Samantha
Ver aqueles dois anéis pendurados no cordão que o Padre Vergas guardava tão próximo ao peito, sob suas vestes de sacerdote, me pegou de surpresa. A princípio, foi um choque, como se o mundo ao meu redor parasse por um segundo, e minha mente lutasse para compreender o que significava aquilo. Ele havia mantido nossa promessa, mesmo depois de tudo. Mesmo após o término. No entanto, em meio ao turbilhão de emoções, algo dentro de mim se manifestou — e eu sorri.
Eu o vi ali, com aquele gesto tão íntimo, tão inesperado, e meu coração quase saltava do peito. Nós nos olhávamos, presos em um laço invisível que ninguém mais poderia entender. Sentia o calor da nossa história pulsar no ar, carregado de sentimentos não resolvidos. Mas quando o padre Vergas tentou se aproximar mais, um grupo de convidadas surgiu inesperadamente. Elas se aproximaram de maneira tão abrupta que o assustou, fazendo-o recuar bruscamente.
O reflexo foi imediato: ele escondeu o cordão rapidamente, porque aquilo era um segredo que não pudia ser descoberto. Os anéis, a prova silenciosa do nosso amor, desapareceram sob o manto sagrado. Aquelas senhoras sem a menor consideração o arrastaram para longe de mim, falando e gesticulando, sem se importarem em interromper o que, para nós, era uma ocasião intímä.
O rosto dele mostrava claramente a inconformidade, a contrariedade em ter que se afastar da sua Cruzinha daquela maneira. Seus olhos ainda estavam fixos nos meus, tentando se comunicar em silêncio, como se quisesse pedir desculpas por ser levado assim, forçado a cumprir seus deveres.
Fiquei parada, observando-o ser puxado por elas, seu olhar se perdendo aos poucos, mas ainda preso ao meu. Sentia uma mistura de frustração e tristeza ao vê-lo partir. A única prova de nossa união, escondida sob suas roupas de sacerdote, era a lembrança de que, por mais que estivéssemos distantes, aquele laço ainda existia — mesmo que escondido do mundo.
Enquanto ele desaparecia em meio ao aglomerado de mulheres, meu coração batia descompassado. A saudade que havia guardado por tanto tempo parecia mais forte agora. A prova de que, por mais que tentássemos nos afastar um do outro, ainda havia algo ali que nenhum de nós poderia apagar.
Padre Vergas
Enquanto as senhoras da igreja falavam, suas vozes soavam como um ruído distante. Elas discutiam sobre as festividades, os preparativos para o próximo evento da paróquia, e pediam minha opinião sobre questões menores da comunidade. Mas minha mente estava muito longe dali.
Eu só conseguia pensar em Samantha.
O momento que acabávamos de compartilhar, por mais breve que fosse, queimava em meu peito. A visão dos anéis, escondidos sob minhas vestes, me lembrava de que, por mais que eu tentasse, não conseguia deixar aquele amor para trás. Não permitiria que escapasse entre meus dedos, e que lutaria para mantê-lo vivo, acesso, mesmo que não tivesse as ferramentas ideias. A sensação de proximidade que senti ao vê-la ali, com o sorriso tímido e os olhos cheios de uma emoção que me consumia, era avassaladora.
Tentei me concentrar nas palavras das beatas que estavam ao meu redor, mas minha mente insistia em vagar. "Será que Samantha ainda está por aqui?", pensei enquanto disfarçava, olhando em volta, tentando encontrar seu rosto entre as pessoas.
Mas não a vi.
Ela havia desaparecido. Sentia a ausência dela como um peso no peito, uma perda súbita que me deixava inquieto. Mesmo assim, me vi obrigado a interagir com aquelas senhoras, que falavam sem parar, sem perceber minha falta de atenção.
— Padre, o senhor acha que deveríamos decorar a capela com rosas ou girassóis na próxima celebração? — uma delas perguntou, animada, sem nem perceber que eu estava ali apenas em corpo, mas não em espírito.
— Rosas... acho que rosas seriam mais apropriadas — respondi mecanicamente, m*l percebendo o que dizia, apenas para satisfazer suas expectativas.
Outra senhora, ainda mais falante, interrompeu:
— Ah, mas o senhor não acha que girassóis trariam mais alegria ao ambiente? Eu sempre digo que a igreja precisa de mais cor, mais vida!
Assenti vagamente, sem sequer processar a discussão. Meu olhar voltou a vagar pelo jardim, pela multidão, mas Samantha não estava lá.
A cada segundo que passava, a inquietação crescia dentro de mim. Deveria estar presente, atencioso, dedicado ao meu papel de líder espiritual para aquelas mulheres, mas não conseguia. Meu coração e minha mente estavam presos à imagem dela. Ao sorriso que escapou em meio ao nosso reencontro, ao brilho nos olhos que, por um breve instante, me fez acreditar que talvez houvesse ainda uma chance de redenção para nós dois.
— Padre, o senhor está bem? — uma das senhoras me chamou de volta à realidade, notando minha distração.
— Sim, claro... estou bem. — Respondi com um sorriso leve, tentando disfarçar o turbilhão dentro do meu interior. A ansiedade de estar com ela, tocar em seus cachos escuros, e ter o enorme e estranho prazër de desmancha-los enquanto os toco com as duas mãos. Sentindo os fios sendo alisados naturalmente ao poder do meu toque de homem apaixonado. Rendido a doce jovem.
No entanto, por dentro, sabia que estava longe de estar bem. Samantha havia se afastado de mim uma vez, e a dor dessa separação ainda pairava entre nós, e isso era insuportável de pensar.
E mesmo cercado por outras pessoas, mesmo imerso nas responsabilidades da paróquia, só conseguia pensar nela. Portanto precisava vê-la novamente.
Samantha
Dei um volta inteira pela frente da grande propriedade, notando enquanto comia as guloseimas do meu prato, a arquitetura, no estilo casarão do interior, antigo mas que beirava sofisticação dos tempos modernos, sem tirar sua maior caracteristica. A fachada.
Voltei para perto da Jessica, a anfitriã da festa e futura mãe, levando comigo alguns quitutes que peguei da mesa. A comida m*l me interessava, mas precisava disfarçar o turbilhão de emoções dentro de mim. O vento ainda soprava leve, e eu tentei focar no céu azul, nas árvores ao redor, qualquer coisa para me acalmar.
Do jardim, tentei avistar o padre Vergas. Mas, entre as beatas da igreja que o cercavam, m*l conseguia vê-lo. Uma frustração começou a crescer em meu ser. Ele estava ali, tão perto, e ao mesmo tempo, parecia inalcançável. Suspirei fundo e sentei ao lado de Jessica.
— Você está bem, Samantha? — Ela perguntou, com um sorriso gentil, enquanto repousava uma das mãos sobre sua barriga arredondada. Tentei não demonstrar, mas o cansaço emocional estava visível no meu rosto. Olhei para ela e sorri, sem muito entusiasmo, focando no prato em minhas mãos.
— Sim... só estou um pouco cansada, acho — respondi, com a voz baixa. Mas, ao olhar para o rosto de Jessica, vi sua expressão tranquila e amorosa. Parecia que minha presença não estava causando desconforto, como eu temia. Talvez ela estivesse de alguma forma tentando desviar a minha atenção de tudo o que me afligia.
Jessica olhou para a direção onde o padre estava, e então, voltando seu olhar para mim, comentou com um leve sorriso nos lábios:
— Ele é um homem muito bonito, não é?
Meu coração deu um salto no peito, e o sangue pareceu correr mais rápido pelas minhas veias. Olhei para ela, tentando disfarçar, mas senti minhas bochechas queimarem de nervosismo. Instintivamente, coloquei um dos cachos que havia arrumado com tanto cuidado para a festa atrás da orelha.
— Quem... quem, o padre? — Gaguejei, tentando parecer desinteressada, mas minha voz me traiu.
Jessica riu baixinho, com um brilho divertido nos olhos, sem perder o tom amigável.
— Sim, o padre. Notei como a senhorita olha para ele... — Ela lançou um olhar rápido para a multidão onde ele ainda estava, cercado pelas senhoras. — Não precisa se envergonhar. Ele realmente chama atenção.
Tentei manter a compostura, mas por dentro, estava em completo caos. "Será que ela sabia? Será que todos ao redor podiam ver o que estava acontecendo entre nós, mesmo sem palavras?" Essas perguntas giravam na minha mente, me deixando ainda mais ansiosa. Desviei o olhar para o prato e brinquei com a comida sem saber o que responder.
Jessica, no entanto, manteve seu sorriso gentil e confortável, como se entendesse mais do que dizia em palavras.
— O amor tem formas curiosas de se manifestar — ela comentou suavemente, passando a mão pela barriga. — E nem sempre podemos controlar por quem ou como sentimos.
Padre Vergas
Estava cercado por um grupo de mulheres faladeiras, cada uma mais ansiosa que a outra, compartilhando seus problemas e preocupações, esperando que eu, de alguma forma, trouxesse respostas e soluções. Sorri para todas, mantendo a cordialidade, e ouvia com atenção. Algumas falavam de seus maridos, outras de problemas com os filhos, e eu ia distribuindo palavras de consolo, paciência e fé, como sempre. Fazia parte da minha função, mas naquele momento, minha mente estava dividida.
Por mais que estivesse ali, rodeado de devotas que tanto confiavam em mim, eu pensava incessantemente em Samantha. Olhei ao redor, tentando encontrá-la no meio da festa, e foi nesse instante que a vi, parada a uma certa distância, olhando na minha direção. Seu olhar era intenso, e naquele instante algo havia mudado no ar. As conversas ao meu redor começaram a silenciar à medida que as outras mulheres também perceberam sua presença. Algumas a observaram com olhos de julgamento, desdenhando sua aparência como se ela fosse uma intrusa.
Por dentro, agradeci silenciosamente por Samantha ter surgido. Ela estava me salvando da avalanche de problemas e murmúrios das senhoras. Então, com uma voz suave e firme, ela chamou minha atenção.
— Padre, a Jessica pediu para o senhor celebrar a oração de encerramento da festa — disse ela, sua voz mais firme do que eu esperava, mas ainda assim carregada de uma tensão nervosa que não passou despercebida pela minha pessoa.
Olhei para as senhoras que estavam ao meu redor, algumas ainda lançando olhares de reprovação para Samantha, mas sem coragem de dizer nada abertamente. Me despedi com um simples movimento da cabeça. Saí do círculo feminino, e sem hesitar, caminhei até Samantha. Quando cheguei ao seu lado, em um gesto inesperado até para mim, peguei sua mão com cuidado e a coloquei repousadamente entre meu braço, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Pude ouvir os suspiros abafados de indignação entre as mulheres que assistiam a cena. Elas nada disseram, mas seus olhares falaram alto. Ignorando-as completamente, virei-me para Samantha e disse, com um tom calmo:
— Vim para fazer o que me pediram — e comecei a caminhar ao lado dela.
Senti o peso do olhar das outras sobre nós enquanto caminhávamos em direção à Jessica, que aguardava mais à frente. O calor da mão de Samantha no meu braço parecia intensificar cada sensação, cada passo que dávamos juntos. Eu sabia o que aquele gesto representava, e sentia as ondas de inquietação e expectativa se misturando ao meu redor.
Samantha, por outro lado, caminhava ao meu lado, incapaz de desviar o olhar do caminho à frente. Era como se ela também sentisse a gravidade do momento, e cada movimento dela revelava a mesma tensão que carregava. O silêncio entre nós falava mais alto que qualquer palavra poderia expressar.
Quando nos aproximamos de Jessica, que estava sentada em sua cadeira branca no centro do jardim, ela nos olhou com um sorriso leve. Parecia contente ao ver a cena diante de si, talvez mais consciente do que qualquer um ali sobre o que realmente se passava entre nós.
— Padre Vergas. Senhorita Samantha... que bom que conseguiu trazê-lo — disse Jessica, com o tom caloroso de sempre.
Samantha e eu paramos diante dela. Havia um ar de expectativa no jardim, e mesmo com tantas emoções conflitantes que surgiam a cada segundo, o dever vinha em primeiro lugar. Ainda assim, o peso da mão de Samantha no meu braço me lembrava que havia algo muito maior, algo que nem as orações ou as cerimônias poderiam apagar.