Vicent De Lucca
A festa estúpida passava na minha frente arrastada. As mulheres se jogavam em cima de mim como se eu tivesse uma espécie de ímã que as fizesse querer a cada dia mais de mim.
Bebi um gole do meu whisky, procurando pelo salão aquele amontoado de cabelos ruivos que tanto me encantou.
Podia me lembrar dos olhos verdes e medrosos, dos braços juntos e a expressão de Pânico quando Henrico mandou ela olhá-lo.
Ainda mais, pude observar o carinho que o meu amigo tinha pela cunhada e ouvi, durante uma noite inteira, a vontade que Henrico tinha de adotá-la e levá-la para morar com ele e com sua esposa.
Ninguém confiava o suficiente em Carlo Lombardi, e não estavam errados.
Mas, a demora estava me matando por dentro. Queria conhecer a ruiva de perto, queria ver seus olhos brilhantes me encarando em pânico, enquanto ela procurava uma saída.
Eu amo sentir o seu medo. Pensei, bebendo o meu whisky.
— Vicent… — A voz melodiosa de Alessandra invadiu meus ouvidos, me fazendo revirar os olhos.
— O que você quer, Alessandra? — Perguntei, observando-a levar a taça de vinho até a boca.
— Não é nada. — Ela se virou para frente, encarando a entrada do lugar. — Você está parado aí por tanto tempo, o que você tanto espera?
— Nada que seja da sua conta. — Falei, desviando meus olhos para ela.
— Ui, você sabe que eu amo quando você age como um ogro assim. — Ela deu um sorriso safado.
Quis rir. Alessandra era uma mulher bonita e elegante, tinha um e setenta, cabelos castanhos escuros e ondulados, olhos escuros e estava na casa dos trinta e cinco anos. Era uma viúva — um tanto quanto satisfeita pela morte do marido — que acabou encontrando na minha cama o refúgio que precisava.
A questão é que Alessandra não se abalava por nada. O que ela queria, ela conseguia e eu não era muito diferente. Se eu soubesse bem como funcionavam seus jogos, teria a certeza de que ela terminaria se contorcendo embaixo de mim essa noite.
— Hoje não é seu dia, Alessandra. — Falei, passando meus olhos pelo seu rosto cínico.
— Todas essas pobres garotas aqui, m*l sabem onde estão se enfiando e você… — ela deu um sorriso. — você, que terá que aguentar esse bando de virgens inúteis, sem poder fodê-las.
— Se elas me derem permissão, eu posso fazer o que eu quiser. — Eu dei os ombros. — Eu sou o Don.
— Aposto que algumas delas farão qualquer coisa, absolutamente qualquer coisa, para conseguir que vocês a escolham… Inclusive... — ela disse, sugestiva.
— Isso não é um assunto seu. — Falei. — Agora, se me dá licença.
— Me procura mais tarde. — Ela sussurrou no meu ouvido, saindo rebolando.
Observei a sua b***a balançando dentro do vestido colado e dei uma risada, virando-me para o lado oposto ao dela.
Andei calmamente até a mesa onde Nina estava sentada, tomando uma taça de vinho e comendo um pouco do jantar servido essa noite.
A especialidade de mia madre¹, e um dos meus pratos favoritos. Lasagna bolognese².
Puxei uma cadeira e me sentei ao seu lado, observando-a sempre tão quieta e na sua.
Mesmo sendo uma ótima conselheira, Nina respeitava os limites e nunca invadia o meu espaço ou quebrava regras. Sua criação rígida havia a deixado assim, tornando-a um pouco retraída, mesmo sendo uma das mulheres que eu daria a minha vida.
Nina cuidou de mim em todas as brigas e com Henrico, me abraçaram todas às vezes que eu só precisava chorar.
Ela era como uma irmã mais nova e eu me pergunto por onde ela se escondeu por tanto tempo. Ela não conversa muito sobre a sua casa e a sua família, na verdade, ela quase não fala do seu passado.
Imagino os horrores que ela possa ter passado e me vem na cabeça a sua irmã, Isabela, e se ela passa pelo mesmo. Queria descobrir os segredos que aquela casa e aquele homem inescrupuloso escondem.
Eu sabia de quase toda a sua história e meu pai, provavelmente, conhecia as garotas, era seu dever como Don, mas não o meu. Eu só queria curtir um pouco e agora, só agora, estou interessado em ir um pouco mais a fundo nessa família.
— Está quieta. — Falei, observando-a enfiar o garfo na boca.
— Henrico teve de ir fazer algumas coisas, prometi que permaneceria aqui. — Ela sorriu fraco. — Além disso, não acho que eu tenho mais o que fazer longe dessa mesa, essas pessoas me dão nos nervos.
Soltei uma risada. Outra coisa em comum, eu e Nina odiávamos com todas as nossas forças, essas festas e a ruiva nunca tentou esconder.
— Eu também não, porém, hoje a atenção é toda minha. — Eu bufei.
— As apresentações começam em dez minutos, não está nervoso? — Perguntou, sugestiva.
— Não, não estou. — Eu fiz bico. — Inclusive, uma delas está atrasada. Não suporto atrasos.
— Algumas mulheres se atrasam, Vicent. — Ela deu um leve revirar de olhos. — Terá de se acostumar.
— Espero que a minha futura esposa não decida me deixar esperando. — Bufei.
— Não fazemos com a intenção de deixar vocês furiosos, atrasos e imprevistos acontecem o tempo todo. — Ela deu os ombros. — Posso saber quem é a moça?
Meus olhos percorreram o salão, quando a porta da frente se abriu e o anjo mais lindo e inocente desse universo entrou pela porta.
Seus olhos estavam esbugalhados, e ela parecia muito assustada, enquanto olhava para todos os lados a procura de algo.
— Acabou de chegar. — Avisei.
Nina virou a cabeça até a entrada e franziu a testa, observando a sua irmã mais nova nervosa, encarando todos os lados.
— A minha irmã? — Ela perguntou, um pouco chocada.
— Sim, gostou? — Perguntei, sorrindo.
Nina largou o garfo e suspirou, fechando os olhos.
— Vicent, eu sei que eu não posso me meter nas suas escolhas e não estou tentando fazer isso, mas… — Ela engoliu um bolo. — Por favor, não a escolha se a sua intenção for machucá-la. Isabela é a pessoa mais importante da minha vida, é a minha garotinha e tudo que eu queria poder fazer era tirá-la das mãos do meu pai.
— Isso só entrará em pauta se eu escolhê-la. — Frisei.
— Por favor, a escolha essa noite. — Ela pousou suas mãos na minha. — Se ela voltar para casa no meio das rejeitadas, eu não sei o que pode acontecer a minha pobre irmã.
Seus olhos pareciam pesarosos, e suas palavras saiam em um murmúrio dolorido. Via-se o quão desesperada para conseguir o que havia me pedido.
Afinal, como eu podia negar alguma coisa a Nina? Eu não tinha coragem. Eu a via como uma irmã, uma pequena irmã e agora, estava vendo em seus olhos o desespero de ver alguém que ela amava ser machucada.
Certamente eu a entendia. No seu lugar, eu faria o mesmo.
— Vou ver o que posso fazer, sí? — Sorri, me levantando. — Fique bem, sorella³.
Ela piscou para mim algumas vezes, assentindo. Seus olhos percorreram o salão, enquanto eu me afastava, observando a jovem ser chamada por uma das assessoras do evento.
Ela disse algumas palavras para Isabela, parecia brava e tinha uma expressão fechada no rosto. Provavelmente, reclamando do atraso do pequeno anjo.
Não gostei da sensação, fechei meu rosto imediatamente, assim como os meus punhos. Não queria que alguém gritasse com a menina, além de mim. E certamente, não queria que alguém a machucasse, somente eu tinha esse direito.
Droga, eu não quero ficar obcecado pela garota. Eu devo escolher a mulher perfeita e não pensar em uma mulher qualquer. Não podia deixar meu p*u escolher a mulher que eu me casaria.
Mesmo que a ruiva fosse uma obra-prima e uma ótima visão aos olhos. Eu quase podia imaginá-la sem aquelas roupas todas.
Mordi os lábios, imaginando-a sem nada. Balancei a cabeça, deixando que os pensamentos saíssem da minha cabeça.
— Vicent. — Carlo disse, vindo até mim, acompanhado da esposa que encarava o. chão.
— Carlo. — Cumprimentei, com meu típico mau-humor. — Yelena.
O rosto da mulher se levantou, enquanto ela me abria um dos seus típicos sorrisos simpáticos e calorosos. Ela parecia ser uma ótima mulher, infelizmente, uma mulher fadada a viver com um carrasco como o seu marido.
— Don… — Ela disse, quase em um sussurro. m*l conseguia ouvir a sua voz.
Parecia ter medo de conversar comigo por tempo demais. Parecia sentir que poderia ser castigada pelo seu marido se o fizesse. Ela sentia medo, um medo absurdo.
— Como vai? — Carlo perguntou. — La Mia ragazza⁴ acabou de chegar.
— Vocês se atrasaram. — Eu falei, encarando-o.
— Coisas de mulheres, você sabe. — Ele disse, dando um breve revirar dos olhos.
O encarei sério. Não, eu não sabia. Nunca tive que esperar por alguém, menos ainda, por uma mulher.
— Não, eu não sei. — Fechei a minha expressão, o encarando de cima a baixo. — Yelena, espero que você e a menina estejam bem.
Acredito que essa tenha sido uma ameaça bem implícita a Carlo, que se virou para a esposa com a testa franzida.
— Ah, sí. — Ela disse, parecendo um pouco assustada. — Inclusive, demoramos, pois Carlo queria que a menina ficasse perfeita, como o senhor pediu. — Ela deu-me um sorriso doce. — Não queríamos decepcioná-lo.
— Ah, mas você e suas filhas nunca decepcionam. — Ela sorriu em agradecimento. — São educadas, sabem se portar, imagino que tudo isso tenha vindo de você.
— Exagero da sua parte, Don. — Ela disse, encarando o chão.
— Bom, eu preciso ir agora, aproveite a festa. — Eu sorri para ela. — Quanto a você, Carlo, espero que eu tenha deixado bem claro o que eu disse.
Ele me encarou, com seus olhos queimando pela raiva. Ele me odiava tanto e aposto que me mataria se pudesse, agora, nesse exato momento. Ele sequer se importaria com as testemunhas.
Se pudesse, enfiaria uma bala na minha testa e seria o meu fim.
Mas ele não pode e é exatamente por isso que ele me odeia a cada dia mais.
Esse poder é meu, Carlo Lombardi!
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Dicionário:
Mia Madre¹: Minha mãe
Lasagna bolognese²: Lasanha a bolonhesa
Sorella³: Irmã.
La mia ragazza⁴: Minha menina.