- Sem a máscara consigo ver nitidamente a Cecília em você. - A Perlla quebrou o silêncio sorrindo.
- Ouço bastante isso. - Eu não tentei controlar o meu tom ao responder. Encarei ela sentindo o meu maxilar firme de raiva com a situação. O Ricardo nem piscava enquanto encarava a Julie, que estava de cabeça baixa à direita do Matteo, que parecia entediado.
- Percebo que está tensa… Sente-se e relaxe. - A Perlla falou com uma voz articulada, de alguém que está acostumada a lidar com leões, e aquele lugar estava completamente tomado por eles.
- Devo admitir que é bem difícil relaxar, quando a recepção está sendo um tanto quanto… intimidante.
Ela deu uma risada forçada e apoiou a mão no ombro do Dominique, o subchefe da máfia Camorra e bem, meu tio.
- Diga para ela, querido, que não deve se preocupar com nada, por enquanto. É apenas um chá para nos conhecermos. - A forma com que ela falou com ele, como se estivesse tentando convencê-lo, não me passou despercebida. Aquilo tudo era uma armadilha e comecei a pensar que ela articulou aquilo de propósito. Eu nem imaginava o motivo, mas essa situação era uma arma para ela, arma essa que ela estava manejando muito bem.
- Desculpe se pareceu que não é bem-vinda. - A voz do Dominique não era nada do que eu esperava, um tom firme mas não muito grosso me surpreendeu, o inglês perfeito e quase sem sotaque.
- Acabamos de descobrir princesas Camorras que não tínhamos conhecimento, e isso deixa qualquer um desconfiado. - A forma que ele olhou para a Julie deixou nítido que ela também recebeu a mesma resistência. - Sentem e vamos tomar chá. - Ele concluiu.
Tinham 3 cadeiras à nossa frente, uma do lado da outra e com distâncias visíveis das demais. Eles nos posicionaram de forma que ficasse nítido que não fazíamos parte daquilo.
O Ricardo puxou a cadeira do meio e eu me sentei, agradecendo a ação enquanto o Rubens sentava ao meu lado e em seguida o Ricardo sentou e puxou a cadeira dele para mais perto de mim, em seguida apoiou a mão na minha perna possessivamente. Os movimentos não passaram despercebidos por nenhum deles.
- Acho que é um bom momento para nos apresentarmos. - A Perlla começou, com a voz ainda animada. Não era necessário, sabíamos quem eram cada um deles, mas eles não sabiam disso. Pelo menos eu queria acreditar que não.
- Como você já sabe. - A Perlla começou. - Sou a sua tia por parte de pai. Esse é meu marido Dominique e as minhas filhas, Anna e Giorgia. - As meninas sorriam forçadamente para nós. O Dominique nem se mexeu. - Aqueles são Davi e Mattia, irmãos do meu marido e esse é o Matteo, o filho mais novo da família. - Eles assentiram com a cabeça, sem mudar as expressões. Os alertas de perigo estavam correndo constantemente no meu corpo, e eu sabia que eles poderiam acabar comigo de várias formas. - E essa, como imagino que você saiba, é a Julie, uma recente e feliz descoberta, irmã do meu esposo também.
- Uma grande família. - O Ricardo falou e os olhares se voltaram para ele. Acredito que pelo sarcasmo no seu tom.
- E você, quem é? - A Perlla perguntou sorridente. Pude ver a expressão dela se tornar mais audaciosa enquanto se dirigia ao Ricardo e aquilo não me agradava em nada, a forma com que ela olhava para ele, com cobiça. - E por favor, o nome verdadeiro… Não é necessário mentir para nenhum de nós. - Aquilo era um aviso, de que eles sabiam exatamente quem éramos e o que fomos fazer ali.
- Ricardo Campos. - Ele falou, demonstrando um desconforto que eu também sentia. - Noivo da Clara.
- E o chefe Truck. - O sorriso da Perlla não vacilou quando ela completou. Nenhum de nós estava surpreso, provavelmente a Julie havia contado tudo o que eles precisavam saber. O Ricardo não confirmou, mas também não negou. Ela virou o rosto para o Rubens. - E você é um capi dos Trucks.
- Como disse? - O Piranh4 assumiu uma postura defensiva ao responder.
- Vocês chamam de generais, aqui chamamos de Capi. - Ele assentiu. A tensão no ar era quase palpável, e esperei que algo acontecesse, qualquer coisa. - Bem, vamos ao chá? - Ela manteve o sorriso quase plástico no rosto.
- Vocês não se apresentaram. - Eu falei. - Digo, suas patentes. - A forma com que o Dominique me olhou fez o meu corpo arrepiar. - Afinal, definimos os Trucks nessa mesa, mas não os Camorras.
Eu sabia que aquilo era um tiro no meu pé e eu poderia estar assinando o meu atestado de óbito ao desafiá-los, mas eu queria entender até onde eles estavam dispostos a ir para tentar me enganar.
- Sou o subchefe, o meu pai é o Dom. - O Dominique falou, de forma objetiva. - Os demais são todos herdeiros.
- Entendi. - Falei. A Perlla ainda mantendo o sorriso no rosto, percebi que ela ia continuar a atuação, mas a minha paciência estava começando a ir para o caralh0 com aquele teatro. - Então Dominique, a Perlla foi muito direta na mensagem dela, sobre vocês querem saber as minhas intenções aqui.
- Imagino que queira conhecer a sua família. - A Perlla respondeu por ele, o sorriso quase vacilando.
- Vocês não são a minha família. - Respondi sem pensar. - Eles são. - Apontei do Ricardo para o Piranh4. - Eu vim a negócios, quero exportar e sei que o que produzo interessa vocês. - O Dominique se mexeu na cadeira. A expressão de surpresa durou dois segundos no rosto.
- Não entendi o que quis dizer. - O Dominique disse. Os outros homens se inclinaram inconscientes na minha direção, as expressões de repente atentas, não tão ameaçadoras.
- Os Trucks sabem reproduzir a receita deles. - Expliquei e olhei para o Ricardo, que sorriu levemente quando joguei o nosso trunfo na mesa. - Nós fizemos o nosso nome nos Estados Unidos usando a droga cobiçada e famosa da Sicília, a receita dos Bambinos.