A manhã começava a iluminar o trailer quando Baldrick acordou. O menino, com os cabelos bagunçados e ainda sonolento, caminhou até onde Baltazar e Paula estavam. Ele esfregava os olhos com uma das mãos e arrastava os pés. Sem dizer nada, estendeu os bracinhos para a mãe. Baltazar sorriu, ajudando-o a subir.
Baldrick se aninhou no colo de Paula, com a cabeça encostada no peito dela. Ela passou a mão pelos cabelos do menino, sentindo o calor pequeno e reconfortante contra o seu corpo. Baltazar olhou para os dois, com o coração cheio. Ter suas duas pessoas favoritas no colo era um momento de pura paz.
— Tem uma padaria perto — disse ele, ainda acariciando Baldrick. — Vou comprar o iogurte que ele gosta. Tem na geladeira comunitária, mas ele não costuma tomar muito a marca que estocamos.
Baldrick desceu do colo de Paula, estendeu a mão para o pai e puxou como se quisesse levá-lo para começar o dia. O menino já entendia sobre as saídas e, para Baltazar sair sem ele, sempre era uma luta. O garoto não desgrudava do pai. Paula levantou-se, mas Baltazar, sorrindo, pegou Baldrick no colo e o levou para o banheiro.
Com o menino seguro em seus braços, Baltazar começou a ajudá-lo a se arrumar. Paula, ainda meio sonolenta, se deitou novamente e observando os dois sorriu Baltazar era tão natural com Baldrick. Em poucos meses, ele aprendeu coisas que ela levou muito mais tempo para entender. Cuidar do filho era algo que ele fazia com dedicação, paciência e, acima de tudo, amor.
Quando terminaram, Baltazar voltou até Paula, com Baldrick no braço e a outra mão livre. Olhou para ela com um sorriso.
— Vamos buscar o iogurte. Quer que eu traga mais alguma coisa?
— Não, só isso está bom.__ bocejando enquanto ajeitava os cabelos.
Baltazar inclinou-se, beijou a testa dela e saiu com o filho no colo. Enquanto caminhavam, o menino batia as mãozinhas, mas ele foi parado por Zachary, o chefe do acampamento. O Baro do povo cigano e líder do grupo de motoqueiros tinha um semblante sério, Baldrick foi pego pelo padrinho..
— Escute — começou Zachary. — Tem alguém rondando. As mulheres não saem sozinhas, e as crianças não ficam na beira do portão.
— Sabe quem é? — perguntou ele.
— Ainda não. Mas estamos em alerta. Bruno disse que um homem de carro esteve por aqui e perguntou por Paula.
Baltazar sentiu o sangue gelar.
— Quem era?
— Estava de boné e óculos escuros. Bruno anotou a placa, mas era fria. Então, seguimos atentos. Se não identificarmos quem é, moveremos o acampamento para a base de apoio.
Baltazar assentiu, tenso. A base de apoio era um acampamento especial, situado ao lado de um condomínio protegido pela máfia brasileira. Era grande, seguro, e todos estariam sob reforço constante. Ele sabia que seria a melhor decisão, mas não conseguia afastar a sensação de perigo iminente.
Ele olhou para Baldrick, que brincava distraidamente com o colar do padrinho, e pensou em Paula. Não importava quem fosse ou o que quisessem: ele protegeria os dois, mesmo que precisasse colocar o mundo inteiro em chamas.
— Ele já tomou café?
— Ainda não. Vou buscar o iogurte que ele gosta.
Com o menino nos ombros, Baltazar caminhou até a padaria. Comprou o que o garoto queria: iogurte natural. Enquanto estavam no balcão, Baldrick apontou para um pirulito colorido. Baltazar olhou para ele, mas balançou a cabeça.
— Mais tarde, garoto. Só depois do almoço.
Baldrick fez bico, mas não chorou, aceitando a decisão. Uma mulher que estava por perto sorriu para o menino, pegou o pirulito e o ofereceu.
— Para ele, é um presente — disse ela.
Baltazar a encarou, sério.
— Eu disse não, senhora.
— Mas é só um presente... — insistiu ela.
Ele não se moveu.
— Não conhece meu filho para dar algo a ele, nem mesmo a mim para insistir. Respeite isso.
A mulher, sem graça, recuou. Baltazar pagou pelo que havia comprado e estava prestes a sair quando um homem parou à sua frente, bloqueando o caminho. O sujeito tinha uma postura arrogante, olhando de Baltazar para Baldrick.
— Esse garoto é seu filho mesmo? — perguntou o homem. — Não se vê um motoqueiro andando com um menino assim a tiracolo... Cadê os documentos?
Baltazar o encarou com um olhar mortal.
— Se não sair da minha frente, vai morrer.
— Vou chamar a polícia — desafiou o homem.
— Chame quem quiser. Apenas saia do meu caminho — Baltazar respondeu, a irritação cresceu e não foi pouco, era bom com seu filho somente.
O dono da padaria apareceu rapidamente, reconhecendo Baltazar e sabendo da gravidade da situação.
— É o pai do garoto. Eles estiveram aqui no ano passado. Saia da frente, ele é do grupo de Zachary Romani — disse o homem, tentando acalmar a situação.
Ao ouvir o nome de Zachary, o homem ficou pálido. Ninguém queria se meter com os homens do grupo cigano, conhecidos por sua influência e por não deixarem ameaças sem resposta. Ele recuou, saindo apressado, enquanto Baltazar seguia o caminho com Baldrick ainda em seus ombros, protegido como sempre.
Baltazar já tinha passado por situações semelhantes. As tatuagens que cobriam os seus braços e pescoço, o jeito como costumava se vestir, com jaquetas de couro e correntes, colocavam as pessoas em alerta. Bastava sua presença para que olhares desconfiados surgissem. No fundo, ele até entendia: não era comum ver um motoqueiro com expressão pesada carregando uma criança nos ombros.
Mas, o que aquelas pessoas não percebiam, era que Baldrick se parecia com ele, sim. O menino tinha o mesmo olhar sério quando estava concentrado, o mesmo jeito de segurar firme em algo, como se soubesse o peso das coisas desde pequeno. Baltazar não precisava de "documentos" para saber que aquele garoto era seu, de todas as formas que importavam.
Ainda assim, os julgamentos continuavam. Inclusive Zachary já tinha enfrentado situações parecidas. O Baro, com sua postura intim.idadora, não passava despercebido em lugar algum. Mas os homens do grupo cigano não cediam espaço para gente assim. Não cediam mesmo. Era uma regra entre eles: nunca se abaixar perante o prec.onceito ou a ignorância alheia.
Seguiu em frente, sem olhar para trás, com Baldrick segurando firme em seus ombros. Era o tipo de cena que ele sabia que gerava estranheza nos outros, mas não se importava. Tudo o que importava estava ali com ele, e nada, nem ninguém mudaria isso.