Paula dormia enquanto Baltazar apagava as luzes do trailer, deixando apenas a iluminação suave do corredor. Ele sabia que, se Baldrick acordasse, aquela luz o guiaria. Se deitou ao lado dela. Paula já estava ali, com os cabelos espalhados pelo travesseiro e os olhos fechados. Por tanto tempo, ele sonhou com esse momento. Agora, sem culpa, sem medo, ele podia tocá-la.
Ele passou a mão pelos cabelos dela, sentindo a maciez entre os dedos. Aproximou-se mais, respirando o cheiro suave que era só dela. Durante anos, ele a amou à distância, a protegeu, mas sem se permitir ultrapassar os limites que a situação exigia. Agora, ela estava ali, ao alcance de seus braços. Ele podia segurá-la, puxá-la para perto, sem a sensação de que estava quebrando uma regra.
Baltazar deslizou o braço em volta de Paula, puxando-a para perto. Ela se mexeu levemente, um movimento delicado, mas logo relaxou contra o peito dele. Em um sussurro, ela chamou o nome dele:
— Baltazar...
A forma como o nome dele soava em sua boca era diferente. Mais bonito. Ele sorriu para si mesmo, o coração cheio de algo que não conseguia colocar em palavras. Sua respiração era leve, tranquila. Baltazar se perguntou se ela sentia o mesmo conforto que ele ao estar juntos assim. Para ele, não havia sensação melhor. O calor dela era como um bálsamo, preenchendo tudo o que antes parecia vazio.
Ele fechou os olhos por um instante, apertando-a de leve, apenas para ter certeza de que aquilo era real. Os preparativos do casamento cigano já haviam começado. Seria um casamento bonito, como toda noiva cigana merecia. Paula podia não ter o sangue cigano, mas tinha o coração dele, e isso era tudo o que importava.
Quando estava quase dormindo, ouviu passos pequenos no corredor. Baltazar abriu os olhos e viu a porta do quarto se mexer devagar. Baldrick apareceu, um pedacinho de gente caminhando com passos inseguros, só de fralda, por causa da noite quente. Esfregando os olhinhos, chamou com uma voz sonolenta:
— Papi...
Baltazar sorriu, sentando-se na cama. Estendeu os braços, e Baldrick, tropeçando nos próprios pés, caminhou até ele. Quando finalmente chegou, Baltazar o pegou com cuidado, segurando o menino como se fosse um pequeno tesouro.
— O que foi, garoto? — perguntou baixinho, tentando não acordar Paula.
— Dormi junto — murmurou Baldrick, aninhando-se no colo dele.
Baltazar olhou para Paula, que continuava dormindo, e ajeitou Baldrick em seu braço. Deitou-se de novo, acomodando o menino contra seu peito. Beijou o topo da cabeça pequena e acariciou suas costas, enquanto a voz suave do menino ecoava:
— Mamãe...
Baltazar sorriu.
— É, agora a mamãe fica com a gente. Dorme, rapazinho. Aqui você está seguro.
Os olhinhos de Baldrick fecharam devagar, e o menino se aconchegou ainda mais. Baltazar olhou para os dois, Paula e Baldrick, dormindo em sua cama. Na sua vida louca, repleta de festas e bebidas, ele nunca imaginou que algo assim seria possível. Agora ela estava ali. E ele sabia que faria qualquer coisa para proteger aquilo. Até incendiar o mundo, se fosse preciso.
Dormiram , mas na madrugada, Paula acordou. Sentou-se por um momento e, sem conseguir voltar a dormir, foi até a janela. O silêncio do acampamento era acolhedor, e o vento leve trazia uma sensação de calma. Não demorou para sentir os braços de Baltazar ao redor dela, envolvendo-a em um abraço firme e protetor. Ele encostou o rosto no pescoço dela e respirou fundo.
— Perdeu o sono? — perguntou ele.
A voz rouca que aqueceu o coração dela.
— Não sei. Mas estou bem. Quando pegamos a estrada novamente? — ela perguntou, olhando para o céu.
— Em dois dias. Já começamos a preparar o nosso caminho. Tenho a licença e podemos nos casar no estado que quisermos — disse Baltazar,
Paula abriu mais a janela. O ar fresco entrou no quarto, e eles ficaram ali, abraçados. O silêncio da madrugada foi quebrado pelo som próximo de um motor. Paula se virou para ele, com uma expressão preocupada.
— Alguém está chegando, Baltazar.
— Não — respondeu ele, olhando para fora com atenção. — É alguém rondando, mas ninguém passa pelo portão. Temos homens de vigia.
O acampamento cigano tinha mudado muito nos últimos anos. Baltazar e os outros ciganos haviam trabalhado duro para garantir a segurança das famílias. Agora, todo terreno onde acampavam era murado e protegido por cercas elétricas. Depois que mais crianças chegaram e os membros começaram a se casar, a segurança se tornou prioridade.
Baltazar puxou uma cadeira para perto da janela e sentou-se, colocando Paula em seu colo. Ela se aninhou contra ele, agarrando-se ao seu peito.
— Promete que não vai deixar nada separar a gente?
— Ninguém vai separar, Paula. Nem mesmo o inferno inteiro. Se tentarem, eu coloco fogo no mundo — respondeu ele, acariciando os cabelos dela.
Os seus dedos encontraram um fio específico, um fio que ele reconhecia de tantas vezes em que o cortou escondido. Nos anos em que precisou manter distância, Baltazar entrava no quarto dela enquanto ela dormia e cortava pequenos pedaços de cabelo para sentir o cheiro. Quando o perfume do fio cortado desaparecia, ele buscava outro.
— Eu cortei — confessou ele, com um sorriso culpado.
— Você? — Paula perguntou, surpresa. Ela achava que o fio quebrava..
— Queria guardar o cheiro dos seus cabelos. Guardar você comigo.
— Eu esperei por você. E não importa o que venha, vou sempre proteger você e o nosso pequeno. Sempre..
Ela alisou o peito dele, mas teve as mãos seguradas.
__ Não pode fazer isso com Baldrick por perto, porque corremos risco de o controle sumir e a excitaç.ao chegar e não podemos com ele por perto..
Ela entendeu.
__ Essa marca foi fogo?
Era uma marca no ombro. Paula passou os dedos com delicadeza, sentindo a textura da cicatriz.
— Foi o fogo, não foi? — ela perguntou, com a voz baixa.
Baltazar suspirou, desviando os olhos por um momento, mas logo voltou a encará-la.
— Foi, mas fui eu que fiz. Vivi na loucura por muito tempo. Só não me afundei nas drog.as porque Zachary não deixou. O Baro não aceita que os homens dele fiquem viciados... não. Mas, quando a minha mente rodava, eu usava o fogo para me acalmar.
— Baltazar... — ela sussurrou, preocupada.
Ele sorriu levemente e balançou a cabeça.
— Não falo mais disso. Agora tenho uma chama mais bonita para olhar — ele disse, com um tom suave. — Você.
Paula sentiu o rosto esquentar e sorriu timidamente.
— Você é minha chama agora. Queimo por você .
Baltazar puxou-a para mais perto, a sua testa encostando na dela.
— Prometo não usar mais o fogo para me acalmar. Agora, você é o único fogo que preciso e tenho um foguinho ali dormindo, o garoto é fogo na roupa..