Continuação…
Padre Vergas
Vire-me no mesmo instante que fogos explodem no céu, capturando espontaneamente a visão daquela linda imagem. As luzes coloridas desceram em incríveis cascatas. Mas não a avistei de imediato, como pensava. Ela se encontrava a metros de distância, e nem havia descoberto a minha presença ali, parado, sondando-a nesse distanciamento. No mesmo instante os meus sentidos ficaram em alerta, mesmo nessa segurança.
Samantha Cruz, estava lindíssima, caminhando tranquilamente pela multidão, alguns passavam apertando a sua mão, sendo educados com ela. Outros paravam para trocar duas, até três palavras de saudação. E eu fiquei ali contemplando pacientemente, enquanto notava o caimento do seu vestido, balançando contra o vento, moldando o corpo esbelto, não muito exagerado e nem muito magra, em forma. No peso que lhe cabia bem devido a sua altura, que devia ser de um metro e sessenta. Usava um vestido branco de alça, uma peça simples, e um tanto recatada, visto da maneira que havia chegado na paróquia. Não julgava ninguém pelas vestimentas, longe de mim cometer tal abominação, mas tudo que se refere a aquela senhorita era completamente incapaz de não reparar. Era algo instintivo, humano. Enfim, Samantha Cruz estava radiante enquanto caminhava lindamente a noite, parou em algumas barracas, e no fim escolheu duas maçãs do amor. Engoli em seco por aquela visão, quem pertenceria a outra fruta vermelha, feita com açúcar e corante?
Olhei em volta, apertando os lábios, pensando, matutando quem havia vindo com ela. Ciúme era o m*l que todo ser humano um dia haveria de sentir, mas um padre não deveria sentir tal transgressão. Me culpei em silêncio, deixando a moça curtir sua chegada nessa pacata cidade, esperando silenciosamente que a minha presença não fosse realmente notada.
Samantha
Minha mente estava a mil por hora enquanto vagava alegremente pela festa, cercada por cores, sons e risadas. As maças do amor que comprei estavam quentes em minhas mãos, um símbolo inocente e doce da celebração. O brilho dos fogos de artifício no céu me encantava, mas havia algo – ou melhor, alguém – que ocupava todos os meus pensamentos.
Caminhei entre as pessoas, desviando-me de conversas animadas e movimentos de dança, com um objetivo claro: encontrar o Padre Vergas. Sua imagem estava gravada na minha mente desde aquele primeiro momento que o vi. O contraste entre a sua presença austera e o ambiente vibrante da festa fazia com que eu me sentisse quase como se estivesse em um sonho.
Finalmente, depois de horas de busca, avistei-o. Ele estava ali, de pé à margem da festa, seu olhar fixo em um ponto distante. O mundo ao redor parecia desaparecer quando nossos olhares se encontraram. Era como se o tempo parasse, e eu me visse, de repente, no centro de um universo que tinha apenas a nós dois.
Ele parecia surpreso ao me ver, e eu pude perceber um leve movimento em seus olhos, como se ele tentasse desviar o olhar, mas fosse inevitavelmente atraído pela minha presença. Eu me aproximei com um sorriso, minha determinação visível, mesmo enquanto sentia um frio na barriga.
— Padre Vergas — comecei, estendendo uma das maças do amor para ele, — eu trouxe isto para o senhor.
Ele olhou para a maça com uma expressão de surpresa misturada com desagrado.
— Samantha. Quis dizer, senhorita... — sua voz estava tensa, como se estivesse lutando contra algum desejo interno. — Você realmente veio, mesmo depois de ter sido tão grosseiro com sua pessoa.
Dei um sorriso suave, meu olhar nunca desviando dos seus olhos negro.s, profundos como um poço sem conseguirmos avistar o fim dele.
— Não importa. Eu queria muito vê-lo — respondi, minha voz firme apesar da emoção que me envolvia.
O silêncio entre nós parecia pesado, como se estivéssemos ambos tentando entender a magnitude do momento. Podia sentir a tensão no ar, e o desejo reprimido de ambos estava palpável.
Ele finalmente aceitou a maça com uma expressão de relutância, e eu percebi uma leve suavização em seu semblante.
— Não deveria estar aqui contigo. É... é impróprio — ele disse, ainda tentando manter a distância.
Mas não deixei isso me desanimar. Com um impulso decidido, comprei um algodão doce para mim, o doce rosa girando na máquina antes de ser entregue. Peguei a delicadeza açucarada e, sem pensar, dei uma mordida enquanto o observava.
— Venha — convidei, puxando-o gentilmente pelo braço. — Vamos aproveitar a festa. Você não pode ficar aqui parado o tempo todo. Vamos dar uma volta, talvez até andar no carrossel.
Ele ficou ainda parado. Depois de comer todo o algodão doce fiquei olhando para ver se ele iria comer a maça vermelha, como não o fez, não quis comer sozinha.
Outras pessoas ao redor, animadas e envolvidas na festa, começaram a nos incentivar. Havia um entusiasmo contagiante no ar, e logo começamos a caminhar em direção ao carrossel. Eu ri quando ele hesitou um pouco, mas a animação ao nosso redor parecia ter um efeito mágico.
— Vamos! — disse-lhe, olhando para ele com um brilho de expectativa. — Não seja tão sério. É uma festa!
Ele parecia estar lutando contra o sorriso, mas era claro que ele estava sendo conquistado pela energia da festa e pela minha persistência. As pessoas ao nosso redor estavam animadas, sentia que a presença dele estava se tornando mais uma parte do momento do que uma barreira.
Chegamos ao carrossel e, apesar de sua relutância inicial, ele acabou se rendendo ao encanto da atração. Subi em um dos cavalos de madeira, e o vi hesitar por um momento antes de se aventurar também.
Enquanto o carrossel girava, olhei para ele e vi que, apesar de sua postura rígida e expressão séria, havia algo de leveza em seus olhos. E enquanto a música e as luzes envolviam a comunidade festeira, soube que, por um breve momento, estávamos compartilhando algo mais profundo do que palavras poderiam descrever.
O tempo parecia um borrão enquanto o carrossel girava, e eu sabia que aquele instante, aquele encontro, era algo que ambos iríamos lembrar por muito tempo. Ou quem sabe, por toda a nossa vida.
Padre Vergas
Samantha estava tão radiante quanto os fogos de artifício que estouravam no céu. Eu a vi se aproximar, sua presença inebriante cortando a multidão como uma faca quente na manteiga. Ela estava segurando duas maças do amor, e a visão dela, com o vestido branco esvoaçante e aquele sorriso encantador, fez meu coração acelerar de maneira inesperada.
Ela me chamou, e eu estava tão imerso em seus olhos brilhantes que quase esqueci de como respirar. A maça do amor em sua mão parecia um presente celestial, mas eu estava mais intrigado com o gesto em si. O que ela estava fazendo aqui? E por que, mesmo após minha rudeza, ela ainda procurava minha presença?
— Padre Vergas — disse ela, estendendo a maça para mim. Sua voz era suave, mas firme, com um tom que carregava uma determinação que eu não conseguia ignorar.
Eu olhei para a maça e depois para ela, tentando formular uma resposta adequada, algo que fosse ao mesmo tempo respeitoso e que pudesse afastar o tumulto que sentia dentro de mim.
— Samantha. Quis dizer, senhorita... realmente veio, mesmo depois de ter sido tão grosseiro contigo — falei, a surpresa e a perplexidade evidentes em minha voz.
Ela sorriu, um sorriso que parecia iluminar não apenas o rosto dela, mas também o ambiente ao redor.
— Não importa. Eu queria muito vê-lo — respondeu ela, a sinceridade em suas palavras era quase palpável.
Eu peguei a maça com uma relutância que tentava disfarçar a agitação que estava sentindo. As palavras dela me atingiram como um golpe inesperado, não conseguia evitar a sensação de que algo estava mudando no ar entre nós.
O peso de sua presença era quase opressor, e eu tentei manter a compostura, mas a verdade era que minha mente estava ocupada tentando entender o que estava acontecendo. Me perguntava se ela tinha noção do efeito que tinha sobre mim, se sabia o quanto sua presença mexia com minha percepção do mundo ao meu redor.
Ela parecia tão confortável, tão confiante, e a maneira como ela caminhava ao meu lado, como se estivesse compartilhando um segredo, me fazia sentir que estava em um território desconhecido e perigoso. A multidão ao nosso redor parecia apenas um borrão de cores e sons, uma abstração distante comparada à clareza de Samantha.
Enquanto caminhávamos, ela comprou um algodão doce, a cor rosa contrastando com o branco de seu vestido. O gesto dela foi tão natural e despretensioso que, por um momento, me senti mais relaxado, como se estivesse começando a aceitar a ideia de estar ali com ela.
— Venha — disse ela, seu olhar desafiador e animado. — Vamos aproveitar a festa. O senhor não pode ficar aqui parado o tempo todo. Vamos dar uma volta, talvez até andar no carrossel.
Eu hesitei, lutando contra a ideia de me entregar à diversão, algo que parecia tão incompatível com minha posição e minha natureza. Mas as pessoas ao redor estavam nos incentivando, e havia uma força invisível que parecia empurrar-me para participar.
Ela subiu em um dos cavalos de madeira do carrossel, e eu a observei por um momento antes de me render. Sentia que estava me afastando do caminho que deveria seguir, mas a maneira como ela me olhava, com um brilho de expectativa e uma leveza que era contagiante, fez com que eu pudesse resistir.
Subi em um dos cavalos, tentando manter uma postura séria, mas a sensação do movimento e a música animada começavam a me envolver. Samantha estava ao meu lado, e eu podia ver a alegria em seu rosto. O carrossel girava, e eu me vi envolvido não apenas na atração, mas na maneira como ela tornava cada momento mais especial.
Enquanto girávamos, o tempo parecia dilatar, e por um instante, a festa, a multidão, e até mesmo meus próprios conflitos internos se dissolviam em um fundo desfocado. Tudo o que restava era Samantha, seu sorriso e o calor da sua presença, que faziam com que eu me sentisse, de alguma forma, em casa.
A música e as luzes do carrossel misturavam-se com a sensação de estar ao lado dela, e eu me perguntei se aquilo era uma forma de fuga ou uma revelação. O que quer que fosse, eu sabia que, naquele momento, o mundo tinha mudado de forma sutil e irrevogável.
O carrossel finalmente parou, mas o impacto daquela experiência continuava a ecoar dentro de mim. Olhei para Samantha, e no brilho de seus olhos, vi algo que eu não conseguia definir com clareza, mas que sabia que era importante. Eu estava prestes a entender mais sobre mim mesmo e sobre o que significava estar ao lado dela.