Ele é o Caos

Beijos chuvosos

Já faziam 15 dias que eu não tinha contato com Henrique, o encontrei alguma vezes durante o almoço, mas ele não me olhou e eu estava sempre acompanhada de Fernando.

Eu estava com um misto de emoções, era difícil admitir, mas eu sentia saudades das nossas conversas e vontade de ir além naquele sexo que ficou pela metade.

No fundo eu estava confusa, aqueles olhos caóticos de Henrique tinham mexido comigo de uma forma que eu não conseguia entender, tentei todos esses dias entender o motivo de estar me sentindo dessa forma. Henrique não era o rapaz mais bonito ( apesar de ser lindo) e nem o mais carinhoso que apareceu em minha vida, não conseguia encontrar uma razão lógica para sentir saudades e tanta vontade dele.

- Eu viajo amanhã- disse Fernando durante nosso jantar.

- Eu sei meu amor, estou pronta para ficar 15 dias longe de ti- respondi, voltando dos meus pensamentos distantes.

- Vou deixar meu carro para você, é mais confortável, você só precisa me deixar na rodoviária, vou de ônibus porque preciso voltar com o carro da nova empresa. - ele disse.

- Tudo bem, estou ciente disso Fernando.- respondi rindo

- Se você se sentir muito sozinha, pede para alguma amiga sua vim lhe fazer companhia, não fique sozinha, isso te deixa ansiosa. - Fernando falou em tom sério.

- Por favor Fernando, eu sei me cuidar. -respondi irritada.

Terminamos de jantar, lavei a louça enquanto Fernando fazia a mala e depois fomos dormir.

- Acorda Heloísa!

- O que é Fernando? Tá muito cedo!

- Você precisa levantar para me levar, lembra? Vai no banheiro, vou preparar seu café.

Fernando estava lindo, com a barba bem feita e um perfume amadeirado que eu amava, eu levantei da cama, fui ao banheiro e ainda de pijamas caminhei até a cozinha onde ele tinha preparado meu café da manhã.

- Bom dia preguiçosa- ele disse me dando um beijo na testa.

- Bom dia bonitão- Falei enquanto me sentava para tomar café.

Tomei café da manhã e fui me vestir, escolhi um vestido de meia estação, o Outono tem um vento gelado por aqui, coloquei meia calça e botas até o joelho, antes de sair lembrei que ficaria fora o dia todo e peguei um casaco, ainda bem, o dia estava chuvoso e cinza.

Entrei no carro de Fernando e segui dirigindo até a rodoviária da cidade, morávamos em uma cidade muito pequena, não tinha aeroporto por perto.

Me despedi de Fernando com um beijo e fui para meu trabalho.

Dias chuvosos me deixam melancólica, me sinto como em um daqueles clipes de música triste, onde a atriz encosta o rosto na janela e chora, sempre odiei esse clima.

A manhã foi difícil, minhas emoções estavam confusas e o clima intensificava isso, passei maior parte do tempo tomando café e olhando as folhas das árvores caírem, pela janela da minha sala.

- Elas caem sem alardes, apenas caem, para que os galhos se fortaleçam. Talvez seja esse o segredo de tudo, cair sem alardes.- Pensei enquanto observava o movimento das folhas.

Já era hora do almoço, chuva estava fina e gelada, eu não sentia a minima vontade de sair para almoçar, mas ainda assim fui até o restaurante.

- "Droga, esse carro é maior que meu, não consigo estacionar"- Falei em voz alta enquanto descia do carro de Fernando.

-Precisa de ajuda moça? -Ouvi a voz de Henrique atrás de mim.

- Não, obrigada- respondi sem olhar para trás e continuei andando até a porta do restaurante.

Me servi e escolhi uma mesa longe da porta, não queria sentir o vento gelado entrando.

Olhei rapidamente por todo restaurante, tentando encontrar Henrique, ele estava se servindo no Buffet de costas para mim.

- "Melhor assim, deixar ir para se fortalecer"- Pensei, ainda refletindo sobre as folhas no Outono.

Me perdi em meus pensamentos por alguns minutos e quando ergo os olhos Henrique está sentado na mesa em frente a minha, me olhando fixamente.

Me perdi naqueles olhos tão caóticos e tão cheios de vazio, fiquei ali olhando fixamente para aqueles olhos, até que ele desviou o olhar

Não consegui terminar de comer, apenas me levantei, paguei a conta e entrei no carro, fiquei alguns minutos ali pensando em tudo que estava acontecendo em minha vida, na situação com Fernando, nos sentimentos que Henrique estava despertando em mim.

-Essa história com Henrique termina aqui- falei para eu mesma.

Eu não podia levar isso adiante, não podia magoar Fernando e ainda tinha a Carla, que não tinha culpa de tudo isso.

Liguei o carro e sai acelerando muito, já tinha tomado minha decisão de casar com Fernando e não iria permitir que nada e nem ninguém interferisse nisso.

Cheguei no meu trabalho e recebi uma mensagem de Fernando:

- Cheguei meu amor -

- Que bom, estou ansiosa pelo nosso casamento, te amo- eu respondi

A tarde passou vagarosamente, a chuva aumentou e com ela o frio, quase não tinha trabalho, então passei a tarde procurando,na internet, louças para minha nova casa.

Já eram 17hrs, sai do meu trabalho, como eu gostava de dirigir o carro de Fernando ( que era melhor do que o meu) resolvi fazer uma rota diferente até em casa, por uma rua que não era muito movimentada na cidade.

Eu estava parada no cruzamento quando vi o carro de Henrique do outro lado, ele me viu e parou, ficamos ali nos olhando por alguns segundos, ameacei acelerar, ele fez o mesmo, eu freiei e ele parou novamente.

Em um ato sem pensar eu abri a porta e fui caminhando até ele, em baixo de uma chuva fina e gelada, ele ficou lá parado olhando assustando, sem entender o que eu estava fazendo.

Fui até seu carro, abri a porta, ele se levantou e eu o beijei intensamente, sabe essas cenas de filme? onde o casal se beija na chuva?

Mas o final não foi como uma cena de filme.

- Você está ficando louca? - ele falou irritado

Eu travei, também pensei que estava ficando louca.

- Você não pode me beijar assim, em público, se alguém contar para a Carla? entre no carro e estacione logo a frente, vamos conversar.

Eu apenas obedeci, não sei o que me deu na cabeça, horas antes eu já tinha decidido que não queria continuar com essa história e agora estava ali, aos beijos com ele no meio da rua, como uma adolescente apaixonada.

Estacionei logo a frente, em uma rua sem saída, em um pulo Henrique estava sentado no banco do carona, ao meu lado.

- Vamos conversar Heloísa, o que está acontecendo? Ele me pergunta.

Eu respiro fundo, tento entender minha atitude.

- Me desculpe Henrique, foi um ato sem pensar, me desculpe mesmo.

- Heloísa, você tem um relacionamento e eu também, não podemos ficar aos beijos no meio da rua, ainda mais em uma cidade pequena onde todo mundo te conhece.

- Você está certo, já pedi desculpas.

- Não se trata de pedir desculpas, mas sim do motivo disso estar acontecendo, você está apaixonada por mim?

Respirei fundo mais uma vez, essa frase me deixou irritada .

- Não Henrique, claro que não, a verdade é que nosso encontro foi estranho, você simplesmente saiu sem mais nem menos, eu só queria te provar que posso ter tudo que eu quero, quando quero. Respondi com ar de desdém.

- Tudo bem, acho que começamos de forma errada, mas me beijar na rua não resolve isso.

- Concordo, começamos de forma errada.

- Vamos tentar fazer isso diferente.

-Henrique, eu estou com frio e molhada, quero ir para casa tomar banho e um chá, podemos conversar sobre isso depois?

- Entendo, eu te envio mensagem amanhã então.- ele disse enquanto saia do carro.

Eu queria sair de perto dele, precisava pensar na minha atitude, eu não estava acostumada a ir atrás de homem algum, sempre tive eles aos meus pés.

Liguei o carro e fui para casa, tomei um banho quente e demorado, preparei um chá e fiquei ali pensando no meu beijo em Henrique, até pegar no sono.