Pressentimentos

1376 Words
Rafael estava absorto em seus próprios pensamentos enquanto dirigia por uma das ruas mais movimentadas da cidade. O barulho dos motores e das buzinas ao redor dele se misturava à trilha sonora de sua vida: um lamento constante que ecoava silenciosamente em seu coração. Ele passou por uma loja de cristais, onde a luz do sol refletia nos objetos expostos, e por um breve instante, sentiu uma pontada de inveja. Não da beleza daquelas peças brilhantes, mas da capacidade delas de captar a luz e se tornar verdadeiramente especiais. Foi como se um presságio dissesse que aquele dia não seria comum. Ao chegar a mais umar eunião, a atmosfera estava pesada, como antes de uma tempestade. Rafael entrou no salão, sua presença impunha respeito e temor. Sorrisos forçados se dirigiram a ele, mas a frieza de seu olhar logo sufocou a ostentação ao seu redor, criando um clima tenso entre os presentes. De repente, sua assistente que estava grávida atravessou seu caminho, tropeçando em suas próprias inseguranças enquanto segurava uma pasta cheia de documentos. Rafael lhe lançou um olhar cortante, e a pobre mulher tremeu ao perceber o que estava prestes a acontecer. A voz de seu chefe soou, baixa e ameaçadora, enquanto os outros contorciam-se em suas cadeiras. "Você não tem outra coisa melhor para fazer a não ser ser um desastre?" Aquelas palavras varreram o ambiente como um vento gélido, e a mulher, com expressões de vergonha e constante nervosismo, se afastou, as lágrimas quase surgindo em seus olhos. Ela iria a um prédio bem a frente para fazer novas copias pois aquelas estavam sujas e impróprias para serem assinadas. Para Rafael ela não fazia mais do que a obrigação, ele não se comdoia por ter sido c***l com ela. Mas, como se a vida estivesse prestes a lhe dar um soco na face, o que se sucedeu naquele preciso momento mudaria tudo. Uma sirene soou do lado de fora, e a cidade, em sua habitual correria, tornou-se um eco distante. A atmosfera ficou paralisada, os olhares voltaram-se para a porta. De repente, uma batida ensurdecedora reverberou através da sala, e tudo mudou. O som de sirenes e gritos reverberava pelas ruas, criando um cenário de caos absoluto do lado de fora do prédio corporativo. Rafael observava a cena de sua sala envidraçada, as mãos apertando o peitoril da janela com força. Seu olhar estava fixo no cenário aterrorizante que se desenrolava nas calçadas debaixo de seus olhos. Lá fora, dois carros haviam colidido violentamente, e um deles, por razões que ele não conseguia compreender, explodira em uma bola de fogo e fumaça espessa. Os gritos dos pedestres feridos e assustados ecoavam pelas ruas. Por um momento, Rafael ficou paralisado, observando a fumaça n***a se erguer no céu, os destroços espalhados pela rua e os corpos caídos. Havia sangue. Havia destroços. E havia algo mais. Algo que o fez congelar e, logo em seguida, uma pontada aguda de remorso o atingiu. Luciana. Sua assistente. Grávida de oito meses. Ela estava lá fora, no meio do caos, e tudo por culpa dele. Luciana não deveria estar ali naquele momento. Ele a havia agido daquela forma, mesmo sabendo que o estado dela. Rafael tinha sido impiedoso, frio como sempre, sem pensar nas consequências. Sabia que ela tinha ido imprimir novas cópias apenas por ele que tinha ranço de qualquer imperfeição e assinar contratos sujos era inadmissível. Agora, no meio daquele desastre, Luciana podia estar em perigo. O remorso o atingiu com força, algo raro para Rafael, como uma lâmina fria cortando sua fachada habitual de indiferença. Sem pensar duas vezes, ele se moveu rapidamente para fora de sua sala. "Luciana," murmurou para si mesmo enquanto atravessava o corredor com pressa, sua mente completamente focada em encontrá-la. Ele não podia suportar a ideia de que ela, com sua gravidez avançada, estivesse entre as vítimas daquele acidente terrível. Ao sair pelas portas de vidro do prédio, Rafael foi imediatamente atingido pelo cheiro de fumaça e borracha queimada. O calor da explosão ainda pairava no ar, misturado aos gritos e à sirene distante que anunciava a chegada de socorro. Mas a cena era dantesca. Havia corpos caídos nas calçadas, alguns se contorcendo de dor, enquanto outros estavam imóveis. Carros completamente destruídos bloqueavam a via, e o veículo em chamas continuava a crepitar, espalhando fuligem pelo ar. A multidão estava em pânico, algumas pessoas corriam desesperadas, enquanto outras tentavam ajudar os feridos. Rafael nunca havia lidado com algo assim antes. Ele estava acostumado a resolver crises financeiras, manipular negociações difíceis, lidar com situações tensas no ambiente corporativo, mas isso... isso era real. E Luciana, sua assistente fiel, estava em algum lugar ali no meio. Ele começou a andar entre os destroços, o coração batendo rápido no peito. Seus olhos percorriam os rostos das pessoas, procurando freneticamente por Luciana. Cada segundo que passava fazia o pânico crescer dentro dele. Ele precisava encontrá-la. Precisava se certificar de que ela estava segura. Sua mente estava cheia de pensamentos de culpa. Se algo acontecesse a ela — ou ao bebê — ele jamais se perdoaria. No meio da busca, Rafael viu uma mulher caída perto da calçada, o rosto coberto de sangue. Não era Luciana, mas ele não conseguia simplesmente ignorá-la. Movido por um instinto desconhecido, ele se aproximou, ajoelhando-se ao lado dela: "Está me ouvindo?" perguntou ele, sua voz carregada de urgência. Ela gemeu em resposta, os olhos semicerrados de dor. "Preciso tirá-la daqui," disse ele, mesmo que suas palavras não fossem completamente compreendidas pela mulher ferida. Com cuidado, ele colocou os braços por baixo dela, levantando-a. Rafael não era médico, não sabia ao certo como movê-la de forma correta, mas sabia que ela precisava ser retirada da proximidade dos carros destruídos, especialmente do veículo em chamas, que ainda representava um perigo iminente. Ele a carregou até um ponto mais seguro, onde outros pedestres já estavam reunidos, tentando se afastar da zona de perigo. Quando a colocou no chão com cuidado, outro homem se aproximou para ajudar. Rafael assentiu para ele, agradecendo silenciosamente, e voltou a sua busca. Os gritos continuavam, o som ensurdecedor das sirenes aumentava. Ele seguiu adiante, desviando de pedaços de metal retorcido e vidros quebrados. Mais adiante, viu dois homens tentando erguer um carro que havia invadido a calçada, e sob ele, o braço de uma pessoa estava visível, preso sob o veículo. Sem hesitar, Rafael se juntou a eles, colocando toda a força que tinha para ajudar a erguer o carro. Juntos, conseguiram liberá-lo o suficiente para que a pessoa ferida fosse puxada para fora. Um dos homens o agradeceu, mas Rafael apenas acenou rapidamente, sua mente ainda focada em Luciana. E então, ele a viu. Ela estava encostada em uma parede de concreto, um pouco afastada do caos principal, com as mãos sobre a barriga. O rosto dela estava pálido, os olhos arregalados de choque, mas ela parecia estar fisicamente bem. Rafael sentiu uma onda de alívio tão grande que quase o fez desmoronar. Ele correu até ela, os passos rápidos e determinados. "Luciana!" Sua voz saiu mais áspera do que ele esperava. Ela levantou o olhar para ele, surpresa, mas ainda trêmula: " Senhor Rafael..." sussurrou ela, sua voz fraca. "Eu... eu estou bem. Só... estou assustada." Sem pensar, ele colocou uma das mãos no ombro dela, um gesto de conforto raro vindo dele: "Você não deveria estar aqui," murmurou ele, mais para si mesmo do que para ela. "Eu... eu não deveria ter…." Luciana o olhou nos olhos, ainda atordoada, mas tentou sorrir fracamente: "O bebê está bem," disse ela, colocando a mão sobre a barriga inchada. "Só preciso... me acalmar." Rafael olhou ao redor, o caos ainda fervilhando ao seu redor. Ele sabia que as ambulâncias e os paramédicos chegariam em breve, mas, por enquanto, ele precisava tirá-la dali, para longe daquele cenário de horror: "Vamos sair daqui," disse ele, sua voz firme, mas com um traço de culpa permeando cada palavra. Ele a ajudou a se levantar, guiando-a com cuidado através dos destroços e da multidão. Enquanto caminhavam, ele viu mais feridos sendo socorridos, as pessoas ainda gritando por ajuda, os paramédicos finalmente chegando. Mas, por um momento, Rafael se permitiu respirar um pouco mais aliviado. Luciana estava viva. O bebê estava bem.
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