AURORA - ELEONORA
Novamente erro o alvo pintado de vermelho e branco em um molde circular. Matteo me entrega outra arma.
— É uma pistola também, agora mire o máximo que puder. Todos os dez tiros que deu foram para qualquer lado, menos no alvo — murmura olhando em volta o estrago que a arma fez: uma estante de vidro foi quebrada e a parede de aço, atrás do alvo, está marcada por tiros.
— Não é fácil, nunca peguei em uma arma. — Ele me puxa para um abraço e beija minha testa.
— Fique calma, podemos tentar outro dia. Você está nervosa, isso tudo é novo e eu sei que está preocupada com essa possível ameaça.
— Eu confesso, estou com medo. — Matteo solta uma respiração pesada.
— Meu maior medo é que ele faça algo com você ou com o nosso filho. — Leva uma das mãos até a minha barriga e a acaricia.
— Vou tentar dar o meu máximo. — Ele sorri.
— Eu sei que vai, meu amor, e vou te ensinar de tudo um pouco.
— Vamos de novo? — Meu marido sorri e me entrega outra arma.
Tenho de fazer isso, tenho de proteger as pessoas que amo; acima de tudo, preciso ser forte e ser a verdadeira senhora Del Frari, filha de Salvatore De Angelis e neta de Richard De Angelis. Os grandes nomes da máfia italiana.
NÊMESIS
Arremesso a arma contra a parede e jogo tudo de cima da mesa do meu escritório no chão.
— Fica calmo, Nêmesis. — Meu olhar a faz se encolher no canto.
— Ficar calmo? Eu estou rodeado de incompetentes! Aqueles malditos seguranças nos impediram de chegar até eles! — grito.
— O que ia fazer se conseguisse alcançá-los? O plano...
— Eu sei da p***a do plano, mas queria me divertir, ver o pavor no rosto deles, ou então só os ferir um pouco. — Encosto minha cabeça na parede, logo em seguida, sinto ela me abraçar por trás.
— Nós estamos dois passos à frente; por mais que ele aumente a segurança ou até mesmo não desgrude dela, não vai impedir de executarmos o nosso plano. Matteo vai pagar pelo que nos fez. — Me viro para encarar seus olhos azuis, intensos e extremamente assassinos, assim como ela.
— Já conseguiu dar um jeito naquele assunto?
— Ele não vai nem saber, Matteo não vai mais lá há anos, nunca vai desconfiar.
— Ótimo, tudo de acordo com o plano.
— Qual é o nosso próximo passo? — pergunta com um sorriso no rosto.
— Vamos continuar com o monitoramento e esperar pelo momento certo.
— Eu estou com algumas ideias e queria pôr em prática — murmura pensativa.
— Que ideias?
— Nada que vá comprometer nossos planos, mas que talvez possa facilitá-los. — A olho com curiosidade.
— Sou todo ouvidos, minha Arlequina... — Ela sorri com o apelido e diz:
— O grande Matteo Del Frari vai chorar lágrimas de sangue.
MATTEO DEL FRARI
Caminho em direção a minha sala e logo vejo Lídia, que se levanta para me cumprimentar.
— Senhor Del Frari, que bom vê-lo. — Abro um sorriso.
— Lídia, nos vimos ontem e não precisamos dessas formalidades, sou amigo do seu noivo e marido da sua melhor amiga. — Ela ri.
— Não quero nenhum i****a dizendo que, por ser amiga da sua mulher, tenho mordomias, afinal, ainda sou sua secretária.
— Sim, você tem razão, então com licença. — Lídia sorri e volta a se sentar.
Entro em meu escritório e a primeira coisa que faço ao tomar o meu lugar em minha mesa é colocar dois porta-retratos. Um do meu casamento, uma foto minha e de Eleonora, e outra foto onde todos estavam juntos, a família adotiva e a verdadeira de Eleonora, Lídia, Edgar, Marco, Damien e até Alex e Adam com suas esposas, Isabel e Angel. Esse foi um dos melhores momentos da minha vida.
Por um breve momento, recordo da minha irmã, Merlinda. Faz muito tempo que não a vejo. Sinceramente, não sei, ela matou os nossos pais em um surto, mas ainda assim tenho um certo receio pelo que ela fez. Por mais que ela tenha problemas mentais, não consigo aceitar isso; a última vez que a vi já faz anos e não faço questão de ir vê-la, eu era uma criança e não consigo olhar na cara dela e não lembrar daquela cena. Sei que posso estar cometendo um erro enorme em não ir procurá-la, mas Merlinda fez algo terrível. Lembro que quando voltou a si teve uma crise de choro por estar em um hospital psiquiátrico. Os médicos acharam melhor não revelar quem matou os nossos pais e como foi, seria demais para ela e, por mais magoado que eu esteja, não quero que ela se machuque ou acabe fazendo algo consigo mesma. Minha irmã só sabe que meus pais estão mortos e eu tive de consolá-la, com toda a minha dor e responsabilidade. Lembro muito bem como ela reagiu ao me ver depois de três anos sem vê-la; eu já havia me formado, estava morando em Dallas e fazia pouco tempo que tinha perdido Amélia e nosso filho. Minha vida estava um caos e eu ainda tive de me manter forte diante da minha irmã.
— Maninho... É você? — murmurou, surpresa ao me ver entrar em seu quarto. Ela estava com uma camisa de força, pois no dia anterior tinha tentado enforcar outra interna em mais um de seus surtos.
— Oi, Merlinda, como você está se sentindo? — Ela abriu um sorriso fraco.
— Como quer que eu me sinta? Eu não queria ser assim, queria ser normal, sair daqui... — Seguro meu choro para não desmoronar em sua frente.
— Você vai ficar bem, maninha. — Coloco uma mecha do seu cabelo ruivo para trás da sua orelha, ela me encara com seus olhos azuis extremamente tristes.
— Faz tampo que não vem me ver... Está com barba, parece o papai.
— Eu não moro mais aqui na Itália, abri uma empresa em outro país. — Merlinda arregala os olhos.
— Uma empresa? Nossa, eu fico tão feliz por você, maninho. — Abre um sorriso sincero.
— Eu prometo que, assim que você ficar boa, vou tirar você daqui.
— Eu deveria cuidar de você, sou a mais velha.
— Os papéis se inverteram.
— Matteo, cadê nossos pais? Eles me esqueceram? Toda vez que te pergunto, você se levanta, vai embora e fica muito tempo sem vir ou me ligar. — Solto uma respiração pesada.
Não dá mais para esconder.
— Merlinda... Você vai ter de ser muito forte. — Fecho os olhos para não chorar.
— Como assim? O que aconteceu com os nossos pais?
— Eles... Morreram, há muitos anos, quando eu ainda tinha cinco anos. Fui adotado pelo melhor amigo do papai, Salvatore, e sua esposa Valentina. Foi assim que você veio parar nesta clínica, depois da morte deles. — Ela arregala os olhos e, depois de alguns segundos, um choro fora do normal reverbera dela; a puxo para um abraço e é um dos raros momentos que me deixo levar pelas lágrimas.
— Co... Como... Eles...
— Xiii... Só chora, isso vai te fazer bem, maninha. — Merlinda não diz mais nada, somente chora, e eu também.
Saio dos meus devaneios com a entrada de Lídia. Me apresso em secar algumas lágrimas teimosas que acabei derramando ao lembrar disso.
— Desculpe, eu estava batendo, mas o senhor...
— Não, tudo bem.
— Os senhores Lavisck e Cooper estão aqui. — Me ajeito na minha cadeira.
— Pode os deixar entrar. — Ela dá um breve aceno e sai, logo em seguida, Adam e Alex entram na minha sala e me levanto para cumprimentá-los.
— Ei, cara, como foi sua lua de mel? Adam e eu estamos muito felizes por você — murmura Alex.
— Eu estou muito feliz, em breve vou ser pai; acho que errei muito em chamá-los de maricas. Tinha de ter ouvido vocês e suas esposas, afinal, as vozes sábias são dos mais velhos.
— Não somos tão velhos assim, estamos perto da casa dos cinquenta anos ainda. E nossas esposas na dos quarenta. — Adam diz se fingindo de ofendido.
— Você logo estará na casa dos quarenta também — acusa Alex, mas abro um sorriso sarcástico e digo:
— Falta dois anos para isso.
— Certo, certo senhor trinta e oito... Vamos aos negócios.
— Vamos. E por falar nisso, soube que em breve vou ter de tratar de negócios com os seus filhos. — Posso ver o sorriso orgulhoso de ambos.
— Júlia está mais preparada do que nunca, falta pouco para assumir meus negócios — avisa Adam.
— Christian assumiu há pouco tempo e já mostra bastante competência — diz Alex.
— Eu vou estar aqui para orientá-los, caso precisem.
— Eu sei que vai, meu amigo, isso vai ser muito bom para eles.
— Mas, mudando de assunto, Salvatore não está no país; liguei para ele e disse que estava na Itália, resolvendo assuntos de vida ou morte. — Alex murmura.
— Algum problema na tal cúpula? — Adam questiona.
Alex e Adam são amigos de Salvatore e se tornaram meus também logo após a suposta morte do mesmo; de forma indireta, eles fazem parte disso, mas sem participarem das reuniões. Não querem se envolver muito e eu respeito a decisão deles.
— Alguém, que se autointitula Nêmesis, está me ameaçando. Não fazemos ideia de quem seja, por isso Álvaro e Salvatore foram para a Itália, acham que foi alguém de lá, já que concluímos ser alguém do meu passado.
— Qualquer coisa, pode contar conosco.
— Estamos velhos, mas ainda sabemos bem como agir em combate — confessa Adam.
O que me faz lembrar do que eles já passaram para estar com suas esposas. Acho que eles entendem bem pelo que eu estou passando no momento.
— Obrigado, espero que nada disso seja necessário, mas se for, vocês serão chamados. — Ambos riem.
— Oh beleza, estou louco para usar meu arsenal novamente. — Alex diz me fazendo rir.
Espero que isso nunca seja preciso; se for é porque errei em proteger a pessoa que mais amo nesta vida.