Vícios

2125 Words
12h00 pm. Eu estava entediada, essa era a verdade. Minha rotina normal era muito mais empolgante e animada do que isso e eu já tinha me adaptado a ter essa correria na minha vida, acho que eu jamais poderia trocar a minha profissão para algo tão monótono como trabalhar em uma empresa como essa. Apertei o meu punho por debaixo da minha mesa e senti as juntas dos meus dedos doerem um pouco, pela força que eu estava usando ali. Provavelmente eu precisaria socar alguma coisa, quando chegasse em casa, para aliviar o estresse que estou começando a sentir por estar a tanto tempo sentada. Meu deus, esse emprego é uma tortura! - Ei, está na hora do nosso almoço. – a secretária simpática falou, parada em frente a minha mesa. Ergo a minha cabeça e a olho seriamente. Eu deveria estar feliz com essa informação? Porque para ser sincera, a única coisa que me deixaria feliz agora, é a notícia de que estava na hora de ir embora. - Obrigada por avisar. – sorrio sem mostrar os dentes e ela assente. - Você quer vir almoçar com a gente? – ela apontou para a outra garota, que não tinha ido com a minha cara. Normalmente eu sou bem direta em minhas respostas e dificilmente me preocupo se estou soando grossa com as pessoas, ou não. Mas como eu estou encenando um personagem nesse lugar, preciso ser simpática. - Não, obrigada. Eu já tenho planos para o meu almoço. Ela parece satisfeita com a minha resposta, abre um sorriso gentil para mim e ajeita a sua bolsa no ombro esquerdo. - A propósito – estava se afastando da minha mesa, mas fez questão de parar no lugar e me olhar. – Não tive tempo de me apresentar para você, mas o meu nome é Ava. E aquela é a – ela aponta para a outra garota, que parece pouco interessada em se apresentar para mim, ou sequer olhar na minha cara. – Manuela. - Muito prazer em conhecer vocês, meu nome é Mona. – falo sorridente e ela assente. - É, eu sei. Ouvi você falando para os nossos chefes. Bom, te vejo daqui alguns minutos! Assinto e observo as duas se afastarem de mim e entrarem no elevador. Solto uma grande bufada quando percebo que finalmente estou sozinha, olhando em direção a sala do Julian. Depois da ligação estranha que ele fez para a minha mesa, não tive mais o desprazer de ouvir a sua voz em meu telefone de novo, ou até mesmo vê-lo. Ele e o amigo estão enfiados em suas salas e não parece que vão sair para o almoço agora, se é que eles vão sair para almoçar. Talvez eu devesse me preocupar com a ideia do Julian ter me reconhecido, afinal, a pessoa que me contratou não faz ideia que eu já conheço o Julian e que nós temos um “passado”. Mas eu nem consigo esquentar a minha cabeça com isso, porque o plano é continuar agindo como se eu não fosse a pessoa que ele pensa que eu sou. Acho que nós teremos mais êxito no meu plano, se for assim. Encaro a porta da sala dele mais uma vez, antes de desligar o meu computador e pegar a minha bolsa, caminhando lentamente até o elevador. Encaro os botões correspondentes aos andares e tenho alguns segundos de confusão, segundos que eu não faço ideia do que fazer. Para qual andar eu iria? Decido, por fim, apertar o botão correspondente ao térreo. Quando as portas estão prestes a se fecharem, eu vejo uma mão passando por elas, impedindo que elas se fechassem. Tenho alguns segundos para pensar que poderia ser o Julian, mas não era, era o Joe. Ele abre um sorriso gentil assim que me olha e entra no elevador rapidamente, se posicionando ao meu lado. - Olá, senhorita Stuart. Como está sendo o seu primeiro dia? – ele coloca as duas mãos em frente ao corpo e ergue os ombros. Insuportável. Entediante. Eu já disse insuportável? Mas é óbvio que eu não poderia ser cem por cento sincera com o que estou pensando sobre o meu adorável dia, então invento uma resposta que o deixe satisfeito. - Está sendo incrível. – é o que eu digo. Mantenho os meus olhos no pequeno visor que mostra em que andar estamos, esperando pacientemente que ele chegue no térreo de uma vez. Minha bateria social está por um fio. Eu não sou uma pessoa sociável, nunca fui a pessoa que se cerca de pessoas e tem uma facilidade absurda em fazer amizades. Eu sou a garota introvertida, a garota que prefere ficar sozinha em casa, tendo a sua própria companhia. Ter que socializar com as pessoas, me cansa. - Vi que você apertou o térreo, não vai almoçar com os outros funcionários? - Não, tenho outros planos. - Oh! – vejo que a sua cabeça se vira para a minha direção. – Almoço com o namorado? Por um mero segundo, eu quase revirei os meus olhos. Eu simplesmente odiava esse tipo de pergunta e odiava ainda mais a entonação que a acompanhava. Se você quer saber se eu tenho um namorado, simplesmente me pergunte. Não tente achar outros meios para isso! - Eu não tenho namorado. – falo simplesmente. Ele não parece nem feliz e nem triste com a informação, na verdade, ele parece pouco se importar. - Ah! Quando as portas se abrem, eu sinto um alívio imediato, e me preparo para sair de dentro do elevador. Nem esperei para ver se o Joe iria sair também, apenas olhei ao redor, tentando encontrar alguma área para os fumantes, assim que vi uma plaquinha, caminhei em direção a uma porta de vidro. Ouvindo os passos atrás de mim e pouco me importando com isso. Arrastei a porta de vidro e vi a área aberta a minha frente, com alguns bancos. Para a minha felicidade, não tinha ninguém ali. Quando eu estava prestes a puxar a porta, para fechá-la, senti uma mão tocando a minha. - Pode deixar aberta, eu vou entrar. Joe estava ali e eu apenas dei de ombros e me afastei, indo me sentar a um dos bancos. Eu não era uma fumante assídua, não fazia isso várias vezes no dia e não alimentava esse vício a esse ponto. Mas eu fumava de vez em quando, quando sentia que estava começando a ficar perturbada demais, como hoje, em que estou tendo que lidar com uma rotina completamente nova, que não tem absolutamente nada a ver com a minha. Abri a minha pequena bolsa e agarrei o maço de cigarro, que ainda estava fechado. Eu tinha comprado esse maço há algumas semanas e não tinha nem tocado nele, até então. - Faz muito tempo que você fuma? – ouço a voz do Joe, próxima a mim. Estava torcendo com todas as minhas forças para que ele não se sentasse ao meu lado. Tudo o que eu queria agora era ter um momento sozinha, estava ansiando por isso. - Não muito. – abro o maço e retiro um cigarro de dentro dele, o ajeitando entre o meu dedo indicador e o dedo do meio. Jogo o maço de volta na minha bolsa e pego o isqueiro, acendendo o meu cigarro tranquilamente. A minha história com o cigarro não era muito antiga, comecei um pouco depois de começar a ter o trabalho que eu tenho, na época do meu treinamento. A pior parte disso foi o treinamento, porque era insuportável ter que acostumar o meu corpo com coisas que eu nunca tinha feito antes, o que me gerou muito estresse, então o cigarro me pareceu uma boa saída. - Eu fumo desde a minha adolescência, não lembro mais como é ter uma vida sem esse vício. – falou e soltou uma risadinha, acendendo o seu cigarro também. Vícios... Isso soa como algo tão bobo para mim. Dou uma tragada no cigarro e sinto a nicotina possuindo o meu corpo lentamente, enquanto eu sopro a fumaça para cima. Sinto uma tranquilidade imediata e a minha tensão começa a se dissipar, não sei explicar o quão bom é ter essa sensação, acho que é justamente por isso que eu não viciei em cigarro, sempre achei que sensações assim, deveriam ser guardadas para situações extremas. - Julian sempre reclama desse meu vício, ele odeia o cheiro. – fala risonho. Bom, estamos chegando em um assunto que verdadeiramente me interessa. - Vocês se conhecem há muito tempo? – pergunto como quem não quer nada e ele dá de ombros, desviando os olhos de mim ao soltar a fumaça pela a sua boca. Eu não saberia dizer ao certo o que acontece comigo, mas ver um homem fumando sempre me pareceu bizarramente atraente. Não é atoa que a maioria dos caras que eu já me envolvi, fumavam. Meus olhos ficam fixos na bela visão que estou tendo a chance de ver e aproveito o momento de distração do Joe, para admirar ele assoprando a fumaça, segurando o cigarro entre os seus dedos. Não posso negar que ele é um homem incrivelmente bonito e uma pessoa que eu poderia facilmente ter uma noite de diversão. Eu não me lembro mais como é a sensação de estar apaixonada por alguém, se é que um dia eu soube, os homens para mim sempre foram apenas para satisfazer o meu prazer, nada mais que isso. Eu não acho que um dia eu vou amar algum homem na minha vida, não acho que eu seria capaz de fazer qualquer coisa por alguém, além de mim mesma. Eu aprendi a ser egoísta e essa é uma lição que a gente não esquece tão facilmente. No fim das contas, é até bom que eu seja mais isolada mesmo, porque se as pessoas conhecessem 1% de como eu sou, elas não me suportariam. - Desde a faculdade, a gente fazia o mesmo curso e depois decidimos fundar essa empresa, junto com um outro amigo nosso. – ele parece bastante sentido ao falar a última parte, percebo que os seus olhos chegam a brilhar. O amigo em questão, deve ser o que morreu. Nota mental: Lembrar de pesquisar o que causou a morte do amigo deles, quando chegar em casa. - Ah, que interessante! E a empresa que vocês têm é a maior no ramo da tecnologia. Acho que eu lhe devo um parabéns. Ele sorriu e voltou os olhos para mim. - E eu acho que você não deveria me parabenizar, estar desse lado é mais desagradável do que parece. – o sorriso em seu rosto vai sumindo lentamente, enquanto os seus olhos estão fixos no meu, de uma forma um tanto intimidadora. Se eu fosse qualquer outra pessoa, estaria me tremendo agora. Abro a minha boca para questionar sobre o que ele estava falando, mas ouço a porta de vidro se abrindo, nos avisando que não estávamos mais sozinhos ali. - Joe? Eu estava te procurando. – a voz irritada do Julian alcança o meu ouvido e um suspiro escapa dos meus lábios, na medida em que dou mais um trago em meu cigarro e viro a minha cabeça para olhar para ele. Os seus olhos também estavam em mim e eu fiz questão de soltar a minha fumaça, com os olhos nele. E vi a feição de nojo que ele direcionou ao meu ato, comprovando o que o Joe tinha me dito. Ele odiava esse vício! - Eu só precisava fumar. – Joe se explica e vejo ele jogando o cigarro no chão e pisando sobre ele, antes de se abaixar para pegar e jogar no lixo. Eu e o Julian trocamos um olhar estranho e talvez, com alguns significados. É notório que ele está tentando descobrir algo sobre mim, mas se tem uma coisa que eu aprendi muito bem, é como esconder quem eu sou. Julian não tem chance alguma de ganhar de mim nisso. - Não sabia que você fumava. – ele fala, olhando diretamente para mim. - Você acabou de me conhecer, não tinha como saber. – falo com toda a calma. Joe anda em direção a ele e passa pela porta de vidro, enquanto os olhos do Julian se estreitam em minha direção. Ele permanece com os olhos cravados em mim por bons segundos e eu sustento o olhar, mas o Joe toca o seu ombro e parece dizer algo para ele, antes que ele finalmente feche a porta e se afaste de uma vez. Abro um sorriso por estar sozinha e por ver o incomodo do Julian com a minha presença, se ele já está achando isso r**m, não quero nem pensar o que ele vai achar quando descobrir a razão da minha presença.
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