Vale dos Condenados.

1365 Words
Astryd Anhgel. Encarava o meu reflexo em frente ao espelho do quarto. Quase não me reconhecia naqueles vestidos extravagantes, decotados e muito sensuais. Meu closet estava repleto deles. Os cabelos brancos se destacavam no vestido vermelho até os pés. O decote nos p****s parecia mais exagerado do que o habitual. Não consegui tirar Mihai da cabeça desde que Scorpius invadiu minha mente, aquela lembrança há muito esquecida não me perturbava há anos. Eu me considerava uma garota emotiva e sensível. Nunca me envergonhei da minha fragilidade, mas ela já não parecia fazer parte de mim. Não mais. Ainda não tive tempo para conhecer todas as alas daquele castelo. Não me sentia segura nele, mas precisava conhecer meu novo lar. Deixei o quarto e caminhei pelos corredores que ainda não explorei. Havia muitos quadros nas paredes, mas um em especial chamou a minha atenção. Era uma rainha. Uma bela rainha de olhos negros impetuosos e cabelos brancos como os de Leonard. Sua expressão era fria e c***l, mesmo que fosse apenas uma pintura. Ouvi a madeira ranger ao meu lado, como se alguém caminhasse por mim. Meus pelos arrepiaram-se outra vez. Era rotineiro me sentir em alerta daquele castelo. A porta do último quarto no corredor abriu-se vagarosamente e uma quantidade absurda de luz saiu dela. Não pensei no que estava fazendo, quando percebi, já estava descendo as escadas daquele cômodo. Não era um quarto. No fim das escadas, havia uma enorme piscina. A calda de peixe da criatura submersa chamou minha atenção imediatamente, mas ela também notou a minha presença. A mulher nua parecia uma sereia de contos infantis. Nunca vi criatura mais bela. Me senti hipnotizada. Sua pele era n***a como a noite e seus cabelos enrolados e volumosos. Ela sorriu para mim, exibindo sua arcada dentária impecável, me peguei sorrindo de volta e caminhando na sua direção. Ela nadou até a borda e tirou os cabelos do rosto. — Ora, o que temos aqui. — Ele disse. — Está respirando? — Sua pergunta soaria estranha dias atrás. Não precisei responder. — Por que não entra? A água está ótima. Seu convite soou estranhamente tentador. De repente, me peguei querendo aquilo mais do que qualquer coisa na vida. Tirei os sapatos e me sentei na borda, colocando os pés na água. Ela me olhou com adoração e se aproximou cautelosamente. Senti seus dedos nos meus tornozelos e ela sorriu como uma criança travessa. Antes que eu conseguisse formular um pensamento, ela me puxou ferozmente para dentro da água e afundamos depressa. Em questão de segundos, já não estávamos mais numa piscina. A água ficava mais turva à medida que afundávamos. Parecia o fundo do mar. A aparência bela da sereia tornou-se assustadora. Seus dentes antes perfeitos, agora estavam pontudos e afiados, como de um tubarão. Os olhos ficaram vermelhos e os cabelos se transformaram em fogo. Senti o ar faltar, eu estava sufocando. Ela me levou cada vez mais fundo, ao ponto de achar meu cérebro ia explodir a qualquer momento. Quando cheguei ao fundo do oceano, fui sugada para um buraco e lançada contra as rochas. Bati a cabeça com força e apaguei. Ao acordar, vomitei a água dos meus pulmões, minha garganta queimava. Levantei-me da pedra, tentando reconhecer o lugar que estava. E me apavorei. Abaixo de mim, havia um lago vermelho com muitos corpos. Gritei e me levantei depressa, escorregando nas rochas e caindo dentro do lago. O cheiro de podre era terrível, minhas narinas ardiam com o odor. O sangue escorria pelos meus cabelos. Senti vontade de vomitar outra vez. Atravessei o mar de corpos e saí de dentro do lago com o choro de desesperando preso na garganta. Segurei num galho para me apoiar e então o cadáver cedeu para cima de mim. Era Mihai. Não consegui conter o choro dessa vez. Berrei em desespero e desejei sair de lá. Fechei os olhos e segurei o colar em meu pescoço. Quando abri os olhos, tudo desapareceu. Eu estava outra vez na borda da piscina. Sozinha. Me levantei desesperada e corri o mais depressa para fora dali. Meu vestido escorria sangue, o odor de cadáver podre impregnado em mim. Por onde passava, deixava rastros de sangue. Eu tremia, minhas pernas se entrelaçavam uma à outra conforme eu caminhava descoordenada. Só desejava sair dali. Eu precisava ir embora daquele castelo. Corri até o saguão, reparando na movimentação nada convencional do castelo. Parecia uma seita. Havia algumas pessoas numa roda encapuzadas da cabeça aos pés, seus rostos eram cobertos por máscaras assustadoras que imitavam caveiras e, ao centro, um casal nu transava ao chão cercado por velas vermelhas, como um ritual. Um dos homens mascarados deu um passo à frente e ergueu uma lança pontiaguda de cabo curto decorado por rubis, como se a exibisse para os demais. Então, cortou a garganta da mulher nua sentada sobre o homem. Eu quis gritar, mas uma mão tapou minha boca e me puxou para trás, arrancando-me dali enquanto eu me debatia, lutando pela minha liberdade. — Quer ser a próxima? — Keimon me soltou, me repreendendo. — Fique longe de mim! — Ordenei como se aquilo fosse o suficiente. Ele quase riu. — Por que sempre que nos encontramos você está suja? — Apontou. — Não tem permissão para perambular pelo castelo durante a noite. — Me repreendeu enquanto me arrastava para o quarto. Tentei me livrar do seu aperto, mas foi em vão. — Me solta, eu quero ir embora daqui! — Gritei, sendo ignorada. Ele abriu a porta do quarto e me lançou para dentro, escorreguei no sangue dos meus pés, caindo sentada no meio do cômodo. — É? Boa sorte com isso. Tente de novo amanhã pela manhã. — Disse debochado, trancando a porta. Aquela foi a última vez em cinco dias que vi qualquer pessoa, mesmo que ele não fosse uma. O sol estava quase se pondo, conseguia ver pela varanda do quarto. Aquele era o único contato que tive com o lado externo. O jardim gigante do castelo já não era mais tão bonito, passei a detestar aquela vista. No terceiro dia eu gritei, soquei a porta, chorei. Implorei para que alguém me tirasse de lá, mas isso também não aconteceu. Tudo o que recebi foram refeições numa bandeja de prata que surgiam sobre a cômoda por um encanto. No quinto dia, meus olhos estavam inchados de tanto chorar. Eu já não tinha mais lágrimas. Nem mesmo fome. Já tinha me conformado com aquele pesadelo particular, quando, a porta finalmente se abriu e Erubus apareceu. Ele não estava sozinho, três mulheres o acompanhavam. Elas entraram com uma arara repleta de vestidos, sapatos e muitas joias. Praticamente me obrigaram a me arrumar e não paravam de falar, mesmo que m*l trocassem palavras comigo. — Você está linda. — Uma delas disse ao terminar de modelar meus cabelos e sorriu. Não tive vontade de retribuir. Permaneci em silêncio absoluto. — O duque a espera para almoçar. — Erubus voltou para anunciar. — Não estou com fome. — É melhor obedecer se não quiser que ele volte aqui para buscá-la. — Avisou. Aquilo pareceu uma ameaça. Suspirei e me dei por vencida. Eu não entendia as atitudes de Leonard e oficialmente desisti de tentar, ele me tratava como uma marionete num jogo que nunca pedi para fazer parte. Talvez eu fosse um prêmio para exibir. Não que isso fizesse sentido para mim. Desci para a sala de jantar, a encontrando vazia. Apertei os olhos e o procurei ao redor. — O que está fazendo? — Ele disse ao aparecer na porta, parecia impaciente. — Não tenho o dia todo, Astryd. — Resmungou, apontando para a saída. — Achei que fôssemos almoçar. — Disse confusa. — Nós vamos, mas não aqui. — Avisou por fim, saindo na minha frente. Não entendi sua indiferença ou a frieza com a minha presença. Tampouco o castigo de cinco dias. O que eu fiz? O segui em silêncio para o jardim e seu motorista abriu a porta para mim, Leonard entrou em seguida, sentando-se ao meu lado. O caminho foi silencioso. Não olhei Leonard, ele também não tentou puxar assunto comigo. Era como se eu não existisse.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD