Eu sei o que eu fiz

1859 Words
Em menos de dez minutos sentada em minha mesa, já tive que lidar com uma quantidade significativa de papéis; a secretária pessoal do Julian tinha me entregado, a mando dele, para fazer cópias. Talvez isso soe como uma implicância minha, mas algo me diz que ele fez isso de propósito. Vou até a sala onde a copiadora ficava, que para a minha sorte, ficava no mesmo andar, e começo a fazer as cópias de todas as folhas. Enquanto a copiadora faz o seu trabalho árduo, eu encaro o meu reflexo por um dos vidros que haviam ali. Meu cabelo era um castanho escuro, quase preto, ele batia um pouco acima do meu ombro. Os meus olhos verdes eram grandes e redondos, o que deixava o meu olhar bem marcante e expressivo. Meus lábios eram carnudos e eu tinha as bochechas saltadas. Tudo na minha aparência gritava meiguice e gentileza. Não é atoa que o meu apelido na época do treinamento era: Anjo Infernal. Porque eu poderia ter a aparência de um anjo, mas eu era capaz de levar a pessoa até o inferno. Pego as folhas e volto a minha posição inicial, prestes a entregar as folhas para uma das garotas, mas ela me impediu na mesma hora. - Ele pediu para que você levasse até ele. – disse, sem sequer me olhar e eu precisei morder os meus lábios, para não sorrir. Não me dei ao trabalho de responder qualquer coisa que fosse, apenas ajeitei a minha postura e comecei a andar em direção a sala do Julian. Bom, talvez o melhor jeito de lidar com essa situação, seja agindo como se eu não me lembrasse dele. Acho que vai ser divertido ver ele queimando todos os neurônios da sua cabeça, para tentar descobrir se eu sou mesmo a Mona que ele está pensando, ou se é só uma coincidência. Reconhecer o Julian foi fácil, porque ele não tinha mudado muito desde a época da escola, só tinha ficado mais forte, acredito eu. Mas me reconhecer? Vai ser uma tarefa mais complicada e severa, já que eu havia mudado completamente. Parei em frente a porta de sua sala e soltei um longo suspiro, precisando de alguns segundos para entrar no meu papel de uma garota simpática, dou uma batida fraca na porta e não espero por uma resposta do outro lado, apenas entro em sua sala, com um pequeno sorriso em meus lábios. Julian não me olha enquanto eu me aproximo da sua mesa, sua atenção está presa ao iPad que está segurando em sua mão. Seu cenho está franzido e ele não me parece muito contente com o que está vendo ali. - Eu trouxe os papéis que me pediu. – falei baixo e com a voz suave. Por deus! Essa definitivamente não sou eu. Ainda assim, ele não esboçou reação alguma ao que tinha sido dito por mim, continuou preso em seu próprio mundinho, enquanto eu passava os meus olhos por todo o seu rosto com atenção. A minha versão mais nova, teria ficado bastante animada por trabalhar com ele, lógico, antes dele decidir que iria me infernizar também, igual a sua namorada babaca. Eu tinha uma queda enorme por esse cara, e não era por menos, Julian sempre fora um colírio para os nossos olhos e pelo o que eu me lembro, ele costumava ser um cara simpático, talvez fosse um personagem para ganhar a atenção das pessoas, o que ele conseguiu com maestria. Porque o garoto era considerado um príncipe na nossa escola, todos amavam ele. Mas hoje, com o trabalho que eu tenho, eu sei bem a facilidade que é você encenar um papel, você agir exatamente como as pessoas esperam que você aja, e assim, conseguir enganar todos ao seu redor. Peguei todos os papéis que estava em minha mão, já cansada de ter que segurá-los e coloquei sobre a sua mesa. Estava pronta para girar os meus calcanhares e me afastar dele, mas para a minha felicidade, ele finalmente pareceu notar a minha existência. Os seus olhos subiram até mim e ele estreitou os seus olhos, os passando lentamente por cada parte do meu rosto. Fico estática em meu lugar, com a minha feição séria, sem sentir incômodo algum com o seu olhar. - Senhorita, Stuart. – ele começa falando e ajeita a sua postura na cadeira. Vejo que ele coloca o iPad delicadamente sobre a sua mesa e gira a sua cadeira, ficando de frente para mim, enquanto apoia as duas mãos na mesa, entrelaçando os seus dedos. - Nós nos conhecemos de algum lugar? Mantenho a minha feição de paisagem e faço um pequeno esforço para fingir que estava tentando me lembrar de algo. - Não. – falo certeira e vejo uma ruga surgindo em sua testa. Isso deve ter doído no seu ego. - Tem certeza? Julian Montgomery não te remete a ninguém? - Não. A sua feição se contorce inteira e eu solto uma risada interna, adorando ver a sua confusão com toda essa situação. Julian assente e finalmente olha para os papéis que está sobre a sua mesa e eu percebo o quão rígidos os seus músculos ficam. Ele está nitidamente incomodado com a situação. - Você vai precisar de mim para mais alguma coisa, Sr. Montgomery? A sua mão aperta uma das folhas e ele novamente levanta os olhos em minha direção. Em alguns momentos, eu tenho a certeza absoluta do quão doente a minha cabeça está se transformando com o passar dos anos e não sei dizer ao certo se isso é um conforto para mim, ou se é uma maldição que está me comendo lentamente. Meus olhos estão presos no Julian e eu tenho certeza que a minha feição neutra, te passa a sensação de conforto. Mas tudo o que a minha mente está conseguindo pensar agora, é em como eu me sentiria se pudesse dar um tiro certeiro, no meio da sua testa, nesse momento. Seria prazeroso de alguma maneira, mas não o faria sofrer. Eu disse, doente. - Eu conheci uma Mona Stuart – fala e mantém os seus olhos sérios sobre mim, tentando analisar a maneira como eu me comporto com a informação que ele acabou de me dar. – Ela estudava comigo no ensino médio. Eu juro que sinto uma vontade absurda de revirar os meus olhos para o que ele diz. O que ele espera ao me dizer isso? - Até então, ela era a única Mona que eu havia conhecido. Tédio! - Mona é um nome bem comum e meu sobrenome também não é uma raridade. – falo com toda a calma que encontro dentro do meu ser, mesmo que nesse instante, seja mínimo. - Eu sempre quis saber a onde ela estava. – ele continua o monólogo e parece divagar em seus pensamentos, enquanto eu guardo o meu tédio apenas para mim. Sério, o que eu fiz para merecer isso? Ele quis saber a onde eu estava? Então era só mandar alguém me procurar, simples assim. Me poupe desse papo furado, Julian. Me poupe! - Lamento por isso. – é o que eu digo. Porque para ser sincera, eu não estou me importando nem um pouco com o que ele está dizendo, ou sobre os seus sentimentos a respeito de sua colega de escola, a colega com quem ele praticava o seu bullying m*****o. Julian abre a boca para dizer alguma coisa, mas o telefone da sua mesa toca, o interrompendo. - Bom, eu tenho trabalho a fazer. – é o que eu digo, antes de virar as minhas costas e me afastar. Não estou muito a fim de ouvir as suas lamentações a essa hora da manhã. Se ele precisa desabafar com alguém, que procure um terapeuta para isso. Ouço ele atendendo o telefone e a última coisa que ouço, antes de fechar a porta, é ele xingando alguém. Viu? Julian não mudou nada. Continua o mesmo arrogante de sempre e eu serei uma mulher muito feliz, quando tiver a oportunidade de acabar com ele, de uma vez por todas. - Do que você está rindo? – ouço uma voz perguntando um tanto áspera e me forço a sair da minha cabeça, para dar atenção aos meros mortais. Era a garota que não tinha feito questão de ser simpática comigo. Minha língua coça para dar uma resposta bem descabida para a moça, mas eu sei que tenho um trabalho sério a fazer aqui e isso inclui manter o personagem de boa garota. Boas garotas não são ácidas com as pessoas de graça, pelo menos eu acho que não. - Nada demais. – falo despreocupada e abro um sorriso simpático para ela, a vendo bufar e desviar os olhos de mim. Talvez aturar essas pessoas, seja a parte mais complicada desse trabalho. Assim que me sento na minha mesa, o telefone que estava sobre ela, toca. Me fazendo bufar. Pego o telefone e o coloco sobre a minha orelha. - Oi. - é o que eu digo, sem saber ao certo o que dizer. - Eu sou muito bom com mentiras, Mona e sempre tive muita facilidade em ler as pessoas, se você acha que eu vou cair em qualquer joguinho seu, está muito enganada! - ouço a voz irritada, dizendo de forma sussurrada. - Se eu descobrir que você mentiu para mim hoje, nós teremos grandes problemas futuramente. A voz do Julian é ameaçadora, mas uma coisa que eu aprendi no trabalho que eu tenho, é não temer ameaça alguma. Mesmo porque eu já recebi diversas delas, e em suma grande maioria, muito pior do que essa frase feita de um garoto mimado. Ele pode achar que está me assustando agora, mas tudo o que eu sinto vontade é de rir. Porque eu definitivamente não sou a pessoa que tem o que temer aqui, Julian é essa pessoa. Ele tem muito a perder nessa história, mesmo que ainda não saiba. E quanto mais ele tentar me atingir, pior a sua morte vai ser! Porque ela vai acontecer, eu passaria por cima de qualquer um para acabar com isso de uma vez. Respiro fundo e a resposta certa aparece em questão de segundos. Ele quer me deixar assustada? Pois bem, então eu vou bancar a garota assustada. - Eu não sei do que você está falando, Sr. - a minha voz trêmula, passa toda a credibilidade da qual eu preciso nesse momento. Ouço o longo suspiro que ele solta, do outro lado da linha. - É impossível que exista duas Mona Stuart. - Por que eu mentiria? Passo a língua pelo os meus lábios lentamente, tentando conter o meu sorriso. - Porque eu sei o que eu fiz! - ele fala um pouco mais irritado. - Eu sei o que eu fiz contra a Mona Stuart! Sua voz sai de forma desesperada e por um mero segundo, eu tenho a sensação que ela está carregada de algo a mais, mas isso muda em questão de segundos, quando ele simplesmente desliga a ligação na minha cara. Que bom que ele se lembra de tudo o que me causou, vai me poupar de refrescar a sua memória.
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