Elo.

917 Words
Os olhos avelãs de Astryd foram transformando-se, ganhando os mesmos pigmentos avermelhados dos meus. Os cabelos antes negros, clarearam, da raiz às pontas, assumindo a coloração platinada da minha. Ao me dar conta do que estava acontecendo, gargalhei, numa mistura de indignação e escárnio. — Do que está rindo? — ela disse confusa e puxou uma mecha dos cabelos longos e ondulados para frente, assustando-se. — O que você fez? — gritou, levantando-se depressa. — Ora, não me dê os créditos por isso. — Disse debochado. — O mérito é todo seu. — O-o que? — Gaguejou. — O que isso quer dizer? — Não fui eu que fiz isso, Anghel. — Expliquei. Ela negou prontamente, dando voltas pela sala. — Eu não fiz isso. Não sei fazer isso! — Gritou. — Eu não... Não entendo. — Balbuciou confusa, o seu olhar se perdeu outra vez. Oh, Astryd. Alguém lá em cima a odeia muito para ter lhe dado de presente para mim com tanta facilidade. Aproximei-me dela em passos largos e segurei seu braço bruscamente, forçando a garota a parar e atentar-se em mim. — O que você pediu exatamente? — Insisti desconfiado. Meu rosto estava de frente para o dela, próximo o bastante para sentir seu hálito encontrar-se com o meu. — Por liberdade. — Sussurrou. — Estranho. — Indaguei, soltando seu braço. — Isso não devia ter acontecido. — Então desfaça. — Pedi. — Não posso quebrar esse feitiço. — Resmunguei, deixando a sala. Astryd não se conformou, me seguindo pelos corredores. — O que isso quer dizer? — Gritou, apertando os passos. — Não posso interferir. Você pediu por isso. — Não, eu não pedi! — Retrucou. — Pedi por liberdade, não uma tintura de cabelo. — Havia irritação no seu tom. — Eu preciso da sua ajuda. — Eu tentei. — Dei de ombros, seguindo meu caminho sem olhar para trás. Nenhum feitiço nunca deu tão errado antes. — Tente mais! — Ela gritou tão alto que ecoou por todo o castelo. Me surpreendi pela potência da sua voz. Não era um tom humanamente possível de conseguir. — Eu disse que concordava com os seus termos. — Argumentou irritada. — Não pode me virar as costas agora. Não me quer mais? — Completou com a voz chorosa. Cessei os passos e sorri diabólico, virando-me na direção dela lentamente. Anghel tinha poderes agora? — Não estou virando as costas para você, amor. — Disse cínico. — Vou descobrir o que aconteceu. Ela suspirou aliviada. — Obrigada. — Forçou um sorriso. Quando tentei aparatar para o meu quarto, algo desviou o meu caminho, me lançando na floresta n***a junto com Anghel. Ela caiu no chão ao meu lado, com os cabelos longos e brancos cobrindo todo o rosto. Porra! Levantei-me depressa e lancei um feitiço de invisibilidade sobre Astryd, depois roubei sua voz. Não havia tempo para pedir educadamente que se calasse. Leviatã estava no fundo, distraído com um mortal que ele devorava lentamente, como se quisesse fazê-lo durar. Comeu primeiro uma das pernas e arrancou toda a pele. Pela quantidade excessiva de sangue, era um ser vivo, ainda encarnado. Aquilo não era raro de acontecer. Muitos magistas evocavam demônios em seus rituais, alguns deles não se empenhavam tanto quanto deveriam em suas proteções e feitiços de banimento. E bem, resultava nisso. Eram arrastados até o submundo e devorados até os ossos. Leviatã possuía r**o de cobra e cabeça de dragão. Anghel não foi capaz de esconder o choque e o pavor do rosto, tanto pela aparência excêntrica da criatura, quanto pela violência que assistia. — O que houve no castelo? — O demônio perguntou, diminuindo seu tamanho e assumindo a forma do mortal que acabara de devorar. Ainda que não completamente. Ele gostava de guardar para mais tarde. O homem chorava e berrava apavorado, seus gritos eram agonizantes. — Nada. Por quê? — Menti. — Nada? — Ele riu com desdém. — Engraçado, três almas escaparam do inferno. Me pergunto o que estava fazendo que não sentiu quando passaram por você. — Três? — Três. — Ele repetiu. — As traga de volta. — Ordenou. Concordei, olhando de soslaio para Astryd que permanecia imóvel e observava tudo com atenção. — Ouça, filho de Lucifer. — Sua voz soou mais grave. — Sabe que não pode permitir coisas como essa. — Acidentes acontecem. — Resmunguei. — Não deviam. — Ele sorriu falso. — Seu pai não está contente com você. — Me surpreenderia se ele estivesse contente com algo. Leviatã concordou, rindo. — Foi designado uma nova missão para que possa corrigir o seu grave erro. — Informou com escárnio. É claro que isso o divertia. Leviatã era um dos sete príncipes do inferno e representava seu pecado capital favorito, a inveja. Ele não gostava de mim. Nenhum príncipe gostava de mim. Eles não eram capazes de gerar mestiços como eu e isso os irritava. Para ser sincero, eu também não entendia o mistério por trás da minha existência. Demônios não respeitavam alguma hierarquia, mas se existisse uma, está claro que Lucifer seria o rei e os príncipes, seus meros discípulos. Talvez Deus ainda o adorasse apesar da sua traição. — E qual seria? — Perguntei entediado. — Cem almas. Você tem uma semana. — Sentenciou e desapareceu, levando consigo sua presa. Porra. Peguei Astryd em meus braços e voltei para o castelo. Ela caiu sobre o sofá. O choque ainda estampava seu rosto. — Como isso foi acontecer? — Reclamei para ela, bufando.
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