Capítulo 5

1991 Words
Continuação... Depois de desfrutarmos do sorvete e conversarmos sobre diversos assuntos, percebi que Samantha parecia mais relaxada. Eu sabia que havia algo a mais que poderia fazer para ajudá-la a se sentir mais confortável na cidade. Então, tive uma ideia. — Samantha, se ainda estiver interessada em encontrar um emprego, conheço uma floricultura que pode estar procurando por alguém. — Disse, com um tom de encorajamento. — Posso levá-la lá agora mesmo. Ela aceitou a sugestão com um sorriso. Era bom ver que ela estava aberta a explorar novas possibilidades. Dirigimos até a floricultura, que ficava em um bairro charmoso da cidade. Era uma loja pequena, mas com um ar acolhedor, e um aroma de flores frescas preenchia o ambiente. Ao entrarmos, a dona da floricultura, Dona Laura, estava organizando um buquê de lírios. Ela era uma senhora de meia-idade com uma aura gentil e calorosa. — Bom dia, Dona Laura — cumprimentei, com um sorriso. — Lhe apresento senhorita Samantha Cruz, uma jovem que está procurando trabalho. Dona Laura levantou os olhos e sorriu para Samantha. — Prazer em conhecê-la, Samantha. — Disse ela, estendendo a mão. — Estamos sempre à procura de ajuda aqui. Ainda mais alguém tão bela assim. Embora o elogio daquela distinta senhora tenha sido do seu mais profundo sincero íntimo, percebi o desconforto que a palavra “bela” trazia em seu semblante. Parecia uma cruz que ela precisava constantemente suportar. Conversamos brevemente sobre a possibilidade de Samantha trabalhar na floricultura, e Dona Laura parecia entusiasmada com a ideia. A partir de hoje, ela poderia começar a trabalhar meio período, ajudando com a organização das flores e atendendo os clientes. Saímos da floricultura com um novo senso de realização. Esse novo passo poderia ser um começo promissor para Samantha. Quando a levei de volta ao carro, percebi que havia algo mais que poderia fazer para ajudar. Decidi aproveitar a oportunidade para oferecer-lhe um lugar onde ela pudesse se instalar com mais tranquilidade. — Samantha, quero te oferecer a minha moradia, que está disponível. Fica um pouco distante da paróquia, por isso não vivo por lá. Dormir nos fundos da igreja fica mais acessível ao meu ver, exclusivamente para realizar minhas funções sacerdotais. Posso lhe dar as chaves para que fique bem instalada enquanto ajeita uma moradia melhor para si. — Disse, observando sua expressão. Ela hesitou, olhou-me com um semblante de dúvida. — Não quero ser um incômodo, Padre. — Respondeu, visivelmente preocupada. Eu a tranquilizei com um gesto de mão. — Não se preocupe, Samantha. A casinha é pequena, mas confortável. E para que você fique tranquila, preciso informar que eu não tenho uma cópia da chave. Portanto, nem eu nem ninguém terá acesso ao lugar sem sua permissão. Meu único desejo é que você esteja segura e se sinta bem aqui. Ela olhou para mim, um pouco mais aliviada. — Se o senhor tem certeza de que não há problema, aceito a oferta. — Disse, com um sorriso tímido. — Agradeço muito, Padre. Fui até o carro, peguei o molho de chaves e entreguei-as a ela. — Espero que este lugar possa ser um refúgio agradável para você até que se sinta mais à vontade. E se precisar de qualquer coisa, não hesite em me procurar. Enquanto Samantha pegava as chaves e olhava para elas, pude perceber um brilho de gratidão em seus olhos. Esperava que essa pequena ajuda fosse um primeiro passo em direção à estabilidade para ela, e para alimentar um lado meu que se contentava em apenas ajudá-la. Samantha Depois de conseguir um emprego na bela floricultura, o padre me levou ao seu outro e verdadeiro lar, quando entramos reparei que ele não visitava há muito tempo a casa, olhei reparando os móveis simples e empoeirados, notando com uma nota de humor sua aparente preocupação em remover os lençóis brancos sobre alguns objetos de decoração, além do acento que ele prontamente bateu levantando uma poeira escura que me fez tossir horrores. Aquilo se infiltrou em meus olhos, enquanto tentava chegar nele para falar para parar, mas ao invés disso bati o pé em algo bastante pesado, machucando-me o suficiente para gemer, e quase tropecei laçando-me desajeitadamente para frente por causa da dor repentina e dilacerante. Padre Vergas me segurou firme pelos braços, a vista voltando pouco a pouco, me concentrando exclusivamente nele, e nas linhas duras do seu rosto de homem maduro, vivido. Mais velho. — A senhorita se encontra bem? Tá machucada? Quer água? Aqui não tem água gelada, faz meses que não visito este lugar, mas tem um poço aqui do lado e… Desculpe, Não deveria ter dado um de perfeccionista com limpeza agora, olha como a deixei. Virei a face, podo a mão fechada perto da boca, dando umas confirmadas se a garganta se encontrava seca. Inocentemente suas mãos gentis escorregaram pela minha cintura, mantendo-me presa a ele de uma maneira que fez meu coração saltar, acelerar, pulsar de uma forma bastante indevida por ele ser um homem de Deus. Um homem praticamente santo, intocável, imaculado. Mesmo assim a pele arde em chamas, sem conseguir controlar a doce sensação proibida que me invadia, Segurei naqueles braços que me agarravam fortemente. Senti discretamente a largura do seu bíceps sobre a superfície áspera da sua batina, a vestimenta de sacerdote. Pisquei tentando me recompor, não pela poeira, mas ele amistosamente se aproximou mais, acariciou um lado do canto do meu olho, e depois o outro, averiguando se tinha causado algum dano a minha visão, se fixando tanto que me vi refletida sobre a sua íris totalmente escurecida. — Estou bem, padre. — Tem certeza? — Absoluta. Suspirou lentamente antes de me soltar. Ele o fez devagar, analisando-me atentamente. — O senhor é sempre tão atencioso com as pessoas que faz caridade? — perguntei, desabrochando um sorriso meigo dos meus lábios, fazia tempo que não me sentia tão protegida assim. No entanto, pareceu incomodar o sacerdote, que se prontificou a dar dois passos para trás, igual o que fez na rua quando nos esbarramos. Ele pigarreou antes de me direcionar a palavra. — Nem tanto, mas isso vai ter que parar. O máximo que posso fazer pela sua segurança é isso. Sorri, mesmo ele falando tão seriamente comigo. Balancei as chaves com entusiasmo bastante expressivo. Eu estava feliz, pela primeira vez na minha vida eu me sentia feliz. — Estou começando bem, muito em breve não terás que se preocupar comigo, padre. Ele juntou solenemente as mãos, enquanto as mantinha com os braços abaixados. — A senhorita não me entendeu. — respirou profundamente caminhando em direção a saída. — Se familiarize com a residência sozinha, preciso ir, ela é sua, não precisa se preocupar, fique o tempo que precisar. — O senhor já vai? Podia ficar mais, quem sabe posso tentar fazer um cafézinho… Podemos ir até a cafeteria onde o senhor queria me levar, antes de mencionar sobre o sorvete. Andei apressadamente na intenção clara e bastante objetiva de alcançá-lo, mas ao se virar levantou as mãos entre nós, fazendo-me frear os movimentos, encerrando os passos abruptamente. — Tenho outros para cuidar, senhorita. Não posso viver exclusivamente aos cuidados da sua pessoa. Mesmo que necessite tanto, preciso de uma pausa. Isso me atingiu de uma forma r**m, mas não deixei transparecer, é claro que ele era um homem bastante ocupado. Importantíssimo para esta cidade aparentemente tão pequena — Perdão, padre, não era a minha intenção fazê-lo perder seu precioso tempo comigo. — ditei mais ranzinza do que esperava. — Espero que me entenda, senhorita. Ficará bem? — perguntou vendo uma faísca pequena de preocupação naqueles olhos escuros, fortes, e penetrantes. Talvez fosse impressão minha, ou talvez fosse a minha carência afetiva, mas o padre Vergas me olhava de uma forma que transcendia com a sua vocação, via-se que ele se perdia claramente quando olhava muito na dimensão da tonalidade dos meus olhos azuis. Não me gabava por isso, pelo contrário, me sentia querida. Especial ao seus olhos. — Senhorita, ficará bem aqui sozinha? — perguntou novamente, dessa vez com um tom preocupante em sua grave voz pastoral. — Creio que sim. — segurei a porta de madeira. — Reze por mim padre. — Rezarei, disso pode ter certeza. E assim ele se despediu rapidamente com um carismático aceno de cabeça e se foi. Fiquei ali vendo este homem santo dirigindo seu carro para fora da sua propriedade. Fechei a porta com certa força, dando um longo suspiro, peguei a vassoura e comecei a faxina. Padre vergas Aquela menina… Não posso, não devo ficar vendo essa garota. Seus olhos me faziam pecar numa intensidade alarmante, o toque sedoso da sua pele na minha fazia meu corpo inteiro estremecer, portanto o máximo que podia fazer por ela já havia feito. Agora era seguir em frente com a vida corriqueira de um padre, a que escolhi para passar todos os dias até a consumação da minha morte. Decidi retomar aos meus afazeres sacerdotais do dia, mas hoje não teria muito o que fazer por causa da festa comunitária, então preferi ir direto ao centro da nossa pequena cidade do interior. O caminho foi calmo, sem as surpresas que o destino despejava em minhas costas. Em todos esses anos de resiliência, orações e dedicação cega, me via sendo atirado na direção de um abismo. Ao chegar encontrei amigos de longas datas. — Padre Vergas! O senhor já cedo por essas bandas? — perguntou um moço, bastante prestativo, enquanto arrumava as bandeirinhas que se agrupavam retas, em correntes em nossas cabeças. Respirei o arzinho da tarde, sendo inundado por uma paz de espírito abundante. — Preferi vir cedo, ajudá-los com a arrumação. A paróquia não será frequentada, os fiéis virão para cá devido a festividade do começo do ano. Normalmente me importaria com esse detalhe, mas hoje, por hora estarei mais feliz por estar em contato com música, brincadeiras e comida boa. O rapaz desceu da escada sorrindo, enquanto outros vieram pedir a benção que precisavam para realizar aquela cerimônia anual, de um jeito que trouxesse sorte para o resto dos meses que virão. *** Horas depois, umas cinco horas da tarde, a festança começava, foi assim que me recordei do convite amistoso que havia feito a senhorita Samantha, e torcia, pedindo a todos os santos que ela não viesse para dar ao ar a da sua majestosa graça. Precisa sair logo daqui, antes que seja tarde demais. Por Deus, Vergas! Que tipo de servo você é se não pode apenas olhá-la de longe? Olhar sem um pingo de malícia, apenas apreciando a beleza angelical da menina. Meus pensamentos não estão em ordem, o que fiz de errado para pensar tal coisa de uma pobre alma precisando de ajuda ? Não fazia sentido, sempre fui tão controlado dos meus instintos de homem, eles nunca tinham se rebelado contra as minhas maiores virtudes. Pensando dessa forma, permaneci por horas andando sem rumo pelos corredores de terra seca e gramado batido, rente, observando as tendas, as barracas de comida. As pessoas que se conheciam e se cumprimentavam alegremente, curtindo aquele momento festivo, cultivando quem sabe novos laços, novas amizades e… — Padre. Uma voz familiar havia me chamado baixinho, como se fosse um canto de sereia, um convite, uma penitência. Vinha atrás. Fechei os olhos com força, apertando o terço que segurava firmemente contra o peito. O ar ficou instantaneamente carregado, pesado com o pensamento de ser obrigado a repeli-la. Estava ao ponto, formulando uma frase nada cordial, nada amigável, contradizendo o que realmente sentia, o que devia sentir por uma alma refém das amarras grotescas do seu passado, mas no fim meu coração falou mais alto do que a frágil intenção de mantê-la afastada. — Então, a senhorita resolveu vir mesmo. — Respirei fundo, lutando internamente para não me virar. No entanto, quando me vi, meu corpo inteiro já havia se decidido por mim, estava fazendo o que minha mente gritava para não executar. Continua...
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