Capítulo 14

1716 Words
Padre Vergas Ao abraçá-la, me movi, erguendo o corpo para segurá-la firme em meus braços, ficando de pé os dois ao mesmo tempo. O calor daquele momento parecia queimar minha pele, aquecendo cada centímetro do meu ser. Tremi, mas com um pouco de esforço afastei-me minimamente dela, o suficiente para remover a joia dentro da caixinha. Com a mão direita, alcancei o pequeno anel de compromisso que antes guardava no bolso da batina. Era como se o peso desse simples objeto carregasse todas as dúvidas, todos os medos, mas também todos os desejos que tentei afogar. Sem hesitar, coloquei o anel em seu dedo, um gesto que selava algo muito maior do que pudesse imaginar, nem o dia da minha passagem para sacerdote, ganhava morada, e sim essa ocasião aqui, onde sabia que seria meu maior pecado, mas também a minha maior redenção dele. "Estamos selando nosso compromisso sacramental", pensei, embora soubesse que era um compromisso proibido, um segredo que jamais deveria ter nascido. Samantha olhou para mim com seus olhos azuis intensos, e a pergunta veio quase como um sussurro: — Agora sou realmente sua? Minhas mãos tremiam levemente enquanto eu alisava um fio solto de seu cabelo. Arrumei-o com um cuidado excessivo, como se aquele simples gesto pudesse anular a gravidade do que estávamos fazendo. Perdi-me nos olhos dela, buscando algum conforto, mas só encontrei a mesma tempestade que rugia dentro de mim. Respondi, minha voz baixa e rouca: – Sim... a senhorita é minha. Então, em um movimento quase automático, retirei do bolso um segundo anel, este destinado a mim. Coloquei-o no dedo, sentindo um aperto no peito. Levantei a mão diante dela, mostrando-a. — E enquanto eu estiver usando isso, estaremos ligados. Era uma confissão, uma verdade inescapável. Cada palavra me pesava, como se Cristo, pendurado na parede da igreja, observasse cada uma delas com desaprovação. Meus olhos, atraídos pela figura sagrada, subiram lentamente. A imagem de Cristo parecia me julgar, suas mãos abertas como se esperasse uma explicação para minha traição. Sussurrei para mim mesmo, quase sem forças. — Perdão... Mas era a única forma de acalmar a tormenta que se formou em minha alma. Antes que a culpa me engolisse, Samantha, doce e firme, se aproximou. Suas unhas feitas roçam suavemente em meu rosto, tirando-me do torpor. — Não se martirize, padre. — Sua voz era baixa, mas cheia de uma certeza que eu não tinha. — Nosso compromisso será santo. Essas palavras, ditas com tanta fé, não deveriam ter trazido consolo, mas, por um breve segundo, senti-me envolvido por uma paz ilusória. Fechei os olhos, tentando acreditar, buscando qualquer fragmento perdoável naquele secreto pecado que agora carregamos juntos. Samantha Nos sentamos no primeiro banco da igreja, o som dos nossos passos ecoando suavemente pelo espaço vazio. As mãos grandes e firmes do padre Vergas seguravam as minhas com uma mistura de força e delicadeza. Eu sabia o quanto esse homem era importante para mim, e agora, com o anel em meu dedo, o compromisso entre nós parecia selado, concreto, mesmo que secreto. — Vamos fazer isso direito — comecei, olhando para as mãos dele enquanto traçava com os dedos as marcas de tempo e devoção. — Durante a semana, a gente pode se ver normalmente na floricultura. Trocar algumas palavras, nada fora do comum, sem despertar suspeitas. Eu sei que o senhor tem seus compromissos paroquiais e eu... não quero atrapalhar sua rotina. Ele escutava cada palavra atentamente, seus olhos fixos nos meus, mas havia uma leve tensão na linha de seu maxilar, um sinal de que ele estava processando tudo o que eu dizia. — Precisamos manter as aparências — continuei, apertando suas mãos entre as minhas. — Ninguém pode saber que algo mudou entre nós. Faço isso pelo senhor. - completei entusiasmada. — Faria isso por mim? — perguntou com uma calma que m*l disfarçava a ansiedade que borbulhava em seu peito. — Óbvio que sim, o padre é todinho meu agora. — falei em tom de brincadeira, e fazendo leves cosquinhas nele, mas o mesmo permaneceu parado, absurdamente sério. Ele suspirou, seus olhos se encheram de pensamentos que pareciam muito distantes, mas ele não se afastou. Pelo contrário, sua mão direita subiu até o meu rosto, pousando ali com uma ternura inesperada. Respondi ao seu toque, elevando suas mãos às minhas e beijando-as brevemente, com uma devoção que talvez só o meu padre pudesse entender. — E nos domingos? — perguntei, tentando ajustar a realidade àquele relacionamento proibido. — Pela manhã e à noite, o senhor tem as missas... Só poderei vê-lo se eu vier... — comecei, mas ele me interrompeu com um sorriso contido. — Depois do culto à noite, posso ir visitá-la — disse ele, a voz suave, mas firme, como uma promessa. Ao ouvir isso, não consegui conter o sorriso que se alargou em meus lábios. Ele, vendo minha expressão, franziu levemente o cenho, sem entender. — Por que esse lindo sorriso? — perguntou, acariciando o canto dos meus lábios com a ponta dos dedos, desenhando um caminho na minha pele que enviou arrepios por todo o meu corpo. — Porque o senhor não vai mais se afastar de mim — respondi, a voz quase um sussurro, enquanto meu coração batia acelerado. Ele sorriu de volta, e lentamente inclinou-se na minha direção. Fechei os olhos, esperando o toque de seus lábios nos meus, mas o beijo não veio. Em vez disso, ouvi sua voz, baixa e envolvente borrifando a minha pele. — Preparei uma refeição para nós dois — disse ele, com uma calma que me desarmou. — Vamos? Sem esperar uma resposta, ele me pegou pela mão e me guiou para fora do banco, levando-me até o refeitório da igreja. Um lugar que, de repente, parecia um refúgio sagrado e íntimo, só nosso. Padre Vergas Ao me sentar à mesa com Samantha, senti uma estranha mistura de serenidade e tensão. Ela estava ali, diante de mim, e tudo parecia incrivelmente simples e ao mesmo tempo, absurdamente complexo. A refeição que eu havia preparado não era nada sofisticada, apenas uma macarronada com vários ingredientes que misturei com cuidado, e um suco de uva natural para acompanhar. De sobremesa, um pavê de coco com limão, uma combinação inusitada que, de alguma forma, parecia refletir a complexidade do momento. Quando coloquei os pratos na mesa, os olhos dela se encheram de admiração. — Está maravilhoso — murmurou, olhando para a comida como se fosse algo especial. Para mim, era apenas um gesto simplório, mas para ela, parecia ser muito mais. Antes de começarmos a comer, fiz uma breve oração, agradecendo por aquele momento e pedindo forças para resistir às tentações que surgiam a cada segundo ao lado dela. Quando terminei, abri os olhos e os encontrei fixos nos dela, que me observavam com carinho. — Vamos comer — disse, quebrando o silêncio. A cada garfada, a tensão ia se dissipando e a conversa entre nós fluía de forma natural. Falamos de tudo e de nada, das pequenas coisas do dia a dia, dos compromissos na paróquia, dos seus dias na floricultura. Era fácil, leve. Enquanto o tempo passava, o ambiente foi se transformando em algo quase íntimö, como se estivéssemos sozinhos em um mundo à parte. Depois de horas, quando os pratos estavam limpos e as panelas vazias, olhei para ela, percebendo que seus olhos começavam a se fechar, pesados pelo sono. A comida, o ambiente, tudo parecia ter criado uma atmosfera de paz que a deixou completamente relaxada. De repente, vi seu corpo se inclinar, quase caindo do assento. Num reflexo rápido, me levantei e contornei a mesa, chegando a tempo de amparar Samantha, que estava à beira de adormecer. Quando a segurei, senti seu corpo leve e relaxado em meus braços. Seus olhos, meio cerrados de sono, abriram-se lentamente, e ela pareceu perceber a minha presença de uma maneira distante, quase como se estivesse sonhando. A suavidade daquele momento me atingiu com uma força inesperada. Ali estava ela, completamente entregue à minha p******o, como se confiasse em mim sem reservas. — Samantha... — murmurei, mas ela não respondeu, apenas suspirou, rendida ao cansaço. Sem hesitar, a envolvi em meus braços, pegando-a com delicadeza. Seu corpo se encaixou no meu com naturalidade, e o calor dela irradiava contra meu peito. Senti um aperto no coração ao perceber como aquilo parecia certo, apesar de tudo o que deveria ser errado. Enquanto caminhava pelos corredores da igreja em direção aos meus aposentos, meus pensamentos fervilhavam. O silêncio ao redor era quebrado apenas pelo som dos meus passos e pelo respirar suave de Samantha. O quarto que eu havia arrumado com tanto cuidado nos últimos anos agora parecia um santuário profanado pela presença dela. Não por causa dela em si, mas pelo que eu estava sentindo. Cada detalhe daquela noite estava cravado em minha memória: o brilho suave das velas, o cheiro leve de cera derretida, e o perfume doce que emanava de seu cabelo. Deitei-a com cuidado na cama, tomando cuidado para não acordá-la completamente. Ela se moveu levemente, mas logo se acomodou entre os travesseiros. Fiquei ali, parado, observando-a por um momento, tentando entender a profundidade das emoções que surgiam dentro de mim. O quarto era pequeno, quase austero, como era esperado de um homem da minha posição, mas agora parecia insuficiente para conter o turbilhão que eu estava sentindo. Cada fibra do meu corpo estava em conflito. Parte de mim queria permanecer ao lado dela, sentir sua presença, seu calor, talvez até tocar seus cabelos macios novamente. Outra parte, a parte que durante anos segui com devoção, me gritava para sair, para deixar o quarto antes que fosse tarde demais. Olhei para ela, já entregue ao sono, o rosto sereno e despreocupado. "Deus, o que estou fazendo?", pensei enquanto continuava a observá-la. Como ela podia dormir tão tranquilamente enquanto tudo em meu ser estava desmoronando?" pensei, sentindo uma mistura de fascinação e desespero. Saí do quarto, fechando a porta com cuidado e fiquei encostado na parede por alguns instantes. O silêncio da igreja parecia mais pesado do que o normal, como se até os santos nas estátuas soubessem do meu conflito interno. Meu coração batia descompassado, e minha mente fervilhava com a lembrança de cada pequeno detalhe desta inusitada noite… romântica.
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