a nos arrumar e nos maquiar, eu me preparava para ser do Ricardo. Escolhi o perfume que ele mais amava, era doce assim como o dele, eles se misturavam e formavam uma essência inigualável. Quando estávamos prontas, ela me olhou de cima a baixo e perguntou: — Amiga, você está preparada para dormir com o Ricardo? Embora eu soubesse que iria ser do Ricardo naquela noite, eu não conseguia pensar como seria ou como me comportaria. Eu não queria compartilhar aquela nossa i********e com a Estela, era nosso momento, só nós poderíamos saber o que iríamos viver. Então, tentando impor inocência em minhas palavras, perguntei: — Como assim, amiga? Só iremos para a festa e voltaremos para dormir aqui. Ela respondeu, sorrindo: — Duvido ele deixar você dormir aqui comigo. Ele está contando os segundos para te ter. E eu estava contando os segundos para ser dele. Havia mentido para minha família, executado o plano perfeito que ele havia planejado, o nosso amor venceria qualquer barreira. Fiquei surpresa com o que a Estela havia dito, não sabia que o Ricardo e ela eram íntimos a ponto de ela saber da nossa i********e, então, perguntei surpresa: — Ele te disse isso? — E precisa? Fiquei imaginando-o me pedindo em namoro, oficializando um compromisso com nossas famílias, faltava pouco para eu ser liberada para namorar. Era um sonho namorar sem ser escondido. Queria sentir o amor verdadeiro, eu queria mostrar à minha cidade que eu era capaz de amar e de ser amada, que eu poderia construir minha família com base no amor. Estávamos à espera do Ricardo na janela do quarto da Estela. Ele chegou em sua caminhonete preta. Vestia uma camisa verde-escuro, que realçava os olhos verdes-esmeralda que ele tinha. Os seus cabelos loiros escorridos no rosto eram sensuais. Quando a mãe da Estela nos chamou, senti meu coração disparar. Desde que ele entrou em minha vida, eu vivia no pecado da mentira e agora eu traía o meu pai de criação, o Sr. Colis. Eu não me reconhecia, eu pecava todos os dias, mas ao mesmo tempo eu gostava de sentir aquela adrenalina correndo em meu corpo, ele me tirava da comodidade e da calmaria que minha família tinha estabelecido para mim, eu sentia algo diferente e achava que era amor. Ele era como um tsunami: abruptamente ele chegava e me levava para onde quisesse com a força de seu olhar e de sua voz. Não sabia se todo amor era assim, não tinha nenhuma experiência, só sabia que era bom sentir aquilo. Entramos no carro, sentei-me no banco de passageiro dianteiro e a Estela no banco traseiro, atrás de mim. O Ricardo não parava de me olhar, ele exalava desejo, então, passou seus dedos pelos meus cabelos e, chegando ao destino que ele tanto queria, sussurrou, olhando nos meus olhos, disse: — Morena, você está pronta para o dia mais incrível da sua vida? Respondi com entusiasmo: — Muito preparada. Sinto a adrenalina correndo no meu corpo. Ele, com um sorriso maroto no rosto, respondeu: — Você não viu nada ainda! A Estela, sentada no banco detrás do carro, fez-se presente e nos interrompeu: — Ô, galanteador das estrelas, cadê minha encomenda? Ele mudou o olhar apaixonado, olhou para a Estela e, com raiva respondeu: — Estará na festa. Eu fiquei sem entender, achei que eles estavam falando algo do antigo namorado da Estela. Eles eram amigos e a Estela estava na esperança de reatar o namoro. Inclusive, eu achava que era essa a condição para ela topar aquele plano. Seguimos rumo à granja da Jasmim. O Ricardo fazia, o tempo inteiro, carinho na minha cabeça e descia os dedos pelos meus cabelos escorridos. Eu estava ansiosa e eufórica para viver o que o Ricardo havia me prometido: uma noite inesquecível. Ele, vez por outra, me beijava e o hálito refrescante dele ardia no meu corpo, eu desejava sentir mais adrenalina, eu desejava ser saciada. Chegamos à granja e umas dez pessoas estavam à nossa espera. Nosso carro foi aplaudido e recebido com muito entusiasmo por todos que estavam ali. Eu não entendia o motivo, afinal, era a festa da Jasmim, éramos apenas convidados. Olhando para aquelas pessoas, sorri e perguntei ao Ricardo, que já estava olhando para mim, como se aguardasse minha reação: — Eles costumam receber todos os convidados assim? Ele, com um sorriso maroto, respondeu: — Todos não, só a rainha da festa! A Estela o interrompeu falando: — A festa é sua bobinha! Ele fez a festa para você. Fiquei atordoada com aquela informação, senti meu corpo arrepiar de medo e, com os olhos arregalados para aquelas pessoas, perguntei: — É o quê? Que brincadeira é essa, Ricardo? Quero ir embora agora. Você me prometeu que ninguém saberia que estaríamos aqui, você sabe que ninguém pode saber que estamos juntos. Ele com uma voz calma, como quem estivesse com todo o plano sobre controle, disse: — Morena, ninguém aqui vai dizer nada. Fiz a festa para você. Quero te mostrar o quanto te amo, que precisamos passar mais tempo juntos, que quero namorar você. Serei a pessoa mais importante da sua vida hoje. Você é minha morena, e será toda minha hoje. A Estela abriu um sorriso e disse: — Deixa de ser marrenta, gatinha. Aproveita que teu "boy magia" quer te fazer feliz. Se você não quiser, tem quem queira! O Ricardo completou: — Você disse que nunca teve uma festa animada e com muitos amigos. Suas festas são sempre você, seus pais e seus empregados. Hoje eu vou me tornar a pessoa mais importante da sua vida. Vou te mostrar o amor verdadeiro que você tanto busca. Engoli a seco o que a Estela e o Ricardo falaram, afinal, eles tinham um pouco de razão naquele momento. O meu desejo de ser saciada por amor era maior do que o meu medo de ser descoberta. Descemos do carro e ele me apresentou para as pessoas da festa como “a rainha da vida dele”. Senti-me tão importante e muito imponente, nunca tinha ouvido aquilo de ninguém, eu era importante para alguém. Passei a minha vida toda em busca de ser reconhecida e amada, e ele estava me proporcionando isso. A sala era grande e a decoração rústica dava um toque aconchegante ao local. As almofadas, distribuídas no chão de forma aleatória, traziam-nos sensação de conforto. Um DJ embalava a festa tocando músicas sem letra e de ritmo forte e pesado. As pessoas dançavam desgovernadas e, nós dois, ali naquela pista, chamávamos atenção por manter o ritmo, o mesmo compasso. Dançamos, bebemos e nos beijamos muito. Até que ele me deu um beijo que acendeu uma força em mim que nunca havia sentido. Eu não queria parar mais aquele beijo, eu queria passar para outra fase, eu queria sentir a adrenalina no nível mais alto no meu sangue, aquilo me dava prazer e me viciava em querer mais. Eu o beijava com voracidade, com desejo e, quando ele sentiu que eu não conseguia mais controlar aquela sede por mais e mais, ele parou o beijo e disse: — Deixe-me matar essa sua sede. Eu sei o que você quer, deixe eu te mostrar um pouco do inferno dos céus... Você é um anjo e hoje será toda minha, vai perder sua pureza para mim. Você será para sempre minha e hoje eu vou te ter por completa como ninguém jamais terá. Eu queria mais, mesmo sabendo as consequências daquele desejo avassalador. Os olhos esmeraldas dele iluminavam o que eu precisava ver naquele momento, seu hálito refrescante era responsável por todos os arrepios do meu corpo e o seu perfume doce já estava grudado na minha pele, unido ao meu perfume. O pecado já estava presente na minha vida, eu queria conhecer aquele inferno do qual ele falava. Queria sentir mais adrenalina, queria sentir a minha pele se arrepiando mais, sentir mais saliva na minha boca e, com um balançado da cabeça, eu disse sim para o Ricardo. Ele, em silêncio e apenas com um gesto com as mãos indicando para o lado de fora da casa, fez com que todos saíssem da pista de dança, inclusive o DJ. Em questão de segundos, estávamos sozinhos naquela sala, com as portas e cortinas fechadas, embalados por uma batida semelhante à que meu coração marcava pela adrenalina que escorria pelo meu sangue. Ele sussurrava no meu ouvido: “ô, morena”. Escorria as mãos nos meus cabelos, não mais com intenção de tocá-los, ele queria o meu corpo e seus dedos o procuravam em todo percurso. Eu me entregava ao sussurro que ele soava. Estava embalada por uma batida que agora eram de corpos em uma pista de dança só nossa. Foi assim que tive minha primeira noite de amor. Consigo sentir a batida da música embalando nossos corpos, a adrenalina saciando meu desejo de querer mais e chegando ao limite de que eu precisava. Fui sentindo meu corpo fraco pelo pecado, pelo inferno que ele havia me apresentado e ele me levou, nos braços, para um quarto da casa. Eu não tinha forças para mais nada, o meu coração voltava a ser embalado pela minha respiração normal, mas o perfume que meu corpo exalava era o que nós havíamos formado naquela dança, eu precisava descansar. Acordei saciada do desejo impuro, meu corpo estava descansado, vieram lembranças do nosso momento, meu corpo voltava a se esquentar, até que percebi que era dia, a janela deixava entrar raios de luz no quarto. Meu corpo se esfriou com rapidez e me bateu um desespero por ter perdido a hora. Levantei-me com um pulo procurando algum relógio naquele quarto, eu buscava qualquer informação que me levasse para a noite anterior. Deparei-me em frente ao espelho usando a camisa que o Ricardo tinha usado naquela noite, verde como seus olhos, aquela esmeralda havia iluminado toda a minha noite. Os raios do sol entravam pela fresta da cortina, era dia e eu estava encrencada com a mentira que tinha inventado. Comecei a procurar minhas roupas pelo quarto e vi, ao lado da cama, que havia uma mesa com uma bandeja de frutas. Mas eu estava sem fome, na verdade, sentia um embrulho na barriga, o medo de ser descoberta tinha me dominado. Eu precisava sair dali com urgência, precisava ter um plano para despistar o Sr. Colis, eu não poderia decepcioná-lo. Eu, ainda vestida com a camisa verde-escura do Ricardo, conseguia sentir o perfume dele grudado ao meu corpo e misturado ao meu perfume. Éramos um só cheiro, um só corpo. Ele tinha deixado um recado junto às frutas, sentei-me na cadeira da mesa, que ele tinha preparado para meu café da manhã, e li o bilhete: "Ontem você se tornou minha, você agora é minha para sempre, eu te amo muito. Que movimento, que cheiro, quantas lembranças... infelizmente não pude esperar você acordar para sair. A Estela está no quarto ao lado. Deixei um carro esperando vocês na entrada da casa para levá-las de voltar para casa da Estela". Eu estava em pânico, afinal, o Sr. Colis iria me buscar de manhã logo cedo para voltarmos para casa. Ele iria descobrir tudo, o pecado começava a pedir as contas. Eu não achava minhas roupas naquele cômodo. Já havia amanhecido e me perguntava o tempo inteiro como iria falar que estava namorando há meses, que tive minha primeira noite de amor com um namorado, que minha família não conhecia, e que teria armado uma mentira para desafiar meus limites em busca de um amor verdadeiro. Com tantos pensamentos na cabeça, ouvi um batido na porta e falei que poderia entrar, era a Estela. — Larissa, ainda está assim? Corre, amiga, a gente precisa ir, o Sr. Colis chegará em 40 minutos na minha casa. Vamos pular a janela do meu quarto para que a mamãe não veja que chegamos agora pela manhã. Ela sempre dorme e me entrega as chaves para que eu entre em casa na madrugada sem acordá-la, então vamos pular a janela para que ela não desconfie de que dormimos fora. Levantei-me da cadeira em um pulo com aquela informação e, olhando para a camisa verde que estava vestida, perguntei: — Como vou sair daqui se não acho minhas roupas? Ela, sorrindo do meu rosto de desespero, falou: — Com certeza estão onde você as tirou, ou melhor, onde o Ricardo as tirou. Ela riu de mim, ela sabia que tínhamos transado. Fiquei com vergonha de ouvir aquilo. Senti meu rosto ficar quente, deveria estar vermelha. As lembranças daquela noite voltaram e senti meu corpo vibrar ao me lembrar da batida de nossos corpos embalados pela mesma batida da música. A Estela interrompeu minhas lembranças e disse: — Dá para ficar lembrando depois? Estamos atrasadas! Com o rosto queimando pela vergonha que sentia de ter minha privacidade ali exposta, perguntei: — Você viu algo ontem? — Lógico que não, quando o Ricardo nos expulsou da sala, ele liberou pacotes para a gente. Eu tinha coisas mais legais para fazer. Ele só liberou para a gente entrar na casa quando vocês foram dormir. Fiquei sem entender do que ela estava falando, a que pacote ela se referia? Eu precisava saber o que o Ricardo tinha dado para todos e que não tinha me oferecido. E, surpresa, perguntei: — Que pacote? — O que mais seria, amiga? Maconha, lógico! Fiquei sem reação na hora, estava sem acreditar que teria me envolvido com alguém desse meio. A Estela, quando percebeu minha reação de surpresa, continuou: — Vai dizer que não sabia que ele trabalhava com isso? Fiquei inerte, eu não conseguia acreditar no que estava ouvindo. Ela continuou: — Essa noite ele liberou de graça por você, para comemorar o que tinha conseguido. Ele fez a festa com a condição de que vocês transassem. Se vocês transassem, ele liberaria os pacotes para todo mundo. Por isso a Jasmim conseguiu o local, eu te trouxe aqui, o pessoal te tratou como rainha e o resto você já sabe. Caso você não liberasse, todo mundo tinha que pagar o dobro pelo material. Não foi só você quem se divertiu ontem! Muda esse rosto, não seja egoísta, foi bom para todo mundo! Ainda sem ação, comecei a fazer perguntas para ter certeza de que o que estava ouvindo era verdade: — Não estou acreditando no que estou ouvindo, eu fui leiloada? O Ricardo vende drogas? Como você foi capaz de me meter nessa história por vício? Eu não conseguia imaginar a Estela envolvida nas drogas, nós crescemos vendo casos de pessoas que se metiam com drogas e que tinham suas vidas arruinadas. Todas tinham finais tristes, seja para família ou para eles mesmos que iam definhando pelo vício, pela falta de controle que só percebiam quando estavam em um caminho sem volta. Não acreditava que minha melhor amiga tinha participado de um plano de leilão da minha virgindade. Não conseguia mais ficar de pé olhando para a Estela, sentei-me na ponta da cama e passei a me olhar no espelho, enquanto ela falava: — Vai com calma, amiga, achei que você soubesse de tudo e, sinceramente, para com isso! O cara fez uma festa para você, te ama e você está preocupada se a gente usou ou não maconha? Que bobagem, todos nós tivemos uma noite divertida, isso que importa. E qual o problema de usar, às vezes, maconha? Você deveria experimentar, já que seu namorado vende a melhor da cidade. Ainda sem acreditar no que tinha ouvido, com os olhos arregalados de desespero, perguntei, aos gritos, já sem controlar as lágrimas que desciam pelo meu rosto machucando a cada segundo. A decepção doía, o pecado era brutal. — Bobagem? Você acha bobagem ser leiloada? Você acha bobagem sua melhor amiga participar do plano de leilão? Há quanto tempo ele te fornece isso? Eu não acreditava que o Ricardo estava acabando com a vida de tantas pessoas e com a minha, lembrei-me do sussurro dele e me arrepiei de nojo. A Estela, vendo minha postura de nojo, respondeu sorrindo: — Lógico que sim. Todo mundo aqui gosta do material que ele fornece. Faz tempo que usamos. — Quanto tempo, Estela? Somos melhores amigas, como você nunca me disse isso? — Começamos naquela festa em que você conheceu o Ricardo. Ninguém te ofereceu porque sabíamos que você não gostava, além de que você iria fofocar para seus empregados, e a vizinhança iria saber. A decepção tinha acabado com minhas forças, eu não conseguia me levantar da cama para fugir dali, fugir daquela verdade. Meu corpo todo doía. Gritei desesperadamente, às lágrimas: — Como você teve coragem? Sou sua melhor amiga. — Por isso mesmo, o cara se apaixonou por seu jeitinho careta de ser, você gostou de sentir a adrenalina e o pecado dele e pronto. Ninguém te obrigou a nada, você fez porque quis. Levei as mãos na cabeça e, me olhando no espelho com aquela roupa, percebi que tinha sido atraída pela adrenalina do pecado e que tudo que tinha vivido era mentira, o pecado não era verdadeiro, não era puro e era incapaz de amar. Comecei a sentir nojo daquele cheiro que nossos perfumes tinham formado. Minha maquiagem já estava manchada das minhas lágrimas, elas caíam no meu rosto. Eu estava, incontrolavelmente, tentando limpar aquela sujeira que estava no meu corpo, a sujeira da mentira. As verdades escancaradas pelas palavras da Estela doíam, machucavam. E ela continuou sem sentir pena do meu sofrimento: — Você gostou de se sentir amada, você nunca sentiu isso por ninguém. Nem seus pais te amam, todo mundo da cidade sabe disso. Abandonaram você aqui para viverem viajando. O Ricardo te trouxe felicidade, amor. Eu a interrompi, gritando: — Tudo mentira, tudo enganação... E você, Estela? Logo você envolvida? Saí correndo para trocar de roupa aos prantos, não conseguia controlar minhas lágrimas. Corri para a sala sem me importar se alguém estava me vendo seminua, eu estava suja, uma sujeira que machucava e escondia quem eu realmente era. Quanta decepção! Nunca me imaginei passando por isso, no meio das drogas, amando alguém que era envolvido nesse meio e, ao mesmo tempo, vinham lembranças da noite, da batida da música e da batida de nossos corpos, a adrenalina, que era boa antes, começou a ser maléfica, a deixar-me anestesiada de dor. Entramos no carro, não conseguia olhar no rosto da Estela, sentia nojo de mim, dela, daquele lugar. Eu precisava ser limpa, mas não sabia como. Chegamos à casa da Estela e, como combinado, pulamos a janela, para que ninguém imaginasse que teríamos dormido fora de casa. Olhei-me no espelho e, com o rosto todo borrado, respirei fundo tentando acalmar meu coração que doía sem parar. Percebi que a Estela me olhava e ouvi quando ela disse baixinho, como se quisesse respeitar ao menos naquele momento o que estava sentindo: — Melhor você ir tomar banho. O Sr. Colis não pode te ver assim com esse rosto e esse cheiro. Era o cheiro do Ricardo que estava grudado no meu corpo que, somado o meu cheiro, formava um perfume que me causava náuseas, era um cheiro doce que me embrulhava o estômago. Concordei com a Estela e fui tomar um banho. No banho, tentei inúmeras vezes limpar minha pele, mas era inútil, minha alma e meu corpo estavam sujos pelo pecado. Terminei o banho e coloquei minha roupa limpa, voltei para o quarto da Estela e me sentei na cama dela, suspirei e perguntei-lhe com um pouco de calma: — Como você entrou nessa? Por quê? Você não precisa disso! — é bom, você deveria provar, relaxa o corpo, nos sentimos bem. Com certeza, com o namorado que tem, vai provar! — O quê? Como você pode pensar que ainda existe namoro? Você me conhece, ou pelo menos eu achei que conhecesse, sabe que jamais permitiria isso. Saia desta encrenca, Estela, aproveite enquanto consegue conter o vício. Drogas não fazem bem a ninguém. A Letícia, da esquina, precisou ser internada, ela começou com a maconha e já vendeu tudo que tinha em casa para pagar essas porcarias. Ainda custo a acreditar que você escolheu esse caminho que não tem saída. Ela me olhava com prepotência, como se eu falasse bobagem e me interrompeu: — Eu sou diferente da Letícia, eu uso apenas como diversão e muito raramente. Além de que, teu namorado... Ela pausou momentaneamente, eu balancei a cabeça com sinal negativo e em seguida me levantei da cama. Ela continuou sem se importar com minha atitude de repúdio: — O Ricardo só vende coisa boa. Ninguém fica com esse vício que falam por aí, não. A Letícia começou a usar a cocaína, por isso ficou do que jeito que está! Eu não acreditava que a Estela estava falando aquilo, então retruquei: — Você acha que ela começou com a cocaína por quê? Porque a maconha não a satisfazia mais, o vício é algo que não conseguimos controlar, ele invade nosso corpo sem que a gente perceba. Veja você, foi capaz de planejar tudo isso para que pudesse ganhar maconha de graça! Respirei fundo de novo e continuei: — Se você escolher seguir esse caminho, nossa amizade acaba aqui. Com tom de raiva, ela respondeu: — Ah, vai pra aquele canto, Larissa! Quer ser a “anja” transando com traficante de burguesia? Você acha que ele ia só te ver na escola? Ele ia levar os pacotes para a gente usar, achei, inclusive, que você usava com ele. Nessa hora, a mãe da Estela interrompeu nossa discussão e disse do lado de fora da porta do quarto: — Meninas, acordem! O Sr. Colis já está à espera da Larissa, no carro. Venham tomar café da manhã. Sem acreditar que tinha passado por tudo aquilo, dirigi-me à porta do quarto, olhei para Estela e disse: — Achei que você era uma irmã para mim, mas estava enganada, como alguém pode deixar a virgindade de sua amiga ser leiloada para ganhar drogas? Pra mim, nossa amizade acaba aqui. Com os olhos cheios de lágrimas, bati a porta do quarto e saí correndo pelo corredor da casa de Estela, fechei a porta da casa com uma batida forte. Eu sentia raiva, a fúria tinha tomado conta do meu corpo. Corri direto para o carro do Sr. Colis, ele estava à minha espera sentada no banco do motorista. Chorando muito, pedi para que ele me levasse daquele lugar, depressa. O Sr. Colis acelerou o carro e acatou o meu pedido mantendo o silêncio no carro, respeitando minha dor que estava estampada nas lágrimas que corriam pelo meu rosto. Fomos a um parque mais afastado da cidade, onde havia um lago em que adorávamos pescar juntos quando eu estava estressada com os sumiços dos meus pais. Sem me perguntar nada, ele alugou uma varinha de pescar e fomos para um píer. Eu chorava muito, me sentia fraca da decepção de ser tão traída e enganada. Sentados no píer e com as varinhas na água e sem nenhuma pretensão de pegar peixes, ele disse: — Eu sei que você estava na granja da Jasmim, vi você chegando em uma caminhonete preta com um loiro de blusa verde e saiu agora pela manhã com o motorista do UBER. Se você não quiser me falar o que aconteceu, eu vou respeitar, mas não vou poder te ajudar! Com o olhar entristecido, envergonhada e nem um pouco surpresa de descobrir que o Sr. Colis estava ali o tempo todo, eu o perguntei: — Por que você me seguiu? Ele, entristecido e tentando diminuir a tensão que estava entre nós, respondeu: — Sua professora de química não gosta de passar trabalhos. Ele tinha investigado a minha versão da história, ele me conhecia como ninguém, sabia que eu estava mentido. Ele havia passado a noite escondido, esperando-me sair ilesa, respeitando minha liberdade. — Você é muito especial, Sr. Colis! Obrigada por ser tão presente em minha vida. Ele colocou a nossa vara de pesca nos suportes de varas e me deu um abraço forte. Ficamos ali abraçados olhando para o lago e eu esqueci por minutos tudo que tinha passado, o amor dele puro me fazia esquecer o pecado que estava na minha alma. Ali, naquele aconchego, perguntei-lhe: — Por que você não me salvou? Por que você não me tirou dali? — Você não quis ser salva naquele momento. Eu engoli a seco aquela resposta e lhe perguntei novamente: — Você já se sentiu sem saída e sujo por consequência de suas escolhas? — Sim, minha menina. Ele suspirou com tristeza, como se lembrasse de algo do seu passado. Afastou-se do abraço e, segurando minhas mãos, continuou: — Você está pronta para me contar o que aconteceu? O que aquele monstro fez com você? — Ele só fez o que eu permiti, estou suja e impura pela mentira, pela sede de — respirei fundo e finalizei — adrenalina na veia. O pecado está na minha alma. — Tudo na vida passa e isso também irá passar. Vamos te ajudar a esquecer de tudo isso.
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