Capítulo 1

2496 Words
— Não achei que você fosse ligar — exclamou a loira, surpresa. — Eu poderia jurar que você ia desistir. — Sabia que Joanne preservava sua vida pessoal, e certamente para a morena chegar ao ponto de aceitar uma de suas sugestões, era porque obviamente não haviam muitas opções, e a opinião dada por Cassie até então havia sido a melhor. Joanne Jones estava sentada em frente à sua grande mesa, um pouco fora de si, alheia e perdida em seus pensamentos. Havia passado toda a noite pondo em questão os prós e contras daquela situação que diante da verdade para seu pai seria desonrosa. Pagar por um noivo na teoria era horrível, e na prática pior ainda. No entanto, naquele momento era necessário. — Meio dia e meia aqui embaixo? — Cassie Foz a olhava surpresa. Agora sim conseguia enxergar nitidamente o desespero da amiga. Não que não visse antes, mas o desespero que emanava dela agora era quase palpável. Cassie cerrou os olhos. — Você marcou com ele? Meu Deus! — Shhhh, desse jeito o andar inteiro vai escutar! — Pediu em tom de súplica. Sabia que seria complicado, mas a questão no momento era um tudo ou nada, ela precisava encontrar o suposto acompanhante para saber o quão diferente aquela teoria seria da prática. — Do jeito que aumentam as coisas aqui, vão me chamar de maníaca. A mais velha das irmãs Jones sempre fora o orgulho do pai, nunca pregara nenhuma peça a seu patriarca, era sempre educada e vencia cada obstáculo à sua frente, nunca havia levado um desagrado ou infelicidade sequer para a casa de seu progenitor. Ela era a filha que ele sempre quis, e mediante àquela postura jamais deixava a desejar, não poderia perder a postura diante do primeiro amor de sua vida. — Mas você vai realmente levar ele para passar as férias com a sua família? — Perguntou Cassie já sabendo que provavelmente aquela pergunta não teria resposta, não ainda. — Já parou para pensar que se realmente for levar ele, vai ter que agir como se ele fosse seu noivo? — Sorriu para logo se perder em suas próprias palavras. — Já parou para pensar se ele for feio? Vale lembrar que eu nunca o vi. Os olhos de Joanne procuraram o teto cor de marfim a fim de se tranquilizar, mas o nervosismo era inevitável diante das suposições da amiga, que tinha toda razão. Fitou Cassie afoita, não tinha pensado naquilo ainda. Certamente não seria tão fácil assim, apenas levar um homem até seu pai e apresentá-lo como seu noivo, deveria mostrar a toda sua família que ele era o amor de sua vida, nunca fora boa com mentiras dentro do âmbito familiar, mas para o bem dessa imagem ela deveria ser. — Eu não consigo acreditar na loucura que eu estou fazendo, eu juro pra você. — Seus pés transitavam com vida própria pela sala. — Quando vi, já tinha ligado. — É seu interior querendo desencanar, mesmo que de mentirinha. — Não estou achando graça nenhuma, Cassie. — Só pra descontrair. — A loira abaixou a cabeça. — Mas sabe que não é casada porque prefere assim. — Ou cuido dos negócios ou cuido de um marido. — Sem desculpas, Joanne. — A amiga salientou. — Sabe que eu te conheço como a palma da minha mão, — continuou — tire esses dias para relaxar, mesmo que a situação não seja lá as melhores. — Isso não pode sair do controle. — Mas em sua percepção já estava saindo. Respirou fundo ao olhar para o relógio e ver que já estava doze minutos atrasada para sair para seu encontro com o suposto futuro noivo. Olhou para a amiga que aguardava um movimento, rezando internamente para que seu noivo fosse ao menos um homem com uma boa aparência, pois aquilo já bastava. — Eu preciso ir, estou atrasada. Cassie pigarreou. — Se quiser e se sentir melhor, eu te acompanho. — Vou sozinha. — Joanne desceu pelo elevador, mas seus pensamentos continuavam altos, mirando o mais alto céu. Respirou fundo, na tentativa falha de acalmar sua respiração que saía do controle, assim como toda a situação. Ajeitou seu vestido de algodão cor de vinho, que se estendia pelo corpo até seus pés; a peça se sustentava apenas por uma alça grossa no ombro direito, escondendo o b***o cheio, herdado de família. Seria direta e passiva. Caminhou através dos corpos que tinham tanta pressa quanto ela de forma afobada. Estava tão ilhada em seus pensamentos que quase passou do ponto de encontro. O grande letreiro do famoso “Cheap Coffee” brilhando em vermelho anunciava que havia chegado. Ela olhou para o estabelecimento um pouco vazio, frequentado por algumas mulheres na entrada e alguns homens sentados no bar aos fundos. O relógio já marcava a primeira hora da tarde em ponto, ele estava atrasado, e o interior dela suplicando que ele tivesse desistido. — Um suco de maracujá, sem açúcar ou adoçante, por favor — pediu ao garçom sorridente que a seguiu ao entrar na cafeteria. Seria certo que nem mesmo aquele suco a tiraria do estado de nervos em que se encontrava. Talvez uma boa dose de gin, mas jamais faria aquilo naquele momento, pois o contato deveria ser profissional, e uma dose de álcool poderia soltá-la mais do que deveria. Uma e onze da tarde. Ethan estava completamente atrasado. Talvez tivesse realmente desistido. Aquilo mais parecia obra do destino mostrando à doce Joanne que aquela ideia era loucura, levar um homem que m*l conhecia para conhecer sua família, sabendo que este poderia ser um psicopata ou um assassino? Definitivamente quando sua melhor amiga lhe dizia que setenta por cento das coisas que ela fazia sem pensar era propício a dar problema, ela não estava errada. Ethan realmente poderia ser mais um dos milhares de problemas que ela arrumaria por acidente. Estava decidida a pedir a conta e ir embora, quando um homem entrou pela porta roubando a atenção de algumas mulheres que tomavam seus respectivos cafés perto da entrada. Mais ou menos um metro e noventa, dentro de uma blusa social azul escura, dobrada até um palmo acima da altura do pulso, onde marcava os músculos que sumiam dentro da blusa. Seus ombros eram firmes, usava uma calça social preta e um par de sapatos de couro cor de vinho. Ela rezou para que aquele não fosse o acompanhante atrasado, mas as chances de não serem foram aniquiladas no momento em que o homem cravou os olhos nos seus e andou em sua direção para sentar na mesma mesa que ela. Ela riu, aquilo só poderia ser uma pegadinha. — Senhorita Jones? — A voz melodiosa e grave era muito mais saliente ao ouvido pessoalmente, nem se comparava a como era por telefone. Ele possuía uma postura impecável, os cabelos acinzentados, desgrenhados como linho de ouro, se destacavam na pele bronzeada, harmonizando com a sutileza de seu olhar. A sobrancelha era grossa, o rosto viril e moldado, os lábios rosados e cheios, a barba por fazer. Não havia como não a notar. — Não contava com todo o engarrafamento, me perdoe pela demora. — Ele sorriu e pediu um drink desconhecido ao garçom, que não tardou a buscar. Até seus dentes cintilavam de tão brancos. — Prazer em te conhecer! — Reuniu todas as forças para lhe fazer uma saudação amistosa. Não era aquele tipo de imagem que ela esperava. — Chaos, Ethan Chaos. — Ele assentiu, observando-a. Joanne não deixava a desejar quando o termo era beleza, não era de nenhuma capa de revista, mas sua beleza chamava atenção entre as muitas mulheres da cidade. — Ao que me devo a sua chamada, senhorita Jones? Joanne assentiu e prosseguiu. — Vou explicar de forma resumida. — Respirou fundo. — Contei a minha irmã que tenho um noivo, e que iria passar as férias com a minha família. O problema é que esse noivo não existe, e eu não contava que ela contaria a todo mundo antes de eu voltar atrás, e dessa forma eu não posso mais desmentir. — Ethan brincou com a borda do copo passando o dedo sobre ele, analisando a história recém ouvida. Ele a encarou e as palavras soaram como ironia. — E para você seria melhor mentir contratando alguém a contar a verdade. — Ele riu. — Precisa então que eu seja seu noivo? — Indagou o homem obtendo uma confirmação da morena. — Já está bem grandinha para ficar mentindo assim para a família, não acha? Ele começou sério. Ela mirou um instante seus olhos azuis, e só então percebeu o quão profundos eles eram, exatamente como o mar, uma imensidão azul que poderia engolir facilmente quem quisesse, como o oceano faz em seu mais violento estágio. — Achei que você fosse um acompanhante. As sobrancelhas escuras arquearam-se. Ele balançou a cabeça rindo, seu riso era quase uma cantoria. Definitivamente Ethan seria perfeito para seu noivo. Não só em sua cabeça, mas definitivamente na de toda mulher. Dono de uma aparência impecável e olhos que fariam qualquer mulher lhe conceder o que quisesse, por que diabos ele era acompanhante? — Em algum momento desde a minha chegada eu disse que eu não era acompanhante? Esse é o motivo de estarmos aqui. — Sua postura se tornou ríspida. — Entenda, senhorita Jones, acompanho mulheres em reuniões, formaturas e coisas do tipo, algo que duraria certamente nada além de mais ou menos umas cinco horas. — Ele gesticulava com as mãos, de forma quase hipnotizante. — Além disso, está me propondo por mais de vinte e quatro horas ser um noivo de mentira. Ela suspirou, acreditando que sua proposta já lhe havia sido negada. — Na verdade, minha proposta são trinta dias no Texas, na fazenda da minha família, como meu noivo. Assim que terminarem esses trinta dias, eu digo que terminamos, você volta para a sua vida e eu para a minha. Ele mexeu na barba m*l feita com os dedos, pensativo. Sua mão correu até o copo, o levando à boca. Bebericou o líquido para depois balançar o copo enquanto pensava. — Cobrarei muito caro por isso. — Tomou mais um gole rápido, puxou um guardanapo e pediu uma caneta ao garçom, escrevendo ali um valor tão alto que a faria desistir de tal loucura ou se olhar no espelho para concluir que com tamanha beleza, ela não deveria contratar um noivo, pois conquistaria facilmente um. Mas ele estava enganado. Ela sorriu. — Aceito. — Ela cerrou os olhos, ela havia enfim, caído naquela loucura. — Partimos no domingo, às dezenove horas. Me passe sua conta bancária e uma foto do seu passaporte para que eu possa retirar suas nossas passagens aéreas. Ágil, essa era a palavra. — Devo saber algo sobre seus pais? — Perguntou seu agora, noivo. — Poucas coisas, te enviarei junto da passagem por e-mail — respondeu-lhe Joanne e ele assentiu. Ela se levantou da cadeira sorrindo ainda sim de forma singela, pronta para partir. Em um chamado quase mudo pediu a conta para o garçom. — E sobre você, eu preciso? De repente o sorriso que vestia os lábios rosados que tornava o homem ainda mais atraente desapareceu, dando a ele uma beleza a mais, mesmo quando ela achou que aquilo pudesse ser impossível. Apoiou o cotovelo na mesa e espalmou as mãos no rosto em posição de pensamento, uma expressão avaliadora caiu sobre sua face. — Não tenho relações íntimas com clientes. — Ele riu. — Além do mais, eu sempre faço o papel de amigo, irmão, ou algo do gênero. Mas, noivo? É bem peculiar. — Não será necessário. Ele se levantou da mesa sem parar de fitá-la. — Já que será minha noiva, preciso conhecê-la com mais detalhes. A única coisa que sei é seu nome. — Ele levou as mãos grandes para a gola de sua camiseta ajeitando o tecido amarrotado que era presente ali. — Se quiser conduzir, pondo limite, sinta-se à vontade. — Ele se aproximou, resgatou sua mão direita em um apertar de mãos amistoso e bem profissional, antes de deixar o dinheiro na conta acima da mesa e se virar para ir embora. Foi possível notar o sorriso sacana que novamente vestiu os lábios junto com suas últimas palavras. — Levo muito à risca meu papel, sua família irá acreditar, mas espero que você não. (...) — p**a merda, ele deve ser gostoso mesmo pra te cobrar tudo isso! — Gritou Cassie pelo telefone. m*l sabia a loira que havia p**o barato. A ideia surreal de que aquele homem costumava trabalhar como acompanhante ainda tomava sua cabeça. — Cara, faz ideia de que o valor que você está pagando para esse homem passar trinta dias com você é maior do que um ano inteiro do meu salário? Você deve estar louca. — Cassie, não me deixe pior ainda com toda essa situação! — Ela suspirou, sentando na quina da cama. — Uma reparação de erro necessária. Foz tossia, o frio da empresa junto ao calor extremo estava lhe deixando doente. — Eu te juro que achei que estivesse blefando. — Aquilo era como uma bronca de irmã mais velha. — Sabe a merda que vai dar se vocês forem descobertos, não sabe? Você contratou um completo estranho para passar trinta dias com você, tem ideia? Na verdade, ela tinha total noção do que estava fazendo, e era justamente essa noção que a deixava num estado de nervosismo total. Sempre planejara sua vida de forma que essa caminhasse sobre os trilhos em sua permissão e sobre seus olhos. Mas, nos últimos dias, ela não teria como prever o resultado de suas escolhas, era praticamente impossível. Estava cega diante do desenvolver da situação. — Ele me pareceu uma boa pessoa e... — Sua cabeça explodiria se seguisse na mesma linha de raciocínio da amiga. — Você falando dessa forma me deixa m*l. Além do mais, foi ideia sua. — Eu te amo e sou sua amiga, você sabe disso. — Pigarreou. — Eu juro que não achei que você aceitar a ideia — disse a loira. — Eu acho melhor que fira seu pai com a verdade do que o decepcione com a mentira. Estou começando a me arrepender de ter dado aquele cartão a você. Joanne se jogou de braços abertos sobre o colchão em seu quarto. — Eu também te amo, Cassy — ela respondeu — mas preciso prosseguir, não seria capaz de decepcioná-lo. — A escolha é sua, vou deixar você se organizar. Sabe que pode contar comigo, né? — Joanne sorriu vazio, sabendo que Cassie tinha total razão. Quem em sã consciência faria algo como aquilo? — Seja cuidadosa, se seu pai descobrir, você vai desejar ter contado a verdade desde o começo. As palavras de Foz raramente lhe chateavam com a verdade, mas quando a loira estava coberta de razão era diferente. Dessa vez, ela era a própria razão.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD