04 - Richy

1441 Words
Richy nunca teve problemas para gerenciar aquela empresa. Como dono, ele apenas aparecia de vez em quando para que todo mundo soubesse que ele ainda estava vivo. Ninguém precisava dele para aceitar ou recusar negócios suspeitos, mesmo assim, vez ou outra ele vinha conferir com os próprios olhos o que é que estava acontecendo. E geralmente, como havia ocorrido naquele dia, ele saia da empresa com o nome de algum comprador duvidoso para que fizesse uma visita durante a noite. Richard não era um homem que se podia dizer que resolvia seus problemas com diálogos. Ele era muito mais adepto a força bruta. E não se orgulhava de ter que quebrar alguns dentes para arrancar alguma confissão que fosse convincente o suficiente para que a polícia agisse. Ele sequer gostava de estar resolvendo tudo na base da p*****a e da força física, porque isso estava acabando com ele lentamente. Richard sempre foi o tipo de homem mulherengo e complicado, até se casar. Depois disso, ele ainda trabalhava em sua rotina noturna de vigilante, mas numa escala muito menor. De modo que sempre estava com energia para chegar em casa e t*****r com sua esposa. Nos últimos dias, Richy estava se sentindo cansado até para pensar em f********o, e recusava com veemência qualquer sinal do seu corpo de que precisava estar dentro de alguém. Ele tinha muitas opções, até mais do que gostaria de ter — achava inoportuno que as mulheres sempre se deixassem abalar pelo dinheiro e pela maneira com que ele demonstrava ser um homem de poucas palavras e mais ações —, só que era bem raro que alguém chamasse a sua atenção realmente para o que ele gostava de fazer, e mais raro ainda que ele tivesse tempo para isso. Richard nem reparou que estava sorrindo enquanto se dirigia até o refeitório, procurando pela pessoa que além de ser o seu cérebro ambulante, ainda havia sido a responsável pelo codinome que agora a mídia interna e externa de Detroit conhecia como O Vigilante Noturno. Ele não se lembrava muito bem como é que o assunto surgiu. A questão é que ele já se fantasiava ao menos com uma máscara no rosto para não deixar que as pessoas soubessem quem ele era, desde a época em que seus pais morreram e ele perceber que teria de se tornar algo além de apenas um herdeiro que só se preocupava com festas. Richy percebeu que usar uma máscara que cobrisse totalmente o seu rosto e mantivesse as roupas normais, fazia com que as pessoas o interpretassem como um bandido e tivessem medo. Ele teve de procurar alguém que poderia fazer um design de roupa que pudesse sustentar aço e couro ao mesmo tempo, para que pudesse se mover e se proteger durante aquelas aventuras noturnas. Ele agora se orgulhava de que apesar de ainda causar medo, já não era mais confundido com alguém de péssimas intenções. — Então eu estava combinando de sair com ele no final de semana, mas vocês sabem como é que sou ocupada por causa do senhor Wees e tudo mais — dizia uma voz feminina e familiar, no momento em que ele passou pelo pequeno espaço onde algumas cafeteiras e copos se localizavam para os funcionários estarem sempre atentos ao trabalho. Richard parou e observou o grupo de mulheres sorridentes e muito belas, que se reuniam para escutar e compartilhar as fofocas do seu final de semana. — Mas, sinceramente, eu acho que não vai dar em nada. Ele simplesmente não entende que eu não sou apenas a secretária de Richard Wees, eu também tenho meus próprios negócios fora daqui, sabe? — Senhorita Harrison — chamou Richy, parado contra a soleira da porta. Ele notou como as mulheres ao redor de sua secretária se viraram com uma lentidão desnecessária, prendendo seus fôlegos para não acabar suspirando diante dele. Ele gostava muito mais de como Dorothy Harrison sempre parecia corada e nervosa ao encará-lo, como estava naquele momento, tentando ajeitar os óculos quadrados que tinham escorregado para a ponta do nariz enquanto ela gesticulava e falava sobre as suas ocupações semanais. — É hora de ir. Há muito tempo Richy tinha perdido a cautela para chamar Dory e levá-la embora com ele. Não importava se quisesse fazer aquilo com o maior sigilo possível. Ele nunca pôde contrar as fofocas daquela empresa. E nunca se preocupou muito de que espalhassem que a ocupação de Dory aos finais de semana era estar com o próprio chefe. Ela não parecia se incomodar sobre isso também, até comentava que era mais fácil não ter de lidar com nenhum colega de trabalho dando em cima dela — no que Richy sempre percebia haver uma leve nota de ironia em suas palavras. Richard não teve que explicar exatamente para onde eles iriam. Dorothy se apressou para beber o último — e talvez o primeiro — gole em seu café, fazendo careta no que deveria ter sido a pior sensação do mundo ao ter a garganta queimada pela bebida quente. Richy não conseguiu esconder o sorriso ao se lembrar que ele também passou por aquela mesma situação naquela manhã, e ajeitou a sua postura para que a dor nas costelas diminuísse. Ainda em silêncio e agindo com a pressa que Richy sempre achou que fosse o maior sinal do quão estabanada era Dorothy, ela jogou o copo descartável na pequena lixeira ao lado das cafeteiras e acenou animadamente para as mulheres que ainda observavam Richy com as bocas entreabertas e os queixos quase caindo. Como qualquer empresa grande, muitos boatos circulavam dentro da Wees Entreprise. Boatos que sempre envolviam o fato de o chefe nunca aparecer de modo ativo na empresa, sempre deixando o trabalho pesado nas costas de seu velho CEO. E havia o mais interessante, de que Richy e Dory estavam saindo há muitos anos, apesar de sempre fingirem estar saindo com outras pessoas para não dar na cara. O que acontecia era exatamente o contrário. Dory e Rhys sempre tentavam ser vistos juntos, porque assim poderiam proteger suas vidas amorosas fora das vistas de todo mundo, e eram bem mais do que os amantes desafortunados que se espalhava em boatos pela empresa. Eram verdadeiramente parceiros. Dorothy esteve ao lado dele alguns anos depois de que tudo havia começado. Ele já usava a fantasia nova, só que ainda não havia aceitado qualquer novo nome para que as pessoas tivessem como chamá-lo. Nem mesmo a mídia soube como é que apelidaria o mascarado de Detroit, e por muito tempo ele foi chamado daquela forma. Até que Dorothy entrou em sua vida. — Aconteceu alguma emergência? — perguntou ela, colocando uma mochila nos ombros. Aproximou-se um pouco mais afim de sussurrar: — Escutou algum alerta? — Não — ele disse com simplicidade, apertando o botão para a garagem do prédio. — Não há nada acontecendo na cidade por enquanto. Porém, precisamos nos preparar para esta noite. — Você vai sair? — ela perguntou com uma nota de pânico na voz. Richy gesticulou com os ombros. — Por que você parece tão chocada? — Senhor Wees, o senhor ainda não se recuperou da surra da noite passada — disse ela em voz sussurrada, ainda que o elevador ao redor deles estivesse deslizando suavemente pelos vinte e tantos andares, passando agora pelo setor onde a fábrica funcionava. — Foram sete costelas afetadas. SETE COSTELAS. Isso é mais do que a metade. Como é que pode estar querendo sair esta noite? — A parte das costelas não foi uma surra, foi um atropelamento — ele disse, querendo evitar pensar que algum dia encontraria alguém grande o bastante para causar tantos danos em seu corpo. — E o meu uniforme permite que eu continue me movendo mesmo depois de ferido. Eu não vou estar saindo desprevenido. — Ainda assim, senhor Wees, é perigoso — disse ela, realizando um trejeito de boca. — Dory, por favor, não se preocupe comigo. Apenas continue sendo meus olhos e ouvidos enquanto o meu corpo faz o resto, sim? — pediu ele em tom gentil. Dory deu risada, e o som fez com que ele abrisse um sorriso também. Juntos eles entraram em seu carro conversível, saindo do prédio como se estivessem montados num animal selvagem que só precisava de um pouco de estímulo para correr a toda velocidade. Dory tinha um sorriso no rosto durante todo o caminho, na verdade, Richard não podia dizer quando é que Dory não estava sorrindo. Às vezes ele se perguntava se ela também não se lamentava por não conseguir proteger a todos que amava da mesma forma que ele ainda se martirizava por tê-los perdido.
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