**Fenrir**
Acordo no outro dia com a minha cabeça doendo, era como se Koda quisesse rasgar a minha cabeça e sair para fora. Aquilo estava me deixando louco. Jogo as cobertas para o lado e levanto-me com um suspiro pesado. Vou ao banheiro e tomo um longo banho, permitindo que a água quente relaxe o meu corpo tenso. Arrumo-me rapidamente, coloco umas calças jeans e ténis, pego numa camisa e na minha jaqueta, e desço. Não foi nenhuma surpresa encontrar Ethan à minha espera na cozinha.
— Quem te mordeu? — pergunta ele, rindo, enquanto termina de fazer o café.
— Estou sem paciência para as suas brincadeiras hoje — digo, servindo-me assim que ele termina.
— Nossa! Tenho dó de quem vai dividir o carro com você hoje — diz ele. Viro-me e olho para ele, arqueando uma sobrancelha.
— Não!
— Sim — digo, sorrindo para ele. — Precisamos discutir algumas coisas, então vem comigo.
— Está querendo se vingar de mim, não é? Belo amigo eu tenho — diz ele, enquanto pega um pedaço de bolo na geladeira.
— Entenda como quiser, não me importo — digo, dando de ombros.
Após tomar o meu café, subo e arrumo uma pequena mala, ou melhor, jogo as coisas lá para dentro. Nada poderia explicar o meu desgosto com aquela viagem. Com tudo pronto, desço e encontro Ethan do lado de fora, à espera com os outros.
— Bom dia, alfa — diz Sam, um dos meus guerreiros e amigo.
— Bom dia, Sam. Como está a Any? — pergunto, e vejo um sorriso espalhar-se no seu rosto com a menção da sua companheira.
— Está ótima. Disse-me para perguntar quando vai aparecer para um café — diz ele. Any era uma loba muito perspicaz, um dos motivos pelos quais evitava ir à casa de Sam. Ela sempre conseguia ver através de mim, e não era esse tipo de conversa que queria ter com a companheira do meu amigo.
— Algum dia — digo-lhe, e vejo-o a balançar a cabeça. Observo que tudo já estava arrumado. Íamos em três carros: dois com guerreiros e o meu. Pude perceber que Ethan estava levando a sério a ideia de proteção.
Os primeiros quilómetros foram tranquilos. Aproveitei para colocar algumas coisas em ordem, já que o caminho seria longo. Teríamos, pelo menos, um dia inteiro de viagem antes de chegar à alcateia Eclipse, e com toda a certeza não tinha vontade de passar a noite lá.
Na hora do almoço, paramos num restaurante à beira da estrada. Com a fome que tinha, qualquer coisa seria bem-vinda. Assim que entramos, pude ver o olhar assustado das pessoas quando nos viram. Não era para menos; éramos todos guerreiros treinados, enormes, seria difícil passarmos despercebidos. Pegamos uma mesa ao fundo, para que pudéssemos conversar com mais tranquilidade. Quando estávamos perto de humanos, todo o cuidado era pouco.
Uma mulher aproximou-se, fizemos o nosso pedido e ela saiu, mas pude ver a forma como nos olhava, o que me encheu de repulsa. Eu não era um santo, mas, nos últimos dias, a ideia de qualquer uma tocar o meu corpo parecia inconcebível, tanto para mim como para Koda. Quando os nossos pedidos chegaram, comemos em silêncio, desfrutando da nossa comida. O caminho até ao hotel ainda seria longo, e eu não queria parar mais.
— Viu a forma como a garçonete te olhou? — pergunta Ethan, sorrindo. Viro-me e olho para ele com cara fechada. — O que foi?
— Não sei, mas aquilo me deixou enjoado — digo, continuando a andar, mas percebo o olhar que ele trocou com Sam.
— Vamos ter que fazer um exame de você, tenho certeza de que não deve estar bem — diz enquanto entra no carro.
— Não é nada, mas não quero qualquer uma me tocando — digo, e vejo Sam virar-se para mim, do banco do condutor.
— Por quê? Não me lembro de se preocupar com isso antes — diz ele, sério.
— Não sei, mas só de pensar nela me tocando o meu estômago dói — digo, abanando a cabeça para afastar a imagem.
— Sabe por que isso está acontecendo? — pergunta Sam, dando partida ao carro.
— Gostaria de saber, mas não sei — respondo, frustrado.
— E Koda? — insiste ele.
— Nem me fale. A minha cabeça parece que vai explodir, de tanto ele tentar sair — digo, massageando os olhos.
— Oh, isso não é bom — diz Sam.
— Também acho. Koda é um lobo muito centrado para estar perdendo o controle desta forma — diz Ethan.
— Sei disso, mas ele também não sabe dizer o que o está o incomodando. Apenas está agitado — digo, dando de ombros.
— Quando voltarmos, vamos ver a curandeira da alcateia. Ela deve saber de algo que te ajude — diz Ethan, pensativo.
— Acho que ele anda só um pouco stressado, e ele não gosta de James. Esta viagem vai ser difícil para ele.
— Por que ele não gosta de James? — pergunta Sam.
— Não sei, mas da última vez que vi o homem tive de me segurar para que Koda não lhe saltasse à garganta. - Lembrar daquele dia só me fazia sentir Koda a arranhar a minha mente. Eu também não gostava do alfa James, mas o ódio que Koda sentia por ele estava num outro nível.
— Tem a certeza de que é boa ideia se encontrar com ele, já que o seu lobo quer matá-lo? — pergunta Sam, e vejo o seu rosto preocupado no retrovisor.
— Claro que é uma péssima ideia — digo, suspirando. — Já disse várias vezes que não queria vê-lo, mas parece que ele não se importa se o matar no processo.
— Isso é estranho. Por que insiste tanto em falar com você? — pergunta Ethan, ao meu lado.
— Não faço a menor ideia, mas é para isso que vocês estão aqui: para evitar que o mate — digo, já sentindo a fadiga a dominar-me.
— Não se preocupe com isso — diz Sam.
— Não posso ficar sozinho com ele, então vocês vão ter de se revezar. No estado em que Koda está, não sei se conseguiria contê-lo.
O silêncio toma conta do carro. Ao meu lado, vejo que Ethan estava a conversar com os outros guerreiros pela ligação mental, provavelmente dando novas instruções. Eu não sabia o que poderia acontecer, mas algo dentro de mim dizia que não seria mais o mesmo após esta viagem.