O bip do despertador faz minha cabeça latejar e eu estico o braço para alcançá-lo no criado mudo. Porém acabo por derrubá-lo no chão.
Solto um grunhido e me sento na cama prendendo meus cabelos num coque e suspiro.
Minha cabeça vai explodir.
Estou exausta, não só pela viagem de ontem, mas pelo que aconteceu. As palavras de Melissa estão esperando apenas que eu dê brechas para que voltem a ecoar na minha cabeça. E me sinto uma tremenda covarde por tentar ocupar minha mente com o que quer que seja para deixa-las o mais longe possível de minha mente.
Visto meu jeans preto, o par de botas e um casaco marrom, deixo os cabelos castanhos caírem em meus ombros e abro a pequena a caixinha com os óculos de grau.
Minhas malas estão praticamente intactas desde ontem. E por mais que eu tenha trago pouca coisa, não quero guardar nada no guarda roupa, nem colocar os poucos livros que trouxe mas prateleiras que Joseph instalou para mim.
Nem sei como foi que aceitei a ideia de vir para cá. Assim que meus pais ficaram sabendo que iria trabalhar um tempo no colégio de Saltlake High School, houve uma grande disputa sobre aonde eu me hospedaria.
Eu nem tive opção de escolha quando cheguei no aero Porto e meu pai estava lá, sem meu consentimento, para me levar para a casa dele.
Não sei se seria diferente com minha mãe.
Suspiro colocando a bolsa sobre o ombro enquanto desço as escadas.
– Não acha melhor levar o carro na oficina para ver se está tudo em ordem? O rapaz do seguro pediu para você entrar em contato em até 48 horas – Joseph comenta apressado ao redor da mesa, tomando café e dando o nó na gravata.
– Depois que eu sair do colégio eu levo na oficina do senhor Oliver para ver se tá tudo certo – respondo – A gente se vê.
– Esta tudo bem? Você chegou tarde ontem – ele comenta antes que eu saia pela porta.
– Sim, eu... Estava com Melissa – antes que ele possa fazer qualquer outro comentário, eu fecho a porta, destravo as portas de meu carro que está estacionado em frente a casa e dou partida.
O colégio de Saltlake parece ter ficado maior da última vez que estive nele, mas adentrando os portões, reparo que foi apenas pintado. O que antes era verde e branco, hoje é composto por dois prédios vermelhos, com detalhes em acabamento cinza, ambos ligados pela escadaria de paredes de concreto puro.
Os vidros que antes era pixados, agora parecem ter sido trocados por novos e bem mais resistentes. O auditório continua o mesmo, a não ser pelos bancos que também foram substituídos por banco de concreto em cinza e estofados em vermelho.
Pelo que parece o ato de vandalismo desde que fui embora, tomou grandes proporções e tudo por estar sempre sendo quebrado, foi substituído por concreto.
A cada momento que caminho pelos corredores, mudo completamente minha opinião. Esse não é mais o lugar que estudei.
A escola que antes era regida pela direção do senhor Harrish, um velho gordo e que passava o dia inteiro em sua cadeira comendo rosquinhas, agora é regida pelas mãos de uma senhora de mais ou menos 48 anos, de cabelos presos num coque fixado com gel no alto da cabeça, saltos barulhentos que fazem as salas se silenciarem a medida em que ela caminha ao meu lado, enchendo o próprio ego, sobre como as coisas mudam do colégio desde que ela entrou.
– Não deixamos mais nenhum aluno no pátio quando professores faltam. Nossa equipe de profissionais agora tem o senhor Travis, Danica e Jen, ambos dão aulas extracurriculares – ela comenta abrindo a porta da sala de leitura – Veja, aqui temos o grupo de estudos – ela diz fazendo com que os alunos reunidos ao redor de uma mesa se voltem para nós duas – Dêem Bom dia á senhorita Wills, ela será a nova professora de história do colégio – a diretora Talbot diz firmemente e eu sorrio para eles que nem desviam o olhar da louca para mim.
Os livros continuam nas mesmas prateleiras, o lugar que antes era ocupado pela bibliotecária, a senhora Green, hoje é ocupado por um aparelho que tem entrada para cartão do aluno + código do livro.
– A sala dos professores, fica para lá, já tem um armário vago para você, café e um computador com registro dos alunos – ela diz e faz uma pausa para que eu diga alguma coisa.
– Muito obrigada senhora Talbot, será um prazer trabalhar com a sua equipe – respondo gentilmente ela torce o nariz.
– Quando é que você vai começar?
– Eu... Bem,
– Não aguento mais os alunos comentando sobre Alissa, você precisa dar um jeito nisso, os pais estão preocupados, a escola caiu no ranking no quesito segurança e quatro alunos foram transferidos, isso quer dizer que nosso colégio está sendo m*l visto por aí a fora e não pense que só porque estamos nessa cidadezinha de merda que vou aceitar que comentem sobre minha regência na direção.
Nossa. Mais orgulhosa do que eu pensei.
– Como está sendo as investigações? – pergunto.
– Muito de vagar, a polícia não tem falado muito com a direção, mas a cidade é pequena, está rolando rumores sobre eles não terem saído da estaca zero ainda.
– Como era a relação dos alunos com a Senhorita Tisdale? Percebi que eles nem se quer me olharam quando dei bom dia.
– A Senhorita Tisdale, era cordenadora do terceiro ano B, se apegou bastente com eles enquanto estava aqui – ela me conta.
– Ela aprendeu a lidar com eles, levando em conta que eles são a sala que mais dá trabalho da escola. Ela era quieta, mas era doce e paciente – assinto enquanto ela conta – A pobre foi encontrada dentro de seu cacifo,na sala dos professores no dia do baile de verão.
– O armário que vou usar a partir de hoje?
– Infelizmente não posso mandar fazer um armário exclusivamente para você, então, se contente senhorita Wills – engulo o seco com a fala dela – As homenagens para Alissa Tisdale, começam depois do intervalo, na quadra de esportes – ela rosna enquanto desce as escadas.
Suspiro assim que a senhora mau humorada some das minhas vistas. E espero alguns minutos para descer até minha sala.
– A senhorita Tisdale era muito reservada, quando chegou aqui. Ela era boa. E... Não merecia isso, eu só... Espero que esteja num lugar melhor, que com certeza é melhor do que Saltlake – a loira dos olhos azuis desce do pequeno pódio que foi feito no centro da quadra e todos, repito, todos não soltam um sequer comentário.
– Quem é ela? – pergunto para Jen, o professor da equipe de aulas extracurriculares e também treinador do time de basquete.
– Marianne Wynicot, a popularzinha – ele diz me oferecendo um pedaço de sua rosquinha e eu escrevo o nome da garota em meu bloco de notas.
– Foi trágico o que aconteceu com a senhorita Tisdale, mas, quando eu deito na minha cama, antes de dormir prefiro imaginar ela sorrindo, por mais que no começo tenha sido difícil de lidar comigo, eu sei qu e lá no fundo, era só o trabalho dela – o garoto faz uma pausa, funga, morde o lábio e continua – Ela está em um lugar melhor e... Eu espero que a família sinta-se abraçada pela Saltlake High School.
– Esse é o Ashlan. Dylan Ashland, se tirar o olho dele, você pode ser acertada no segundo seguinte por uma bolinha de papel – Jen comenta comigo bebendo seu suco.
– Alissa Tisdale, posso dizer que era como uma ótima ouvinte. Eu... Ãh, ela era legal. Não era como as outras professoras, que só davam aula por obrigação. Ela nos ouvia, era tranquila e não olhava para você com olhar de julgamentos. Nós falamos que sentimos muito, mas acredito que não vamos conseguir sentir o que ela sentiu, o que a família está sentindo, mas eu espero que passe, eu sei que não vai passar por completo mas, ela ia querer isso, ela me disse uma vez sobre nenhum sofrimento ser para sempre, e sei que aonde ela estiver agora, ela diria isso para o Saltlake High School e para a família.
– Bill Daker, ele é calado. Só responde a chamada, mas geralmente ele mata aula, então, menos um para lidar – Jen comenta como se estivesse vendo o jogo de futebol.
– Alissa Tisdale era uma boa observadora e... se tornou uma amiga. Ela sentia sua dor e... É difícil aceitar que ela ajudava no que podia, mas quando precisou de ajuda, não tinha ninguém – a garota miúda faz uma pausa para soluçar e cobre o rosto – Desculpa, – e aí ela desce pela pequena escadinha e sai da quadra.
– Anna Lee, a melhor da turma do terceiro B, todos são do terceiro B. Ressaltando que a única que conseguiu domar essa sala, foi a senhorita Tisdale, como eles falam, ela virou amiga deles – Jen explica de boca cheia e eu assinto anotando o nome dela.
– Eu senti muito pelo quê aconteceu, ela não merecia e espero que esteja num lugar melhor – o rapaz com blusa do time de futebol americano é breve e desce para sentar juntos com os outros garotos do time que estão calados.
– Bernard McKinley, namorado da popularzinha, líder do time, valentão, – Jen comenta enquanto observo o mesmo encarar o chão, com as mãos juntas. Anoto o nome dele.
– Ninguém conhecia Alissa Tisdale na verdade, – ouço a voz de Alice – Ela era nova e estava tentando se encaixar. A gente diz que sente muito mas, nem conhecíamos ela praticamente. Alissa Tisdale estava sempre sozinha e não, eu... A gente geralmente não liga muito quando tem professores novos. Alissa Tisdale conheceu todo mundo, nas ninguém realmente se importou em conhecer ela de verdade – começa alguns murmúrios pela quadra, de pessoas impressionadas, a diretora mandando um professor subir e tirar Alice de lá, mas ela prossegue – A Senhora Talbot ordenou que todos nós criássemos um discurso para homenagear Alissa, mas deveríamos nos desculpar. Na nossa sala, tem um monte de gente com problemas, pedindo socorro, e ela era só uma professora. E eu Alice Marian Wills, peço desculpas para a família Tisdale, peço desculpa por não termos sido apenas alunos, e eu espero que o caso de Alissa Tisdale seja solucionado e os verdadeiros responsáveis sejam peg.... – A Senhora Talbot pega Alice pelo braço e assume o microfone.
– É com extrema tristeza que a Saltlake high School, se despede de Alissa Tisdale – a senhora Talbot encerra as homenagens e desço das arquibancadas e vou atrás de Alice que corre dali para o banheiro.
Bato na porta antes de abrir e a encontro encarando o espelho.
– Bree, eu sinto muito – ela choraminga cobrindo os olhos.
– Não foi sua culpa Alice.
– Foi. Foi culpa de todo mundo